ASSUNTO em pauta Expectativas e desafios do jovem no mercado de trabalho: comunicação entre jovem e empresa Velychko 30 REVISTA DA ESPM maio/junho de 2011
O jovem quer seu espaço no mercado de trabalho. Sua empresa está pronta para recebê-lo? P o r Caio Pereira Infa n t e e Roberta Brandi Pfrimer o m dos grandes desafios que estamos vivenciando está na comunicação entre diferentes gerações e na falta de alinhamento das expectativas entre os jovens e as empresas. U De um lado os jovens das gerações Y e digital, ingressando no mercado de trabalho, ansiosos por uma rápida ascensão profissional, imediatistas, com expectativa por participar mais das decisões da empresa, além de quererem atenção e reconhecimento. Por outro, vemos empresas engessadas e tradicionais, com uma cultura consistente e em constante busca por metas e resultados. Dentre outros desafios que enfrentam, destaca-se a relação com os jovens: como se comunicar, motivar e retê-los na organização. Para o jovem dos anos 70 e 80, uma boa faculdade era sinônimo de um bom emprego, estabilidade e uma carreira promissora. O mundo corporativo já não é mais o mesmo e os requisitos também são outros e muitos: hoje é necessário ter alguma experiência profissional desde o início da faculdade, falar pelo menos duas línguas, conhecer áreas diversas de seu campo profissional e ter as habilidades necessárias para alcançar os resultados esperados. As exigências competitivas somadas às caracte rísticas da era da informação promovem cada vez mais um jovem que além de gerenciar todo o seu aprendizado ainda precisa gerir a sua própria carreira e sua personalidade. Levantamos seis dimensões que impactam a comunicação e a relação entre jovem e empresa e mostram a diferença de expectativas mais frequentemente encontradas entre ambos: maio/junho de 2011 R EVISTA DA ESPM 31
L.L., programador web, 25 anos, comenta }Enxergo o trabalho como algo que precisamos gostar, para pôr em prática o que a gente aprende, e não como algo a ser imposto.~ RELAÇÃO EMPRESA VERSUS JOVEM R.S., designer, 19 anos, fala de sua decisão pela empresa em que está estagiando: }Procurei uma empresa que me ensinasse, desse oportunidade de eu aprender e de expor meu trabalho.~ EMPRESA Funcionário Processos Promoção Progressão hierárquica Aprender Comportamento JOVEM Usuário Flexibilidade Incentivos Empreendedorismo Reconhecer Conhecimento Funcionário versus usuário Aproveitando o jargão desta geração, os jovens esperam ser tratados como usuários, isto é, como pessoas que façam parte do processo e não como simples funcionários apenas, com tarefas operacionais e que pouco influenciam as decisões da empresa. O jovem quer falar e ser ouvido, além de receber atenção e feedback. Por outro lado, o papel cada vez mais ativo dos jovens no que diz respeito a gestão de sua carreira promove um grande desafio às empresas. Retenção passou a se tornar um dos grandes focos de atuação do RH. O jovem espera que a empresa oriente e eduque, e a empresa espera que, ao investir e desenvolver o jovem, este permaneça na organização e contribua por bastante tempo. M. Dueñas DESAFIO DO JOVEM: Aprender a se comunicar e respeitar hierarquia. DESAFIO DA EMPRESA: Comunicar de maneira clara e transparente o que é esperado dos jovens profissionais. Processos versus flexibilidade As empresas possuem regras e processos em sua operação. Quanto maior a empresa, maior será o nível de complexidade operacional. Entender e adaptar-se aos procedimentos é fundamental para estes jovens terem sucesso no mundo corporativo. Uma empresa não é líder de seu segmento ou atua por mais de 15, 20 anos no mercado sem ter regras bem definidas. O jovem deve controlar sua ansiedade e aceitar que não poderá mudar o futuro de uma organização em poucos meses. Propor mudanças e buscar alguma flexibilidade no ambiente de trabalho é saudável e necessário, mas um não deve ser visto como uma oportunidade de repensar, buscar uma nova alternativa criativa e mostrar seu valor, e não como um obstáculo. O trabalho em equipe é de grande importância no aprendizado do jovem. Aqui, cabe respeitar os processos e compreender a interdependência entre as funções. 32 REVISTA DA ESPM maio/junho de 2011
