OS IMPACTOS SOCIOAMBIENTAIS NOS LAGOS BOLONHA E ÁGUA PRETA: O processo de degradação na reserva do Utinga, localizada em Belém do Pará. ThayssaCristina Santos de Sousa Discente da Faculdade de Geografia e Cartografia FGC/UFPA thayssacsousa@bol.com.br Carlos Alexandre Leão Bordalo ProfºDrº da Faculdade de Geografia e Cartografia FGC/UFPA carlosbordalo@oi.com.br INTRODUÇÃO: A água abrange quase quatro quintos da superfície terrestre, 97% referem-se aos mares e 3% às águas doces. Apenas 0,3% do volume total da água do planeta pode ser aproveitado para consumo humano, onde 0,01% encontra-se em fontes de superfície e o restante em fontes subterrâneas. É um recurso imprescindível na vida dos seres humanos, fazendo parte de quase todas as atividades cotidianas. Para atender a demanda de uma população é necessário que se tenha um manancial com quantidade e qualidade suficiente de água, tendo em vista que muitas doenças estão ligadas ao consumo fora dos padrões de potabilidade exigidos pelos órgãos competentes. Dentre as legislações que definem essa qualidade destaca-se a portaria nº 2.914, de dezembro de 2011 que dispõe sobre os procedimentos de controle e de vigilância da qualidade da água para consumo humano e seu padrão de potabilidade. Devido à deficiência do serviço de abastecimento público, a população acaba por buscar meios de solução para amenizar suas necessidades quanto ao uso da água, porém esse processo pode ser perigoso, uma vez que se dá de forma não monitorada e consciente, envolvendo uma série de riscos.
OBJETIVOS: Compreender a ação antrópica e seus impactos no Parque Ambiental do Utinga, onde as transformações espaciais são visíveis, e não recebem a devida atenção do Poder Público, mesmo tem extrema importância, já que os lagos da área em questão abastecem a Região Metropolitana de Belém. METODOLOGIAS: A temática em questão ainda é pouco estudada por profissionais da região, devida a sua complexidade, assim, os livros, relatórios e trabalhos realizados e produzidos nos últimos anos foram indispensáveis para a construção deste artigo, bem como as visitas nas proximidades da área, para a comprovação do crescimento urbano desordenado. As conversas com os estudiosos também influenciaram na avaliação deste assunto, visto que os mesmo possuem conhecimentos multidisciplinares diferenciados. RESULTADOS PRELIMINARES: A cidade de Belém e muitas outras, como Gurupá e Abaeté, formaram-se na relação com o mundo aquático e florestal, com fauna e flora diversas. Localizadas na embocadura dos rios Amazonas e Tocantins, essas cidades tiveram sua história marcada também pela presença de outros rios que teceram essa extensa rede hidrográfica, como os rios Guamá, Pará, Acará, Moju e o rio Tocantins. Metrópole com 1.280.00 habitantes (IBGE, 2010), Belém está localizada no complexo hidrográfico dos rios: Tocantins- Araguaia, Guamá-Capim e Acará-Moju. O desenho urbano da cidade, assentada em terras baixas e atravessada por pequenos rios ou igarapés, conforma ainda hoje as divisões internas de bairros de um lado, terrenos mais altos ou aterrados; de outro, áreas alagadas, de baixadas-, retrato e afirmação de hierarquias e de processos de segregação social. Em seus aspectos urbanos, Belém passou por algumas transformações de forma rápida, o município dobrou sua população em 30 anos (de 602.861 para
aproximadamente 1.127.354), com taxas de crescimento de 3,18% (1970-80) e 5,60% (1991-2000). A situação em questão extrapola as possibilidades de acompanhamento por políticas urbanas, a cidade é uma forma de ocupação não uniforme, que está ligada a organização social do espaço e a sua formação econômica, sendo construída pelos atores sociais de seu contexto. A cobertura florestal de Belém está bastante alterada, já atingindo a Área de Proteção Ambiental, que corresponde ao Parque Ambiental de Belém, onde se encontram os lagos Bolonha e Água Preta, que são os mananciais de abastecimentos de água potável do município. O Parque Ambiental do Utinga foi denominado como Área de Proteção, segundo os Decretos Estaduais n.