HERMENÊUTICA CONSTITUCIONAL Objetivo final do estudo da Hermenêutica Jurídica. A Constituição assume dimensão muito mais ampla do que a legislação em geral. CF = ponto de encontro entre o social e o jurídico, a sociedade e o Direito, o cidadão e o jurista. (equilíbrio das duas dimensões) Interpretação da CF exige uma nova postura teórica e ideológica, pois seu texto é produzido em forma de princípios e regras, que às vezes colidem. Padrões da hermenêutica clássica são insuficientes, devendo buscar-se auxílio nas teorias das ciências filosóficas e sociais (norma + contexto). Constituições de cunho social, seu texto não encerra um sentido exato, mas busca a mais adequada solução para os problemas jurídicossociais. Interpretação da CF não envolve apenas metodologia, mas uma realidade existencial dentro da qual se situam a sociedade e o intérprete.
SISTEMA CONSTITUCIONAL CF contém um dinamismo permanente entre o social e o jurídico, intérprete e texto, num movimento de complementaridade necessária (CF+legislação). Toda interpretação legislativa é, ao mesmo tempo, interpretação da Constituição. Interpretação CF se faz numa espécie de tríplice fronteira (hermenêutica jurídica, sociologia jurídica, direito constitucional). Constituição não é uma norma isolada, mas inserida num conjunto de normas que a efetivam e a complementam (constitucionalização do Direito). A doutrina atual se refere a um Sistema Constitucional, formado por ela própria, leis complementares, ordinárias, normativos diversos, sentenças, partidos, etc. Novo constitucionalismo: superação dos limites do princípio da legalidade estrita, buscando maior aproximação entre Estado e Democracia.
NOVO CONSTITUCIONALISMO Surgiu após a 2a guerra mundial, reestruturando a doutrina clássica oriunda da Revolução Francesa. As diversas forças sociais atuam em conjunto e de modo harmônico, em busca do mesmo fim: proteção das liberdades e garantia dos direitos individuais e coletivos. CF 88: novo modelo do Estado Democrático de Direito, baseado no princípio da legalidade material (sociedade livre, justa e solidária). Maior intervenção do Estado na sociedade, visando por em prática sempre mais efetiva o texto constitucional (sistema jurídico-político interno). Interpretação constitucional é regida pelo critério valorativo, para atender as modificações impostas pela evolução dos fatos sociais e da realidade política. Nova hermenêutica constitucional determinada pelo órgão responsável pela determinação do seu conteúdo e significado: o tribunal constitucional. Flexibilização do princípio da separação dos poderes.
JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL - SUMULA VINCULANTE Exercida pelo STF, é o conjunto de procedimentos destinados a garantir, de forma imediata, a observância da Constituição. O Poder Judiciário pode expedir interpretações com caráter de quase lei, sobre a determinação e o sentido das normas constitucionais. A EC 45/2004 incluiu dois novos procedimentos: súmula vinculante e repecussão geral, que vieram juntar-se aos anteriores: ADI, ADC e ADPF. SV tem efeito obrigatório aos demais órgãos do Poder Judiciário, bem como à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal. Foi criada pelo art. 103-A da Constituição e regulamentada pela Lei n.º 11.417/2006. Exige o quórum de dois terços para a sua aprovação, cabendo também ao STF a atribuição de editar, rever ou cancelar.
SUMULA VINCULANTE - REFERÊNCIAS HISTÓRICAS Antecedentes: jurisprudência romana e brocardos jurídicos. Procedimento característico dos países do sistema common law, que adotam o caráter vinculativo das decisões da Suprema Corte. Houve tentativas anteriores de introdução da SV no Brasil: Rui Barbosa, após a proclamação da República, tentou incluir na Constituição, sem êxito; Haroldo Valadão, em 1961, propôs anteprojeto de lei para essa finalidade, sem apoio; Alfredo Buzaid, em 1964, propôs anteprojeto do CPC incluindo a SV, foi rejeitado; Sem caráter vinculativo, a súmula teve início no STF em 1964, por sugestão da sua Comissão de Jurisprudência, presidida pelo Min. Victor Nunes Leal. Principais argumentos contrários: viola a separação dos poderes, risco de estagnação do Direito, retira o livre entendimento dos juízes. Principal vantagem: medida processual contra o número excessivo de recursos. Não prevalece sobre a lei.
