A gênese do conceito freudiano de inconsciente

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Transcrição:

A gênese do conceito freudiano de inconsciente Estudos de Psicologia Gilberto Gomes Universidade Estadual do Norte Fluminense Resumo Durante toda sua obra, Freud concebe os processos psíquicos como derivados da atividade do cérebro. Aqui é proposta uma reconstituição dos passos inferenciais (constituindo uma seqüência lógica e não cro- Freud, a consciência é uma espécie de percepção interna de processos psíquicos. Como a consciência não é inerente a esses processos, torna-se natural imaginar que eles possam também ocorrer sem serem percebidos (processos pré-conscientes). O conceito de inconsciente propriamente dito também se mostra tributário de sua concepção psiconeural. Abstract The genesis of the Freudian concept of the unconscious. - E muitas vezes se pensa, Freud sempre manteve a concepção de que os processos psíquicos dependem do funcionamento do cérebro (Gomes, 2005). Citações cobrindo toda sua Freud sempre considerou a atividade psíquica como tendo fun- Discutimos também as conseqüências desta concepção do Em primeiro lugar, destacamos a adesão ao pensamento causal em que esta posição implica. Inegavelmente, a pressuposição do determinismo psíquico é um dos componentes essenciais da teoria freudiana. Em segundo lugar, lembramos o aspecto quantitativo presente em todos os aspectos de sua teoria, e que decorre diretamente da suposição de um fundamento material dos processos mentais. Finalmente, a suposição de que o sistema nervoso é responsável pela atividade anímica leva naturalmente originando o ponto de vista tópico da teoria psicanalítica (Gomes, 2005). concepção sobre a relação mente-cérebro no desenvolvimento desenvolvimento das neurociências e de questionamento sobre as relações entre neurociências e psicanálise, evidencia-se a relevância da questão proposta. A criação por Freud de uma teoria do inconsciente é muitas vezes vista como uma ruptura em relação às tentativas de sua época de explicar os fenômenos psíquicos pelo funcionamento bral não quer dizer que este estivesse de alguma forma presente ou

32 G.Gomes em seu livro The unconscious before Freud (1960). Sem negar a originalidade de Freud, é preciso, entretanto, sobre o inconsciente, concebido ainda sob a perspectiva da teoria muito efetivamente a concepção tradicional do papel central da freudiano que estava presente, mas sim toda uma problemática que estava claramente colocada, todo um novo campo do pen- Desse ponto de vista, podemos encontrar um sentido no fato de a psicanálise não ter sido criada por um psicólogo ou o único fator que propiciou a criação do conceito psicanalítico de das dos outros quadros clínicos de que os neurologistas deviam - as condições de emergência do conceito freudiano. 2 - Freud s Freud, pensavam questões muito próximas às que moldaram o pensamento desse último. Conseqüências da concepção psiconeural A busca de entender os fenômenos psíquicos como derivados da atividade cerebral, entretanto, pode levar a diferentes tipos de conseqüências na elaboração de uma teoria explicativa. O notável - vai incorporar os conceitos do psíquico, como representação, muito claramente no Projeto, de 1895. Mais tarde, ele abandonou riqueza dos processos psíquicos. - vontade consciente e à substituição dos princípios explicativos derivados da consciência de si e dos outros pelos princípios como conseqüência uma extensão das qualidades da consciência - Passos inferenciais para a elaboração do conceito freudiano de inconsciente Confrontando a teoria freudiana do inconsciente com sua concepção sobre a relação mente-cérebro, podemos reconstituir os seguintes passos inferenciais como etapas lógicas que levaram em colaboração com outros fatores, sem dúvida ao conceito Primeiro passo. Se os fenômenos psíquicos conscientes têm um substrato neural, os processos neurais que constituem esse substrato devem ter as características dos fenômenos psíquicos Segundo passo. Se existem processos neurais que funcionam como os processos psíquicos de que temos consciência, conscientes). Terceiro passo. Se existem processos neurais com todas as características do psíquico consciente menos a consciência, características (as que permitem caracterizá-los como repre- algumas outras (negação lógica, contradição, temporalidade, consideração da realidade, etc.). 3 lógica cente ao desenvolvimento do conceito freudiano, e não como uma sucessão de formulações que o autor deveria ter enunciado tado de uma inferência lógica a partir de certos pressupostos. É claro que ele resultou também de questões clínicas e teóricas com é como a resposta que deu a essas questões foi atingida por um Processos neurais com características de processos psíquicos Antes de tudo, o que importa constatar é que a suposição de processos neurais possuidores das características dos processos consciente que é verdadeiramente psíquico, e não simplesmente como ele é concebido como constituído por processos naturais, isso permite considerá-lo como dependente de mecanismos causais que podem ir além daquilo que se costumava atribuir consciência. Sem essa pressuposição de processos neurais com características psíquicas, o inconsciente se mostraria ou desprovido das características dos fenômenos psíquicos, ou tão dependente dessas que seria impossível concebê-lo como consti-

