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ORIGINAL ORIGINAL NUTRIÇÃO ENTERAL EM ADULTOS HOSPITALIZADOS 513 Suprimento de micronutrientes, adequação energética e progressão da dieta enteral em adultos hospitalizados Adequacy of energy and micronutrient supply and progression of enteral diet in hospitalized adult patients Vivian Cristine LUFT 1 Diego de Matos VIEIRA 1 Mariur Gomes BEGHETTO 1,2 Carísi Anne POLANCZYK 1 Elza Daniel de MELLO 2 R E S U M O Objetivo Avaliar a adequação da dieta enteral, em termos de micronutrientes e energia e identificar fatores interferentes na progressão da dieta enteral prescrita a adultos hospitalizados em um hospital geral de alta complexidade. Métodos Entre junho de 2004 e maio de 2005, adultos internados em um hospital de alta complexidade do sul do Brasil foram avaliados quanto às suas características clínicas e da prescrição da nutrição enteral. As características da nutrição enteral foram avaliadas e comparadas às recomendações diárias de ingestão, obtendo-se o percentual de adequação de nutrientes prescritos na dieta enteral em relação aos valores de recomendação para cada paciente. Os fatores associados à prescrição de energia foram identificados por meio de Regressão Linear Múltipla. Resultados Foram acompanhados 230 pacientes em uso de nutrição enteral. As recomendações diárias foram alcançadas satisfatoriamente para vitaminas hidrossolúveis (exceto ácido fólico), lipossolúveis (exceto vitamina D) e minerais (exceto cálcio). Em média, as prescrições iniciais de nutrição enteral ofereceram 24,0kcal/kg/dia (desvio-padrão=10,8, e valores mínimo e máximo de 4,3 a 69,2), e progrediram até 28,4kcal/kg/dia 1 Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Programa de Pós-Graduação em Epidemiologia. R. Ramiro Barcelos, 2350, Sala 635, 90035-903, Porto Alegre, RS, Brasil. Correspondência para/correspondence to: V.C.LUFT. E-mail: <vivi_luft@yahoo.com.br>. 2 Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Comissão de Suporte Nutricional. Porto Alegre, RS, Brasil.

5 V.C. LUFT et al. (desvio-padrão=11,8, valores mínimo e máximo de 1,4 a 69,2). A recomendação de 25 a 35kcal/kg/dia foi prescrita para 32,6% dos pacientes. Para,7% dos pacientes foram prescritas acima de 40kcal/kg/dia. Somente o índice de massa corporal e o número de dias de hospitalização, ajustados para a quantidade de energia já inicialmente prescrita, associaram-se de forma independente à prescrição energética final. Conclusão Pequena proporção das prescrições esteve adequada em relação à quantidade de energia, e a progressão da dieta enteral ocorreu independentemente das características clínicas dos pacientes. Termos de indexação: Adulto. Dietoterapia. Nutrição enteral. Terapia nutricional. A B S T R A C T Objective To asses the adequacy of enteral diet, in terms of micronutrients and energy and to identify factors that interfere in the progression of enteral diets prescribed to adults hospitalized in a high complexity general hospital. Methods From June 2004 to May 2005, adult patients hospitalized in a high complexity hospital, in Southern Brazil, were assessed in terms of enteral diet prescription and clinical characteristics. The characteristics of the enteral nutrition were assessed and compared with the recommended daily intakes, obtaining percentages of nutrient adequacy of the enteral diet. Factors associated with energy prescription were identified by multiple linear regression. Results Two hundred and thirty tube-fed patients were followed. The dietary reference intakes