1 A SÍNDROME DE BURNOUT EM TRABALHADORES DA SAÚDE NA ATENÇÃO PRIMÁRIA Sabe-se que na sociedade capitalista o trabalho é fonte de aspectos positivos, como inserção social, valor econômico e cultural, possuindo, assim, importância fundamental no modo de vida e na saúde física e mental das pessoas. É através do trabalho que o ser humano tem a oportunidade de crescer e se desenvolver, de criar identidade e trazer mudanças favoráveis para a sua vida individual e coletivamente. 1 Pode-se então estabelecer uma relação de interdependência construída pelos termos saúde e trabalho. Por um lado, o trabalhador necessita ter equilíbrio de seu organismo para desenvolver suas atividades laborativas e constatar assim que este está saudável, pois possui uma ocupação. Por outro, a ausência e até mesmo o excesso de afazeres profissionais com este propósito podem provocar desequilíbrio e consecutivamente o adoecimento do indivíduo. Este processo de adoecer pelo trabalho e posterior investigação sobre o estresse presente no ambiente laboral tem sido estudado por diversos autores. Estes estudos descrevem a influência do trabalho sobre a saúde do trabalhador e com isso buscam traçar possíveis intervenções no contexto laboral a fim de que o equilíbrio seja restaurado ou mantido e este trabalhador não venha a adoecer. (2,3,4,5) É neste contexto, que emerge a preocupação com o burn-out ou Burnout, termo derivado da cultura inglesa que se refere àquilo que deixou de funcionar por absoluta falta de energia. 5 Em analogia ao termo descrito percebe-se, neste caso, que o trabalhador está com suas forças exauridas e assim, não produz mais como deveria causando danos tanto à produção quanto a sua própria saúde. Há um consenso entre os autores que o burnout é uma síndrome característica do meio laboral e deriva da cronificação do estresse ocupacional, apresentando consequências negativas tanto em nível individual, como profissional, familiar e social. 6 Vale ressaltar que existem diferenças entre Burnout e estresse, pois enquanto o estresse pode apresentar aspectos positivos ou negativos, o burnout apresenta-se apenas com um caráter negativo (distresse). Estas se estendem ainda, a perspectiva ocupacional a medida que além de apontar para uma incapacidade temporária do trabalhador, absenteísmo, a qualidade do trabalho é influenciada pela desatenção e negligência do trabalhador acrescida pela
2 interferência na relação profissional-cliente com distância, falta de empatia e hostilidade por parte do profissional. 5 Os estudiosos sobre a temática também concordam que os profissionais que assistem diretamente as outras pessoas ou como responsáveis pelo bem-estar das mesmas estão mais sujeitos ao desenvolvimento da síndrome. 5 Assim, os trabalhadores da área da saúde devido à atividade laboral que executam e a presença dos fatores de risco presentes no ambiente laboral tais como: físico, químico, biológico, ergonômico, acidentes ou mecânico somados aos de natureza humana ou comportamental (decorrentes da ação ou omissão do homem) estão sujeitos ao estresse ocupacional e com a potencialização destes fatores podem desenvolver a síndrome de burnout e sofrer sérias consequências sobre a sua saúde física e mental. 7 O Burnout apresenta-se como uma síndrome multidimensional que acomete o trabalhador sob pressão dos fatores estressores organizacionais e do trabalho demarcadas pela exaustão emocional, despersonalização e perda da realização pessoal. 5 A síndrome de Burnout pode ser traduzida como o esgotamento profissional, estresse crônico que frequentemente ocorre em pessoas entusiastas e idealistas que em contato com o mundo do trabalho vão mudando seu modo de ser e apresentam transtornos que interferem nos aspectos pessoais e sociais do indivíduo e também no seu desenvolvimento no trabalho. Fato este que justifica a presença da síndrome de burnout em muitos trabalhadores da área da saúde e do ensino. 5 Adota-se nesta discussão, a perspectiva do adoecimento do trabalhador da saúde devido às práticas laborais exercidas, ao ambiente de trabalho em conflito aos aspectos de saúde do indivíduo, as relações interpessoais e hierárquicas desfavoráveis à produtividade do mesmo e a influência destes sobre a qualidade de vida deste indivíduo tanto no trabalho quanto fora dele devido à síndrome de burnout. É importante mencionar ainda, como se dá o ambiente em que as relações de vínculo são construídas na atenção básica. Em relação aos aspectos geográficos, estes muitas vezes destoam dos atendimentos dos grandes centros, são verdadeiras áreas rurais, periféricas em todos os sentidos, em que se tem que caminhar longas distâncias para prestar atendimento ou recebê-lo, sem redes de esgoto, lixos na via pública, animais soltos na estrada, o que dificulta sobremaneira a resolução dos desvios de saúde. Na perspectiva relacional mesmo que a orientação para a saúde seja a melhor possível este indivíduo pode ou não permitir a construção do vínculo e a intervenção necessária à sua saúde. 8
