O ESPAÇO DO BRINCAR NA EDUCAÇÃO INFANTIL: um estudo em creches e pré - escolas



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Transcrição:

O ESPAÇO DO BRINCAR NA EDUCAÇÃO INFANTIL: um estudo em creches e pré - escolas Maria Zita Figueiredo Gera Doutora e Livre Docente em Psicologia Uni-FACEF Ana Maria Tassinari Psicopedagoga clínica, Mestre em Serviço Social e Educadora Infantil Docente - Ceuclar-Batatais INTRODUÇÃO O brincar é ferramenta essencial e necessária ao processo de desenvolvimento humano. O lúdico abrange o brincar e tem o mesmo sentido de infantil, diz respeito ao inútil do ponto de vista imediato, refere-se à atividade em si mesma que não visa algum outro fim, mas que tem grande importância no processo de desenvolvimento a longo prazo (KISHIMOTO). O senso lúdico tem papel fundamental para o ser humano, tanto no início como durante toda sua vida, devendo fazer parte do dia-a-dia de cada um, pois favorece a construção prazerosa do viver e da convivência social. A evolução lúdica, notadamente, nos primeiros anos de vida mostra que ao brincar a criança desenvolve a inteligência, aprende prazerosa e progressivamente a representar simbolicamente sua realidade, deixa, em parte, o egocentrismo que a impede de ver o outro como diferente dela, aprende a conviver. O lúdico não está nas coisas, nos brinquedos ou nas técnicas, mas nas crianças, ou melhor dizendo, no homem que as imagina, organiza e constrói (Oliveira, 2000, p.10). Temos notado que criar condições para o brincar está sendo transferido, cada dia mais, do núcleo familiar para a esfera institucional mais ampla como creches, escolas, centros de lazer, etc. No entanto, como a criança aprende a brincar muito cedo, ela precisa de alguém, de um outro significativo, disponível para brincar com ela. Mas será que o brincar é entendido e valorizado, principalmente pelas pessoas que cuidam e educam as crianças? Em que medida essas pessoas dão espaço, oferecendo tempo e oportunidades para o brincar? Procurar entender estas questões,

2 constituiu-se o núcleo central desta pesquisa que teve o objetivo geral de conhecer a visão de educadores infantis sobre o brincar para crianças de 0 a 6 anos. A EDUCAÇÃO INFANTIL NA LDB- 1996 A educação infantil que se desenvolve em creches e pré-escolas, ganha um novo sentido no sistema escolar brasileiro, passando a integrar a Educação Nacional, a partir de dezembro de 1996 quando entrou em vigor a Lei n 9394/96, que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a LDB. Esta lei, no Título V Dos níveis e das Modalidades de Educação e Ensino, no Capítulo I, da Composição dos Níveis Escolares, em seu art. 21, diz que a educação escolar compõe-se de dois níveis: I educação básica e II educação superior. A educação básica, por sua vez, subdivide-se em educação infantil, ensino fundamental e ensino médio. Na Seção II, em seu art. 29 diz: A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e comunidade. No art. 30 diz que a educação infantil será oferecida em: I creches, ou entidades equivalentes, para crianças de até três anos de idade; II pré-escolas, para crianças de quatro a seis anos de idade. Tanto as creches, que atendem crianças de zero a três anos, como as pré-escolas, para as de quatro a seis anos, são consideradas instituições de educação infantil. A distinção entre ambas é feita pelo critério de faixa etária. O título IV, trata da organização da Educação Nacional, art.ii, v. considera que: Os municípios incumbir-se-ão de: [...] oferecer educação infantil em creches e pré-escolas e, com prioridade, o ensino fundamental, permitida a atuação em outros níveis de ensino quando estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua área de competência e com recursos acima dos percentuais mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do ensino.

