Uma lenta recuperação



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Transcrição:

Texto preparado A África do Sul e os Desafios da Economia Mundial David Lipton, Primeiro Subdirector-Geral do FMI Fundo Monetário Internacional Instituto de Relações Internacionais da África do Sul, Pretória 8 de Maio de 2013 Primeiramente, quero agradecer ao Instituto pelo convite. Eu me sinto honrado por estar a falar numa instituição tão envolvida com a ascensão da África do Sul ao cenário mundial. A África do Sul passou a ocupar um lugar de relevância na comunidade internacional nos últimos anos, fazendo ouvir a voz da razão e servindo de exemplo das possibilidades de uma mudança pacífica. Tive a oportunidade de trabalhar directamente com as autoridades económicas sul-africanas no G-20 e no FMI. A África do Sul é um membro importante da comunidade internacional. Gostaria de discutir os desafios económicos enfrentados pelo seu país à medida que o mundo busca retomar o caminho do crescimento após quase meia década de crise. Proponho que examinemos o papel dos países de mercados emergentes e em desenvolvimento numa época de dificuldade para muitas economias avançadas. Gostaria de falar também sobre os riscos que países como a África do Sul têm pela frente em decorrência das políticas monetárias pouco convencionais empregadas para debelar a crise. Por último, tratarei dos desafios económicos da África do Sul no campo interno. Minha mensagem é simples e directa: para que os governos consigam vencer este período perigoso, precisarão responder de maneira concreta a todos esses desafios, a despeito dos obstáculos políticos. Isso é de grande importância para países como a África do Sul que estão a lutar para alcançar os níveis de crescimento necessários para satisfazer as aspirações de toda a sua população.

2 Uma lenta recuperação As mais recentes previsões do FMI mostram que a economia mundial está a fortalecer-se lentamente. Contudo, ainda não conseguimos vislumbrar um crescimento que ao menos se aproxime dos níveis registados antes da crise de 2008. Embora os mercados financeiros tenham recuperado, a economia real continua lenta em muitos países e isso significa que o crescimento não é suficiente para oferecer trabalho aos milhões que perderam os seus empregos nos últimos cinco anos. As nossas previsões mais recentes indicam um crescimento da economia mundial de 3,3 por cento neste ano e 4 por cento em 2014. Estamos a notar uma recuperação em três ritmos diferentes, porém precisamos de uma recuperação a toda a velocidade, o que significa crescimento forte, sustentado e equilibrado. Os países de mercados emergentes e em desenvolvimento de modo geral estão a ir bem e algumas economias avançadas estão a apresentar sinais de recuperação, enquanto outras ainda precisam avançar muito. Vemos que a Europa só deve retomar o caminho do crescimento em 2014, mas a um ritmo modesto de 1 por cento. Por ora, os países do sul da Europa permanecem presos numa profunda recessão, e o crescimento nas economias centrais continua fraco. Em muitos países, a banca não consegue oferecer o crédito tão necessário e as empresas estão a investir menos. O desemprego continua a subir a níveis inaceitáveis. Os problemas da Europa exigem acções nacionais e colectivas. A política orçamental é fundamental. Os países que tiverem espaço para apoiar as suas economias precisam fazê-lo e de maneira a estimular o sector privado a investir e aumentar a procura. Outros precisarão de um firme compromisso com medidas de ajustamento para assegurar a sustentabilidade das finanças públicas. No que tange à política monetária, o Banco Central Europeu tem protegido a união monetária com as operações de refinanciamento de longo prazo (LTRO), a fim de oferecer crédito aos bancos, e com o mecanismo de transmissão monetária condicional, por meio das chamadas transacções monetárias directas (OMT). Mas