Por outro lado, as empresas devem entender que liberdade e flexibilidade são características consideradas essenciais ao jovem para que tenha um bom ambiente de trabalho. A busca por informações nas redes sociais, a velocidade em conseguir uma informação só são possíveis dentro de uma organização que permita o jovem se expor e ousar sem ter medo de ser repreendido. Muitos jovens esperam que a empresa cobre-os apenas pelo resultado. Querem ter flexibilidade na forma como executam as tarefas. O efeito esperado é o aumento da produtividade dos jovens que, sentindo-se respeitados, realizarão suas tarefas com maior comprometimento e com foco no resultado. E.F., freelancer, 24 anos, aponta: }O que os gestores antigos às vezes não sabem é que fechando, tirando essa liberdade da gente para ter mais produtividade, tem um efeito contrário.~ R.G., que trabalha numa agência de design, 23 anos, comenta: }Me dá liberdade, que eu tenho responsabilidade! Liberdade não significa que tendo deadline de um minuto que eu vou ficar na internet, nas redes sociais. Isto não tem nexo!~ Empresas como Natura, Google e Apple já se adaptaram a essa realidade. Empresas que inspiram, atraem e retêm talentos. Inovação é uma característica comum dessas organizações que dão maior liberdade e espaço aos jovens, sabem escutar e tirar o melhor de cada um deles. DESAFIO DO JOVEM: Adaptar-se e compreender as regras da corporação. DESAFIO DA EMPRESA: Revisar e adaptar seus processos à necessidade e dinamismo do mercado. Promoção versus incentivos Dinheiro, status, bônus, benefícios são o que os profissionais buscam, porém muitos jovens querem algo a mais do ambiente de trabalho: querem reconhecimento, desafio e oportunidade para mostrarem seus valores, colocarem em prática o que aprendem na faculdade e sentiremse úteis à empresa. O incentivo depende muitas vezes do quanto esse jovem percebe que pode ser reconhecido e crescer na empresa. Cabe mencionar que receber desafios é um modo de o jovem sentir que a empresa confia e aposta nele. Outro incentivo é a relação com o líder. O jovem busca inspiração nos profissionais mais experientes. É com eles que o jovem quer aprender e crescer. Ter um bom líder, que saiba conversar com o jovem e entender sua necessidade, é fundamental para amenizar o choque cultural provocado pela diferença de gerações. R.S., designer, 19 anos, comenta: }É como você dar um doce para uma criança. Se você falar para a criança Vai ali e pega o controle remoto para mim. Se você falar para a criança que você vai dar o doce se ela pegar o controle, ela vai pegar resmungando, se sentindo chantageada. Se você falar para ela que ela pode ficar com o doce inicialmente e que ela pode manusear o controle remoto, nunca mais você vai ter problema com demanda, pois ela vai se sentir parte do processo.~ Enquanto a empresa precisa ouvir seus colaboradores desta nova geração, os jovens devem ter paciência para descobrir a maneira e o momento certos de falarem, sempre respeitando a hierar- Levando-se em conta que a Era da Informação prima pela vantagem de uma boa aplicação do conhecimento, impedir o acesso a sites, portais e redes sociais aos jovens funcionários pode limitar a velocidade com que atingem uma informação. maio/junho de 2011 R EVISTA DA ESPM 33
quia e as políticas da empresa. Ser imediatista pode ser uma armadilha para eles. Eles devem buscar um diálogo aberto e transparente, porém sempre de maneira profissional. DESAFIO DO JOVEM: Fazer a diferença na organização que trabalha, trazendo novos conceitos e ideias criativas ao negócio. DESAFIO DA EMPRESA: Reconhecer e apoiar o trabalho do jovem. Progressão hierárquica versus empreendedorismo O jovem hoje já não vislumbra uma carreira de anos na mesma empresa. Muitas vezes não sabe ainda aonde quer chegar ou onde estará daqui a 5 ou 10 anos. O século XXI é dinâmico, mudanças ocorrem de maneira rápida e desorganizada, refletindo nas escolhas e atitudes dos jovens. A estrutura das empresas tende a ser mais horizontal, com menos hierarquia e mais participativa, dando oportunidade e voz a todos que nela atuam. R.S., estagiário de Design que está desde janeiro de 2011 estagiando numa consultoria, comenta que espera estar numa nova posição dentro de 2 meses: }Me passa para o campo de batalha mais forte que eu quero trabalhar!...). É como um jogo vídeo game). Você precisa passar de fase, e se você não passa, você enjoa de jogar.