3 Especifica no art. 9, IV, que: A união incumbir-se-á de [...] estabelecer, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, competências e diretrizes para a educação infantil [...] que nortearão os currículos e seus conteúdos mínimos, de modo a assegurar formação básica comum. O Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil (Brasil,1998, p.13), especifica os vários aspectos a serem contemplados, dentre eles o brincar. Diz: A qualidade das experiências oferecidas que podem contribuir para o exercício da cidadania, respeitando-se as especificidades afetivas, emocionais, sociais e cognitivas das crianças de zero a seis anos, devem estar embasadas nos seguintes princípios: O respeito à dignidade e aos direitos das crianças, consideradas nas suas diferenças individuais, sociais, econômicas, culturais, étnicas, religiosas, etc.; O direito das crianças a brincar, como forma particular de expressão, pensamento, interação e comunicação infantil; O acesso das crianças aos bens sócio culturais disponíveis, ampliando o desenvolvimento das capacidades relativas à expressão, à comunicação, à interação, ao pensamento, à ética e à ciência. A socialização das crianças por meio de sua participação e inserção nas mais diversificadas práticas sociais, sem discriminação de espécie alguma; O atendimento aos cuidados essenciais associados à sobrevivência e ao desenvolvimento de sua identidade. Ainda, segundo Brasil (1998, p.23), Educar significa, portanto, propiciar situações de cuidados, brincadeiras e aprendizagens orientadas de forma integrada e que possam contribuir para o desenvolvimento das capacidades infantis de relação interpessoal, de ser e estar com os outros em uma atitude básica de aceitação, respeito e confiança, e o acesso, pelas crianças aos conhecimentos mais amplos da realidade social e cultural. Neste processo, a educação poderá auxiliar o desenvolvimento das capacidades de apropriação e conhecimento das potencialidades corporais, afetivas, emocionais, estéticas e éticas, na perspectiva de contribuir para a formação de crianças felizes e saudáveis. Para Campos (apud ABRAMOWICZ; WAJSKOP, 1995), um ambiente coletivo de crianças e adultos traz vantagens em relação à situação familiar, devido à possibilidade

4 de contar com recursos humanos e materiais que propiciam maior variedade de oportunidades de situações vividas pela criança, o que estimula sua sociabilidade e aprendizado sobre o mundo que a cerca. Desta forma, as creches e pré-escolas, com a LDB-96 passam a ser vistas como locais legítimos de favorecimento do desenvolvimento infantil, uma vez que têm a função de educar as crianças nas suas múltiplas necessidades. A LDB-96, ao contemplar a importância do brincar nas creches e pré-escolas, deixa implícita a idéia de que deve haver espaço para o brincar e para os jogos e as brincadeiras. Concordamos com Wajskop (1999, p.31) quando afirma: a garantia do espaço do brincar na pré-escola ou creches, é a garantia de uma possibilidade de educação da criança numa perspectiva criadora, voluntária e consciente. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Considerando os objetivos deste estudo, privilegiamos a pesquisa de caráter exploratório, que tem como objetivo principal o aprimoramento de idéias ou a descoberta de intuições. Este tipo de pesquisa permite um planejamento bastante flexível, devendo incluir levantamento bibliográfico, entrevistas com pessoas que tiveram experiências práticas com o problema pesquisado e análise de exemplos que estimule a compreensão (Gil, l991, p. 43). Sendo assim, o estudo bibliográfico subsidiou e favoreceu todo o percurso da pesquisa; coletamos dados através de um questionário e de entrevistas com os educadores de Educação Infantil e analisamos suas falas, buscando uma maior compreensão do objeto de estudo. A pesquisa foi realizada em dois momentos. A aproximação inicial, visando caracterizar o universo de educadores que atuavam em creches e pré-escolas do município de Batatais, foi feita através de um questionário que atingiu a totalidade da população, num total de 98, entre professores e auxiliares de educação infantil. Julgamos necessário ressaltar que consideramos educador infantil tanto os professores como os auxiliares de desenvolvimento infantil (MELLO; VITÓRIA, 1992).

5 No segundo momento, utilizamos a entrevista semi-estruturada que segundo Ludke; André (1986, p. 34), se desenrola a partir de um esquema básico, porém não aplicado rigidamente, permitindo que o entrevistador faça as necessárias adaptações. A entrevista é indicada neste tipo de pesquisa, uma vez que a relação pesquisadorpesquisado é essencial. As entrevistas, tendo o apoio de um roteiro composto de questões abertas, foram realizadas com 22 educadoras, no 2 semestre de 2004. As falas foram gravadas com o consentimento de cada entrevistada, transcritas e por fim avaliadas através de análise de conteúdo, cujos procedimentos foram desenvolvidos mediante descrição de Bardin (2004). Entendemos que não haveria espaço mais apropriado para a realização deste estudo, uma vez que a proposta foi conhecer a visão dos educadores sobre o brincar no contexto onde as ações se realizam. ANÁLISE E DISCUSSÃO A análise dos dados, realizada através de análise de conteúdo, exigiu inicialmente repetidas aproximações ao material coletado, leituras e releituras das falas das participantes da pesquisa, a fim de que, no momento seguinte, pudéssemos reunir as informações com um sentido comum, isto é, elementos com características comuns, lembrando que Bardin (2004, p. 108.) recomenda desconfiar das evidências. Através destes procedimentos foram construídas as categorias de análise dentre as quais trazemos à discussão: Significado do brincar e o Espaço do brincar nas creches e préescolas. Significado do brincar O que é brincar? Em que sentido o brincar favorece a criança? O que o brincar proporciona?