º 1.551 e n.º 1.552, ambos de 03 de maio de 1993, com objetivo de proteger os lagos contra alterações antrópicas que possam prejudicar a qualidade de suas águas. Tem área de 1.340 ha, é o maior parque ambientaem área urbana da Amazônia e um dos três maiores do Brasil.Os lagos Bolonha e Água Preta são abastecidos pelas águas drenadas de sua bacia hidrográfica (Rio Aurá e parte do Igarapé Tucunduba e Uriboquinha, sub-bacias do igarapé Mucutu), bem como por um sistema de bombeamento de água do rio Guamá, implantado pela Companhia de Saneamento do Pará COSANPA, que tem por objetivo suprir o déficit de água destinada ao abastecimento de Belém. A COSANPA é responsável pelo abastecimento público de água na maioria dos distritos administrativos de Belém. As exceções são os Distritos Administrativos de Icoaraci, Outeiro e parte de Mosqueiro, que é de responsabilidade do Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Belém (SAAEB), através de convênio entre a Prefeitura Municipal e a Fundação Nacional de Saúde (FUNASA). (FENZL/ MENDES/ FERNANDES, 2010, p. 26). As deficiências urbanas são graves, basta olhar os números da cobertura de esgoto para que se constate uma série de problemas de saúde que podem acometer as populações urbanas. Os índices de atendimento dos serviços ficam baixo da média brasileira, a qualidade da água utilizada nessasáreas está diretamente relacionada com a saúde pública. As pesquisas sobre Belém revelam que a situação é crítica tanto em bairros da periferia, na área urbana continental, como nas áreas insulares, com índices de
incidência de coliformes fecais encontrados nos rios urbanos que ultrapassam os limites definidos pela Organização Mundial de Saúde (Ribeiro, 2003). Por outro lado, é notório que o abastecimento de água e a sua qualidade dependem do tratamento e do destino dos esgotos. O lago Bolonha possui uma área de 1,8 Km2 formado com o igarapé do Utinga e o lago Água Preta, com uma área de aproximadamente 7,2 Km2, que nasce no município de Ananindeua, percorre grande extensão de área habitada desse município, atinge o município de Belém, forma o lago Água Preta e desemboca no rio Guamá.Como já foi exposto, ambos são bastecidos com água bruta do rio Guamá. Foi a partir da segunda metade dos anos 1970, que a expansão urbana de Belém rompeu e ultrapassou, definitivamente, o cinturão institucional expandindo-se pelo eixo da rodovia Augusto Montenegro até o Distrito de Icoaraci, e pela BR-316, até o Município de Ananindeua. Inicialmente, essa expansão ocorreu dentro de uma forma planejada, com a construção de conjuntos habitacionais, porém nas décadas seguintes (1980 e 1990), verificou-se um agravamento da crise econômica, política e habitacional, que favoreceu o grande número de assentamentos espontâneos, muitos deles em terrenos públicos e privados, conhecidas como áreas de invasões.(bordalo, 2006) A partir dos anos setenta, as grandes transformações no espaço urbano de Belém começaram a se manifestar, fundamentada em fatores de ordem política, econômica e demográfica, como: a forte presença do estado autoritário, criado com o golpe militar de 1964, no planejamento habitacional e urbano; a pavimentação da rodovia BR 010 (Belém-Brasília), criada na década anterior, possibilitando uma maior integração e rapidez do Estado do Pará, ao eixo econômico do centro-sul do país; a implantação dos Distritos Industriais de Icoaraci e Ananindeua, voltada principalmente para os setores madeireiro e alimentício; e a criação em 1973 da Região Metropolitana de Belém, envolvendo os Municípios de Belém e Ananindeua. (BORDALO, 2006) O município de Belém sofreu até a década de 1990 fortes inchaços populacionais, ligados a intensos movimentos migratórios no sentido interior-capital e a fluxos positivos de migrações interestaduais. (CASTRO, 2006, P.182).