SÚMULA VINCULANTE - PROCESSAMENTO De acordo com a Lei n.º 11.417/2006, art. 3.º, a proposta de SV pode ser feita: diretamente pelo STF pelo Presidente da República pelos Presidentes das Mesas do Congresso pelo Conselho Federal da OAB pelo Defensor Público Geral da União pelas Assembleias Legislativas pelos Tribunais Superiores A aprovação e o cancelamento devem ser decididas por dois terços dos Ministros do STF (funcionamento do Plenário Virtual). As SV iniciaram uma nova numeração, sem alteração das súmulas ordinárias, que seguem a numeração já existente.
JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL - REPERCUSSÃO GERAL Constitui-se em preliminar arguída num recurso extraordinário ao STF, no qual a parte recorrente demonstra que a querela ultrapassa os interesses subjetivos das partes e passa a ser relevante para toda a sociedade. Introduzido na CF pela EC 45/2004, através do art. 102, 3º e regulamentado pela Lei n.º 11.418/2006. A preliminar é apreciada pelo Ministro Relator, que profere decisão irrecorrível de aceitação ou não (funcionamento do Plenário Virtual). A repercussão geral pode ser alegada envolvendo questões de grande relevância nas ordens econômica, social, política ou jurídica, envolvendo toda a sociedade. Caso a matéria não seja reconhecida, o STF não apreciará o mérito e o processo transita em julgado.
REPERCUSSÃO GERAL - FUNCIONAMENTO Qualquer recorrente pode se servir desse instrumento jurídico. Os Tribunais Regionais Federais e Estaduais farão uma triagem nos recursos do mesmo tema e enviarão ao STF um ou mais representativos da controvérsia. A decisão do STF proferida nesses recursos será aplicada aos demais, que ficaram sobrestados na origem. Os Tribunais farão a adequação. Principais argumentos contrários: viola o princípio do acesso ao judiciário (denegação da justiça) restringe-se ao entendimento subjetivo de um(a) Ministro(a) incompatível com o sistema jurídico brasileiro Principais argumentos favoráveis: redução do número de recursos repetidos desobrigação dos procuradores públicos permitir ao STF dedicar-se mais às novas questões. A Lei n.º 11.672/2008 aplicou o mesmo sistema aos recursos do STJ.
EC 45/2004 - REFORMA DO PODER JUDICIÁRIO Efeito prático da SV e da RG: medidas contra a morosidade da Justiça brasileira. Juntamente com a SV e a RG foi baixada a Lei n.º 11.419/2006, a lei do processo judicial eletrônico (PJe), em fase de implantação. O PJe abrangerá todo o Poder Judiciário nacional, substituindo os sistemas processuais próprios de cada Tribunal. Administrado pelo CNJ, que estabelece os critérios técnicos normativos da sua confecção. Breve eliminação dos processos físicos (papel), substituídos por autos virtuais. Resultados: maior agilidade, maior transparência, mais segurança jurídica. Introdução do Poder Judiciário no mundo da informática, onde já estão inseridos os sistemas bancários e financeiros em geral, acompanhando a evolução da tecnologia.
MÉTODO DA NOVA HERMENÊUTICA CONSTITUCIONAL O novo constitucionalismo trouxe a necessidade de um novo método de interpretação da Constituição, abandonando a legalidade estrita. Essa doutrina, chamada de pós-positivismo, orienta uma compreensão do Direito voltada para os valores sociais (lógica teleológica e axiológica). Gera-se uma nova compreensão das normas jurídicas, tanto legislativas quanto constitucionais, de que elas não carregam apenas um sentido único, podendo ser interpretadas sob diversas perspectivas. Isso acarreta mudança no entendimento do que sejam: norma - não traz pronta a solução (positivismo), mas aponta para um início de solução, havendo a necessidade de colaboração pessoal do intérprete (pós-positivismo); problema - deixa de ser simples contexto fático (positivismo), passando a funcionar como um co-fornecedor de elementos jurídicos, que se materializarão na aplicação da norma; intérprete - sua função não é meramente técnica (positivismo), mas é um participante ativo no processo de criação do Direito, completando o trabalho do legislador.
