PLANEJANDO AS ATIVIDADES ESPORTIVAS (Prof. MSc. Ronaldo Pacheco) I UMA PROPOSTA PEDAGÓGICA. Ao darmos início a nossa reflexão sobre o uso pedagógico do esporte, no caso específico as modalidades coletivas, é necessário entender o que denominamos como ação pedagógica. Na nossa visão, ação pedagógica é um ato que envolve quatro etapas: a) Definição de objetivo(s); b) Elaboração de estratégias; c) Intervenção do professor nas estratégias estabelecidas; e d) Avaliação do alcance dos objetivos e posterior reprogramação. É importante que estas etapas estejam bem claras e para desenvolvê-las o professor deve conhecer claramente os princípios que compõem cada uma delas e os diversos métodos de ensino-aprendizagem bem como as suas formas de intervenção. Nesta primeira parte faremos uma reflexão sobre estas etapas. 1 Os objetivos da iniciação esportiva. Como em tudo que fazemos na vida, é necessário, prioritariamente, definir o objetivo daquilo que estamos realizando. Para que realizamos? Quais são as nossas intenções? O que pretendemos alcançar com nossas ações? Ao usarmos como instrumento pedagógico um esporte, qualquer que seja ele, é necessário que esteja clara a importância que essa prática pode ter na vida dos participantes. A definição dos objetivos que se pretende alcançar deve ser traçada desde o começo pelos professores para que não haja cobranças e pressões indevidas que possam prejudicar a formação e convivência entre os atores envolvidos neste cenário. Vários são os problemas decorrentes do conflito de objetivos entre praticantes, professores e familiares. Dentre eles podemos destacar: - A pressão psicológica exercida por pais, professores, amigos, etc.; - Inclusão precoce em competições; - Especialização prematura de movimentos de acordo com funções executadas no jogo; - Busca excessiva e precoce da plenitude atlética. Estes problemas podem levar o aluno a conflitos pessoais que promovam o abandono da modalidade e em muitos casos a uma ojeriza ao esporte e a atividade física de maneira geral. Em vista disso, se torna imprescindível traçar os objetivos para o uso do esporte na educação física escolar atinja o objetivo de formar um ser na sua forma integral. Em vista disso, quais seriam os objetivos iniciais a serem propostos?
Primeiramente devemos fazer com que o jovem praticante se sinta bem no ambiente esportivo. O prazer em praticar a modalidade e estar em contato com outros participantes deve ser o principal motivo da aderência à prática esportiva. Desta forma, estaremos atuando com o esporte nos seus conteúdos conceituais, procedimentais e atitudinais. Os conteúdos conceituais se referem aos conceitos do esporte que se referem ao histórico, as regras e os fundamentos do jogo. Isso trará aos alunos os conhecimentos básicos sobre a modalidade que estará praticando, saber do que trata este esporte. Os conteúdos procedimentais serão os conteúdos relativos ao fazer, realizar os movimentos ligados ao esporte. Os conteúdos atitudinais estão ligados ao saber ser, saber estar. Nestes conteúdos são trabalhados os valores, as atitudes e as normas que são construídas pelos grupos sociais. Estes conteúdos devem estar interligados, onde o saber (conceitual) dê suporte ao saber fazer (procedimental), que irão permitir as vivências dos valores, a exposição de atitudes e a construção de normas. Visto desta forma, a iniciação esportiva deve ser considerada uma etapa no processo de formação humana, não sendo o alcance da performance esportiva um fim em si mesmo. O esporte pode e deve ser utilizado para inserir e reforçar valores humanos. O exemplo dado pelo professor e suas intervenções serão de fundamental importância para a aquisição de valores inerentes ao Saber Ser (autodisciplina, autocontrole, perseverança, determinação, humildade, etc.), como também ao Saber Estar (agir em grupo, respeito mútuo, lealdade, cooperação, solidariedade, etc.), mas sem dúvida, na visão dos praticantes, o principal objetivo é o Saber Fazer (ampliação e especialização do repertório motor visando à prática de atividades esportivas). Especificamente tratando deste aspecto, deve-se valorizar o desenvolvimento psicomotor, enfatizando o conhecimento e controle