Esses fatores foram fundamentais para que o crescimento urbano da cidade seguisse em dois sentidos: O vertical (verticalização) que se ampliou de forma rápida, principalmente nos anos oitenta, quando foi inserido dentro da área central até mesmo em algumas baixadas que foram saneadas e urbanizadas. E o horizontal (conurbação), que foi se expandindo ao longo da área de transição e da própria área de expansão, ao longo dos eixos-viários das rodovias Augusto Montenegro, no sentido do Distrito de Icoaraci, e BR 316, conurbando os Municípios de Ananindeua, Marituba e Benevides. A falta de uma rede geral de esgoto na cidade demostra o grande risco de contaminação do lençol freático e, por conseguinte, de poços rasos, muito comuns em áreas não atendidas pelo sistema público de abastecimento de água. Mesmo em áreas atendidas, a falta de rede de esgoto também pode provocar contaminações quando em contato com tubulações rompidas submersas no lençol freático. O crescimento populacional também afeta o serviço de abastecimento, causando um déficit nas ligações domiciliares de água, um dos problemas mais difíceis de serem resolvidos, principalmente nas zonas mais periféricas, onde a ocupação urbana ocorre, em grande parte, em áreas impróprias ou de forma inadequada. (FENZL/ MENDES/ FERNANDES, 2010, p. 27-28). Essas transformações ocorridas no espaço urbano da RMB, a partir da segunda metade dos anos setenta, também se reproduziram, dentro da área dos mananciais do Utinga, que até então, era caracterizada pelo predomínio do uso do solo institucional e rural, onde são encontrados os seguintes órgãos: CPATU/EMBRAPA; UFRA; MPEG; DNPM; INCRA; INEMET; EXÉRCITO; COSANPA e a CEASA., sendo o uso urbano, restrito à parte Noroeste, no eixo da Av. Almirante Barroso e o início da BR-316, onde encontramos os bairros do Marco, Souza e Marambaia. Neles, encontramos os conjuntos residenciais Castelo Branco, Costa e Silva, Conjunto do BASA e Jardim Tropical, o loteamento Itororó, clubes recreativos (Tuna Luso Brasileira e Assembléia Paraense), o Hospital da Aeronáutica, a Secretaria Municipal de Saneamento - SESAN, a Delegacia Regional do Ministério da Agricultura, a Delegacia Regional da Polícia Rodoviária Federal, o Parque de Exposição do Estado, alguns estabelecimentos comerciais e industriais, e residências em geral. Na área dos mananciais do Utinga, o uso urbano que até o início da década de setenta estava restrita a parte Noroeste, passou
a se expandir no sentido Norte e Nordeste, com a construção dos conjuntos habitacionais: Jardim Tucuruví (1977), Júlia Seffer (1984), e Denise de Melo (1989). (BORDALO, 2006) Foi nesse momento de forte retração, da implantação de unidades habitacionais voltadas para a população de menor poder aquisitivo, aumentando o déficit habitacional do Estado, que a população desprovida de moradia (sem teto), os moradores de áreas de baixadas com as obras de saneamento e drenagem, tiveram que ser desalojados, bem como, os migrantes do interior do estado, que foram em longo das estradas arteriais perpendiculares à Av. Augusto Montenegro e da Rodovia BR-316. (BORDALO, 2006) Dentre esses, alguns estão localizados bem próximo da margem do braço Leste do lago Água Preta seguindo a arterial Osvaldo Cruz (estrada das Águas Lindas) como: Palmeiras do Açaí (60 unidades), Canindé (74 unidades) e os conjuntos Verdejantes I, II, III e IV (1200 unidades), sendo muitas dessas unidades habitacionais, ocupadas antes do término das construções. A partir do segundo governo de Jader Barbalho ocorreram muitas ocupações de terrenos particulares, ao longo das áreas de transição e expansão. Segundo dados da COHAB-PA, citados por TRINDADE JUNIOR (1998), ocorreram 223 ocupações recentes na RMB, sendo que nove estão localizados dentro da área das bacias do Utinga, próximo do Lago Água Preta. Em 1998, a caracterização do uso do solo, na área das microbacias dos igarapés Murutucum e Água Preta (Utinga) podem ser classificadas em dois tipos diferentes. Um espaço rural, com uso para pesquisas agrossilvipastoris e de proteção dos mananciais, que ainda é predominante, ocupando as terras centrais e meridionais das bacias, correspondendo a EMBRAPA, UFRA, Exército, COSANPA e SECTAM, e um espaço urbano, localizado em toda parte setentrional, e a Leste, ao longo do eixo da Av Almirante Barroso e Rodovia BR 316, e respectivas artérias, com uso predominantemente comercial e residencial, com assentamentos planejados. (BORDALO, 2006) Essas formas alternativas de moradias são conhecidas na região como invasões, onde um grande número de famílias ocupa e toma posse de terrenos urbanos vazios públicos ou privados, construindo pequenas casas de madeira (ou utilizam lonas), a espera de uma futura desapropriação e regulamentação da mesma.no início dos anos
