Artigo Original Segurança e Eficácia da Angioplastia com Implante de Stent Intracoronariano em Pacientes com Síndromes Coronarianas Instáveis: Comparação com Síndromes Coronarianas Estáveis Luís C. L. Correia, José Carlos Brito, Andréa C. Barbosa, Antônio M. Azevedo Jr, Mário S. Rocha, Heitor G. Carvalho, José Péricles Esteves Salvador, BA Objetivo - Avaliar a segurança e eficácia da angioplastia coronariana com implante de stent em síndromes coronarianas instáveis. Métodos - Análise retrospectiva da evolução hospitalar e tardia de 74 pacientes com síndromes coronarianas instáveis (angina instável ou infarto sem supradesnível do segmento ST) submetidos a angioplastia coronariana com implante de stent, comparados a 31 pacientes com síndromes coronarianas estáveis (angina estável ou isquemia silenciosa estável) submetidos ao procedimento. Resultados - Não houve óbito ou necessidade de revascularização da artéria alvo na fase hospitalar, com incidência de 1,4% de infarto agudo do miocárdio sem onda Q no grupo instável e 3,2% no grupo estável (p=0,6). A incidência desses eventos combinados no seguimento tardio (11,2±7,5 meses) foi de 5,7% no grupo instável e 6,9% no grupo estável (p=0,8). Na análise multivariada, a única variável com tendência a significância como preditora de eventos foi diabetes mellitus (p= 0,07; OR= 5,2; 95% IC= 0,9 29,9). Conclusão - A evolução hospitalar e tardia de pacientes com síndromes coronarianas instáveis submetidos a angioplastia com implante de stent intracoronariano é semelhante ao grupo de síndromes coronarianas estáveis, sugerindo ser este procedimento seguro e eficaz, quando realizado em pacientes instáveis. Palavras-chave: angioplastia coronariana; stent; síndromes coronarianas instáveis Hospital Português - Salvador Correspondência: Luís C. L. Correia - Av. Juracy Magalhães Jr, 2452/1204-41920-000 - Salvador, BA Recebido para publicação em 3/8/99 Aceito em 19/1/2000 A realização de angioplastia coronariana com implante de stent em pacientes com síndromes coronarianas instáveis, teoricamente, traz um risco aumentado de complicações trombogênicas, considerando-se a instabilidade da placa aterosclerótica, associada ao potencial trombogênico das próteses metálicas 1. Por este motivo, inicialmente, esta conduta esteve contra-indicada em pacientes com angina instável ou infarto agudo do miocárdio sem onda Q. Com a incorporação de avanços na técnica de implante de stent, esta terapia tem se comprovado segura nestes pacientes e freqüentemente indicada nestas condições 2-4. O implante de stent intracoronariano traz vantagem sobre angioplastia convencional em vários aspectos: redução da necessidade de revascularização urgente, com diminuição da taxa de oclusão aguda durante o procedimento; aumento do ganho imediato após angioplastia (menor estenose residual e estenose residual negativa em alguns casos); redução da taxa de reestenose, devido a maior ampliação do lúmen e diminuição do remodelamento luminal tardio. Considerando o maior risco de complicações trombóticas da angioplastia coronariana com cateter-balão em pacientes com angina instável 3-8, e pelo seu potencial trombogênico, o advento do stent ficou, aproximadamente, três anos limitado a pacientes estáveis ou em situações complicadas de angioplastia por balão 1. O advento recente da técnica de liberação ótima do stent (alta pressão de insuflação do balão) 5,6 associado ao benefício adicional de antiplaquetários, como ticlopidina 7, clopidogrel 8 e infusão venosa de antagonistas da glicoproteína IIb/IIIa 9,10, tem proporcionado maior segurança à angioplastia com stent em placas ateroscleróticas instáveis, tornando-se este um procedimento comum, o que gera necessidade de cuidadosa investigação da evolução destes pacientes. Com o objetivo de avaliar a segurança e eficácia da angioplastia com implante de stent intracoronariano em pacientes com angina instável ou infarto sem onda Q, compara- Arq Bras Cardiol, volume 74 (nº 6), 503-507, 2000 503