6 A pesquisa mostrou que as educadoras (nomeadas no feminino, uma vez que todas as educadoras infantis do município de Batatais eram mulheres por ocasião da realização da coleta de dados) concebiam o brincar como importante para o desenvolvimento da criança em todos os sentidos e também para a aprendizagem em geral. Cada uma a seu modo expôs seus pontos de vista. A criança se torna um ser humano melhor. Ela desenvolve a coordenação, o coleguismo, o social. Brincar desenvolve a imaginação. Olhe, desenvolve tudo. Ajuda muito no relacionamento e na interação entre as crianças. O aspecto afetivo foi destacado. Brincar é prazer. Muito prazer. Brincar é descontração, as crianças se soltam mais. O brincar é uma atividade agradável em si. O brincar como agente de socialização foi situado de forma significativa. Eu noto que há muito egocentrismo entre as crianças, então eu acho que nas brincadeiras elas começam conviver melhor uma com as outras e também o vínculo delas com a gente fortalece. O brincar é facilitador de aproximação e de melhoria de relacionamento entre o educador e a criança. Também foi apontada a questão da relação entre o brincar e a aprendizagem. Eu acho que brincar é a base. Tudo o que a criança aprende está relacionado com o brincar. Aprendizagem e brincadeira estão intimamente relacionadas. Nesta idade acabam sendo a mesma coisa.

7 Espaço do brincar nas creches e pré-escolas Que tempo é disponibilizado para o brincar nas creches e pré-escolas? Em que momentos o brincar é priorizado nas salas junto às educadoras? Quanto tempo é doado diariamente, semanalmente ou mensalmente às crianças para o prazer e para aprendizagens livres? Como vimos anteriormente, a Educação Infantil deve assegurar o o direito das crianças a brincar, como forma particular de expressão, pensamento, interação e comunicação infantil. Para tanto, se torna necessária a criação de espaços que permitam atividades livres, significativas e prazerosas que possam ser realizadas através do brincar, de brincadeiras e de jogos. A pesquisa mostrou que o espaço do brincar é disponibilizado às crianças depois que realizam as atividades importantes e necessárias para educar. Normalmente reservam o período da manhã para as atividades importantes e necessárias e no período da tarde elas podem brincam, quando tudo está encaminhado. De um modo geral o núcleo central das falas sobre este aspecto apontou nesta direção. No período da manhã, primeiro eu dou as atividades no papel, cada dia eu ofereço uma brincadeira, ou são jogos pedagógicos, ou fantoches, massinha. No período da tarde, eles têm recreação à tarde toda. Embora tenham revelado priorizar condições e momentos reservados ao brincar, foram contraditórias em relação ao que responderem sobre o significado do brincar para as crianças pequenas. Naquela questão foi acentuado o valor do brincar tanto para o desenvolvimento como para a aprendizagem. Ao retardarem o momento do brincar para o final do período em que as crianças permanecem na instituição, evidenciaram a pouca importância que atribuem ao brincar, aos brinquedos e às brincadeiras como espaço efetivo de aprendizagem.

8 Em contraposição a esta visão, outras percebem que o tempo gasto com as crianças nas diversas atividades é direcionado para brincadeiras, o que indica que estas sabem que brincando, as crianças aprendem. Nessa faixa etária, dois e três anos, o que mais importa são as brincadeiras. Todo nosso trabalho dirigido volta-se para o brincar, pois é a melhor forma das crianças aprenderem. Concordamos com Noffs (2000,p.162) quando diz que a partir do brincar e do brinquedo, os usuários lidam com a possibilidade de se aprender, permitindo a aquisição/ressignificação de conhecimentos, que se movimentam em direção ao saber. A participação do educador nesses momentos foi considerada essencial. Sempre saio com eles da sala de aula. Às vezes vamos ao pátio, outras à pracinha, para que possam correr, pular, desenvolverem atividades motoras e também respiratórias. Somente sob meu olhar; neste momento, o brinquedo é o corpo. Quando brincamos numa situação mais dirigida, sempre sou convidada a brincar com eles, principalmente para comer (risos), experimentar o que fizeram; e eu sinto que neste momento do brincar, não é a tia que está ali com eles, mas a aluninha. Ao situarem suas presenças nas brincadeiras das crianças, as educadoras revelaram um aspecto louvável do papel do educador como mediador e incentivador do brincar. CONSIDERAÇÕES FINAIS Esta pesquisa possibilitou uma compreensão mais aprofundada dos pensamentos e sentimentos de educadoras atuantes na Educação Fundamental sobre questões pertinentes ao brincar nas creches e pré-escolas. Mostrou que as educadoras que lidam diretamente com as crianças, percebem o brincar como relevante para os diferentes aspectos do desenvolvimento, reconhecendo