Conceito freudiano de inconsciente 33 tuído por processos naturais. Mais ainda, e principalmente, essa dependência das características dos fenômenos psíquicos, tais como se mostram à nossa consciência, impediria a concepção de processos inconscientes possuidores de algumas, mas não de outras, dessas características, o que caracteriza, precisamente, os processos do sistema do inconsciente propostos, de forma inovadora, pela teoria psicanalítica. Outros autores podiam, com maior facilidade, colocar uma seqüência inconsciente de no lugar de um pensamento consciente, do que imaginar um pensamento (propriamente dito) como realidade neural. Ora, o substrato neural de um pensamento sim, como podemos constatar com especial clareza no Projeto de uma psicologia, um verdadeiro pensamento neural (voltarei a esse ponto na próxima seção). - ou Butler (1880/1920), a extensão de atributos psíquicos aos manifestam uma sensibilidade e uma vontade é, sem dúvida, propor um psíquico inconsciente, mas não concorre muito com a concepção de um inconsciente verdadeiramente psíquico, uma característica de toda a matéria. à atividade cerebral, se voltaram para a psicologia associativa para dar conta desse psíquico, pois essa forma de psicologia era Imaginemos que o córtex é uma tabula rasa, e apresentemos a ele um fenômeno que (...) estimula duas áreas distintas do córtex (...) as duas imagens registradas se associam e, sempre que uma delas é re-excitada, a excitação vai se estender através ciacionista tendia a eliminar as faculdades psicológicas, como a razão, a vontade, etc., reduzindo os processos psíquicos à combinação de sensações. entre sensações. Ao contrário desses autores, Freud supôs a existência de um campo próprio de processos neurais possuindo plenamente as características do psíquico. Quando digo que Freud postulou a do psíquico, isso não implica necessariamente na suposição de um do Projeto - correlato psicológico (Freud, 1891/1983, pp. 105-106).. Projeto, o que Freud requer dos processos neurais responsáveis pela atividade psíquica é um grau de complexidade, uma estrutura etc., sem pretender reduzi-los a meros processos de associações de sensações. O primeiro passo inferencial descrito acima pode ser ilustra- no Projeto. 5 partir da fonte pulsional, e sua descarga por ocasião da vivência também um esforço para percebê-lo (pp. 332-333). dele, a exigência de percebê-lo e a representação da atividade simples associação de sensações. Freud também apresenta, no Projeto, toda uma teoria - efetuada pelo eu ( ), concebido como um grupo de neurônios corresponde ao investimento dos neurônios a+b e o investimento perceptivo ao investimento dos neurônios a+c, o pensamento c a b (p. litações, mas também pela representação-alvo (Ziel O neurônio b, que corresponde a esse alvo, exerce uma atração sobre o deslocamento da quantidade. sistêmico de processos teleonômicos, mas vemos que a limitação de evitar a todo custo um pensamento teleológico em relação aos fenômenos naturais não vale para Freud. Algumas vezes,

