Os sistemas técnicos e os Novos Usos do Território



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Transcrição:

Introdução O sistema financeiro se expande no território por meio dos sistemas de objetos técnicos e dos sistemas de ações. Assim, sua análise e compreensão pode se dá, entre outros caminhos possíveis, através do estudo do espaço geográfico. Este pode ser definido [...] como união indissolúvel de sistemas de ações, e suas formas híbridas, as técnicas, que nos indicam como o território é usado: como, onde, por quem, por que, para quê (SANTOS E SILVEIRA 2012, p. 11). Hoje, verifica-se cada vez a capilaridade do crédito como um dos elementos centrais do sistema financeiro para incorporar os pobres ao mercado capitalista do consumo, o que acentua, deveras, o processo de desigualdade social e territorial. Os créditos assumem papel importante na organização do território endividando os pobres e, ao mesmo tempo, inserindo-os na lógica de mercado. Esta é, sem dúvida, uma característica importante do período atual marcado, sobretudo pelo processo de globalização, período que estamos vivenciando o meio técnico científico informacional (SANTOS, 2006, P. 159) com sua instantaneidade que através das propagandas do consumo e do dinheiro fácil alcança as diversas camadas da sociedade, acentua a dispersão do crédito e o processo de alienação das diversas camadas sociais. A dispersão do crédito no território nacional atinge as classes mais abastadas, com a ideologia do comércio próprio, da casa própria, do carro próprio propagada pela acessibilidade do crédito financiado pelos bancos invade a consciência humana e aumenta o desejo de se inserir nos padrões capitalistas do consumo. Para Milton Santos, o consumo tornado denominador comum para todos os indivíduos, atribui um papel central ao dinheiro nas suas diferentes manifestações; juntos o dinheiro e o consumo aparecem como reguladores, da vida individual (SANTOS, 2000, p.56), isso é demasiadamente percebido pela realização dos desejos através do crédito. A classe mais abastada por meio de instrumentos financeiros, como o crédito pessoal, consignado, microcrédito produtivo entre outros atraem novos consumidores possessivos que

deixam seus direitos de lado. A acessibilidade ao crédito é efetivada pela banalização do cartão de crédito tornado popular, que passa a atingir as classes sociais de baixa renda. Para Fernando Costa (2002), o crédito massificado concedido pelos bancos através de linhas de crédito direto ao consumidor (CDC) e de empréstimos pessoal é um dos segmentos mais rentáveis do sistema financeiro. Tal facilidade da acessibilidade e da capacidade de capilarização do crédito ocorre através da solidariedade técnica na organização do sistema financeiro, que normatiza os territórios. Esse território normado (SANTOS, 2006, p.230) é tornado um objeto de manipulação pelo capitalismo que se instaura de diversas formas, regula o homem e suas ações, criando novas formas de dependência. Com a expansão do consumismo, surgem necessidades que cada dia são criadas num mundo onde a globalização frenética utiliza diversos artifícios de manipulação do homem. Caracterizando a ideologia das novas oportunidades, o crédito realiza as expectativas da população pobre que a cada dia o busca como um meio de isenção perante as novas condições impostas pelo sistema aos países pobres. Dessa forma, busca-se através da criatividade novos meios de sobrevivência com a necessidade imposta pela perversidade do sistema capitalista de produção; um novo público alvo começa a ser de interesse do sistema econômico financeiro, aqueles que fazem parte do circuito inferior da economia (SANTOS, 2008) desprovido de tecnologia suficiente para seu desenvolvimento e totalmente desprotegido. Segundo Silva (2013, p.97 apud MONTENEGRO, 2011& SILVEIRA, 2011). A expansão do consumo, no entanto, por si só não serve como parâmetro para medir a pobreza. Ao contrário, devido aos mecanismos atuais utilizados pelas empresas como a financeirização do território e da sociedade, aumenta ao mesmo tempo o consumo e a pobreza porque cresce também o endividamento. O território se conforma também pelas relações sociais e econômicas. A tentativa de unificação a qualquer custo e a implantação dos sistemas de engenharias