were satisfatory met for water-soluble vitamins (except for folic acid), fat-soluble vitamins (except for vitamin D) and minerals (except for calcium). The mean initial energy prescription was 24.0 kcal/kg/day (standard deviation=10.8, minimum and maximum values ranging from 4.3 to 69.2kcal/kg/day) and progressed to 28.4kcal/kg/day (standard deviation=11.8, minimum and maximum values ranging from 1.4 to 69.2kcal/kg/day).The recommendation of 25 to 35kcal/kg/day was prescribed to 32.6% of patients. Forty or more kcal/kg/day was presuibed to.7% of the patients. Only body mass index and the number of hospital stay days, adjusted to the energy prescribed at the beginning, were independently associated with the final energy prescription. Conclusion A small proportion of the prescriptions were adequate in terms of Kcal/kg/day, and the progression of enteral diet occurs regardless of the clinical characteristics of the patients. Indexing terms: Adult. Diet therapy. Enteral nutrition. Nutrition therapy. I N T R O D U Ç Ã O A desnutrição hospitalar é um problema freqüente em cerca de 50% dos adultos hospitalizados 1,2, com impacto sobre a morbimortalidade 3-6, o tempo de permanência 1,3,7 e os custos hospitalares 7. A nutrição enteral é a alternativa terapêutica que viabiliza a manutenção do estado nutricional em pacientes com impossibilidade parcial ou total de manter a via oral como rota de alimentação, devendo ser adotada como via de escolha, sempre que o trato gastrointestinal estiver funcionante 8. A nutrição enteral, portanto, visa oferecer todos os nutrientes necessários para a manutenção da vida, o crescimento celular e tecidual, minimizando e/ou revertendo o impacto da desnutrição. Por se tratar de terapêutica de alta complexidade, não isenta de complicações, o planejamento e a implementação da nutrição enteral devem integrar o tratamento dos pacientes, especialmente nos indivíduos desnutridos 9. Diferentes métodos podem ser utilizados para estimar a necessidade energética dos indivíduos adultos 10. Ainda assim, é comum que médicos e nutricionistas deparem-se com situações

NUTRIÇÃO ENTERAL EM ADULTOS HOSPITALIZADOS 5 clínicas que dificultam a estimativa das necessidades nutricionais e escolha de fórmulas dietéticas apropriadas. A prescrição de 30 calorias por quilograma de peso corporal ao dia (kcal/kg/dia) 11, variando entre 25 a 35kcal/kg/dia, e de 0,8 a 1,2g/kg/dia de proteínas 12, é usualmente adotada no cuidado de pacientes hospitalizados. No entanto, naqueles severamente desnutridos a progressão da nutrição enteral deve ser mais lenta, a fim de evitar a síndrome de hiperalimentação 13, não devendo o fornecimento de energia ultrapassar 40kcal/kg/dia. A tolerância à nutrição enteral deve ser cuidadosamente monitorada. Distensão e dor abdominal, resíduo gástrico e vômitos limitam a progressão do suporte nutricional -17. Além disso, o adequado suprimento de vitaminas e minerais, estabelecido a partir de estimativas derivadas de estudos de base populacional, deve ser assegurado 18-22. Ainda que a indicação, a prescrição e o acompanhamento criterioso dos pacientes submetidos à terapia nutricional enteral sejam regulamentados pelo Ministério da Saúde no Brasil 23, não se dispõe de artigos que descrevam estimativas globais do uso de nutrição enteral em pacientes hospitalizados neste País. Neste sentido, este estudo tem por objetivo: a) avaliar a adequação das prescrições de nutrição enteral, do ponto de vista do fornecimento de energia para pacientes adultos hospitalizados, b) identificar os