3 Neste cenário, percebe-se que este conjunto de trabalhadores ao executar as atividades profissionais precisa estar muito próximo da comunidade na questão espacial e participantes da história de vida dos usuários podendo sobrecarregar a sua saúde física e mental. Fatos estes que podem levar ao adoecimento de si quando as possíveis estratégias de enfrentamento do profissional forem ineficientes em relação aos dilemas da vida dos pacientes que estão sob seus cuidados. Outros fatores presentes no modelo assistencial que podem colaborar no adoecimento destes profissionais, como: os recursos que são escassos para atender as complexas demandas com as quais se deparam. Somam-se a isto, algumas falhas na rede de atenção à saúde que se refletem no trabalho e afetam a resolutividade das ações. 9 Tal visão traduz que estes profissionais estão inseridos no processo saúde-doença do indivíduo como promotores de saúde, mas a ausência ou a quantidade insuficiente de recursos materiais, as longas filas de espera para atendimento, o despreparo dos recursos humanos para prestar uma assistência de qualidade interferem, negativamente, no processo de trabalho e consequentemente estes usuários são tem seus problemas de saúde solucionados ou encaminhados à resolução, com isso, os trabalhadores sentem-se impotentes diante da realidade de saúde apresentada e podem acabar adoecendo. Situações estas que levam a questionar a presença da Síndrome de Burnout nos trabalhadores da saúde na Atenção Primária à medida que estes profissionais prestam assistência direta ao indivíduo, a família e a comunidade em contextos de saúde diferenciados. Estes têm como objetivo levar os serviços de saúde para mais próximo das pessoas, objetivando resolver a maior parte dos problemas de uma comunidade, com a pretensão de cuidar integralmente. 10 Entretanto, há uma escassez de estudos na área da enfermagem, em relação à esta síndrome voltados para unidades de atendimento de baixa complexidade como: unidade básica de saúde e estratégia saúde da família como se, nestes ambientes de trabalho, a frequência de tal fenômeno fosse menor ou até mesmo não existisse, fato este que traz grande relevância para estudos nesta área de atuação. Portanto, ao estudar o fenômeno do Burnout na Atenção Primária elucidará alguns dos problemas enfrentados pelos trabalhadores da saúde, tais como: adoecimento no ambiente de trabalho; absenteísmo; insatisfação profissional, baixa produtividade, entre outros. Com isso, será possível sensibilizar mudanças eficazes, estratégias de prevenção e
4 controle da síndrome tanto na esfera organizacional do trabalho quanto na esfera individual da saúde dos trabalhadores. REFERÊNCIAS 1. Souto DF. Saúde no trabalho: uma revolução em andamento. Rio de Janeiro: SENAC Nacional, 2007. 336p. 2. Dejours C. A loucura do Trabalho: estudo de psicopatologia do trabalho. 5 ed. ampl. São Paulo: Cortez- Oboré. 1992, 168 p. 3. Maslach C, Schaufeli, WB & Leiter MP. Job Burnout. Annual Review of Psychology, 52:397-422, 2001. Disponível em: http://www.annualreviews.org/doi/abs/10.1146/annurev.psych.52.1.397. Acesso em: 25 out 2014. 4. Murofuse NT, Abranches SS, Napoleão AA. Reflexões sobre estresse e burnout e a relação com a enfermagem. Rev. Latino-am.Enfermagem, 13(2):255-261, mar.- abr, 2005. 5. Benevides-Pereira AMT. (Org.) Burnout: quando o trabalho ameaça o bem-estar do trabalhador. 4ª ed.são Paulo: Casa do Psicólogo, 2014. 282 p. 6.. O estado da arte do Burnout no Brasil. Rev. Eletrônica InterAção Psy. 1(1):4-11, 2003. Disponível em: http://www.saudeetrabalho.com.br/download_2/burnout-benevides.pdf. Acesso em: 03 set 2014. 7. Brasil. Organização Pan-americana de Saúde. Doenças relacionadas ao trabalho: Manual de procedimentos para serviços de saúde. Ministério da Saúde do Brasil, Organização Pan-Americana da Saúde no Brasil; organizado por Elizabeth Costa Dias; colaboradores Idelberto Muniz Almeida et al. Brasília: Ministério da Saúde do Brasil, 2001. 8. Figueiredo NMA, Santos I, Handem PC, Tavares R, Machado WCA. Programa de Saúde da Família (PSF): a família como sujeito de intervenção. In: Figueiredo, N.M.A.; Tonini, T. (Orgs.). SUS e PSF para enfermagem: práticas para o cuidado em saúde coletiva. São Caetano do Sul: Yendis. 2007, [cap. 6, p. 175] 9. Trindade LL, Lautert L. Síndrome de Burnout entre trabalhadores da Estratégia de Saúde da Família. Rev Esc Enferm USP. 44(2):274-9, 2010. 10. Silva ROL da. A visita domiciliar como ação para promoção da saúde da família: um estudo crítico sobre as ações do enfermeiro. 2009. Dissertação (mestrado em enfermagem) - Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), Rio de Janeiro.
5 Autores: Renata da Silva Hanzelmann Doutoranda do PPGENFBIO/UNIRIO. Responsável Técnica pelo Programa Saúde na Escola (PSE) da Secretaria de Saúde do Município de Nova Iguaçu/RJ. Docente do Curso de Graduação em Enfermagem da Associação Brasileira de Ensino Universitário (UNIABEU). Membro do Grupo de Pesquisa PENSAT. Joanir Pereira Passos Doutora em Enfermagem pela Universidade de São Paulo. Coordenadora do PPGENF Mestrado. Professora Associada da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO). Professora nos Programas de Pós-Graduação em Enfermagem (PPGENF) e em Enfermagem e Biociências (PPGENFBIO) da UNIRIO. Líder do Grupo de Pesquisa PENSAT. Como citar este post (Vancouver adaptado): HANZELMANN RS, PASSOS JP. A síndrome de burnout em trabalhadores da saúde na atenção primária. [internet]. Rio de Janeiro (br); 2015 [Acesso em: dia mês (abreviado) ano]. Disponível em: http://www...(completar com os dados do site).