para a aceleração do processo de proliferação dos créditos, leva-nos a pensar o território marcado pelos diferentes usos de acordo com os interesses políticos e econômicos. Mas, o processo de integração marcado pelo sistema impõe novas formas de vida com a ideologia de bem-estar para as populações pobres que não alcançaram seus objetivos. Assim os bancos empresariais como o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal, o Banco Bradesco, o BMG (sendo este último que não tem ao menos uma agência em União dos Palmares-AL, mas oferta crédito) bem como outros propagam a acessibilidade através de empréstimos, cartões de crédito e outros itens oferecidos a essa camada da população que se encontravam até então esquecida pelos interesses do sistema financeiro. A expansão do sistema financeiro, através da instalação de caixas aqui é possibilitada pela combinação dos diversos sistemas de engenharias instalados no território e a sua localização pontual de acordo com os interesses socioeconômicos. Tudo isso se torna relevante quando analisamos principalmente o papel da técnica e da política dentro do território. Para Santos (2006, p.26) [...] As técnicas apenas se realizam, tornando-se história, separadamente. Segundo Santos é essa política das empresas que dita às normas do território e aumenta a segregação territorial e social, com a má distribuição de renda e que acentua o nível de pobreza da população. Os sistemas técnicos e os Novos Usos do Território O espaço geográfico sinônimo de território usado é mutável, dinâmico passível de usos diversos por diferentes atores e, segundo Santos (2006), de diversas intencionalidades. O uso do território, hoje não se dá simplesmente pelos atores hegemônicos, mas pela sociedade, porém é necessário enfatizar que os atores que detém poderes políticos e econômicos se utilizam do território de forma intensa e pontual, que segundo Santos (2006) se dá através da apropriação das técnicas. Desse modo, consideramos as técnicas como elemento fundamental na ampliação dos usos do território que se dá conforme o lugar. De maneira que as novas bases técnicas e as novas bases econômicas criam as condições materiais e políticas de

uma ampliação do contexto que interessa primordialmente às atividades mais importantes (SANTOS & SILVEIRA, 2012, p. 294). A técnica acaba por transformar o meio e construí-lo de acordo com as intencionalidades dos homens. As técnicas têm tido um uso hegemônico e tendem a atender a fins específicos, de interesse dos grandes órgãos supranacionais que no período atual tentam unificar todos os lugares, unificação dos mercados, dos costumes, dos gostos concebido, sobretudo pelo processo de globalização que tem como base a internacionalização da economia nacional. Dessa maneira, podemos dizer que: a técnica é a grande banalidade e o grande enigma, e é como enigma que ela comanda nossa vida, nos impõe relações, modela nosso entorno, administra nossas relações com o entorno (SANTOS, 1994, p. 7). Ainda, conforme Santos (1994), ontem a técnica era submetida. Hoje, conduzida pelos grandes atores da economia e da política, é ela que submete. Os objetos técnicos inseridos no território carregam consigo uma racionalidade que impõe as ações humanas, essas ações estabelecem normas. Tudo isso graças ao papel das técnicas que só têm sentido através das ações; objetos técnicos que se realizam através dos sistemas técnicos conjuntamente com os sistemas de ações que proporcionam os usos do território. Não há como explicar o território e a sociedade sem antes entender o papel que as técnicas exercem no período atual. Objetos cada vez mais autônomos regidos por uma lei que já não mais correspondem às forças locais, leis externas, estranhas que correspondem às forças alienígenas e decerto servem para alienar seu entorno. Objetos técnicos que conforme Santos são carregados de informações específicas, feitos para atender a fins específicos que necessitam de profissionais capazes de entender sua finalidade; uma finalidade que foge à compreensão social e que atende ao interesse do capital hegemônico. Dessa forma, podemos perceber que os objetos já não trabalham sem o comando da informação, mas, além disso, passam a ser, sobretudo, informação. Uma

informação especializada, específica e duplamente exigida: informação para os objetos, informação nos objetos (SANTOS, 1994, p.50). Objetos que manipulam, controlam e, sobretudo afirmam-se como fábula no mundo contemporâneo. Hoje as técnicas comandadas por uma política das empresas tem a finalidade de aprisionar o homem e submetê-lo aos desígnios hegemônicos. Se antes quando a natureza primeira, o meio natural (SANTOS, 2006) o homem buscava aperfeiçoar os utensílios que tinham a sua disposição e torna-lo objetos eficazes capazes de facilitar seu trabalho e sua vida, hoje os objetos técnicos conduzidos pelas grandes empresas buscam aperfeiçoar o próprio homem. Os diversos sistemas técnicos ganham ainda mais significados específicos e são normatizados quando conduzidos por uma política das empresas juntamente com o Estado; um Estado submetido às políticas corporativas responsáveis pelo desequilíbrio do território, a falsificação das ideias e a manipulação da consciência humana, cujo objetivo é a ampliação do mercado e os níveis de competitividade entre tais empresas. Desse modo: Se a produção se fragmenta tecnicamente, há do outro lado, uma unidade política de comando. Essa unidade política do comando funciona no interior das firmas, mas não há propriamente uma unidade de comando do mercado global. Cada empresa comanda as respectivas operações dentro de sua respectiva topologia, isto é, do conjunto de lugares da sua ação, enquanto a ação dos Estados e das instituições supranacionais não basta para impor uma ordem global. (SANTOS, 2006, p. 26/27). Os espaços são selecionados de acordo com os interesses dos agentes hegemônicos, que manipulam, usurpam e se utilizam desses lugares de diversas maneiras para servirem ao seu principal propósito que é a produção para um mercado global. A Creditização e as Formas de Alienação Sócio Territorial

