EXMO(A). SR(A). JUIZ(ÍZA) FEDERAL DA VARA FEDERAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA EM PERNAMBUCO, POR DISTRIBUIÇÃO AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA N. /2008 Ref.: Procedimento Administrativo MPF/PRPE n. 1.26.000.003066/2006-93 O Ministério Público Federal, pela procuradora da República infra assinada, vem, com fulcro no art. 37, 4º, da Constituição Federal e no art. 17 da Lei n. 8.429/92, e com base nos fatos apurados nos autos do procedimento em referência, perante Vossa Excelência, propor a presente Ação Civil de Improbidade Administrativa em face de Edilson Valentim da Silva, brasileiro, ex-servidor público federal, inscrito no CPF/MF sob o n. 268.299.674-49, Carteira de Identidade n. 2370222-SSP/PE, residente e domiciliado na Rua Poeta Francisco Sabino, n. 14, quarta etapa, Rio Doce Olinda/PE; e DOS FATOS pelos motivos de fato e direito a seguir expostos: Foi instaurado nesta Procuradoria da República o Procedimento Administrativo MPF/PR/PE n. 1.26.000.003066/2006-93, para apurar, sob a ótica da improbidade administrativa, fraude na concessão de segurosdesempregos no âmbito da Subdelegacia do Trabalho de Paulista/PE. Nos anos de 2002 e 2003, o demandado adulterou e concorreu para a adulteração de formulários de requerimento de seguro-desemprego
2 (SD) a fim de obter proveito econômico, possibilitando, com sua conduta, a concessão de benefícios em valores superiores ao que os segurados faziam jus, bem como o aumento da quantidade das parcelas devidas, fatos evidenciados por meio de sindicância, instaurada pela Portaria n. 050, de 25/09/2003 (fl. 3, Anexo I 1 ) e do Processo Administrativo Disciplinar (PAD) n. 46213.001356/04-06. Restou comprovado por meio do exame grafotécnico acostado às fls. 151/155 do Anexo I que o réu adulterou os requerimentos de segurodesemprego de Marconi Cavalcanti da Silva, Luciano José Ferreira e Josuel Ramos de Araújo, todos com data de fevereiro de 2002 (fls. 157, 158 e 160 do Anexo I), aumentando os valores dos três últimos salários (campo 17 do formulário) e o da soma respectiva (campo 18 do formulário). Sobre os detalhes do modus operandi da fraude executada pelo réu, merece referência excerto do relatório elaborado pela comissão do aludido PAD, in verbis (fls. 193/194 do Anexo I): 2.2.6 Como já foi observado pela Comissão, as alterações procedidas pelo indiciado nos formulários de SD, tiveram o escopo de fraudar o Programa de Seguro Desemprego, pois consignou valores salariais superiores aos que efetivamente haviam sido percebidos pelos trabalhadores, conforme comprova-se do cotejo dos formulários com os valores registrados nas declarações de salários prestadas pelos respectivos empregadores quando elaborados da RAIS/2001, conforme passamos a detalhar: A) O Requerimento de Seguro-Desemprego de Marconi Cavalcanti da Silva, fls. 154 do PAD (fl. 95, vol. principal), teve os valores dos três últimos salários, respectivamente, R$ 287,16, R$ 298,11 e R$ 268,02, alterados para, respectivamente, R$ 387,16, R$ 498,11 e R$ 368,02 e o somatório do campo 18 do formulário de R$ 853,29 para R$ 1.253,29; ao passo que, às fls. 173 do Processo de Sindicância (fl. 97, vol. principal), RAIS/2001, os salários declarados pelo empregador relativos aos meses de novembro e dezembro/200l, foram de R$ 287,16 e R$ 298,11, respectivamente. Tais alterações, que partiram do punho do indiciado, conforme item I.II do laudo pericial, implicou elevação dos valores das parcelas do Seguro-Desemprego, pois com base no salário efetivamente percebido, cada parcela do SD seria de R$ 227,54 e com a alteração passou a ser de R$ 307,92, fls. 172 do Processo de Sindicância (fl. 96, vol. principal), configurando, assim, percepção indevida de vantagem pelo trabalhador beneficiário. B) Igualmente, no formulário de SD de Luciano José Ferreira, às fls. 155 do PAD (fl. 158, Anexo I), os salários percebidos nos três últimos meses, registrados nos campos respectivos com igual valor de R$ 210,00 foram alterados para R$ 310,00, alterando, também, a soma 1 Todas as folhas mencionadas no corpo da presente petição inicial dizem respeito à numeração do Procedimento Administrativo MPF/PR/PE n. 1.26.000.003066/2006-93, que a instrui, sendo que as folhas do Anexo I correspondem à numeração dada pelo Ministério Público do Distrito Federal, identificada pela sigla MPF/PR/DF.