fatores associados à evolução da quantidade de energia oferecida durante a hospitalização (progressão da dieta), e c) verificar a contribuição da terapia nutricional enteral quanto ao suprimento apropriado de micronutrientes. M É T O D O S Entre junho de 2004 e maio de 2005, pacientes internados no Hospital de Clínicas de Porto Alegre, um hospital geral universitário de atenção terciária à saúde, foram prospectivamente avaliados quanto às suas características clínicas e à prescrição de nutrição enteral. Este estudo foi aprovado pela Comissão de Pesquisa e Ética em Saúde da instituição (protocolo nº 02-2). Foram incluídos pacientes com idade igual ou superior a 18 anos, hospitalizados por motivos clínicos e/ou cirúrgicos, pelo Sistema Único de Saúde. Foram excluídos os pacientes internados no Centro de Terapia Intensiva (CTI) e na unidade de internação psiquiátrica, os com expectativa de hospitalização inferior a 72 horas, os com doença inflamatória intestinal, diarréia, portadores do vírus da imunodeficiência humana adquirida e os pacientes sem condições de ter seu peso corporal aferido, por impossibilitar a estimativa da necessidade energética diária em kcal/kg/dia. Os pacientes foram acompanhados até a alta hospitalar, ou até apresentarem algum dos critérios de exclusão. Os pacientes foram identificados a partir de uma listagem informatizada, no momento da primeira prescrição de nutrição enteral, sendo, a seguir, avaliados quanto aos critérios de elegibilidade. Após inclusão, as variáveis acompanhadas foram: idade, especialidade médica, diagnóstico nutricional, número de dias de uso de nutrição enteral, tipo de sonda, fórmula(s) dietética(s) utilizada(s), modo de administração da nutrição enteral e presença de vômitos, resíduo gástrico, distensão e dor abdominal. Todos os cuidados com os pacientes foram realizados pelas equipes assistentes, mantendose as rotinas institucionais estabelecidas, de modo que a equipe de pesquisa não interferiu em nenhum momento no atendimento individual dos pacientes. Assim, para todos os pacientes eleitos foi adotado o sistema aberto de nutrição enteral, seguindo procedimentos validados de produção, armazenamento, distribuição e administração, conforme legislação vigente 23. Seguindo a rotina institucional, são adotados 5 padrões de dietas industrializadas, em pó ou líquidas, reconstituídas ou diretamente envasadas em frascos descartáveis em área física específica 23 (dieta polimérica com fibras nas densidades energéticas de 1,0kcal/mL, 1,2kcal/mL e 1,5kcal/mL; dieta polimérica sem fibras 1,2kcal/mL; e dieta oligomérica 1,2kcal/mL), além da possibilidade de modulação de dietas

5 V.C. LUFT et al. especiais. A dieta é fracionada em 6 a 8 frascos ao dia, distribuídos em intervalos regulares de 3 horas. Todos os pacientes foram avaliados 3 vezes por semana, em dias intercalados, por investigadores treinados, utilizando-se o mesmo protocolo de pesquisa. Na inclusão do estudo, os pacientes tiveram o estado nutricional avaliado pelo cálculo do índice de massa corporal (IMC), expresso em kg/m 2, pelo percentual de peso corporal em relação a seu peso usual e pela Avaliação Nutricional Subjetiva Global (ANSG) 24. Os micronutrientes prescritos na nutrição enteral foram avaliados pela diferença absoluta (em mg ou µg) e percentual de adequação em relação aos valores das recomendações nutricionais (Dietary Reference Intakes - DRI), de acordo com idade e sexo. Para os micronutrientes abaixo foram adotadas as seguintes quantidades (Recommended Dietary Allowances - RDA): Vitamina C: : 75mg, : 90mg; Ácido fólico: 400µg; Ácido pantotênico: 5mg; vitamina B12: 2,4µg; B6: até 50 anos: 1,3mg, >50anos, : 1,7mg, : 1,5mg; B3: : mg, :mg; B2: : 1,3mg, : 1,1mg; B1: : 1,2mg, : 1,1mg; E: mg; A: : 900µg, : 700µg; Zinco: : 11mg, : 8mg; Ferro: : 8mg, até 50anos: 18mg, >50anos: 8mg; Fósforo: 700mg. Valores recomendados como ingestão adequada (Adequate Intakes - AI) foram adotados para: Biotina: 30µg; K: : 120µg, : 30µg; D: até 50anos: 5µg, 50 a 70anos: 10µg, >70anos: µg; Fibra: g/1000kcal; Cálcio: até 50anos: 1000mg, >50anos: 1200mg). O suprimento das necessidades de micronutrientes foi considerado adequado quando atingiu valores iguais ou superiores a 100% das DRI 18-22. A prescrição da dieta também foi avaliada quanto ao fornecimento de energia e proteínas. A energia foi descrita em calorias por quilograma de peso corporal por dia (kcal/kg/dia) 11, enquanto o fornecimento de proteínas foi expresso em gramas por quilograma de peso corporal por dia (g/kg/dia) 12. Foram consideradas adequadas, sob a perspectiva de fornecimento de energia, as prescrições que ofereceram entre 25 a 35kcal/ kg/dia (recomendado). Também foi descrito o percentual de prescrições acima de 40kcal/kg/dia (muito acima do recomendado). Os dados referem-se, exclusivamente, à dieta ofertada via sonda enteral, ainda que parte dos pacientes tenha recebido adicionalmente dieta por via oral e nutrição parenteral. Foi calculada a diferença entre a quantidade de energia prescrita ao final e no início do uso da nutrição enteral. As médias da evolução (progressão) do fornecimento de energia foram comparadas pelo teste t de Student, Mann- Whitney ou Kruskal Wallis. Para identificar os fatores que se associam à quantidade final de kcal/kg/dia prescrita, foi realizada Regressão Linear Múltipla. A adequação do modelo multivariável foi avaliada quanto à sua forma funcional, à suposição de normalidade dos resíduos, à inexistência de autocorrelação e à homocedasticidade 25. Trata-se de uma amostra fixa de 230 pacientes. Neste sentido, considerando como clinicamente relevante uma diferença entre pacientes com ou sem fatores clínicos (como câncer e outras comorbidades, desnutrição, tipo de nutrição enteral e tolerância à nutrição enteral) de 5kcal/kg/dia na progressão da dieta, assumindo grande variabilidade (desvio-padrão foi de 7kcal/kg/dia), para um valor α=0,05, este estudo tem poder de 90% para identificar tal diferença para fatores presentes em 10% ou mais da população, e poder de aproximadamente 65% para detectar essa diferença para fatores presentes em 5% da população. R E S U L T A D O S Foram acompanhados 230 pacientes com idade entre 20 e 99 anos (média - M=62 e desviopadrão - DP= anos), que fizeram uso de nutrição enteral por 1 a 57 dias (mediana, intervalo inter-

NUTRIÇÃO ENTERAL EM ADULTOS HOSPITALIZADOS 517 quartil: 6, 10-18 dias). A média e o desvio-padrão do peso dos foram de 70,7 e kg, respectivamente, e das de 53,8 e,7kg, sendo o Índice de Massa Corporal médio de 21,6 (DP=4,7, valores mínimo e máximo de 12,4 a 36,2) kg/m 2. A mediana (intervalo interquartil, IQ) do percentual de perda de peso em relação ao peso usual foi de -12,8 (IQ: -20,7 - -5,1), com valores mínimo e máximo de -50 a +50%. A mortalidade para esta população foi de 22,6% e o período médio de hospitalização foi de 23,8 (DP=17,9, valores mínimo e máximo de 2 a 6) dias. O fornecimento inicial de energia foi de 24 (DP=10,8, valores mínimo e máximo de 4,3 a 69,2) kcal/kg/dia e o final foi de 28,4 (DP=11,8, valores mínimo e máximo de 1,4 a 69,2) kcal/kg/ Tabela 