do próprio corpo, procurando extrair dele a mais variada capacidade de movimentos que forem possíveis. O praticante irá adquirir autoconfiança conforme vá conhecendo progressivamente seu corpo. Com isso deve adquirir a melhoria da técnica esportiva. Segundo Greco 2 (1998, p15) a realização de uma técnica ou de uma habilidade é concretizada graças a uma complexa combinação de mecanismos e processos mentais motores. Sendo assim, podemos concluir que a iniciação esportiva deve possuir dois grandes objetivos gerais básicos: 1 Desenvolvimento de bases morais, emocionais e psíquicas sólidas para um ajuste social adequado e uma posterior preparação desportiva consistente e duradoura. 2 - Desenvolvimento motor amplo visando aquisição de vivências motoras que serão essenciais no seu cotidiano e na técnica exigida na prática esportiva. Apresentamos abaixo uma tabela onde são sugeridos alguns objetivos de acordo com a faixa etária do praticante. É importante ressaltar que os objetivos vão sendo modificados ao longo da trajetória esportiva do praticante, de acordo com sua maturação, motora, cognitiva, afetiva e social. FAIXA ETÁRIA OBJETIVOS 8-11 anos - prazer na prática esportiva; - conhecer amigos; - reforçar valores como respeito, disciplina, amizade, etc. - aprender sobre o jogo através de jogos adaptados;
- Desenvolvimento perceptivo-motor. 12-14 anos - aperfeiçoar as habilidades específicas do jogo; -reforçar valores como respeito, disciplina, amizade, determinação, superação, ética, etc. - Aperfeiçoar habilidades físicas e técnicas; - conhecer os movimentos pré-táticos. 15-17 anos - variar a técnica aprendida; - conhecer e entender os procedimentos táticos; - aprofundar o sentido de trabalho em equipe; - Especializar em funções específicas do jogo; 18-20 anos - Aprimoramento da especialização motora; - aprimoramento dos aspectos físicos; - reforçar os valores de disciplina, superação e determinação, ética esportiva, trabalho em equipe. - otimização das capacidades psíquicas e sociais. - Estabilização e domínio técnico-tático-psíquico e social. 20 anos em diante - Aprimoramento técnico-tático-psíquico e social. - aprimoramento e manutenção das valências físicas. - otimização dos processos cognitivos e psicológicos. 2 A elaboração de estratégias. A formação esportiva do jovem é de responsabilidade direta do professor, visto que é ele o responsável pela orientação, planejamento e execução das aulas. Não devemos deixar de levar em conta a influência que é exercida pelos familiares, amigos e demais envolvidos no esporte, mas queremos deixar clara a responsabilidade que o profissional de educação física assume ao inserir o jovem no ambiente esportivo. Assim sendo, o professor deve zelar pelo seu planejamento para que suas aulas tenham uma seqüência pedagógica adequada, onde haja espaço para as sugestões dos alunos e reflexões sobre a prática realizada. A metodologia utilizada deve privilegiar a motivação e o bem-estar dos seus praticantes. Greco 2 (1998, p19), alerta que existem quatro variáveis a serem consideradas no planejamento das sessões de trabalho: - a estrutura temporal (quando se realiza, em que momento da aula/treino); - a freqüência (quantas vezes se realiza); - o oferecimento (como se apresentam os exercícios, formulação dos mesmos); - a precisão (quantas/como deve acertar. Exigências de forma crescente). No processo de iniciação quanto menor a idade, mais características lúdicas teve ter a atividade. A partir dos 12 anos devem-se balancear as atividades entre as recreativas e as de fixação de movimentos (ensino da técnica). Esta é uma ótima fase para o desenvolvimento motor, e a capacidade de coordenar os movimentos será a base para futuros desempenhos esportivos. O professor deve ter o jogo como principal instrumento de aprendizagem por possuir características que favorecem que a atividade seja gratificante, motivadora e permanente. A partir do jogo deve proporcionar um ambiente que seja rico em oportunidades e altamente estimulante. O praticante deve, a partir das orientações recebidas, se sentir encorajado a tentar realizar as atividades propostas, sem receio de cometer erros ou de pressões decorrentes dos mesmos.
