NUTRIÇÃO DE CRIANÇAS COM FENDA LABIAL E PALATINA: REVISÃO DA LITERATURA AUTORES Jackeline Cristina MENDONÇA Marina Palace Moreira PANZA Discente da União das Faculdades dos Grandes Lagos UNILAGO Amanda Priscila de OLIVEIRA; Ana Iara Costa FERREIRA Carla Machado SILVA; Fabiana NAKASHIMA Natália MARTIN; Natália Sperli G. M. S. SASSAKI Sílvia Messias BUENO; Paula Curi de Freitas FAVARO Docente da União das Faculdades dos Grandes Lagos UNILAGO RESUMO Fenda labial ou palatina são deformidades congênitas, que envolvem a face e a cavidade oral, o seu desenvolvimento tem início ainda no período embrionário. Pacientes com fissuras orofaciais muitas vezes requerem cirurgia ou outros procedimentos complexos. A etiologia das fendas labiopalatinas encontram-se condicionadas a uma série de fatores ambientais e genéticos, uma fenda pode ser uma única anomalia ou uma parte de uma síndrome. Os problemas com a alimentação de indivíduos com fissuras labiais e palatinas são frequentes e surgem logo ao nascimento, devido ao comprometimento da sucção e deglutição. A utilização de métodos de nutrição adequados ao momento da vida do indivíduo é fundamental para seu desenvolvimento. PALAVRAS - CHAVE Fenda labial, Fenda Palatina, Nutrição.
1. INTRODUÇÃO Fenda labial e fenda palatina (Figura 1), são as deformidades congênitas mais comuns da região orofacial, com grande impacto epidemiológico, social e econômico. Fendas orofaciais surgem de falhas dos processos de desenvolvimento craniofaciais normais. Quando uma fenda labial ocorre, o lábio não é contínuo, e quando uma fenda palatina ocorre, há uma comunicação entre as cavidades oral e nasal (LESLIE, MARAZITA, 2013; REILLY et al, 2013; MONLLEÓ et al, 2014; FAKHIM et al, 2016; HIREMATH et al, 2016). Figura 1. Tipos de fenda labial e fenda palatina Uma consequência muito comum de crianças com fissuras é o estresse psicológico dos pais devido à alimentação inadequada e essas perderem peso e estarem propensos à insuficiência nutricional. As fendas podem afetar severamente a fala, o posicionamento dentário e a estética. Sem o devido tratamento, podem provocar sequelas graves, como a perda da audição, problemas de fala. Devido ao avanço no campo da medicina, há um reparo total da fenda labial e palatina, através de cirurgias, e esses procedimentos são realizados nas fases posteriores. Necessitando de uma abordagem multidisciplinar que inclui odontopediatra, cirurgião oral e fonoaudióloga até a idade adulta e, geralmente, necessita mais de uma intervenção cirúrgica (KUHN et al, 2012; HIREMATH et al, 2016). A fenda pode atingir até o palato, facilitando as crianças a sugarem o alimento, provocando infecções como otites e pneumonias, pois há comunicação buco-nasal. As anemias também estão presentes nos pacientes com fendas lábio e palatina, devido à dificuldade em se alimentarem. A amamentação, embora dificultoso para o recém-nascido, é indicado para evitar infecções, combater a anemia e fortalecer a musculatura da face e boca (KUHN et al, 2012; LESLIE, MARAZITA, 2013).