3 dos três últimos salários de R$ 630,00 para R$ 930,00, enquanto que a empresa empregadora declarou na RAIS/2001 o salário de R$ 228,00, para os meses de novembro e dezembro/2001, conforme documento de fls. 208 do Processo de Sindicância (fl. 100, vol. principal). Em razão da modificação, o trabalhador passou a receber a parcela de R$ 248,00, fls. 207 do Processo de Sindicância (fl. 99, vol. principal), quando a parcela devida era de R$ 200,00. C) O requerimento de SD de Josuel Ramos de Araújo, às fls. 157 do PAD, teve alterados os valores relativos aos três últimos salários, respectivamente, de R$ 240,00 cada, para R$ 300,00, acarretando uma majoração das parcelas do SD de R$ 200,00 para R$ 240,00 cada, conforme documento de fls. 218 do Processo de Sindicância. 2.2.7 Os acréscimos nos valores das parcelas do Seguro-Desemprego percebidas pelos trabalhadores beneficiários, descritos nos itens anteriores, caracterizam o ilícito administrativo consistente em valer-se do cargo para lograr proveito pessoal ou de outrem em detrimento da dignidade da função pública, nos termos do art. 117, inciso IX, da Lei 8.112/90. Refuta-se desde logo o argumento invocado pelo demandado em sua defesa no processo disciplinar no sentido de que, juntamente com os demais funcionários que recepcionavam requerimentos de segurodesemprego, estava autorizado a realizar correções nos formulários de SD quando as informações neles inseridas divergissem com os documentos apresentados pelos segurados (fl. 180, Anexo I), tendo em vista que, como consignado acima, os valores dos salários nos formulários periciados estavam corretamente preenchidos antes de modificados pelo demandado, como se infere da simples comparação entre os salários constantes dos requerimentos adulterados e das declarações de salários (RAIS) prestadas pelos respectivos empregadores. De outra banda, restou demonstrado que o demandado intermediou a obtenção do seguro-desemprego de Izabel Cristina da Silva, tendo sido adulterados no requerimento respectivo os campos referentes aos três últimos salários (campo 17), à soma dos três últimos salários (campo 18) e ao número de meses trabalhados (campo 20) (fl. 156 do Anexo I). À semelhança dos casos acima relatados, as alterações do benefício de Izabel Cristina da Silva consistiram: 1) na elevação do antepenúltimo salário de R$ 246,59 para R$ 546,59, do penúltimo salário de R$ 247,28 para R$ 547,28 e do último salário de R$ 227 para R$ 527; 2) na conseqüente elevação da soma dos três últimos salários para R1.350,00; e 3) na elevação do número de meses trabalhados de 7 para 27, consoante se verifica do próprio requerimento da segurada (fls. 156 do Anexo I). De sua vez, o exame grafotécnico realizado no requerimento de Izabel Cristina da Silva (fls. 151/155 do Anexo I) constatou que partiram do
4 punho do demandado anotações de cálculos no verso do documento em questão (fl. 156v), o que denota sua efetiva intermediação no caso. Por outro lado, ficou evidenciado o recebimento de vantagem econômica indevida por parte do demandado para a realização das alterações e intermediação em questão. Sobre esse ponto, o senhores Geraldo de Lima (fls. 105 e 118 do Anexo I) e Ozinalvo da Silva Batista (fls. 39/40 do Anexo I e fls. 71/72 do vol. principal), ambos funcionários da Subdelegacia de Paulista à época dos fatos, afirmaram ter conhecimento de que Edílson pedia propina aos segurados em troca do aumento do valor dos seguros-desempregos correspondentes. Tem especial relevância as informações prestadas por Geraldo de Lima, que por duas vezes confessou ter encaminhado funcionários da empresa Intex Interior Exterior Ltda., na qual também trabalhava, ao sr. Edílson, que resolveria o pagamento dos