1. Fornecimento energético inicial (em kcal/kg/dia), diferença do início ao fim da dieta enteral, e proporção de pacientes em uso de nutrição enteral com prescrição superior a 40kca/kg/dia, de acordo com características clínicas e do estado nutricional dos pacientes. Porto Alegre (RS), 2004-2005. Características Fornecimento inicial de kcal/kg/dia Evolução do fornecimento inicial de kcal/kg/dia, do inicial ao final Prescrição >40 kcal/kg/dia Mediana P25 - P75 Valor p Média (IC 95% ) Valor p % Valor p Diagnóstico de câncer Sim (n=1) Não (n=69) 20,7 23,9,4-27,7 19,4-33,7 <0,01 4,7 3,9-3,5-05,9-2,3-05,6 0,48 19 0,38 Doença hepática Sim (n=5) Não (n=225),4 21,7 10,3-33,8,7-29,5 0,36 6,2 4,4-5,1-17,5-3,4-05,4 0,80 20 0,58 Diabetes Sim (n=21) Não (n=209) 22,6 18,8-28,0,2-29,5 0,37 0,9 4,8-2,0-03,5-3,8-0 5,8 0,04 9 17 0,39 Doença renal Sim (n=8) Não (n=222) 18,8 22,0,9-22,2,6-28,5 0, 1,2 4,6-3,0-05,5-3,6-05,6 0,25 0 0,36 DPOC Sim (n=7) Não (n=223) 26,5 22,6-36,6,4-29,3 0,08 1,0 4,6-1,2-03,2-3,5-05,6 0,23 1,00 Insuficiência cardíaca Sim (n=7) Não (n=223) 25,2 21,4-31,2,5-29,5 0,29 1,8 4,5-1,2-04,9-3,5-05,5 0,19 1,00 Índice de massa corporal* <18,5 kg/m 2 (n=52) 18,5 a 24,9 kg/m 2 (n=108) >25 kg/m 2 (n=47) 26,3,5 20,5-36,7,9-29,3 13,1-21,7 <0,01 7,1 4,2 2,3-4,4-09,9-2,9-05,4-1,0-03,6 0,03 36 8 0 <0,01 Perda de peso >5% em 6 meses** Sim (n=9) Não (n=59) 23,2,1 19,1-30,3 12,4-21,3 <0,01 8,2 5,4-3,3-05,9-2,1-04,5 0,83 18 3 <0,01 ANSG Desnutrido grave (n=137) Desnutrido moderado (n=53) Nutrido (n=40) 23,0,6 19,2-31,3,0-29,0 13,0-20,9 <0,01 5,5 3,4 3,9-3,6-06,5-1,4-05,2-2,4-05,4 0,61 22 9 2 <0,01 DPOC: doença pulmonar obstrutiva crônica; ANSG: avaliação nutricional subjetiva global. Teste Mann-Whitney; Teste Kruskal Wallis; Teste exato de Fisher; * 23 pacientes não tiveram sua altura aferida, impossibilitando o cálculo do IMC, ** 12 pacientes não puderam informar seu peso usual, impossibilitando o cálculo do percentual de perda de peso; % proporção de pacientes.

518 V.C. LUFT et al. dia. O alvo energético, estimado em 25 a 35 kcal/ kg/dia, foi atingido por 21,7% dos pacientes ao início do uso da nutrição enteral e por 32,6% ao final. Por outro lado, já no início do uso da dieta enteral mais de 40 kcal/kg/dia foram prescritas a 9,1% dos pacientes e, ao final, a,7%. O suprimento final de proteínas foi de 1,0 (DP=0,5, valores mínimo e máximo de 0,1 a 3,1) g/kg/dia. Não foi observada diferença ao comparar a progressão de energia entre (4,9; IC95%: 3,7-6,1kcal/kg) e (3,7; IC95%: 2,0-5,4kcal/kg) (p=0,23) e entre pacientes clínicos (4,1; IC95%: 2,8-5,5kcal/kg) e cirúrgicos (4,8; IC95%: 3,3-6,2kcal/kg) (p=0,54). Verificou-se que os pacientes diabéticos (p=0,04), os com vômitos (p=0,01) e os com resíduo gástrico (p=0,06) tiveram menor progressão da dieta durante o período de uso da nutrição enteral (Tabelas 1 e 2). Ainda que sem significância do ponto de vista estatístico, pacientes com doença renal (p=0,25), doença pulmonar obstrutiva crônica (p=0,23), insuficiência cardíaca Tabela 2. Fornecimento energético inicial (em kcal/kg/dia), diferença do início ao fim da dieta enteral, e proporção de pacientes em uso de nutrição enteral com prescrição superior a 40kcal/kg/dia, de acordo com o modo de administração da dieta e a tolerância à nutrição enteral. Porto Alegre (RS). 