Goiânia (GO), 03 a 06 de maio de 2001 Pag 1 ANÁLISE DE RISCO DOS PROCESSOS EROSIVOS E DO ASSOREAMENTO NA BACIA DO CÓRREGO DO RECANTO, MUNICÍPIO DE NOVA ODESSA, SP CAMPAGNOLI, F.; OGURA, A.T. - Instituto de.pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo ABSTRACT This paper presents the studies conducted on Nova Odessa county, on São Paulo State, Brazil. It was measured the sedimentation depth of the silting process of the three reservoirs for water supply, and analyzed the impacts of erosion and sedimentation, due to inadequate land use in the study area. Using digital models terrain (DTM), the authors could estimate the possible evolution of the silting up inside these reservoirs, considering different rates of sedimentation. KEYWORDS ASSOREAMENTO EROSÃO RECURSOS HÍDRICOS 1. INTRODUÇÃO A Divisão de Geologia do Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo S.A. IPT realizou estudos bacia do córrego do Recanto (figura1), município de Nova Odessa, visando subsidiar a prefeitura local no combate à erosão e ao assoreamento de alguns dos seus reservatórios de abastecimento, dentro do Plano de preservação dos recursos hídricos da bacia do córrego do Recanto, elaborado pelo poder local. O serviço de abastecimento de água do município de Nova Odessa capta aproximadamente 65 litros/s de água do manancial da bacia do córrego do Recanto. Isto corresponde a 60% do consumo total, o equivalente a atender a uma população de cerca de 25.000 habitantes. Estes dados mostram a importância da bacia do córrego do Recanto para o abastecimento de água do município, e como tal deve ser reconhecido, valorizado e preservado. 2. CONTEXTO REGIONAL A dinâmica dos processos erosivos é controlada pela interação de fatores do meio físico, pluviometria local e uso e ocupação do solo. Cada um destes aspectos que condicionam a ocorrência dos processo superficiais foram abordados neste trabalho. Os índices pluviométricos variam com totais de 900 a 1.000 mm na estação chuvosa e de 200 a 300 mm na estação seca, evidenciando um clima tropical com período seco e úmido bem diferenciados e alternados (INSTITUTO GEOLÓGICO, 1995). Estiagens prolongadas também podem ocorrer na área do município, como as que foram registradas de 1 de junho a 22 de julho de 1986 (52 dias), de 27 de junho a 14 de setembro de 1988 (80 dias), de 1 de maio a 10 de julho de 1992 (71 dias), de 25 de julho a 15 de outubro de 1994 (83 dias) e de 12 de junho a 17 de setembro de 1995 (91 dias!), podendo comprometer a oferta de água para o abastecimento. O meio físico da área de estudo foi classificado em unidades de terreno definidas em função de suas características naturais de fragilidade à erosão. Esses compartimentos sintetizam comportamentos dos terrenos em relação aos processos erosivos por erosão laminar e por ravinas e boçorocas. Desta forma, os terrenos mapeados neste trabalho tiveram como base as relações entre geologia, geomorfologia e pedologia.
Goiânia (GO), 03 a 06 de maio de 2001 Pag 2 A geologia da área é composta de sedimentos da Formação Itararé (siltitos, folhelhos, tilitos, arenitos, arcóseos, ritmitos), rochas basálticas da Formação Serra Geral e sedimentos aluvionares quaternários. A geomorfologia é caracterizada pelo sistema de relevo de Colinas Amplas, com topos extensos e aplainados, vertentes com perfis retilíneos a convexos, vales abertos e baixa densidade de drenagem. As declividades predominantes são inferiores a 15%, com alguns trechos localizados maiores que 20%. Como prevalece apenas este sistema de relevo na área, e de acordo com a escala adotada neste trabalho, a compartimentação do relevo foi feita com base na declividade, nas faixas de 0 a 6%, 6 a 12%, 12 a 20% e maiores que 20%. A pedologia é bastante variada, ocorrendo desde latossolos de textura argilosa e média, cambissolos e litólicos, e solos gleys e hidromórficos, e está intimamente relacionada com o substrato geológico e a declividade dos terrenos, podendo ser compartimentados em domínios morfopedológicos, caracterizando os tipos principais de terrenos da área. Estes domínios foram estudados quanto ao seu potencial erosivo natural e a sua fragilidade frente as formas de uso do solo. A elaboração de um mapa de uso e ocupação atual das terras foi efetuado a partir de trabalhos de campo, com o auxílio de cartas topográficas nas escalas 1:10.000 e 1:25.000. O mapa de uso e ocupação atual das terras engloba todas as coberturas, naturais e antrópicas, bem como as demais estruturas da ocupação, como espelhos d água, núcleos rurais e lavra mineral, existentes na bacia do córrego do Recanto. A caracterização do uso considera o conhecimento da utilização da terra pelo homem e a presença de vegetação natural, alterada ou não. 3. METODOLOGIA O reconhecimento das características do meio físico e o entendimento da dinâmica dos seus processos superficiais e inter-relações com as formas de uso e ocupação dos terrenos, formam um conjunto de subsídios imprescindíveis para a elaboração de um Plano de Preservação para a bacia do córrego do Recanto. Foram propostos e executados os seguintes trabalhos: a) diagnóstico do potencial de erosão dos terreno a partir de identificação das feições erosivas, das características pedológicas, geomorfológicas e geológicas; b) análise da qualidade da água nos reservatórios, a partir da coleta de amostras de água corrente e ensaios de qualidade; c) diagnóstico da capacidade de armazenamento dos três reservatórios e sua situação em relação aos processos de erosão e assoreamento, através de amostragens de sedimentos de fundo (piston corer e Van Veen) e levantamento batimétrico. Os resultados obtidos representam um diagnóstico da situação atual. Os dados servirão como valores de referência para balizar ações de recuperação, controle e monitoramento sistemático dos processos de erosão, assoreamento e da qualidade da água, no bojo de um plano de preservação dos recursos hídricos da bacia.