respectivos seguros-desempregos, em troca da metade das duas primeiras parcelas do benefício recebido pelos referidos trabalhadores. Corrobora este fato as declarações fornecidas pelo sr. Hilmério Alves de Brito, o qual confirma o rateio das duas primeiras parcelas do seu benefício com o sr. Geraldo, para que fossem posteriormente entregues ao réu (fls. 78/79 do Anexo I). Como visto, restou demonstrado que o demandado, na condição de servidor da Subdelegacia do Trabalho de Paulista/PE, ao viabilizar a concessão de benefícios em importâncias maiores, mediante a adulteração dos requerimentos de seguro-desemprego, percebia uma parte do respectivo valor, utilizando-se, pois, do seu cargo para obter vantagem ilícita, em prejuízo do Fundo de Amparo ao Trabalhador FAT, fundo especial vinculado ao Ministério do Trabalho destinado ao custeio do Programa de Seguro- Desemprego. DA LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM O réu Edilson Valentim da Silva era, à época dos fatos, servidor da Subdelegacia do Trabalho de Paulista/PE. A Lei de Improbidade Administrativa dispõe: Art. 1 Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, servidor ou não, contra a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, serão punidos na forma desta lei. Parágrafo único. Estão também sujeitos às penalidades desta lei os atos de improbidade praticados contra o patrimônio de entidade que receba subvenção, benefício ou incentivo, fiscal ou creditício, de órgão público bem como daquelas para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com menos de cinqüenta por cento do
5 patrimônio ou da receita anual, limitando-se, nestes casos, a sanção patrimonial à repercussão do ilícito sobre a contribuição dos cofres públicos. Art. 2 Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior. (destaques acrescentados) Desse modo, forçoso reconhecer que o réu é parte legítima para figurar no pólo passivo da presente demanda, uma vez que, na qualidade de servidor da Subdelegacia do Trabalho de Paulista/PE, lançou mão do seu cargo para adulterar documentos públicos e perceber vantagens indevidas, faltando, assim, com a probidade administrativa que deve ser exigida de todos os agentes públicos. DA LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL E DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL Em consonância com as funções institucionais do Ministério Público, descritas no art. 129 da Constituição Federal, os arts. 17 da Lei da Improbidade Administrativa e 6.º, XIV, f, da Lei Orgânica do Ministério Público da União atribuem, expressamente, ao Parquet legitimidade para o ajuizamento da ação civil por ato de improbidade administrativa. Levando-se em conta que o demandado praticou os atos de improbidade ora discutidos na condição de servidor público federal, exsurge naturalmente a competência do Ministério Público Federal para atuar no presente caso. Ademais, fundamentando-se essa ação, precipuamente, no desvio de verbas federais por meio de fraude ao seguro-desemprego, benefício este que encontra amparo financeiro no FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), fundo especial vinculado ao Ministério do Trabalho, mantido pelas arrecadações do PIS (Programa de Integração Social) e Pasep (Programa de Formação do Patrimônio do Servidor), resta indiscutível o caráter federal da sua manutenção financeira, de sorte que afigura-se inconteste o preenchimento dos requisitos necessários à configuração da legitimidade ativa do MPF à frente desse feito. Portanto, demonstrada está a legitimidade ativa ad causam do Ministério Público Federal e a competência da Justiça Federal para processar e julgar a demanda, nos termos do art. 109, I, da Constituição Federal. DOS ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA VERIFICADOS Faltou o réu Edilson Valentim da Silva com a probidade administrativa ao adulterar os formulários de seguros-desempregos e ao intermediar a obtenção de seguro-desemprego, possibilitando, com sua
