HOMICÍDIO ENTRE MULHERES EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA, CAMPO GRANDE- MS Caroliny Oviedo Fernandes 1 caroliny.oviedo@gmail.com Maria Auxiliadora de Souza Gerk 2 txai@terra.com.br Cristina Brandt Nunes 3 cbrandt@terra.com.br Resumo: A violência contra a mulher é baseada na relação de gênero e ocorre em escala mundial. Várias são as consequências para as mulheres desde problemas físicos e psicológicos, podendo culminar em homicídio. O objetivo desse estudo é verificar a prevalência e as características dos homicídios dolosos entre as mulheres vítimas de violência em geral em Campo Grande/MS. Trata-se de um estudo transversal descritivo e retrospectivo, em dados notificados nos Boletins de Ocorrência (BO), de mulheres residentes em Campo Grande vítimas de homicídio doloso, gerados pela Primeira Delegacia de Atendimento Especializado à Mulher de Campo Grande/MS (1ª DEAM), no período de março de 2010 a março de 2015, armazenados no Sistema Integrado de Gestão Operacional (SIGO) da Secretaria Estadual de Justiça e Segurança Pública de Mato Grosso do Sul (SEJUSP). No período, foram registrados 123 homicídios dolosos de mulheres na faixa etária acima de 25 anos (54,5%), cor auto referida parda (50,4%) na região Segredo (15,2%), aos finais de semana (40,6%) no período noturno (55,3%). Os óbitos de mulheres vítimas de violência perpassa todo o ciclo de vida feminina com maior prevalência nas jovens em idade produtiva e reprodutiva, indo ao encontro de estudos realizados tanto no Brasil como em outros países. Conclui-se que o resultado encontrado é semelhante a muitas localidades nacionais e internacionais, porém não é universal. Também percebeu-se a necessidade de políticas que englobem uma articulação entre os serviços de segurança, saúde e sociais que contribuam para a redução dos homicídios entre as mulheres em situação de violência. Palavras-chaves: Violência Contra a Mulher. Homicídio. Direitos Humanos. Enfermagem. Grupo temático: Diversidade e Direitos Humanos 1 Acadêmica do curso de Enfermagem da UFMS. Bolsista de Iniciação Científica CNPq PIBIC 2015/2016 2 Enfermeira. Doutora em Ciências. Professora Associada da UFMS. 3 Enfermeira. Doutora em Ciências. Professora Associada da UFMS
1 INTRODUÇÃO A violência contra a mulher é um problema com proporções endêmicas (OPAS, 2003) de causas multifatoriais que requer ações intersetoriais capazes de articularem os diversos setores da sociedade e do Estado como a segurança, a saúde e o desenvolvimento social (SILVA JÚNIOR, 2005). Ainda que não figure no cenário mundial como um fenômeno novo, assim como as consequências físicas, mentais e na saúde reprodutiva, a sua compreensão como um problema amplo, que viola os direitos das mulheres, é relativamente recente. Um problema global de saúde que afeta aproximadamente um terço das mulheres pelo mundo (WHO, 2013). A violência de gênero, para Minayo (2010, p.95), compreende: [...] qualquer violência baseada no gênero que resulta, ou que provavelmente resultará em dano físico, sexual, mental emocional ou sofrimento para as mulheres, incluindo ameaças, coerções ou privação arbitrária da liberdade, seja na vida pública ou privada. A morte de mulheres é o extremo de um continuum de violência contra mulher que pode ocorrer juntamente com tortura, prostituição forçada, estupros, espancamentos, mutilações e privação de liberdade. Os óbitos femininos resultantes de conturbações de gênero são denominados de femicídio (RUSSEL; CAPUT apud MENEGHEL et al., 2013). O termo femicídio ou femicide (original em inglês) foi utilizado pela primeira vez em 1976 por Diana Russel no Tribunal internacional de crimes contra mulheres, em Bruxelas, definido como mortes intencionais e violentas de mulheres em decorrência de seu sexo, ou seja, pelo fato de serem mulheres e [...] não ser um fato isolado na vida dessas mulheres (PASINATO, 2010, p. 229-230). Para Meneghel et al. (2013, p. 524) [...] o conceito de femicídio contribui para desfazer os argumentos de que a violência de gênero é uma questão privada e pessoal, e a posiciona como um fato político e social. Na última avaliação mundial entre 83 países realizada em 2013, foi constatado que, nos casos de homicídios resultantes de violência contra a mulher, o Brasil ocupou o 5 lugar com uma taxa de 4,8 homicídios por violência em 100 mil mulheres, Mato Grosso do Sul ocupou a 9 lugar entre as unidades federativas e Campo Grande, o 23 lugar entre as capitais (WAISELFISZ, 2015).