34 G.Gomes será mesmo preciso ir contra as facilitações presentes (Freud, eu que tornará isso possível (p. que vêm tomar o lugar do pensamento. Ao contrário, Freud se esforça para construir um modelo neural do pensamento que possa representar as características psicológicas do próprio pen- mas nem por isso limitando-o ao que essa revela). O papel da consciência nos processos psíquicos É preciso considerar também qual é a teoria freudiana da consciência. Isso importa, aqui, pois o problema mente-cérebro é antes de tudo o problema mente consciente-cérebro (Gomes, 1995). É só secundariamente que se coloca o problema da relação entre o psíquico inconsciente e o cérebro. Duas concepções sobre da consciência é intrínseca a todos os processos psíquicos. Mesmo se restringirmos essa tese a uma parte somente dos processos psíquicos, o importante aqui é ser a consciência considerada por esse ponto de vista como intrínseca a eles. A outra concepção considera que a consciência é um evento mental distinto, que uma propriedade relacional (pois envolve a relação entre dois de Freud (Gomes, 2003). a consciência (...) é excitável (...) a partir (...) do sistema da per- de prazer e desprazer (...) Mas (...) a consciência (...) tornou-se também um órgão sensorial para uma parte de nossos processos implica necessariamente numa teoria materialista do psíquico. Mas ela se adapta bem à tese da identidade psiconeural, ou dos dois aspectos. Se queremos de fato estimar o papel da concepção de Freud sobre a relação mente-cérebro na gênese do conceito psicanalítico de inconsciente, devemos relacionar essa concepção com sua teoria da consciência. Se a consciência inclui a percepção - dar conta da complexidade dos processos psíquicos percebidos pela consciência. Isso quer dizer que categorias psicológicas de- etc.) devem ser, numa certa medida, aceitas e não consideradas - mesmo se essa complexidade ultrapassa largamente o que é inferencial descrito acima). Como a consciência não é uma qualidade inerente aos processos psíquicos que são conscientes, mas sim uma percepção desses processos, torna-se natural imaginar que os processos percebidos pela consciência possam também ocorrer sem serem percebidos. 6 A consciência torna-se, assim, contingente, e será conscientes. Como, nessa etapa, são pensados processos não conscientes que têm as mesmas propriedades dos processos pré-conscientes. (Segundo passo inferencial). todo indispensável a esse segundo passo inferencial, que pode essa concepção o torna mais fácil de realizar. Em relação a esse segundo passo, podemos relembrar esta passagem do Projeto - independentemente dela. Estamos preparados para descobrir consciência. Se não nos deixarmos cair em erro nisso, eis o que - em toda sua extensão, como inconscientes, e devem ser inferidos Isso quer dizer que mesmo os processos psíquicos que são consciência. dente da Standard Edition (Freud, 1950/1966b, p. 308), dizendo e que será preciso um certo tempo para que o autor possa repeti-la, em A interpretação dos sonhos (1900/1982a, p. 580), em relação a eventos psíquicos Projeto ) o que para outros seria uma contradictio in adjecto. Vimos que a concepção psiconeural não é, em realidade, indispensável ao segundo passo inferencial, se bem que o torne mais natural. É preciso, entretanto, que os processos não essa terceira etapa lógica, assim como para a primeira, essa concepção será fundamental. É a possibilidade de pensar os processos psíquicos em termos de algo que não é puramente de pensar a possibilidade de processos psíquicos que, além do fato de não serem conscientes, não têm todas as características sos que, ao contrário, têm propriedades bem diferentes, mesmo - Projeto)

Conceito freudiano de inconsciente 35 deveria nos impedir de constatar que seu criador não poderia ter dispensado a formulação neural para desenvolver os conceitos que desenvolveu. Conclusão simples linguagem metafórica, uma simples roupagem da teo- como muitas vezes se considera, mas, na verdade, a condição de possibilidade de pensar os processos do inconsciente. O Projeto constituíram a incubadora na qual pôde ser gestada a teoria psicanalítica. cessos psíquicos, que desenvolveu nessa obra, por ele repudiada. a natureza desses processos, postulando mecanismos de um - trado que, sem essa concepção neural, não teria sido possível para Freud criar e desenvolver sua teoria do inconsciente. Referências - Butler, S. (1920). publicado em 1880) Gesammelte Werke Gesammelte Werke, vol. Standard Edition, vol. 5 (pp. Standard Edition em 1905) Standard Edition, vol. 18 (pp. Standard Edition Standard Edition Standard Edition, Standard Edition publicado em 1888) Standard Edition, vol. 1 Studienausgabe Studienausgabe Studienausgabe, vol. 3 (pp. 119-162). - Gesammelte Werke, Nachtragsband em 1950) Oeuvres complètes publicado em 1930) Philosophical, 8(2), 155-165. Gomes, G. (2003). A teoria freudiana da consciência. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 19 sicologia: Teoria e Pesquisa, 21 Philosophical Studies, The unconscious before Freud

36 G.Gomes Notas 1 feitas pela fonte utilizada em cada caso, dando-se preferência à referência ao original quando este foi confrontado com as traduções disponíveis. Em alguns casos, em que nem todas as citações foram confrontadas ao original, ou quando foi à fonte utilizada no caso. As citações literais foram traduzidas para o português pelo autor. Adotamos a convenção de indicar a obra pelo ano da publicação original seguido pelo da publicação consultada. 2 dos Sonhos. 3 A ausência de negação lógica, de contradição, de temporalidade e de consideração da realidade, nos processos do inconsciente propriamente dito, é discutida na parte 5 de (Freud, 1915/1982c). 1965, p. 39). 5 6 algo inerente ao próprio processo, mas algo que se acrescenta a ele. Lembremos que o autor usa Seele e, e seelischer e, respectivamente, como sinônimos (podendo ser traduzidos como alma e psique, e anímico e psíquico, respectivamente). Gilberto Gomes Revisado em 25.out.06 Aceito em 18.dez.06