Arq Bras Cardiol mos retrospectivamente a evolução hospitalar e tardia destes pacientes com uma população de pacientes com síndromes coronarianas estáveis. Métodos De fevereiro/95 a agosto/98, 370 pacientes consecutivos foram submetidos a intervenção coronariana percutânea na nossa Instituição, sendo 209 com implante de stent intracoronariano. Destes, 105 pacientes foram selecionados para esta coorte retrospectiva e divididos em dois grupos, de acordo com as seguintes características clínicas: 1) grupo estável: pacientes com quadro clínico de angina estável (dor precordial aos esforços físicos iniciada há mais de 60 dias) ou isquemia miocárdica silenciosa detectada em avaliação funcional, como teste ergométrico, cintilografia miocárdica de esforço físico/estresse farmacológico, ou ecocardiograma estresse; 2) grupo instável: pacientes com quadro clínico de angina instável, de acordo com a classificação de Braunwald (classe I, II ou III) 11, ou infarto sem supradesnível do segmento ST após estabilização do quadro clínico, e submetidos a angioplastia nos primeiros 60 dias pós-infarto. Foram excluídos: 1) pacientes pós-infarto agudo do miocárdio com Q submetidos a angioplastia com implante de stent, seja para abertura tardia de artéria ocluída ou cujo procedimento resultou de estratificação de risco pós-infarto; 2) pacientes com decisão do implante de stent ocorrida durante o procedimento como resultado de angioplastia por balão complicada; 3) pacientes que foram submetidos a angioplastia por cateter-balão (sem stent) em outra artéria, no mesmo dia do implante de stent, ou durante seguimento; 4) angioplastia com stent em enxertos venosos ou arteriais. Cateteres-balão para o implante do stent foram escolhidos de forma a obter relação diâmetro artéria/balão próximo a 1:1. A pressão de insuflação foi de pelo menos 12 atm. Heparina não fracionada (10.000 a 15.000 UI) foi administrada por via venosa apenas durante o procedimento, não havendo indicação de heparinização de rotina após o mesmo. O introdutor arterial foi retirado após o tempo de tromboplastina parcial ativado ter alcançado nível menor que 60s. Compressão manual foi realizada pelo tempo necessário para se obter hemostase após retirado o introdutor, sendo então aplicado curativo compressivo. Eletrocardiograma foi realizado de rotina logo após a angioplastia, antes da alta da unidade coronariana e em caso de precordialgia. Enzimas cardíacas (CPK e CK-MB) foram realizadas de 6/6 horas após angioplastia, totalizando pelo menos três dosagens durante internamento na unidade coronariana. Ácido acetilsalicílico 100 mg por via oral uma vez ao dia e ticlopidina 500 mg por via oral duas vezes ao dia foram iniciadas pelo menos três dias antes do procedimento, sendo o ácido acetilsalicílico mantido cronicamente na dose de 100 mg/dia e ticlopidina 250 mg duas vezes ao dia, pelo menos por 15 dias. Sucesso primário foi definido como fluxo TIMI-3 e estenose residual visual menor que 20% após implante do stent. Eventos primários constituíram-se em morte, infarto agudo do miocárdio (surgimento de nova onda Q no eletrocardiograma e/ou elevação da enzima CK-MB para mais de duas vezes o valor normal) e nova revascularização (angioplastia ou cirurgia) da artéria submetida ao implante de stent anteriormente (artéria alvo). Eventos secundários foram considerados valor da formação de hemoglobina decorrente do procedimento e necessidade de novo estudo coronariográfico. Tais eventos foram analisados separadamente na fase hospitalar e no seguimento tardio (11,2 ± 7,5 meses), tendo este último ocorrido através de contato telefônico com o paciente e/ou médico assistente. Variáveis contínuas foram expressas como média ± desvio padrão. Teste do qui-quadrado para variáveis categóricas ou teste t de Student não pareado para variáveis contínuas foram utilizados para análise das características da população e comparação das variáveis representantes da evolução clínica nos dois grupos. Resultados referentes a eventos clínicos foram expressos em intervalos de confiança do risco relativo do grupo instável em relação ao estável. Análise multivariada foi realizada por regressão logística, com o objetivo de corrigir para eventuais diferenças nas características dos dois grupos que pudessem confundir os resultados estatísticos, além de analisar a interação entre diversas variáveis. A despeito de este ser um estudo de coorte, os resultados provenientes da análise multivariada foram expressos por intervalo de confiança do odds ratio, conforme o método de regressão logística. Curva de Kaplan-Meier e teste do log-rank foram utilizados na análise de sobrevida livre de eventos. Nível de significância bicaudal menor que 5% foi representativo de