9 que proporciona mudanças de comportamento, fazendo surgir novas formas de respostas e de ação às solicitações do meio em que as crianças vivem. As educadoras deram destaque ao brincar como fonte de aprendizagem, como forma de socialização, pois ao se relacionarem, aprendem a conviver com seus pares. Também reconhecem que brincar dá prazer, pois é uma atividade agradável em si. Por outro lado, a pesquisa mostrou haver discrepância entre o reconhecimento do significado e da importância do brincar para a criança e o espaço que as creches e pré-escolas estavam dando para esse brincar. Frente a este cenário, fica evidente que, embora as educadoras tenham revelado dar significativo valor ao brincar, elas precisam construir um sólido conceito do brincar para crianças pequenas e desenvolver habilidades que as capacitem a abrir espaço e poderem, assim, priorizar as atividades lúdicas, proporcionando a confiança e o domínio das mesmas de tal forma que o prazer imediato que a criança sente no brincar, se estenda e se transforme em prazer de viver. Acreditamos que este estudo possa subsidiar reflexões e assim contribuir para que educadores mães, pais, professores e outros adultos significativos que cuidam e educam crianças vejam o brincar como uma forma de ser e estar no mundo. Concluímos com a fala de Brougère (1998, p.98), com a qual concordamos: Na falta de qualquer argumento, a relação do jogo/brincar com o prazer e com a criatividade vai autorizar que se deixe as crianças a eles se entregarem durante uma parte de seu tempo, como pré requisito necessário a toda educação. REFERÊNCIAS ABERASTURY, A. A criança e seus jogos 2ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1992. ABRAMOWICZ, A.; WAVSKOP,G. Creches: atividades para crianças de zero a seis anos. São Paulo: Moderna, 1995. BARDIN, L. Análise de Conteúdo. 2ed. Lisboa: Edições 70, 2004. BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei n 9.394/96, publicada no DOU de 23/12/1996, Seção I, p. 27839. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado, 1996.

10 Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria da Educação Fundamental. Referencial curricular nacional para Educação Infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998. v. I. BROUGÈRE, G.Jogo e educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998. GERA,M.Z.F. Conhecendo os educadores de creche: um estudo sobre quem cuida diretamente da criança. 1996. Tese (Livre Docência) UNESP: Franca. GIL, A.C. Como elaborar projetos de pesquisa. 3 ed. São Paulo: Atlas,1991. HADDAD, L. A creche em busca de identidade. São Paulo: Loyola, 1993. KISHIMOTO, T. M. (ORG). O brincar e suas teorias. São Paulo: Pioneira, 2002. LEONTIEV, A. N. Os princípios psicológicos da brincadeira pré-escolar. In VIGOTSKII, L. S.; LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. 9ed. São Paulo: Ícone, 2005. LUDKE, M.; ANDRÉ, N.E. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: Pedagógica e Universitária, 1986. MELLO, A M.; VITORIA, T. O desafio da aquisição do conhecimento coletivo. Resumos. Sociedade Brasileira de Psicologia, p.43, out., 1992. MOYlLES, J.R. Só brincar? O papel do brincar na Educação Infantil. Porto Alegre: Artmed,2002. OLIVEIRA, V.B. (ORG). Introdução In: O brincar e a criança do nascimento aos seis anos. Petrópolis: Vozes, 2000. PIAGET,J. Seis estudos de Psicologia. Rio de Janeiro: Forense, 1969. PIAGET, J. ; INHELDER, B. A psicologia da criança. 17ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001. VIGOTSKII, L.S. ; LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. 9ed. São Paulo: Ícone, 2005. WAJSKOP, G. Brincar na pré-escola. 3ed. São Paulo: Cortez, 1999.