Os indivíduos nascidos com fissura têm incidência aumentada de problemas mentais e maiores taxas de mortalidade em todas as fases da vida. A presença das fendas também está associada a um maior risco de vários tipos de câncer, incluindo câncer de mama, cérebro, bem como seus descendentes (KUHN et al, 2012; LESLIE, MARAZITA, 2013). 2. INCIDÊNCIA E PREVALÊNCIA A incidência da fenda labial, com ou sem fenda palatina, ocorre em 1 em cada 600 nascidos vivos. Fenda palatina isolada, ocorre em 1 em cada 2.000 nascidos vivos. No Brasil, existem problemas no registro epidemiológico de defeitos congênitos (HIREMATH et al, 2016; MASIH et al, 2016). A prevalência ocorre em um caso a cada 500-2.500 nascimentos. Essa variação está relacionada a fatores genéticos e ambientais envolvendo etnia, região geográfica, saúde da população e às condições nutricionais (MONLLEÓ et al, 2014). Segundo estudos realizados por Cymrot et. al (2010), em relação ao sexo dos pacientes com fissura labial e/ ou palatina, este verificou que 53% dos pacientes são do sexo masculino (Tabela 1). Tabela 1. Porcentagem de fissura lábio/palatina por sexo Sexo Porcentagem Masculino 53% Feminino 47% Total 100% Fonte: Cymrot et. al. (2010) 3. EMBRIOLOGIA O mecanismo embriológico que causa as fissuras na região pré-maxilar ocorre entre a 4ª e 8ª semana de desenvolvimento embrionário. Quando a fusão dos processos nasais lateral e medial com a extensão anterior dos processos maxilares, podendo ser em ambos os lados, falhar, origina a fenda labial. Por outro lado, o desenvolvimento de uma fenda no palato pode resultar de uma falha de penetração do tecido mesodérmico no sulco ectodérmico da linha média do palato posterior a lateral do pré-maxilar (KUHN et al, 2012; MASIH et al, 2016). 4. GENÉTICA As fendas labial e palatina associadas a outros defeitos, é classificada como sindrômica, porém quando aparecem isoladas são classificadas como não sindrômica, com etiologia multifatorial. Já as fendas sindrômicas podem ter etiologia conhecida como uma síndrome monogênica, cromossômica ou teratogênica, mas também podem não ter etiologia conhecida (MONLLEÓ et al, 2014).
Quando de herança multifatorial, os fatores etiológicos que parecem estar mais relacionados a esta anomalia são: hipervitaminose A, consanguinidade, estresse emocional, viroses, uso de corticoides, radiações ionizantes, alcoolismo, trauma mecânico, tabagismo, uso de drogas e ausência de ácido fólico (KUHN et al, 2012; LESLIE, MARAZITA, 2013). Fenotipicamente as fissuras podem ser classificadas em três categorias, a que afeta somente o lábio, Fenda labial, que afeta o lábio e o palato, Fenda labial e palatina e a que afeta exclusivamente o palato, Fenda palatina (LESLIE, MARAZITA, 2013). 5. NUTRIÇÃO Em indivíduos com fenda palatina, o principal problema é a alimentação, o que é extremamente essencial nas fases iniciais dos lactantes para proporcionar uma melhor nutrição, necessário para o crescimento e desenvolvimento. O grau de dificuldade na alimentação varia com a gravidade da fenda. Se a criança tem apenas um pequeno entalhe no lábio, a alimentação pode não ser um problema, ao contrário de crianças com fenda palatina. O principal cuidado com crianças com fissura palatina é manter uma alimentação adequada e uma técnica de alimentação apropriada para o crescimento e desenvolvimento da criança e preparar o mesmo para a cirurgia corretiva. (GOYAL, et al, 2016; HIREMATH et al, 2016). Os problemas mais notáveis são de sucção insuficiente, ingestão excessiva do ar, fadiga, asfixia, ingestão de leite inadequada, regurgitação nasal, a incapacidade de ganhar peso e o tempo excessivo necessário para se alimentar. Incapacidade para alimentar satisfatoriamente pode levar ao estresse materno e ansiedade (DEVI et al, 2013). Entretanto, crianças de qualquer idade com fenda tem exigências nutritivas semelhantes às outras crianças nascidas sem uma fissura desde que nenhuma outra alteração esteja associada (DEVI et al, 2013). 6. AMAMENTAÇÃO DE RECÉM NASCIDOS A amamentação do recém-nascido fissurado, na maioria das vezes, é muito difícil, sendo necessário que a mãe seja orientada a realizar esse procedimento (OLIVEIRA, 2014). As dificuldades de alimentação de recém-nascidos com fissura de lábio e/ou palato são bem documentadas, cerca de 63% experimentam tais dificuldades e a maioria destes estão relacionados com a redução da eficiência de sucção, pois, devido à separação da área palatal, há a posição inadequada da aréola do seio para a compressão e sem a pressão intra-oral negativa adequada para a sucção e pela regurgitação do leite para a cavidade nasal resultarão em alimentação e nutrição insuficiente. (DUARTE et al, 2015; GOYAL, et al, 2016; HIREMATH et al, 2016). A maioria dos profissionais de saúde concordam que a amamentação é benéfica tanto para criança com fissura de lábio e mãe, evidenciando que a presença da fenda não impede a realização do aleitamento materno. O leite materno pode conferir proteção contra otite e está ligado a maior pontuação em testes inteligência e desenvolvimento da linguagem (DEVI et al, 2013; SILVA et al, 2015; GOYAL, et al, 2016).