significância estatística. Foi utilizado o software STATA versão 5,0 na análise dos dados 12. Resultados Foram analisados 105 pacientes, sendo 31 do grupo estável e 74 do grupo instável. Dois pacientes em cada grupo foram submetidos a implante de stent em dois vasos, tendo sido analisadas 109 angioplastias com implante de stent. A média de idade da população foi de 61±10 anos, sendo 60% do sexo masculino, no grupo instável e 68% no grupo estável. As prevalências de hipertensão arterial, diabetes, dislipidemia, tabagismo, acometimento multiarterial e disfunção ventricular esquerda por análise ecocardiográfica ou na ventriculografia por contraste foram semelhantes nos dois grupos. No grupo instável, o tempo médio entre o diagnóstico e o procedimento (tempo de estabilização) foi de 10,7±11,9 dias, sendo a mediana de sete dias. Desses pacientes, 90% estavam nos primeiros 30 dias após o quadro agudo de angina ou infarto. A maioria dos pacientes com angina instável encontrava-se na classe II de Braunwald (73% do grupo instável, n=55) e o restante dividido eqüitativamente entre as classes I e III. Pacientes na classe B de Braunwald corresponderam a 75% do grupo instável (n=56), e os pacientes na classe C de Braunwald (angina pós-infarto) corresponderam a 15% (n=11). No grupo instável, oito pacientes tinham diagnóstico de infarto sem supradesnível do segmento ST (tab. I). 504
Tabela II - Características angiográficas das lesões tratadas Grupo estável Grupo instável Valor de p Artérias tratadas 33 76 DA 16(49%) 41(54%) 0,7 Cx 3(9%) 17(22%) 0,1 CD 11(33%) 14(19%) 0,2 Diagonalis 3(9%) 3(4%) 0,3 Tronco de CE 0 1(1,3%) 0.7 Tipos de lesão A 2(6%) 14(19%) 0,1 B1 10(30%) 23(30%) 0,98 B2 14(43%) 32(42%) 0,97 C 7(21%) 7(9%) 0,1 Reestenose prévia 3(9%) 8(11%) 0,8 DA - artéria coronária descendente anterior; Cx - artéria coronária circunflexa; CD - artéria coronária direita; CE - artéria coronária esquerda. A maioria das angioplastias foi realizada na coronária descendente anterior (52%), sendo 24% na coronária direita e 18% na circunflexa. Foram feitas seis angioplastias na diagonalis e uma em tronco da coronária esquerda. Não houve diferença significante entre os grupos quanto à distribuição do tipo de artéria manipulada. Quanto à morfologia da lesão, a grande maioria dos casos foi de lesões do tipo B (73%). A distribuição de lesões tipo B foi semelhante nos dois grupos. O número de lesões tipo A no grupo instável (19%) foi maior que no grupo estável (6%, p=0,12), e as lesões tipo C foram mais prevalentes no grupo estável (21% vs 9%, p=0,13) (tab. II). O uso de heparina e ácido acetilsalicílico foi universal, sendo que apenas dois pacientes (ambos do grupo estável) não fizeram uso de ticlopidina. Contudo, isto não influenciou os resultados, pois nenhum destes pacientes apresentou eventos hospitalares ou tardios. Apenas um paciente fez uso de abciximab. Tabela I - Características clínicas da população Grupo Grupo Valor de p estável instável Número 31 74 Idade (média±dp) 61,4±10 60,8±9,8 0,8 Sexo masculino 21(68%) 45(60%) 0,4 Hipertensão arterial 20(65%) 48(65%) 0,97 Diabetes mellitus 7(23%) 25(33%) 0,3 Dislipidemia 19(61%) 53(71%) 0,5 Tabagismo 5(16%) 17(23%) 0,5 IVE sistólica 2(7%) 13(17%) 0,3 Multiarterial (>1 artéria) 16(52%) 34(45%) 0,3 Cirurgia de RM prévia 2(7%) 6(8%) 0,7 Angioplastia prévia 5(16%) 16(21%) 0,5 Classificação de Braunwald I 6(8%) II 55(73%) III 6(8%) A 0 B 56(75%) C 11(15%) Infarto sem supra de ST 8(11%) IVE= Insuficiência Ventricular Esquerda; RM- revascularização do miocárdio. Sucesso angiográfico primário foi obtido em todos os pacientes. Não houve óbito ou necessidade de revascularização da artéria alvo durante a fase hospitalar, sendo a incidência de infarto agudo do miocárdio durante o internamento e após o procedimento semelhante nos dois grupos (3,2% no grupo estável e 1,4% no grupo instável, p=0,6), todos os casos sem onda Q ou supradesnível de segmento ST. Na análise multivariada de regressão logística, não houve diferença significativa da incidência de eventos entre os grupos após controle para variáveis confundidoras: p=0,31; odds ratio = 0,31; 95% IC = 0,03-2,7. Nenhuma variável mostrou-se preditora de complicações nesta análise. A média de redução da hemoglobina medida após o procedimento foi de 0,91±1,47g% no grupo estável e 0,97±1,42g% no grupo instável (p=0,8) (tab. III). Foram