2 OBJETIVO Verificar a prevalência e as características dos homicídios dolosos entre as mulheres em situação de violência em geral em Campo Grande/MS. 3 DESCRIÇÃO METODOLÓGICA Pesquisa quantitativa transversal e retrospectiva com a utilização dos dados notoficados nos Boletins de Ocorrência (BO) preenchidos na 1ª DEAM (Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher de Campo Grande-MS) de mulheres residentes em Campo Grande, independente da cidade onde tenha ocorrido o homicídio doloso e do tipo de violência praticada. Os dados utilizados na pesquisa são disponíveis apenas para os próprios funcionários cujo acesso ocorre por meio de uma senha pessoal e intransferível. Assim, a coleta de dados foi intermediada por um funcionário As variáveis do estudo compreendem: idade (menores de 12, de 12 a 17 anos, entre 18 e 25 e maior de 25); cor da pele auto referida (branca, preta, amarela, parda e indígena); dia da semana, horário (00:00 a 06:59, 07:00 a 11:59, 12:00 a 17:59 e 18:00 a 23:59) e região urbana em que ocorreu o homicídio. Esta pesquisa faz parte de um projeto maior intitulado Situação da Violência contra a mulher em Campo Grande/MS aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (CEP/UFMS) sob o parecer nº (incluir), com dispensa do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido por tratar-se de pesquisa em fontes secundárias, bem como preenchimento do Termo de Compromisso de Manuseio do Banco de Dados. 4 RESULTADOS No período estudado, março de 2010 a março de 2015, obteve-se um total de 123 notificações em BO de homicídios dolosos ocorridos entre mulheres, registradas na 1 DEAM de Campo Grande-MS. Observa-se a predominância da faixa etária maior de 25 anos (54,5%). Verifica-se que o homicídio está presente nos diferentes momentos do ciclo vital da mulher, com maior frequência em mulheres adultas na fase reprodutiva (74,8%).
As mulheres de cor da pele parda (50,4%) são as principais vítimas fatais da violência, seguidas pelas de cor da pele branca (18,7%) e preta (3,3). Entretanto, há uma parcela considerável cuja cor da pele não foi informada. Esse resultado surpreendeu as pesquisadoras, visto que a população parda campo-grandense, na região urbana, é 9,3 % mais baixa em relação à população branca (PMCG, 2015). A maior frequência dos homicídios ocorre aos finais de semanas (40,6%) e nos dias que o precedem, quinta e sexta-feira (17,8%), sendo que 20,3% desse dado não foi informado. Quanto ao horário, constatou-se que o homicídio ocorre com maior frequência no período de 18:00 às 23:59 horas (36,6%) e de 00:00 às 06:59 horas (18,7%) totalizando 55,3% dos casos registrados. Dessa forma, o homicídio feminino ocorre nos principais períodos em que as mulheres se encontram em suas residências. Quanto à distribuição dos casos de homicídios dolosos nas regiões urbanas do município durante todo o período, observou-se que houve o predomínio da Região Segredo (15,2%), seguido pela Região Bandeira e Anhanduizínho (12,8%), sendo que em 28,8% dos casos a região urbana não foi informada. Comparando esse resultado com as características sociodemográficas das regiões do município, nota-se que a Região Segredo possui a segunda maior densidade demográfica, a terceira maior renda per capita, a segunda menor taxa de alfabetismo e de Índice de Qualidade de Vida Urbana (PLANURB, 2013; PLANURB, 2015). 5 CONCLUSÕES Por meio da determinação da prevalência e das características dos homicídios dolosos entre as mulheres em situação de violência em Campo Grande/MS foi possível determinar que a maioria da população encontra-se acima dos 25 anos de idade e são pardas e que os homicídios ocorreram em sua maioria aos sábados e domingos entre às 18:00 e 23:59 horas, na Região do Segredo. Esse perfil municipal é semelhante a muitas localidades nacionais e internacionais, entretanto, não é universal. Destaca-se que os dados utilizados na pesquisa são referentes à mortalidade de mulheres e, devido à falta de informações sobre o contexto dos óbitos, não é possivel afirmar que os mesmos são enquadrados no conceito de femicídios.
Apesar disso, os resultados fornecem aos profissionais da rede de atenção e combate à violência um direcionamento na identificação das mulheres em situação de maior vulnerabilidade e, para que medidas futuras preventivas e de proteção possam ser empregadas com a finalidade de contribuir para a redução da mortalidade como consequência da violência. 6 REFERÊNCIAS MENEGHEL, S.N. et al. Femicídios: narrativas de crimes de gênero. Interface, v. 17, n. 46, p.523-533, set. 2013. MINAYO, M.C.S. Violência e saúde. 1.reimp. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2010. OPAS. Organización Panamericana de la Salud. Informe mundial sobre la violência y la salud. Washington, D. C.: OPS, 2003. PASINATO, W. Femicídios e as mortes de mulheres no Brasil. Cad. Pagu, [s.l.], n. 37, p.219-246, dez. 2011. PLANURB. Instituto Municipal de Planejamento Urbano. Prefeitura Municipal de Campo Grande. Perfil Socioeconômico de Campo Grande. 22 ed. rev. Campo Grande, 2015. PLANURB. Instituto Municipal de Planejamento Urbano. Prefeitura Municipal de Campo Grande. Índice de Qualidade de Vida Urbana bairros de Campo Grande 2010. 2 ed. rev. Campo Grande, 2013. SILVA JÚNIOR, J.B. Apresentação. In: BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em saúde. Departamento de Análise de Situação da Saúde. Impacto da violência na saúde dos brasileiros. Brasília/DF, 2005. WAISELFISZ, J. J. Mapa da violência 2015: homicídio de mulheres no Brasil. Brasília: CEBELA/FLACSO, 2015.