~ O jovem busca novas experiências, quer conhecer um pouco de tudo e acaba por não se aprofundar nos assuntos que lhe competem e acaba não tendo forças para superar obstáculos, pois pelo dinamismo dos mercados de hoje, mudar o caminho é mais fácil do que superar um novo desafio. DESAFIO DO JOVEM: gerenciar sua carreira dando oportunidade para aprofundar-se mais em determinadas áreas. DESAFIO DA EMPRESA: compreender as diversas necessidades dos jovens e propor novos vínculos. Aprender versus reconhecer Para muitos jovens, a faculdade ensina uma metodologia e passa uma ideia do que acontece no mundo real dos negócios. A semelhança entre estes dois mundos é que todos os projetos, dentro e fora da universidade, são estruturados e executados de acordo com esta metodologia, enquanto a diferença é que no trabalho a responsabilidade é maior e o tempo é mais corrido, logo o processo tem de ser mais rápido e algumas partes metodológicas acabam sendo deixadas de lado, podendo comprometer o resultado final. Usar a criativadade para obter flexibilidade no ambiente de trabalho não deve ser encarado como um obstáculo e sim como algo saudável e necessário ao desenvolvimento profissional. 34 REVISTA DA ESPM maio/junho de 2011 Olly
O jovem, seja estagiário ou recém-formado, quer ter a oportunidade de aplicar seu conhecimento, recém-adquirido na faculdade, no trabalho e, portanto, busca oportunidade de realização. Por outro lado, espera constantemente receber feedback e se desenvolver, aprender novas formas de melhorar ainda mais seu trabalho e ser reconhecido por isso. R.S. comenta: }A empresa onde eu trabalho tem um time que reconhece os valores da minha área.~ DESAFIO DO JOVEM: adaptar o aprendizado adquirido na faculdade à realidade da empresa. DESAFIO DA EMPRESA: oferecer a possibilidade de o jovem aplicar seu conhecimento na sua área de formação. Comportamento versus conhecimento Num mercado cada vez mais competitivo, um dos filtros mais relevantes que as empresas utilizam na hora de contratar é a avaliação de perfil ou de personalidade. Analisar o comportamento do profissional se tornou um recurso para a garantia de uma contratação mais efetiva. Para o jovem, esse é mais um desafio que ele encontra ao enfrentar uma entrevista de trabalho. Não basta conhecer várias línguas, ter uma boa formação, experiência anterior, entre outros quesitos. É necessário também conhecer-se, saber falar de si e gerenciar seu próprio comportamento. Aquele jovem que já tem certo autoconhecimento sabe seus pontos fortes e seus pontos a serem desenvolvidos, pode gerenciar melhor seu comportamento numa entrevista ou numa dinâmica de grupo. DESAFIO DO JOVEM: conhecer-se. DESAFIO DA EMPRESA: equilibrar comportamento e conhecimento de modo a encontrar a melhor medida numa contratação. Portanto, vemos que estão surgindo novos desafios no mercado de trabalho. Enquanto as empresas estão buscando atender as novas tendências do mercado e buscando um modo de incluir esse jovem que está chegando às empresas com novas expectativas e demandas, o jovem está identificando novos nichos de atuação e encontrando novos desafios num mercado cada vez mais competitivo. A comunicação entre empresa e jovem é fundamental na medida em que as expectativas muitas vezes se divergem no que diz respeito a: vínculo de trabalho, o que é esperado em termos de resultado, os incentivos, autonomia, reconhecimento e comportamento. Portanto, cabe a ambos buscar uma aproximação que atenda às necessidades de cada parte. ESPM CAIO PEREIRA INFANTE Diretor de marketing e novos negócios da Fellipelli, formado em Comunicação Social pela ESPM e pós-graduado pela University of Technology Sydney. ROBERTA BRANDI PFRIMER Gerente de relacionamento da Fellipelli, formada em Psicologia pela PUC-SP e pós-graduada em Mediação de Conflitos, também pela PUC-SP. O aprendizado contínuo se torna imprescindível para muitos jovens no desenvolvimento da carreira. Aprender novas formas de melhorar ainda mais seu trabalho é uma das maneiras de ser reconhecido. maio/junho de 2011 R EVISTA DA ESPM 35