No período atual as bases técnicas e informacionais colaboram para o apogeu das novas lógicas capitalistas. O mercado financeiro tem ampliado o acesso ao consumo, uma nova racionalidade estratégica que organiza e ao mesmo tempo desorganiza o território. O fato de os agentes que compõem o circuito inferior da economia (SANTOS, 2008) ter acesso a cartões de crédito, crédito direto ao consumidor e a empréstimos bancários não quer dizer que essa classe da população está saindo de sua condição de pobreza, estes apenas estão se inserindo na nova lógica territorial do consumo e aumentando sua capacidade de endividamento. No curso da história atual, de acordo com Medeiros (2013, p.236), para as classes mais populares [..] o crédito representa a possibilidade de acesso ao consumo, mesmo que não tenham renda fixa. (SANTOS, [1975] 2004, p. 229). Esse processo de distribuição do crédito para as camadas sociais de baixa renda intensifica o acesso ao consumo, pois as classes mais pobres ansiosas pela satisfação dos desejos consomem em níveis elevados. Desse modo: O mundo atual é regido por uma lógica que consegue intensificar laços, cada vez mais intensos e alheios aos interesses da sociedade, em especial com as camadas menos abastadas. As variáveis do período atual tais como técnica, informação, consumo e finanças fundamentadas pela lógica do próprio capital, se tornaram mecanismos intensificadores das desigualdades sociais, de forma que, suas bases foram ampliadas por novas formas de reestruturação modus operandi do capital que conseguiu atrair as camadas populares para novas formas de consumo de insumos materiais e imateriais gerando um ciclo cada vez mais dependente da política dos agentes hegemônicos. (MEDEIROS, 2013, p. 235). A difusão do crédito é uma nova estratégia do capital para ampliar seus níveis de difusão no território, sobretudo porque no período atual com a desburocratização do crédito as finanças assumem decerto um controle sobre as diversas camadas da sociedade, principalmente nas áreas aonde a carência desse tipo de serviço vem com a

ideologia de suprir as necessidades existenciais da população. As finanças se organizam e se reorganizam de acordo com as especificidades do território e, desta forma, é possível destacar que: As diversas formas de organização financeira que se processam no território são, atualmente, entremeadas pela inserção de novos conteúdos técnicos em consonância com os sistemas de ações e conformadas segundo as especificidades do território impactado por esses vetores. Neste sentido, na medida em que se imbricam as relações comerciais, a interdependência entre o dinheiro e o território ganha novos contornos em função da complexidade das relações de troca. (MEDEIROS, 2013, p. 109). A difusão das finanças nos territórios desprovidos desse bem impõe uma nova ordem territorial e uma nova racionalidade em função da existente. Essa racionalidade vem impulsionada pelas novas formas de consumo junto às novas bases técnicas e informacionais que tendem a ampliar a participação da sociedade e contribuem, segundo Santos para essa psicosfera alienante; pois ao mesmo tempo em que se instala uma tecnosfera dependente da ciência e da tecnologia, cria-se, paralelamente, e com as mesmas bases, uma psicosfera (SANTOS, 2006, p.172). Dessa maneira é notório que: É sobretudo esse crescente consumo de informação que participa do alastramento de uma psicosfera modernizadora, impondo racionalidades mas também despertando ou fabricando um imaginário. Ambas, tecnosfera e psicosfera, formas de existência do meio técnicocientífico-informacional, condicionam os comportamentos e entretecem racionalidades e emoções convergentes e conflitantes. (SANTOS, 2012, p. 243). O fenômeno da creditização destaca-se como um dos principais elementos relevantes para integrar as classes sociais de baixa renda ao novo período da história marcado pelos ditames do consumo desenfreado. Isso se torna relevante, no entanto, porque a informação junto às propagandas impulsionam a proliferação das finanças no