Um método para a amamentação é o posicionamento cuidadoso da cabeça do bebê com a criança em posição semi-sentada para evitar aspiração; promover pausas no decorrer da mamada; realizar estímulo próximo ao local da fissura por meio da aproximação ao bico do seio; ao término da mamada, posicionar a criança em decúbito lateral, com o objetivo de diminuir riscos de asfixia (JINDAL, KHAN, 2013; SILVA et al, 2015; HIREMATH et al, 2016). Há uma grande variedade de métodos de alimentação utilizando alguns dispositivos, para que ocorra nutrição de sucesso em crianças com fissura de lábio e palato. Estes dispositivos são basicamente de dois tipos, os que se destinam a bloquear a continuidade da cavidade oral com a cavidade nasal, e os que se baseiam em diminuir a necessidade da criança de sugar (DEVI et al, 2013). Uma das técnicas é a utilização de placas de alimentação no palato, que interrompe a comunicação entre a cavidade oral e a nasal, estas têm sido amplamente defendidas. A principal desvantagem dessas placas de alimentação é a exigência repetida de fabricação de novas por causa do crescimento e manutenção de uma boa higiene oral (JINDAL, KHAN, 2013; HIREMATH et al, 2016). Não podendo realizar a amamentação, recomenda-se que o leite materno seja retirado e oferecido por meio de mamadeira, uma grande variedade de bicos ortodônticos está disponível. Entretanto, a mamadeira pode ser prejudicial ao crescimento e desenvolvimento normal da face dependendo dos bicos utilizados, pois, alguns não são desenvolvidos de acordo com a fisiologia da amamentação dos fissurados, portanto a utilização de um bico inadequado leva os lábios a adotarem uma posição invertida, causam enfraquecimento muscular, deve-se então, procurar dentre a diversidade de bicos de mamadeiras o mais adequado para cada tipo de fenda (OLIVEIRA, 2014; SILVA et al, 2015; HIREMATH et al 2016). A utilização de sondas nasogástricas não é recomendado por prejudicar os reflexos de sucção e deglutição. Além disso, interfere nos mecanismos normais de respiração pela interposição da sonda na narina e a dificuldade para o fechamento adequado da boca. O uso de sondas deve ser realizado em casos de extrema necessidade quando não há sucesso na alimentação por via oral (OLIVEIRA, 2014). 7. ALIMENTAÇÃO DE CRIANÇAS Recomenda-se que as crianças com fenda labial e palatina não recebam alimentos pastosos antes dos cinco meses, já essas crianças, com idade superior a seis meses, apresentam uma preferência pelos alimentos pastosos e umidificados, pois facilitam a deglutição e reduzem os esforços durante a mastigação. Quanto à consistência dos alimentos, as mães podem liquidificar os alimentos; amassar ou processar (CAMPILLAY et al, 2010; SILVA et al, 2015). Crianças com fissuras, nas faixas etárias de 2 a 4 anos, e de 4 a 6 anos, mesmo após a correção cirúrgica, apresentam crescimento e altura mais baixa que crianças da mesma faixa etária sem a presença de fendas, devido a uma alimentação precária antes do procedimento cirúrgico (GOPINATH, 2013).