Segundo Bareto (in Tavares, 2004, p. 60), as capacidades perceptiva e de tomada de decisão, na variabilidade do contexto do jogo, precisam de tolerância para que as respostas ocorram. Se o jogo pelas suas características não proporcionar esse ambiente, cabe a quem ensina adequar as condições de prática, quer às particularidades dos praticantes (competências que possuem), quer aos propósitos da aprendizagem (conseguir que joguem). É importante que as aulas não sejam meras repetições de atividades e movimentos reproduzidos pelos alunos sem compreenderem o sentido da sua realização. Segundo Bayer (1994), a compreensão do jogo se dá a partir do momento em que a criança consegue modificar o que percebe, interagindo diretamente nas suas ações. Visando ampliar as possibilidades de aprendizagem no treinamento esportivo, Greco 2 (1998, pp. 29-36) estabelece 11 princípios para um treinamento técnico na iniciação esportiva, onde em cada um deles são apontadas estratégias para melhor assimilação da técnica. Não cabe aqui analisarmos todos os princípios, mas aproveitaremos para destacar alguns pontos que acreditamos serem os mais importantes em relação à metodologia empregada neste livro: - Elaborar sequências pedagógicas para aprender por etapas, os elementos constitutivos da técnica; - Proporcionar auxílio direto através da ajuda tátil-cinestésica e/ou auxílio indireto através de informação ótica (vídeo, figuras) ou acústica (ritmo, verbalização); - Facilitar algumas formas de movimento e ir ampliando-as aos poucos - Simplificar a progressão metodológica partindo do movimento mais fácil para o mais difícil; - Simplificar as regras; - Reduzir a ação do oponente dando ao praticante mais tempo e melhores condições para resolver o problema gerado pela situação criada (comportamento pré-estabelecido para o oponente, superioridade numérica; - Usar a seguinte divisão metodológica: exercitar sem adversário, com adversário passivo, em condições dificultadas, em condições competitivas. - Reduzir a participação do companheiro e gradativamente ampliar esta participação; - Simplificação do ambiente onde se executa a técnica. Para Roth, citado por Greco 2 (1998, p. 37) deve-se desenvolver condições de execução partindo de situações simples, passando a condições variáveis, porém previsíveis e antecipáveis, até chegar a uma condição altamente variável e pouco previsível de difícil antecipação. Todas estas situações devem ser contempladas na elaboração das estratégias do professor, visando uma aprendizagem efetiva e consciente por parte do aprendiz. No aspecto da formação de valores e atitudes, o professor deve ter estratégias que permitam a participação dos alunos de forma aberta, onde as opiniões dos mesmos sejam respeitadas, dialogadas e aceitas desde que não se perca os objetivos propostos para as aulas. 1.3 - As intervenções do professor.
O professor deve sempre preservar uma atitude formativo-educativa correta (ética) diante da prática desportiva. Para isso suas intervenções deverão ser sempre pautadas no sentido de justiça, imparcialidade, lealdade, compreensão, serenidade, tolerância e paciência. Estes princípios deverão sempre nortear as resoluções de conflito que acontecerão normalmente no meio esportivo e devem ser resolvidas sempre a partir do diálogo e compreensão entre as partes envolvidas. As informações dadas aos participantes necessitam de bastante conhecimento do professor não só sobre o assunto, mas também, sobre as formas adequadas de comunicação. O tipo de informação pode auxiliar ou prejudicar a aprendizagem se não for transmitida da forma correta e no momento adequado. O professor ao elaborar sua aula deve compreender que: - A relação professor-aluno deve ser de cumplicidade para melhor compreensão do conteúdo tratado. - A dificuldade de aprendizagem do aluno pode estar diretamente relacionada com o tipo da atividade escolhida, a forma de transmitir a informação por parte do professor ou mesmo a pressão exercida pelos colegas; - Cada aluno possui ritmo de aprendizagem e interesses diferentes e isso deve ser respeitado; - O aluno deve ser estimulado a ter uma participação ativa durante a prática. Deve ser estimulado a opinar, criar e ajudar os demais colegas, incentivando desta forma, a autonomia e responsabilidade individual. Nas suas intervenções, o professor deve levar em conta que a formação esportiva é importantíssima na vida de qualquer praticante, e, por isso, os comportamentos corretos no sentido de formação humana devem ser sempre priorizados em relação aos resultados competitivos. Deve-se ter muito cuidado para que não se incentive a competição exacerbada