território e atraem um público alvo de maior proporção, as bases técnicas são os principais mecanismos para a expansão do acesso ao crédito à classe pobre, que são ludibriadas pelas políticas capitalistas. Sendo assim (...) o crédito se tornou, verdadeiramente, um nexo banal no mundo atual, acirrando a banalização do uso das atividades e das classes de um circuito, antes sem acesso as formas tão banais de acesso ao crédito, o circuito inferior e as classes mais pobres do país (...) (MEDEIROS, 2013, p. 197). Apesar de o sistema capitalista proporcionar a classe pobre, a capacidade de consumir, através das novas possibilidades que as finanças oferecem com os cartões de crédito e outros itens relacionados à capilarização das finanças no território, é notória que as diferenciações de rendas ainda continuam a assolar a sociedade. Essas diferenciações são observadas não só a nível regional, mas, sobretudo a nível local. A fragilização da classe pobre junto à realização dos desejos de consumo tão sonhados contribui decerto para ampliar o processo de alienação duma sociedade que busca constantemente se afirmar perante a perversidade do sistema capitalista de produção. Considerações Finais O texto procurou evidenciar como as finanças assumem um papel importante no período atual, diante das características da sociedade e das especificidades do território. A proliferação das finanças intensifica a difusão do consumo, principalmente o consumo entre a classe pobre que graças ao acesso ao crédito desburocratizado pelas instituições financeiras consegue se inserir na lógica dos interesses capitalistas, contudo aumenta-se também o número de inadimplentes e o endividamento excessivo por parte da sociedade. As finanças assumem um importante papel na sociedade graças aos sistemas técnicos que junto com os sistemas de ações proporcionam o conhecimento do território, através dos fluxos de informações que colaboram com a expansão dos fixos financeiros que se alastram no território de maneira intensa e pontual.

Nosso intuito é procurar entender o papel que as finanças exercem no período atual, e o poder que as técnicas exercem na sociedade, principalmente as técnicas hegemônicas que se tornam ludibriadoras e alienantes. Dessa forma, evidencia-se como o mercado financeiro tem ampliado o acesso ao consumo das classes mais pobres com cartões de crédito, crédito direto ao consumidor e empréstimos bancários, constituindo assim uma nova racionalidade estratégica que acaba por organizar e desorganizar os territórios. As finanças assumem um controle sobre as diversas camadas da sociedade, contendo a ideologia de suprir as necessidades existenciais de uma população cada vez mais carente, fragilizada e desprovida de uma educação financeira, são estas lacunas que contribuem decerto para essa psicosfera alienante instituída por um mercado financeiro que se afirma como fábula para a sociedade do mundo contemporâneo. Referências Bibliográficas SANTOS, M. Técnica, espaço, tempo: globalização e meio técnico-científico informacional. São Paulo, maio de 1994. SANTOS, M. Por Uma Outra Globalização. Do Pensamento Único à Consciência Universal. Rio de Janeiro: Record, 2000. SANTOS, M; Por Uma Outra Globalização. Do Pensamento Único à Consciência Universal. Rio de Janeiro: Record. 2006. SANTOS, M; A Natureza do Espaço: Técnica e Tempo, Razão e Emoção. 4. Ed.2.reimpr. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2006. (Coleção Milton Santos; 1). COSTA, F.N. Bancarização, Crédito popular e Microcrédito. Instituto de Economia- Unicamp. 2002. Seção de artigos. Disponível em: www.unicamp.br.. Acessado em: maio de 2007.

SANTOS, M; O Espaço Dividido: Os Dois Circuitos da Economia Urbana dos Países Subdesenvolvidos/ Milton Santos, tradução Myrna T. Rego Viana. 2. Ed., 1. reimpr.- São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2008. SANTOS, M; Pobreza Urbana/ Milton Santos; Com uma bibliografia internacional organizada com a elaboração de Maria Alice Ferraz Abdala.-3. Ed.- São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2009. SILVEIRA, María Laura. Modernizações Territoriais e Circuitos da Economia Urbana no Brasil. In: XIV. Encontro Nacional da ANPUR. Rio de Janeiro, 2011, p. 1-21. MONTENEGRO, Marina Regitz. Globalização, Trabalho e Pobreza no Brasil Metropolitano. O Circuito Inferior da Economia urbana em São Paulo, Brasília, Fortaleza e Belém. São Paulo: 2011, 303 p. Tese (Doutorado em Geografia Humana). Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. São Paulo, 2011. MEDEIROS, Dhiego Antônio de. Financeirização do território e circuitos da economia urbana: agentes de crédito, técnicas e normas bancárias. Um exemplo em Alagoas/ Dhiego Antônio Medeiros; orientadora Maria Adélia Aparecida de Souza. São Paulo, 2013. 275 f. SILVA, Fernando Antônio; SOUSA, Reinaldo. O processo de urbanização de União dos Palmares- AL e a diversificação/ fragmentação recente de sua economia urbana. Sociedade e Território, Natal, V.25, n 1, p. 80-101, jan./jun. 2013.