Rio de Janeiro, 23 de junho de 2015. Exma. Sra. Presidente da Comissão de Direitos Humanos do IAB Dra. MARCIA DINIS Ref. Ao PL. 6705/2013, de autoria do Deputado Arnaldo Faria de Sá que amplia os poderes do inc. XIV, do art. 7º; e acrescenta o inc. XXI, do mencionado artigo, da lei 8906/94 (Estatuto da advocacia). O mencionado PL 6705/2013, tem a seguinte redação: Art. 7º (omissis...) XIV examinar em qualquer instituição responsável por conduzir investigação, mesmo sem procuração, auto de flagrante e de investigação de qualquer natureza, findos ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos que seja física ou digitalmente, sob pena de incorrer abuso de autoridade, inclusive pelo fornecimento incompleto e ou retirada de peças já incluídas no caderno investigativo. Sendo que nos casos sigilosos, será necessária a apresentação de procuração.(os grifos são para realçar o que foi acrescido pelo projeto)... XXI assistir, sob pena de nulidade, aos seus clientes investigados, durante a apuração de infrações, bem como o direito de apresentar razões e quesitos, e
requisitar diligências. (inciso acrescido pelo projeto ao mesmo artigo) Trago à douta apreciação da comissão o referido PL, que visa por normatização definitiva ao desempenho da advocacia, na fase preliminar dos procedimentos investigativos. A matéria, ainda que insculpida em nossa Lei Fundamental, mesmo nos dias de hoje, tem sido objeto de tormentoso entrave no relacionamento advocatício com os meios de persecução penal; principalmente, como tem sido notado, na atuante participação do MP, ainda na fase investigativa. Como é de sabença comum, o exercício da advocacia não constitui privilégio ao desempenho do advogado, mas direito público subjetivo que todo cidadão deve ter. Não deve ser interpretado em favor da discricionariedade, em desfavor da cidadania. Com efeito, assim expressa o inc. LV, do art. 5º, da Constituição ao referir se às garantias e aos princípios fundamentais, nela inscritos; verbis: Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes. Por força do dispositivo Fundamental acima transcrito, não resta a menor dúvida que o legislador constitucional optou pelo que os doutrinadores do instrumental penal chamam de processo acusatório. No citado sistema, acusação e defesa, estão situados no mesmo nível, em homenagem ao princípio do contraditório, da ampla defesa e porque não, do devido processo legal. O sistema vigente em nosso Código de Processo Penal, de 1941, também chamado de Código Rocco, adota o chamado princípio penal inquisitório, com nítida influência fascista. Além do poder discricionário, a autoridade policial se pauta pelo autoritarismo do sigilo e o inquérito pelo princípio da verdade real, nele contido.
Não há defesa nem contraditório. Pois o Estado é soberano em face do investigado. Seria desnecessário dizer os incontáveis obstáculos enfrentados pelos patronos dos indiciados/ investigados. Por outro lado, a realidade mostra uma nítida presença, cada vez mais acentuada, do órgão acusador na fase investigativa indicando provas. Não raro revestidas de sigilo contra o investigado, em evidente prejuízo à defesa. A fase policial do procedimento de incriminação ganha autonomia e importância maior de acordo com o grau de exclusão e segregação social (logo de distância social máxima) do acusado (cf. Salah Hassan Khaled Junior, citando Misse, in Revista Eletrônica da PUCRS.) A Constituição Cidadã, de 88, pondo fim ao Estado inquisitorial, consagrado pelo CPP declarou textualmente que aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa... Portanto, seguindo o contido na Lei Maior, é indiscutível que o ordenamento jurídico pátrio, adotou o sistema acusatório, mesmo nos procedimentos administrativos e ou policiais, assegurando contraditório e ampla defesa (cf. art.5º, da CF). Erigido à condição de princípio Fundamental pétreo; como contrariar o postulado constitucional em prestígio ao sistema inquisitorial, ainda vigente? Assim, não é por outro motivo, que certo seguimento da doutrina insiste em afirmar que entre nós vige o sistema chamado processo penal misto ; como forma de ajustar o princípio do processo penal de Rocco (inquisitório), com o chamado processo acusatório consagrado pela CF. Tal critério visa estabelecer um meio termo entre os dois sistemas em prejuízo da ampla defesa e do contraditório.
O processo penal acusatório de viés humanista e igualitário coloca o Estado acusador e o acusado no mesmo nível de forças na busca da prova, desde a fase procedimental. Não há segurança jurídica onde não existe contraditório: daí a necessidade do advogado em todas as fases do inquérito, que também pode ser investigativo e probatório em favor do investigado. No sistema acusatório a gestão da prova está nas mãos das partes: é democrático. Não só no processo pode haver uma estrutura dialética, onde as provas poderão ser apreciadas em igualdade de condições, senão também na fase investigativa. No processo penal acusatório, adotado pelo nosso Estado de Direito Democrático (acusação defesa juiz), estão assegurados os sagrados postulados de ampla defesa, contraditório, devido processo legal e julgamento justo prolatado por juiz natural. A súmula vinculante nº 14 do STF. Dispõe: É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão de competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa Por isso, os procedimentos punitivos jurídico penais inquisitoriais, devem ser banidos das práticas punitivas ilegais do processo penal, em face do que dispõe a Constituição e agora em acatamento ao decidido na citada súmula.
Destarte, entendo que os acréscimos propostos pelo PL.6705/2013, ao Estatuto da Advocacia, impõe linhas definitivas ao que estabelece a Constituição Federal. Dou parecer favorável ao mencionado projeto, sugerindo que o mesmo seja apreciado em caráter de urgência. É o parecer que submeto à apreciação da comissão. RIO DE JANEIRO, 23 de junho de 2015. ROBERTO A. REIS Advogado, membro da Comissão de Direitos Humanos do IAB. o