3 é preciso fazer mais para que os canais do crédito tornem a funcionar. Talvez sejam necessárias outras medidas monetárias pouco convencionais. União bancária europeia Também é preciso agir com relação à união bancária, o que abrange a recapitalização dos bancos por intermédio do Mecanismo Europeu de Estabilidade; de uma união bancária abrangente que agregue uma autoridade única de resolução à recém-criada autoridade supervisora e um de fundo para a garantia de depósitos. Todas essas acções são essenciais para que a Europa evite a estagnação. Isso teria implicações para a economia mundial sobretudo para países como a África do Sul, para os quais o mercado europeu é tão importante. Retomarei essa ideia mais à frente. No caso dos Estados Unidos, a recente retomada crescimento de quase 2 por cento neste ano, subindo para 3 por cento em 2014 ocorre apesar do impacto da forte consolidação orçamental neste ano. Um factor crucial para a recuperação foi a política monetária pouco convencional que o Federal Reserve adoptou após a crise de 2008 e, posteriormente, reforçou. Mais recentemente, essa política serviu de espelho para o Japão, onde o Banco do Japão actuou de forma agressiva para afrouxar a política monetária no intuito de superar a deflação. Até ao momento, essa política monetária pouco convencional tem sido boa para a economia mundial, mas o seu impacto futuro preocupa, sobretudo nos mercados emergentes. Muito tem-se discutido sobre o impacto do fluxo monetário das economias avançadas sobre os preços dos activos e a avaliação das taxas de câmbio. Até agora, não notamos taxas de câmbio pressionadas e fora do seu alinhamento nem estamos a ver sinais de bolhas de activos. Mas é justificável ter cuidado, e também é importante estudar estratégias de saída mesmo que a saída só ocorra daqui a alguns anos.

4 Ainda falando das economias de mercados emergentes e de baixo rendimento, elas responderam por quase três quartos do crescimento desde a crise de 2008, segundo estimativas. A força das economias emergentes da Ásia tem sido de importância vital, sobretudo aqui em África. A procura da Ásia por produtos primários e o fluxo de investimentos e de bens manufacturados de baixo custo daquela região gerou uma dinâmica crucial que está a impulsionar a procura mundial. Contudo, o crescimento tem sido mais lento em países como o Brasil e a África do Sul, o que sugere que a nossa teoria da recuperação em três ritmos talvez seja excessivamente ampla e pouco detalhada. Agora estamos a ouvir sobre a preocupação com a Ásia, de que ela estaria a desacelerar o crescimento da Índia está em torno de 6 por cento ao ano, comparado com 8 por cento há alguns anos, e a China provavelmente não tornará a alcançar dois dígitos de crescimento sustentado. Os desafios para uma África em ascensão Num cenário mundial decididamente irregular, a África Subsariana destaca-se como uma história de sucesso. Nos quase cinco anos desde a crise de 2008, esta região cresceu mais rápido do que nos anos anteriores à crise. O produto regional cresceu 5,1 por cento no ano passado e essa taxa deve subir para 5,4 por cento neste ano e 5,7 por cento em 2014. Mas o crescimento tem sido mais vigoroso nos países exportadores de petróleo e nos de baixo rendimento. Os países de rendimento médio, como a África do Sul e os seus vizinhos, cresceram a um ritmo mais lento em alguns casos devido ao enfraquecimento da procura na Europa e, em outros, em decorrência de problemas internos. Tratarei das questões internas ao falar da África do Sul mais detidamente. Como muitos devem saber, o crescimento de África apoiou-se nos fortes investimentos e nos preços favoráveis dos produtos primários. Porém, gostaria de salientar um factor interno muito importante: a gestão macroeconómica prudente que muitos países estão agora a seguir. Trata-se de uma das conquistas mais impressionantes de África, pois demonstra a melhoria da capacidade institucional e um novo padrão de governação. Com o passar do tempo, instituições mais competentes e uma boa governação podem traduzir-se em melhores