2004-2005. Características Fornecimento inicial de calorias/kg/dia Evolução do fornecimento de kcal/kg/dia, do inicial ao final Prescrição >40 kcal/kg/dia Mediana P25 - P75 Valor p Média (IC 95% ) Valor p % Valor p Tipo de sonda nutrição enteral SNE (n=213) 22,0,8-29,4 0,11-4,5-3,5-05,5 0,52 0,21 Gastrostomia (n=8) Jejunostomia (n=9) 27,4,1,6-39,3 08,0-29,0-3,2-4,1-9,5 -,9-0,1-08,3 37 11 Modo de administração da nutrição enteral Intermitente (n=183) 21,4,7-29,1 0,43-4,6-3,5-05,7 0,63 0,46 Contínua (n=47) Gravidade (n=2) 23,1 22,0,3-35,1,9-29,5 0,11-4,0-4,5-1,8-06,1-3,5-05,5 0,82 19 0,71 Bomba de infusão (n=),4 11,5-28,1-3,7-3,6-11,0 20 Uso da VO Sim (n=126) Não (n=104) 20,8 23,0,5-26,1,7-33,9 0,02-4,4-4,5-3,0-05,8-3,1-05,9 0,89 11 21 0,04 Uso de NP Sim (n=5) 12,4 08,0-0,03-1,9-1,6-05,3 0,26 0 1,00 Não (n=225) 22,0,7-29,5-4,5-3,5-05,5 Vômitos Sim (n=28) 22,8 18,1-31,2 0,25-2,0-0,2-03,8 0,01 18 0,78 Não (n=202),5-29,5-4,8-3,7-05,9 Resíduo gástrico Sim (n=4) Não (n=226) 18,5 21,8 10,2-24,4,5-29,5 0,27-0,4-4,5-6,6-05,8-3,5-05,5 0,06 0 1,00 Distensão abdominal Sim (n=42) 21,0,3-28,1 0,46-3,1-0,9-05,3 0,20 0,78 Não (n=188) 21,6,8-29,8-4,8-3,6-05,9 Dor abdominal Sim (n=57) 22,1,4-30,4 0,62-3,3-1,6-05,0 0,18 0,97 Não (n=173),6-29,4-4,8-3,6-06,0 SNE: sonda nasoentérica; VO: possui via oral como rota auxiliar para nutrição; NP: possui via parenteral como rota auxiliar para nutrição. Teste Mann-Whitney; Teste Kruskal Wallis; Teste exato de Fisher.

NUTRIÇÃO ENTERAL EM ADULTOS HOSPITALIZADOS 519 (p=0,19), e em uso de nutrição parenteral (p=0,26), também tiveram menor progressão da dieta enteral. Entretanto, aqueles com doença pulmonar obstrutiva crônica e insuficiência cardíaca já iniciaram o uso da nutrição enteral recebendo maior quantidade de kcal/kg/dia. Por meio da análise multivarida, verificouse que quanto maior o fornecimento inicial de energia (p<0,01), quanto menor o IMC (p<0,01) e maior o tempo de uso da nutrição enteral (p<0,01), maior foi a prescrição final de energia, sendo esses três os fatores que se mantiveram independentemente associados à prescrição final da dieta. A Figura 1 (A) mostra uma tendência de relação inversa entre o número de kcal/kg/dia prescritas e o IMC do paciente, sendo observado maior fornecimento de energia aos pacientes desnutridos graves. Na Figura 1 (B) está apresentada a relação entre o número de dias de uso de nutrição enteral e a prescrição energética final atingida. Nela observa-se que não há um claro padrão de evolução na quantidade de kcal/kg/dia com o passar dos dias. Além disso, verifica-se que prescrições acima da recomendação ocorrem já na primeira semana de uso da nutrição enteral, e com maior faixa de variabilidade nos primeiros dias (Figura 1, B). Quanto ao suprimento de micronutrientes (Tabela 3 e Figura 2), observa-se que as recomendações diárias de ingestão foram alcançadas satisfatoriamente para vitaminas hidrossolúveis (exceto ácido fólico), lipossolúveis (exceto vitamina D) e minerais (exceto cálcio). Foi identificado que o grupo de pacientes em que houve maior deficiência no suprimento de ferro foi o das de idade jovem, enquanto que, para vitamina D, o grupo dos idosos foi o que recebeu suprimento mais deficiente. O limite máximo de ingestão (Tolerable Upper Intake Levels - UL) foi ultrapassado para vitamina A (>3000µg/dia) em 4 pacientes; para niacina (>35mg/dia), em 110 pacientes; para ácido fólico (>10000µg/dia), em 2 pacientes; e para zinco (>40mg/dia), em 1 paciente. Figura 1. Relação entre o índice de massa corporal e o tempo de uso de nutrição enteral e o fornecimento final de energia, de pacientes em uso de nutrição enteral. Porto Alegre (RS), 2004-2005. Nota: Salienta-se (entre as linhas tracejadas) o alvo da recomendação de 25 a 35 calorias/kg/dia. Cada ponto representa um indivíduo.