noventa, durante o governo Collor, foram construídos os últimos conjuntos habitacionais localizados na área de expansão da RMB, principalmente no Município de Ananindeua, com base no Plano de Ação Imediata para Habitação PAIH. As paisagens urbanas são um reflexo dos grandes mecanismos produtores da organização e da estruturação do espaço; também são reflexos dos modos de viver dos habitantes, das práticas sociais e culturais da cidade. Antes de tudo, a paisagem é o nosso referencial visual e espacial quotidiano. Os captores espaciais, dentro dos limites das suas especificações técnicas, apreendem, medem e restituem no espaço caracteres físicos deste mesmo referencial. (CASTRO, 2006, p. 186). Todo esse crescimento urbano não veio acompanhado de infraestrutura, provocando o aparecimento de focos de poluição ambiental a partir do desmatamento das matas, e hídrica, através dos esgotos que vertem para as nascentes dos lagos em questão. Um crescimento populacional de tal amplitude sugere processos de produção de espaços urbanos de igual proporção. (CASTRO, 2006, p.184). Agravando a situação, existe ainda a preocupação com a construção próxima do Lago Água Preta, do primeiro cemitério parque de Belém, o Recanto da Saudade, pois existe a possibilidade de na estação da chuva, haver uma maior infiltração para o lençol freático. Mais grave ainda é a existência de um lixão abandonado que estálocalizado as proximidades do Lago Água Preta, e a implantação numa área distante 1,4 Km desse mesmo lago do Complexo de Destino Final dos Resíduos Sólidos da Região Metropolitana de Belém, o aterro sanitário do lixo doméstico, industrial e hospitalar dos municípios de Belém e Ananindeua, onde são depositados em torno de 6.000 t/dia. Um dos problemas é a drenagem do resíduo líquido que sai do aterro, o chorume até uma lagoa de decantação, mas durante as estações das chuvas ela aumenta, colocando em risco o lençol freático, bem como a contaminação direta do Rio Aurá que tem sua foz distante 200 metros das bombas de captação e bombeamento de água da COSANPA no Rio Guamá, que abastecem os lagos através da adutora, colocando em risco os mananciais. Em estudos e levantamentos químicos concluiu-se
que principalmente os íons metálicos Al, Cr, Fe e Ni estão sob influência da pluma de chorume do lixão/aterro sanitário do Aurá, existente na cabeceira da bacia. Dessa forma, práticas de preservação ambiental devem ser aplicadas, especialmente no que se refere à contenção dessa urbanização descontrolada, sem esquecer a contenção e tratamento do chorume oriundo do aterro sanitário, a recuperação da mata marginal em áreas desmatadas, e aimplantação de um programa de monitoramento,entre outras medidas que devem ser planejadas na Região Metropolitana de Belém. BIBLIOGRAFIA: BORDALO, C. A. L. O DESAFIO DAS ÁGUAS NUMA METRÓPOLE AMAZÔNIDA: UMA REFLEXÃO DAS POLÍTICAS DE PROTEÇÃO DOS MANANCIAIS DA REGIÃO METROPOLITANA DE BELÉM-PA (1984 2004). Belém: UFPA/NAEA, 2006 (Tese apresentada como requisito parcial para a obtenção do título de doutor em Ciências). CASTRO, Edna. Belém de águas e ilhas. Belém: CEJUP, 2006. FILHO, O. B. Q. de O.; JUNIOR, A. R. M.; MORALES, G. P. Avaliação hidrogeoquímica na área de abrangência do Parque Ambiental de Belém PA. XV CONGRESSO BRASILEIRO DE ÁGUAS SUBTERRÂNEAS. MENEZES, L. B. de C.: BRAZ, V. N.: QUEIROZ, Suzy A. R.; CUNHA, E. C. S. Perfis de oxigênio dissolvido nos lagos Bolonha e Água Preta, Utinga. Belém-PA. VI Simpósio Ítalo Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental. NORBERT, F.; MENDES, R. L. R.; FERNADES, L. L. A sustentabilidade do sistema de abastecimento de água: Da captação ao consumo de água em Belém. Belém: NUMA/ ITEC/ UFPA, 2010. ROSA, L. L. O.; MELO, M. M.; SANTANA, H. M. Avaliação paralela da qualidade da água do lago Água Preta, de águas subterrâneas de áreas próximas e a água para abastecimento. XX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos.
SIQUEIRA, G. W. & APRILE, F. Avaliação de risco ambiental por contaminação metálica e material orgânico em sedimentos da bacia do Rio Aurá, Região Metropolitana de Belém PA. TUNDISI, J. G. Água no século XXI: Enfrentando a escassez. São Carlos: RiMa, IIE, 2003. UHLY S. & SOUZA, E. L. A questão da água na grande Belém. Belém: Casa de Estudos Germânicos, 2004. VASCONCELOS, V. M. M. Caracterização dos parâmetros de qualidade da água do manancial Utinga, Belém-PA. Taubaté: Universidade de Taubaté, 2010 (Dissertação para obtenção do certificado de mestre em Ciências Ambientais). ESTÀGIO ATUAL DA PESQUISA: A pesquisa encontra-se num estágio de aprofundamento, algumas visitas estão sendo planejadas para verificar outros detalhes sobre a área estudada. Entrevistas com funcionários também estão sendo pensadas, para entender melhor dinâmica do parque e a sua integração com outros órgãos. Além da busca por mais trabalhos desenvolvidos que acrescentem informações interessantes.