Goiânia (GO), 03 a 06 de maio de 2001 Pag 3 4. RESULTADOS Na área da bacia do córrego do Recanto, observou-se que a erosão dos terrenos está fortemente associada ao uso do solo, além das características naturais dos terrenos. O cultivo da cana de açúcar abrange cerca de 75% do uso dos terrenos na área da bacia. Esta categoria de uso do solo, apesar de ser uma cultura semi perene, com ciclo médio de quatro anos, provoca a exposição dos terrenos com o conseqüente aumento da erosão laminar, principalmente nos períodos de plantio e renovação dos talhões. Ocorre porém, que estes procedimentos são realizados no período seco, onde há escassez de chuvas, diminuindo assim os impactos da erosão nos terrenos expostos. Além da erosão laminar causada pelo escoamento difuso das águas de chuva na superfície dos terrenos, e que atua sem deixar cicatrizes profundas nos terrenos, foram observadas feições lineares, tais como sulcos, ravinas e boçorocas, provocadas pela concentração do escoamento das águas pluviais. O mapa de risco gerado a partir do cruzamento dos compartimentos morfopedológicos, com suas respectivas suscetibilidades, com as formas de uso e ocupação do solo. As formas de uso do solo foram agrupadas de acordo com seu potencial de impacto erosivo, e relacionada aos compartimentos gerando as categorias de risco, conforme mostra o QUADRO 1 abaixo. A Bacia do Córrego do Recanto apresenta uma criticidade média em termos de risco aos processos erosivos. As áreas de cabeceira de drenagem, se adequadamente ocupadas, vão se manter estáveis. Porém, qualquer alteração brusca e mais impactante das formas de uso do solo destas áreas, ou a não adoção de medidas de conservação de solo nos terrenos de maior declividade podem deflagrar processos de ravinamentos ou até de boçorocas. 5. ASSOREAMENTO DOS RESERVATÓRIOS O assoreamento dos reservatórios do Córrego Recanto foi estudado entendendo-se que os três reservatórios formam um sistema integrado, com transferência de água e sedimentos finos de montante para jusante. Assim sendo, a vida útil do reservatório Recanto 1, de onde é feita a captação, depende dos impactos do assoreamento dos reservatórios de montante. O assoreamento foi estudado com base nos levantamentos de campo, através de amostragens de sedimentos de fundo, dados de batimetria e cálculos de volume. As amostragens de sedimentos de fundo foram executadas com amostradores do tipo mandíbula, ou Van Veen, e amostrador de cravação Piston Corer. O primeiro coleta amostra dos primeiros 20 cm de espessura de sedimentos de fundo, enquanto que o segundo pode penetrar até 2m de profundidade, trazendo à tona a coluna sedimentada. O amostrador de mandíbula fornece, através das diferenças granulométricas de diferentes posições no fundo do lago, os vetores de sedimentação atual, ou seja, o movimento da dinâmica sedimentar no interior do lago. O amostrador de cravação piston corer já determina espessuras de assoreamento e variações na coluna sedimentar, traduzindo a história evolutiva dos depósitos. As taxas de sedimentação média estimadas forneceram os elementos comparativos importantes para a avaliação da vida útil dos reservatórios.
Goiânia (GO), 03 a 06 de maio de 2001 Pag 4 QUADRO 1 - Categorias do mapa de risco à erosão RISCO MEIO FÍSICO USO DO SOLO I BAIXO II MODERADO III MODERADAMENT E ALTO Áreas de topos de colinas ou áreas de várzeas. Declividades inferiores a 12%, Nos topos ocorrem latossolos de textura argilosa (LVa, LR), substratos argilosos das Fm Itararé e Fm Serra Geral. Nas várzeas ocorrem solos gleys e hidromórficos. Áreas das vertentes com declividades variando de 12 a 20%, com latossolos argilosos (LVa, LVe) de textura média argilosa. Substratos geológicos argilosos da Fm Itararé. Áreas de cabeceira de drenagem, com declividades superiores a 12%, latossolos arenosos e cambissolos litólicos dos substratos arenosos da Fm Itararé. Vegetação natural e mata ciliar, reflorestamento, cana-deaçúcar, núcleos rurais, culturas perenes Vegetação natural/ mata ciliar, pasto sujo, cana-de-açúcar, pastagens, lavra mineral, culturas perenes. Áreas urbanas consolidadas ou em consolidação, pastagens reflorestamento, cana-deaçúcar. O sistema de captação e abastecimento da bacia do córrego do Recanto é composto por 3 reservatórios escalonados: o de montante, o intermediário e o de jusante, denominados Recanto 1, 2 e 3. Os volumes dos reservatórios foram calculados a partir da elaboração de modelos digitais de terrenos. Os modelos e perfis dos lagos na época do enchimento e na situação atual, que mostraram as calhas das drenagens antigas, que apresentavam formas mais entalhadas em V, passam a formas mais arredondadas em U, devido ao acúmulo de sedimentos de assoreamento. Os modelos digitais do assoreamento forneceram os dados tabelados abaixo, para os três reservatórios. A partir das diferenças nos volumes úteis, antigo e atual, pode-se calcular o volume de assoreamento depositado e as taxas históricas de sedimentação, sabendo-se as idades aproximadas das barragens fornecidas pelos técnicos da prefeitura.