520 V.C. LUFT et al. Tabela 3. Padrão de referência (Dietary Reference Intakes - DRI), quantidade de micronutrientes na dieta enteral prescrita, e a diferença entre o prescrito e o padrão de referência de pacientes em uso de nutrição enteral. Porto Alegre (RS), 2004-2005. Vitamina C (mg) b Ácido fólico (µg) b Ácido pantotênico (mg) c Biotina (µg) c Vitamina B 12 (µg) b Vitamina B 6 (mg) b Vitamina B 3 (mg) b Vitamina B 2 (mg) b Vitamina B 1 (mg) b Vitamina K (µg) c Vitamina E (mg) b Vitamina D (µg) c Vitamina A (µg) b Fibra (g/1000kcal) c Zinco (mg) b Ferro (mg) b Fósforo (mg) b Cálcio (mg) c <50 anos >50 anos, >50 anos, <50 anos 50 a 70 anos >70 anos, <50 anos, >50 anos <50 anos >50 anos DRI Prescrito a Diferença a 0210,0 08,0 75 90 400 5 30 2,4 1,3 1,7 1,5 1,3 1,1 1,2 1,1 120 90 5 10 900 700 11 8 8 18 8 70 1000 1200 0340,5 0012,9 0191,1 005,7 003,4 004,0 003,4 038,6 033,6 0004,2 0003,7 0003,7 0003,4 08,0 08,0 00 0008,4 0008,4 0009,4 95,4 1329,2 00,9 0023,2 0020,2 00,8 0013,4 0013,4 0924,0 1008,0 1008,0 (126,0-210,0) (1,47-210,0) (252,0-420,0) (8,8 -,7) (126,0-2,2) (3,8-6,3) (2,5-4,2) (2,5-4,2) (2,8-4,2) (25,2-42,0) (25,2-42,0) (2,8-4,6) (2,8-4,6) (2,5-4,2) (25,2-42,0) (126,0-210,0) (126,0-210,0) (,9-24,4) (6,3-10,5) (7,9-10,5) (7,9-10,5) (996,9-61,5) (996,9-61,5) (,9 -,9) (,1-25,2) (,3-25,2) (10,1-18,0) (9,7-20,2) (10,6 -,8) (693,0-15,0) (756,0-1260,0) (756,0-1260,0) +135,0 +78,0-59,5 +7,9 +1,1 +3,3 +2,1 +2,3 +1,9 +22,6 +19,6 +2,8 +2,6 +2,6 +2,3 +48,0 +78,0 +6,5 +3,4-1,6-5,5 +595,4 +629,2 +0,9 +12,2 +12,2 +8,8-4,6 +5,4 +224,0 +8,0-192,0 (+51,0 - +135,0) (+57,0 - +120,0) (-8 - +20,0) (+3,8 - +9,7) (+96,0 - +184,2) (+1,4 - +3,9) (+1,2 - +2,9) (+0,8 - +2,5) (+1,3 - +2,7) (+9,2 - +26,0) (+11,2 - +28,0) (+1,5 - +3,3) (+1,7 - +3,5) (+1,3 - +3,0) (+1,4 - +3,1) (+6,0 - +90,0) (+36,0 - +120,0) (0,0 - +9,4) (+1,3 - +5,5) (-3,7 - +0,5) (-7,0 - -4,5) (+96,9 - +761,5) (+296,9 - +961,5) (+0,9 - +0,9) (+4,1 - +,2) (+7,3 - +17,2) (+2,01 - +10,0) (-8,2 - +2,1) (+2,6 - +8,8) (-7,0 - +455,0) (-244,0 - +260,0) (-444,0 - +60,0) a mediana (percentil 25 percentil 75); b RDA: Recommended dietary allowances; c AI: Adequate intaque. Valores positivos indicam que o prescrito superou a recomendação; valores negativos indicam em quanto a prescrição não alcançou a recomendação. Figura 2. Mediana (percentil 25 - percentil 75) do percentual de adequação às recomendações dietéticas de ingestão (DRI) 18-22 de pacientes em uso de nutrição enteral. Porto Alegre (RS), 2004-2005.