e procure-se ressaltar a sociabilidade, o espírito de cooperação, a responsabilidade e a compreensão sobre a vitória e a derrota. Nas atividades competitivas o professor deve criar um clima facilitador minimizando o estresse, permitindo entender o erro, e incentivando o aluno a arriscar e avaliar sua atuação. O aluno só deve participar de competições quando estiver preparado para atender as exigências motoras, físicas e psicológicas que esta prática solicitar. Em relação à competição, esta quando bem administrada, tem papel fundamental na formação do jovem, pois o prepara para encarar desafios, devendo auxiliá-lo na busca da auto-superação (perseverança, determinação). Os resultados das competições devem servir sempre para uma auto-avaliação. Nas derrotas devem buscar a compreensão e correção dos erros cometidos, e nas vitórias a busca da superação e o reconhecimento do esforço realizado. No aspecto da compreensão técnica e tática do jogo, o professor deve levar o aluno a refletir em razão das suas ações e para isso deve conhecer os mecanismos do
processo de informação, que é formado pela percepção (as informações dadas pelos seus sentidos) e tomada de decisão (capacidade de buscar, selecionar alternativas e agir). Sendo usado desta forma, o jogo pode levar a uma evolução de raciocínio que irá auxiliar na sua compreensão e prática. É importante ressaltar que os esportes coletivos exigem uma interação entre os companheiros o que faz com que a necessidade de pensar decidir agir, ocorra durante todo o seu transcurso. O praticante deve aprender a ler a situação apresentada para poder decidir adequadamente como agir, em uma ação conjunta com sua equipe. Para isso desde os exercícios básicos até o momento de um treinamento mais apurado deve ser reforçada a reflexão dos praticantes sobre as ações realizadas. 1.4 Avaliação: Avaliando o progresso do praticante Ao realizarmos qualquer atividade, a avaliação se torna essencial, pois é ela que dará o respaldo para que possamos continuar da forma que estamos agindo ou se necessitamos mudar de rumo neste processo ensino-aprendizagem. A avaliação sempre deve levar em conta os objetivos para os quais direcionamos o nosso trabalho. Esta afirmação pode parecer óbvia, no entanto, vemos muitas vezes avaliações sendo feitas pela assiduidade, ou pelo desenvolvimento de determinada habilidade, e em alguns casos, pelos resultados obtidos em competições, sem levar em conta os demais objetivos que estão sendo trabalhados. Neste ponto, é essencial termos claros os objetivos a serem atingidos em cada etapa do trabalho com esportes. Para isso o trabalho deve definir claramente os objetivos para os quais se propõe. No inicio deste tópico sugerimos alguns objetivos para o trabalho esportivo, apresentando uma tabela sobre as prioridades que devem ser dadas a cada etapa da iniciação esportiva de acordo com a faixa etária envolvida. As avaliações devem ser feitas em relação a cada objetivo estabelecido. As avaliações servem não só para verificar o progresso dos praticantes, mas também para verificar se os métodos estão sendo empregados adequadamente, se as estratégias estão de acordo com a capacidade de desenvolvimento dos praticantes e se o volume de trabalho está adequado ao progresso esperado. Conclusão: Estas quatro etapas da ação pedagógica devem se desenvolver de forma interligada e para isso o planejamento da disciplina é fundamental. É a partir dela que cada professor elaborará o seu plano de aula e poderá acompanhar o processo educativo. O planejamento não é uma garantia de sucesso, mas sim um elemento imprescindível na ampliação da possibilidade de êxito na atuação docente. Cada uma destas etapas deve ser realizada com coerência para que elas não entrem em choque. Muitas vezes temos objetivos claros que são prejudicados por estratégias não adequadas às faixas etárias ou situação motivacional da turma. Outras vezes, mesmo com objetivos e estratégias adequadas, a intervenção do professor prejudica o desenvolvimento da turma. Em vista destes fatos, a avaliação deve ser feita através de instrumento adequado e criterioso, pois não serve apenas como avaliação do
aluno, mas como avaliação dos métodos empregados em cada etapa e para isso o professor deve ter auto-crítica e estar aberto ao posicionamento dos alunos durante o transcorrer das aulas. Todo planejamento deve ser flexível para se adequar as condições de momento. Isso não significa mudança nos objetivos, que devem ser determinados pela necessidade da turma, mas uma constante flexibilidade nas estratégias e intervenções, desde que não fujam do alcance dos objetivos propostos.