Recanto 1 Recanto 2 Recanto 3 FIGURA 1: Localização dos reservatórios da Bacia do Recanto, com pontos de coleta de amostras de água para análise de qualidade.
Goiânia (GO), 03 a 06 de maio de 2001 Pag 7 Os processos erosivos tendem a ser intensificados com a expansão urbana da cidade e com o avanço natural da evolução da boçoroca e das ravinas já instaladas nos terrenos. No caso da bacia de contribuição do Recanto 3, onde as feições erosivas apresentam-se mais estabilizadas, com recuperação das cabeceiras erodidas já apresentando vegetação de porte médio a alto no interior dos anfiteatros. O QUADRO 2 mostra que o Recanto 1, de onde é feita a captação é um reservatório de vida útil bastante confortável, em função de seu volume útil ainda disponível e da pequena taxa de sedimentação, devido ao fato dos reservatórios de montante reterem grande parte dos sedimentos da bacia contribuinte. QUADRO 2: Cálculo das taxas de sedimentação dos reservatórios do Córrego do Recanto. Reserv. volume assoreado (m3) volume útil atual (m3) Idade do Reservat (anos) Tendência de evolução Perda de Volume útil (%) taxas de sedimenta ção (m3/ano) Recanto 1 261158 1625212 13,8 18 crescente 14509 Recanto 2 499551 839080 37,3 15 crescente 33303 Recanto 3 28422 1021181 2,7 12 estável 2369 Porém, o Recanto 2 apresenta uma grande fragilidade em função da boçoroca que contribui com grande parte do assoreamento deste lago, servindo de veículo para a concentração de águas pluviais da estrada que passa na sua cabeceira. Soma-se ainda o pequeno volume disponível para abrigar esse aporte de sedimentos. Se considerarmos taxas ainda maiores de sedimentação, a situação fica ainda mais crítica. O Recanto 2 portanto acaba funcionando como efeito cascata, ou seja, a rápida evolução de seu assoreamento pode acarretar prejuízos consideráveis no lago do Recanto1, a jusante deste. Pode-se ter um forte comprometimento da segurança da barragem do Recanto 2, provocando seu rompimento e transmitindo o impacto do assoreamento para o corpo d agua subseqüente, ou simplesmente não reter mais os sedimentos de montante, transferindo-os para o Recanto 1. Desta forma, se mantidas essas condições, com taxas de assoreamento constantes, o Recanto 2 atingirá o máximo de seu assoreamento em aproximadamente 25 anos, gerando instabilidade na respectiva barragem. Neste momento, a barragem pode ou não suportar a passagem de água por cima da ombreira, criando assim instabilidade em todo o sistema de abastecimento do Recanto. Essas duas possibilidades foram investigadas e os dados calculados estão apresentados no QUADRO 3, em termos de prognósticos de evolução.
Goiânia (GO), 03 a 06 de maio de 2001 Pag 8 QUADRO 3: Prognósticos de evolução dos reservatórios do Córrego do Recanto Prognósticos de evolução (% de assoreamento ) Lago para 25 anos a taxa constante de sedimentação Para 25 anos a taxa constante com rompimento da barragem do Recanto 2 para 34 anos a taxa constante sem rompimento da barragem do Recanto 2 Recanto 1 22,3 73,5 100,0 Recanto 2 99,2 0 100,0 Recanto 3 5,8 5,8 7,9 Considerando-se essas possibilidades, a bacia contribuinte do Recanto 2 deve ser imediatamente objeto de investigação mais detalhada, a fim de se definir algum projeto executivo de contenção e prevenção da boçoroca, e implantação de rede de drenagem apropriada a desviar e evitar o escoamento concentrado dentro da mesma. A bacia contribuinte do Recanto 1 também deve ser protegida do escoamento concentrado das águas pluviais, principalmente das águas pluviais concentradas na ravina contribuinte, cujas águas são carreadas pela estrada viscinal. O Recanto 3 apresenta situação mais confortável, embora deva se adotar todas medidas conservacionistas de preservação do solo, nos usos agrícola e pecuário, em conformidade com as exigências das capacidades de uso do solo.