5 resultados na luta contra a pobreza embora os ganhos até ao momento tenham sido desiguais. Onde estão os riscos para as perspectivas de África? Naturalmente, uma nova desaceleração da economia mundial seria uma das principais preocupações, sobretudo se isso envolver uma queda acentuada da procura por bens dos mercados emergentes, com todas as implicações que isso teria para os preços dos produtos primários. De imediato, embora a inflação esteja a cair na maioria dos países, há alguns em que a elevação dos preços continua a ser um desafio. Em alguns outros países, ainda é importante reverter ou travar a expansão fiscal. Certamente, todos os países devem proteger-se dos choques de uma nova desaceleração da economia mundial; essa é a essência de uma gestão prudente. Por esse motivo, o FMI instou vários países africanos a restabelecer as suas margens de reserva orçamentais. Esses países saíram relativamente ilesos da recessão de 2009, em parte porque lançaram mão das suas reservas orçamentais. Agora é a hora de poupar para uma necessidade. O desafio é evitar a redução dos investimentos públicos produtivos e dos gastos efectivamente em favor dos pobres. Entre as opções, destacam-se o alargamento das bases de tributação, a reforma de programas mal administrados e a substituição dos subsídios à energia de custo elevado por medidas direccionadas para a protecção dos pobres. A questão da reforma dos subsídios à energia é tratada no mais recente Regional Economic Outlook, o relatório sobre as perspectivas económicas regionais de África a ser lançado nesta sexta-feira. Numa perspectiva de mais longo prazo, dois desafios prementes respeitam aos gargalos na infra-estruturação e à criação de empregos. Há uma estreita relação entre esses desafios, pois o crescimento necessário para reduzir o desemprego exige avanços efectivos na área da infra-estruturação, sobretudo a geração de energia e isso remete ao problema dos subsídios à energia que geram desincentivos ao investimento. A subida dos preços dos produtos primários também destaca a necessidade de melhor administrar as receitas derivadas dos recursos naturais nos países que agora exploram novos jazigos minerais. Essa questão é crucial para que os países consigam evitar a maldição dos

6 recursos naturais. Essa é uma área em que o FMI está a concentrar a sua assistência técnica para ajudar os países a efectivamente colher benefícios da sua riqueza natural. As perspectivas da África do Sul Percebe-se claramente que a África do Sul beneficiou do êxito da África Subsariana. Os países ao norte são o segundo maior mercado dos bens produzidos por este país, atrás apenas da Europa, e absorvem 15 por cento das exportações. Eles têm quase a mesma participação nas exportações que a China. De facto, a expansão dos recursos naturais aumentou o comércio de equipamentos para a mineração. A Comunidade Sul-Africana de Desenvolvimento em breve pode tornar-se o maior mercado de bens manufacturados da África do Sul. Para além disso, o país está a alargar o seu papel como centro regional de transportes. Os investimentos feitos na região por empresas sul-africanas também estão a subir acentuadamente. O stock de investimento directo da África do Sul no restante do continente equivale a aproximadamente 5 por cento do PIB do país, em comparação com 1 por cento antes da crise financeira mundial. Uma larga amostra da comunidade empresarial está envolvida e os bancos sul-africanos aparentam estar bem posicionados para tirar partido da expansão dos serviços financeiros em toda a África. Contudo, o crescimento africano não compensará a fraca procura no mundo nem os factores internos que limitam o crescimento do país. As perspectivas da África do Sul são moderadas e provavelmente permanecerão assim. Em 2010 11, a média de crescimento do PIB real foi de 3,3 por cento, tendo vindo a cair para 2,5 por cento em 2012. No entanto, o desemprego está em 25 por cento. A expectativa do FMI é de uma recuperação modesta, com 2,8 por cento neste ano e, possivelmente, 3,3 por cento em 2014. Isso decorrerá do aumento da procura por exportações na região e na China. A recente depreciação da taxa de câmbio também deve ajudar, assim como os investimentos públicos em infra-estruturação.