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS Manter uma nutrição adequada é prioridade para recém-nascidos e crianças com fenda labiopalatinas e encontrar uma técnica de alimentação é essencial para que possam obter os nutrientes necessários para o crescimento e desenvolvimento. Não se deve excluir a possibilidade de amamentação, mesmo com as dificuldades enfrentadas como engasgo, refluxo, e a não sucção, porém se não conseguir manter exclusivamente esse tipo de alimentação existem outras técnicas para fornecer os nutrientes necessários para esses indivíduos. As crianças portadoras de fenda labial e palatina são iguais a qualquer outra criança, porém necessitam de maior atenção com a alimentação.
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS CAMPILLAY, PL; DELGADO, SE; BRESCOVICI, SM. Avaliação da alimentação em crianças com fissura de lábio e/ou palato atendidas em um hospital de Porto Alegre. Revista CEFAC, v.2, n.2, Abr 2010. CYMROT, M. ET. AL. Prevalência dos tipos de fissura em pacientes com fissuras labiopalatinas atendidos em um Hospital Pediátrico do Nordeste brasileiro. Rev. Bras. Cir. Plást.; v. 25, n. 4, 2010. DEVI, ES; SANKAR, AJS; KUMAR, MGM; SUJATHA, B. Maiden morse- feeding in clefit lip and palate infants. J Int Soc Prevent Communit Dent. V.2, n. 2, p. 31-37, Mar 2013. DUARTE, GA; RAMOS, RB; CARDOSO, MCAF. Feeding methods for children with cleft lip and/orpalate: a systematic review. Brazilian Journal of Otorhinolaringology, 2015. FAKHIM, SA; SHARIDI, N.; LOTFI, A. Prevalence of Associated Anomalies in Cleft Lip and/or Palate Patients. Iranian Journal of Otorhinolaryngology, v. 28, n.2, p. 135-139, Mar 2016. GOPINATH, VK. Assessment of Nutrient Intake in Cleft Lip and Palate Children After Surgical Correction. Malays J Med Sci. v. 20, n. 5, p.61-66, Dez 2013. GOYAL, A; JENA, AK; KAUR, M. Nature of feeding practices among children with cleft lip and palate. JOURNAL OF INDIAN SOCIETY OF PEDODONTICS AND PREVENTIVE DENTISTRY. v. 20, n. 1, p.47-50, 2016. HIREMATHl, VS; LINGEGOWDA, AB; RAYANNAVAR, S; KUMARI, N. A Innovative Technique - Modified Feeding Bottle for a Cleft Palate Infante. Journal of Clinical and Diagnostic Research. v. 10, n. 4, 2016. JINDAL,MK; KHAN, SY. How to feed cleft patient? International Journal of Clinical Pediatric Dentistry. v.6, n. 2, p.100-103,ago 2013. KUHN, VD; MIRANDA, C; DALPIAN, DM; MORAES, CMB; BACKES, DR; MARTINS, JS; SANTOS, BZ. Fissura labiopalatais: revisão da literatura. Ciências da Saúde. v.13, n.2, p. 237-245, 2012. LESLIE, EJ; MARAZITA, ML. Genetics of Cleft Lip and Cleft Palate. Am J Med Genet C Semin Med Genet. v. 163, n. 4, p. 246-258, Nov 2013. MASIH, S; CHACKO, RA; THOMAS, AM; SINGH, N; THOMAS, R; ABRAHAM, D. Simplified feeding appliance for an infant with cleft palate. Journal of Indian Society of Pedodontics and Preventive Dentistry. v. 32, n. 4, p. 338-341, Dez 2016.
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