obtidas informações referentes a evolução póshospitalar em 29 pacientes do grupo estável e 70 pacientes do grupo instável. Os resultados encontram-se na tabela IV. O tempo entre a alta do paciente e a coleta dos dados foi de 11,4±1,5 (mediana de 9) meses no grupo estável e 9,5±0,7 (mediana de 8) meses no grupo instável, diferença não significativa (p=0,2). A incidência de eventos combinados (óbito, infarto agudo do miocárdio e revascularização da artéria alvo) foi semelhante nos dois grupos: 6,9% grupo estável vs 5,7% grupo instável, p=0,8. A análise de sobrevida livre de eventos não mostrou diferença nas curvas dos dois grupos (p=0,8) (fig. 1). Houve um óbito em cada grupo: incidência de 3,5% no grupo estável e 1,4% no grupo instável, p=0,6. Infarto agudo do miocárdio ocorreu em apenas um paciente do grupo instável (1,4%, p = 0,7) (sem onda Q e sem supradesnível do segmento ST). Necessidade de revascularização na artéria alvo teve distribuição semelhante nos dois grupos (6,5% grupo estável e 5,4% grupo instável, p=0,8). O único caso de infarto do grupo instável foi submetido a cirurgia de revascularização, culminando em óbito do paciente. Analisando a incidência de infarto, combinando as fases hospitalar e pós-hospitalar, não houve diferença significativa entre os dois grupos: 6,1% grupo estável, 3,9% grupo instável, p=0,6. Durante o período de seguimento, um maior número de pacientes no grupo instável submeteu-se a nova coronariografia, por indicação clínica; contudo, esta diferença não alcançou significância estatística: 10,3% no grupo estável e 18,6% no grupo instável, p=0,4. Na análise de regressão logística, a única preditora de eventos foi diabetes mellitus (OR = 5,2; 95% IC = 0,9-29,9; p=0,07). Discussão Nossos resultados demonstram que implante de stent intracoronariano em pacientes com síndromes coronarianas instáveis é um procedimento seguro e eficaz, visto a semelhança na taxa de complicações precoces e tardias, em comparação com a evolução de pacientes com doença coronariana estável submetidos ao mesmo procedimento. O risco relativo de eventos combinados no grupo instável em relação ao estável foi de 0,4 na fase hospitalar e de 0,8 no seguimento tardio, diferenças sem significância estatística. 505
Arq Bras Cardiol Tabela III - Resultados hospitalares Grupo estável Grupo instável RR (95% I.C.) Valor de p Número 31 74 Sucesso primário 31 (100%) 74 (100%) Infarto* 1(3,2%) 1(1,4%) 0,4 (0,01-32,9) 0,6 Óbito 0 0 Revascularização 0 0 Queda Hb 0,9±1,5 g% 1,0±1,4 g% 0,8 * Todos os casos de infarto foram sem onda Q. Tabela IV - Resultados do seguimento tardio Grupo estável Grupo instável RR (95% I.C.) Valor de p Número 29 70 Seguimento (meses) 11,4±1,5 9,5±0,7 0,2 ventos combinados 2(6,9%) 4(5,7%) 0,8 (0,1-9,2) 0,8 Infarto* 0 1(1,4%) 0,7 Revascularização 2(6,9%) 4(5,7%) 0,8 (0,1-9,2) 0,8 Óbito 1(3,5%) 1(1,4%) 0,4 (0,01-32,5) 0,6 Coronariografia 3(10,3%) 13(18,6%) 1,8(0,5-9,8) 0,4 * Todos os casos de infarto foram sem onda Q. Fig. 1 - Curva de sobrevida livre de eventos combinados, mostrando evolução semelhante nos grupos de pacientes instáveis e estáveis. A realização de angioplastia coronariana com cateterbalão em portadores de angina instável exibe maior incidência de trombose ou oclusão aguda (até as primeiras 24h após o procedimento) 13. Angioplastia seguida de implante de stent oferece maior suporte mecânico e recentes avanços na técnica de implante 5,6 e regimes antiplaquetários 7-10 têm proporcionado maior segurança ao uso de stent em condições de instabilidade, conforme sugerido por Alfonso e cols. 14, que realizaram angioplastia com stent em uma série de pacientes com trombose adjacente à placa aterosclerótica, mostrando baixa taxa de complicações trombóticas. Marzocchi e cols. 15 compararam pacientes com angina instável e estável submetidos a implante de stent, sem alcançar significância estatística, contudo com maior incidência de complicações no grupo instável. Ao contrário, nosso grupo não encontrou diferença alguma a favor do grupo estável, sendo o ris- co relativo do grupo instável sempre menor que 1.0. Visto que o resultado da angioplastia é influenciado pelo tempo de estabilização 16,17, tal diferença pode se dever ao tempo médio de sete dias que nossos pacientes tiveram entre o diagnóstico e o procedimento, enquanto aquele trabalho possuía uma população mais