7 Mas a procura externa poderia fazer ainda mais. Uma nova desaceleração na Europa e nos mercados emergentes seria motivo de preocupação. De maneira análoga, o enfraquecimento dos preços dos produtos primários seria um entrave para a economia. Nesse cenário, a África do Sul precisa recorrer mais a fontes internas e sustentáveis de crescimento, sem agravar as suas vulnerabilidades, uma ideia que retomarei num instante. Os fluxos de capital também fazem parte desse cenário. A África do Sul beneficiou da entrada de capitais nos mercados emergentes nos últimos anos. Isso representa um tributo à abertura financeira do país; a soma dos activos e passivos externos equivale a 170 por cento do PIB. Mas a própria abertura da África do Sul e a sua grande necessidade de financiamento externo expõe o país ao risco da saída de capitais. Um surto repentino de aversão ao risco em escala global ou uma turbulência nos mercados mundiais poderia despoletar um desdobramento indesejado. O financiamento dos dois défices do país o do orçamento e o da conta corrente ficaria muito mais difícil. Questões de origem interna É aí que entram em cena as questões de origem interna enfrentadas pela economia. O emprego está baixo demais, sobretudo no sector privado. De cada dois jovens sul-africanos, um está desempregado. Ao mesmo tempo, o salário médio real aumentou a um ritmo superior ao da produtividade. O problema da competitividade da África do Sul está a manifestar-se na forma de um crescente défice comercial, mesmo num cenário de crescimento fraco. Os gargalos nos sectores de energia e transportes são um entrave para a economia. E apesar do forte desempenho das empresas, a queda da confiança dos empresários limitou o investimento privado. A rigidez dos mercados de trabalho e de produtos está na base de muitos desses problemas. O sistema de acordo colectivo precisa atender os interesses de toda a população e não apenas os de quem está dentro. Também é preciso aumentar a concorrência nos mercados de produtos, o que, por sua vez, abriria as portas para novas empresas, inclusive as de pequeno e médio porte. Essas reformas também reduziriam os preços e criariam mais

8 incentivos à inovação e ao aumento da produtividade. Não será fácil levar a cabo reformas nessas áreas, mas um grande acordo social nacional poderia ajudar a superar esse impasse. A África do Sul tem a sorte de contar com gestores económicos capazes. Eles precisam manter a politica macroeconómica prudente que pode gerar um ambiente económico propício ao crescimento e à geração de empregos. Ao mesmo tempo, uma estratégia de médio prazo, conforme delineada no orçamento de 2013, é essencial para restabelecer as margens de manobra orçamentais e reduzir as vulnerabilidades externas. Essas políticas podem abrir espaço para a execução das reformas necessárias para acelerar o crescimento e aumentar o emprego. O Plano de Desenvolvimento Nacional (PDN) do governo contém um projecto bem pensado e amplo para resolver as várias limitações que descrevi, sobretudo na infra-estruturação, educação, saúde e prestação de serviços públicos. É chegada a hora de tomar medidas concretas. Conforme indicado no PDN, a África do Sul precisa consertar o futuro, a partir de hoje. Se os problemas estruturais não forem atacados, as perspectivas de crescimento enfraquecerão e os esforços para reduzir o desemprego e a desigualdade serão prejudicados. Isso pode despoletar uma queda da confiança e um recuo dos fluxos de capital. No longo prazo, a falta do crescimento inclusivo cria um risco para a estabilidade social. As reformas estruturais são a chave que abrirá as portas para a realização do potencial sul-africano. O FMI está totalmente empenhado em trabalhar com a África do Sul para prestar a assessoria e oferecer a análise que pode ajudar a resolver esses problemas e dar vazão a toda a capacidade da economia do país. Como membro do G-20 e maior economia da África Subsariana, este país tem um papel a cumprir para assegurar a estabilidade da economia mundial e contribuir para o crescimento sustentado e equilibrado, ao atacar os seus próprios problemas. A África do Sul fez grandes avanços no desenvolvimento económico e social desde o fim do apartheid. Elevou os níveis de rendimento e reduziu a pobreza. Agora é imperativo gerar crescimento suficiente para criar os milhões de empregos necessários para reduzir o

9 desemprego e absorver quem está a ingressar no mercado de trabalho. O processo de reforma exigirá coragem política, mas é o caminho para colher mais benefícios para toda a população e continuar a construir um país inclusivo que pode orgulhar-se de servir de exemplo para a comunidade internacional.