FORÇA NORMATIVA DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS A nova metodologia renovou uma antiga polêmica acerca da força vinculante dos princípios, introduzindo novos elementos norteadores da interpretação da Cons. De acordo com a doutrina clássica, os princípios são conselhos ao legislador para elaboração das leis, sem força imperativa diante de todos. Caráter político. No pós-positivismo, as normas constitucionais programáticas não são meros conselhos, mas a interferência do jurídico sobre o político, com obrigatoriedade. Isso demonstra que há uma unidade normativa na Constituição, sendo necessário rever a distinção entre princípios e regras. Na doutrina atual, prevalece o entendimento de que a expressão normas forma o gênero, da qual princípios e regras são as espécies. As normas constitucionais podem ser classificadas em normas-princípios e normas-regras.
PRINCÍPIOS E REGRAS NA CONSTITUIÇÃO Normas-princípios, ou simplesmente princípios, são as de conteúdo abstrato e de maior abrangência no sistema; Normas-regras, ou simplesmente regras, são as de conteúdo mais prático e de aplicação mais específica. Esse entendimento está contido no art. 5º, LXXVII, 1º: As normas definidoras de direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata. Numa visão bem ampla, o princípio atende a um comando genérico, enquanto a regra corresponde a uma determinação mais precisa. Exemplos: princípio - A aula começará amanhã cedo. O aluno deve chegar o mais cedo possível. regra - A aula começará amanhã às 8:00 horas. O aluno que chegar atrasado terá falta.
PRINCÍPIOS E REGRAS CONSTITUCIONAIS Diversos juristas explicam essa distinção entre princípios e regras no Direito atual. Conforme J. J. Canotilho, os critérios de distinção são os seguintes: pelo grau de abstração - princípios são genéricos, regras são específicas; pelo grau de determinação - princípios são indeterminados, regras são concretas; pelo grau de fundamentação - princípios=fundamentos; regras=aplicação imediata; pelo grau de proximidade - princípios aproximam-se dos ideais do Direito; regras - dos fatos; pelo grau normogenético - princípios constituem as bases das regras. Conforme Luis Roberto Barroso, podemos distinguir três critérios: quanto ao conteúdo - princípios expressam valores, regras são relatos objetivos; quanto à estrutura - princípios indicam estados ideais, regras estruturam condutas fáticas; quanto à aplicação - princípios podem entrar em rota de colisão com outros e se aplicam mediante ponderação, regras operam pela via do enquadramento do fato, aplicam-se mediante subsunção; Quando duas regras dispõem de modo diverso, só uma delas prevalecerá; no caso dos princípios, um não pode afastar o outro, mas deve haver a ponderação.
REGRAS E PRINCÍPIOS NA CONSTITUIÇÃO Conforme Luis Roberto Barroso, os princípios podem ser: fundamentais - republicano, separação dos poderes, dignidade da pessoa humana; gerais - isonomia, segurança jurídica, devido processo legal; especiais ou setoriais - tributário (anterioridade da lei), administração pública (moralidade, impessoalidade), ordem econômica (livre concorrência), ordem social (autonomia universitária) Buscando no texto constitucional, podemos identificar alguns princípios, a título de exemplos: princípios jurídicos - razoabilidade, publicidade, legalidade, livre acesso, duração razoável; princípios políticos - formas de estado e governo, ordem econômica, direitos fundamentais; princípios de garantia - juízo natural, direito adquirido, reserva legal. Alguns exemplos de regras: regras da organização estatal; regras de competência; regras procedimentais (processo judicial, processo legislativo) regras de proteção da família, do casamento, da maternidade...
INTERAÇÃO ENTRE REGRAS E PRINCÍPIOS O sistema jurídico não tolera regras incompatíveis, mas entre princípios, é possível haver colisão sem afetar a unidade do sistema. Exemplos: princípio da segurança colide com a liberdade individual; direito à informação colide com a privacidade; princípio do desenvolvimento colide com a proteção ambiental; livre iniciativa colide com a proteção do consumidor. Sempre que se dá mais espaço para um, faz restrição sobre o outro. Por isso, é necessário equilibrar a interpretação, de modo a atender a ambos. O intérprete aplicará o conjunto de suas potências intelectuais, de modo a viabilizar a solução jurídica que melhor efetive a justiça no caso concreto. A isso, dá-se o nome de ponderação ou proporcionalidade. Quanto mais a intervenção estatal afeta a liberdade de ação do homem, mais cuidadosamente devem ser ponderadas as justificativas dessa intervenção.