heterogênea, também incluindo pacientes em situações semi-eletivas e urgentes, com risco mais elevado. Pressões de insuflação do balão de pelo menos 12 atm, ao lado do uso de ticlopidina associada ao ácido acetilsalicílico, pode diminuir o efeito do potencial trombogênico do stent, permitindo que se possa oferecer à população instável uma terapia com menor risco de reestenose a médio-longo prazo. Esta hipótese seria idealmente testada caso uma população de angina instável fosse randomizada para uso de stent ou angioplastia convencional, porém em se considerando o benefício do stent na taxa de reestenose, este desenho de estudo não é provável tornar-se realidade. Acreditamos que o presente estudo contribue na confirmação desta hipótese. Observa-se na análise dos nossos dados que a taxa de repetição de coronariografia no grupo instável é maior (não estatisticamente significante), o que poderia sugerir pior evolução neste grupo. Contudo este dado é limitado para esta análise, já que este exame poderia ser realizado por conta de isquemia decorrente de lesão em outra artéria. Além disso, a realização de um novo procedimento na lesão alvo, um critério mais confiável, não mostrou diferença significativa entre os grupos. Na análise multivariada, a presença de diabetes mellitus foi a única variável preditora de eventos pós-angioplastia. Existe controvérsia quanto a este resultado, pois estudos recentes, com amostras grandes de diabéticos submetidos a implante de stent, identificam que apenas os paci- 506
entes diabéticos insulino-dependentes são de pior prognóstico tardio 18-20. Nossa conclusão é limitada pelo pequeno número de pacientes na amostra examinada, levando a maior chance de erro estatístico do tipo II. Contudo, ao contrário do estudo de Marzocchi e cols., as taxas de complicações nos dois grupos foram bastante semelhantes, tendendo até a ser maior no grupo estável, tornando-se menos provável a ocorrência deste erro estatístico em favor da determinação de uma falsa segurança do grupo instável. Embora não estatisticamente significante, houve maior prevalência de lesões de tipo A no grupo instável e do tipo C no grupo estável, podendo ter ocorrido confusão nos resultados. Entretanto, o ajuste destas variáveis por análise multivariada não gerou mudança nos resultados encontrados. Da mesma forma, o tempo de seguimento foi menor no grupo instável (sem diferença estatística), mas a análise multivariada não encontrou influência significativa deste fator nos resultados finais. Conforme comprovado pelo estudo EPISTENT 17,21, o uso de abciximab diminui significativamente a incidência de grandes infartos sem onda Q (elevação da CPK maior que cinco vezes o normal), havendo um evidente sinergismo desta droga com o implante de stent. Além disso, a incidência de revascularização da lesão alvo após seis meses é menor em diabéticos que utilizaram abciximab. A despeito da importância desta terapia, nossos pacientes realizaram o procedimento quando o abciximab não fazia parte da rotina na terapia adjunta ao implante de stent. Apesar disso, nossos dados sugerem a segurança do uso de stent em situações instáveis. Idealmente, o paciente internado com angina instável ou infarto sem Q deve ser submetido a um período de estabilização (pelo menos 48h) antes de qualquer angioplastia. O grupo instável teve uma mediana de sete dias de estabilização, estando a grande maioria dos pacientes de angina instável na classe II de Braunwald. Conseqüentemente, estes resultados se aplicam a pacientes que tiveram pelo menos alguns dias de estabilização antes da angioplastia, não sugerindo que esta deva ser realizada na fase hiperaguda da apresentação clínica. Em conclusão, nosso trabalho sugere que angioplastia coronariana com stent é procedimento seguro (evolução hospitalar) e eficaz (evolução tardia) em pacientes com síndromes coronarianas instáveis. Referências 1. Agrawal SK, Ho DSV, Liu MW, et al. Predictors of thrombotic complications after placement of a flexible coil stent. Am J Cardiol 1994; 72: 1216-9. 2. Serruys PW, van Hout B, Bonnier H, et al. Randomised comparison of implantation of heparin-coated stents with balloon angioplasty in selected patients with coronary artery disease (BENESTENT II). Lancet 1999; 352: 673-81. 3. Stone GW, Brodie BR, Griffin JJ, et al. 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