6 conduta, a concessão de benefícios em valores superiores aos devidos, em detrimento do FAT. Conforme acima relatado, os atos praticados pelo demandado importaram em seu enriquecimento ilícito, mediante o recebimento indevido de vantagem econômica (parte dos benefícios concedidos a maior aos segurados). Diante disso, incide na hipótese o art. 9º, IX da Lei n. 8.429/92, ora transcrito: Art. 9º. Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1º desta lei, e notadamente: IX perceber vantagem econômica para intermediar a liberação ou aplicação de verba pública de qualquer natureza; De outro giro, a conduta do réu - possibilitando a concessão de seguros-desempregos em valores superiores aos que os segurados faziam jus -, além de manifestamente ilegal, implicou dilapidação do patrimônio público, notadamente o do FAT, configurando assim espécie de ato de improbidade administrativa que causa prejuízo ao erário, prevista no art. 10, I e XII, da Lei n. 8.429/92: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: I - facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei; XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; Ainda, os fatos imputados ao demandado atentam contra os princípios da Administração Pública, sobretudo o princípio da legalidade, com violação dos deveres de honestidade, legalidade e lealdade às instituições, nos termos do art. 11, I, da Lei n. 8.429, de 1992, in verbis: Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente: I praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto na regra de competência.
7 Por fim, observa-se que para além dos atos de improbidade administrativa acima indicados, os fatos em questão estão sendo apurados no âmbito criminal, por meio do IPL 428/2004, tombado nessa justiça federal sob o n. 2004.83.00.024558-0, o que denota o elevado grau de ofensividade e reprovabilidade da conduta do réu. DO PEDIDO Por todo o exposto, requer o Ministério Público Federal: a) a autuação da presente petição e do Procedimento Administrativo MPF/PR/PE n. 1.26.000.003066/2006-93; b) a notificação do requerido para oferecimento de manifestação no prazo de 15 (quinze) dias, nos termos dos art. 17, 7º da Lei n.º 8.429/92; c) o recebimento da presente ação e a citação do réu, nos termos do art. 17, 9º, da Lei de Improbidade Administrativa; d) a intimação da União para que se manifeste sobre eventual interesse em integrar o pólo ativo da presente demanda, nos termos do art. 17, 3º, da Lei n. 8.429/92; e) que seja julgado procedente o pedido para condenar o demandado pelos atos de improbidade que importam enriquecimento ilícito e que atentam contra os princípios da administração pública, arts. 9, IX, 10, I e XII, e 11, I, todos da Lei n. 8.429, de 1992, sendo-lhe aplicadas as penas do art. 12, I, II e III, da mesma Lei; Protesta provar o alegado por todos os meios de prova, requerendo de logo o recebimento da documentação que segue em anexo e a oitiva das testemunhas abaixo arroladas: 1. Ozinalvo da Silva Batista, qualificado às fls. 30 e 39 do Anexo I; 2. Geraldo de Lima, qualificado à fl. 118 do Anexo I; e 3. Marcos José de Lima Santos, Auditor-Fiscal do Trabalho, matrícula SIAPE nº 0986611, lotado na Delegacia Regional do Trabalho em Pernambuco, situada na Av. Agamenon Magalhães, 2000, Espinheiro, CEP 52.021-170, Recife-PE. Dá-se à causa o valor de R$ 1.000,000 (mil reais). Pede deferimento. Recife, 30 de outubro de 2008. MABEL SEIXAS MENGE Procuradora da República