NUTRIÇÃO ENTERAL EM ADULTOS HOSPITALIZADOS 521 D I S C U S S Ã O A terapia nutricional enteral prescrita alcançou, para a maioria dos pacientes, as recomendações dietéticas vigentes para micronutrientes. É importante ressaltar que, apesar de os valores utilizados como referência terem sido derivados a partir de uma população saudável, constituem o melhor padrão de referência disponível. Sendo assim, sua aplicação em indivíduos hospitalizados ainda é a prática vigente. Futuramente, valores de referência específicos para condições de morbidade deverão ser estimados, de modo a permitir uma avaliação mais apropriada da adequação de micronutrientes no contexto hospitalar. No presente estudo, o suprimento de cálcio foi considerado o mais deficiente, sugerindo a necessidade de revisar, prioritariamente, a oferta deste nutriente nas dietas enterais adotadas como padrão nesta instituição. Observou-se grande variabilidade no fornecimento de energia. A prescrição final de energia não esteve associada de forma significativa às características clínicas classicamente relacionadas à tolerância à dieta, sugerindo existir um padrão de prescrição que não valoriza estas informações. Mais do que isto, chama a atenção que, já no início do uso da nutrição enteral, pacientes tenham recebido prescrição de energia tão acima do recomendado. Ainda que a nutrição enteral seja mais fisiológica que a nutrição parenteral 8, sua administração requer vigilância, dadas as complicações metabólicas decorrentes da administração inadequada. Pouco foi descrito na literatura quanto à vigilância da dietoterapia no contexto hospitalar, com exceção à terapia intensiva. Em um estudo 17 que avaliou a adequação da prescrição energética em indivíduos em ventilação mecânica alimentados por via enteral, foi verificado que para 68% dos pacientes foram prescritos valores abaixo do recomendado. No entanto, as necessidades energéticas dos pacientes foram estimadas pela equação de Harris & Benedict 26 que, como se sabe, superestima o gasto energético em cerca de 500kcal, quando comparado com o aferido pela calorimetria indireta (2.0 vs 1.638 calorias/dia, respectivamente) 17. Também raros são os estudos descrevendo fatores associados à progressão da nutrição enteral e o risco para hiperalimentação, ainda que o planejamento dietético e seu monitoramento sejam altamente recomendados 12. Engel et al., utilizando calorimetria indireta, avaliaram a necessidade energética de 60 pacientes internados em uma unidade de tratamento intensivo. Os autores verificaram que a presença de sintomas gastrointestinais, intervenções cirúrgicas múltiplas, traumas abdominais, pélvicos e lombares comprometeram o fornecimento de energia na dieta. Embora a associação entre uso de nutrição enteral e complicações metabólicas não possa ser estabelecida pelo presente estudo, o fornecimento excessivo de energia coloca os pacientes em risco para síndrome de hiperalimentação, caracterizada por hiperglicemia, hipertrigliceridemia, disfunção hepática, hipercapnia e azotemia, especialmente em pacientes criticamente doentes 13,27. A elevada mortalidade observada neste estudo (22%), bem como a longa permanência hospitalar (média de 24 dias), apontam para o fato de que usuários de sonda para alimentação enteral, ainda que não internados em um centro de terapia intensiva, constituem um grupo clinicamente comprometido e, conseqüentemente, suscetíveis a complicações relacionadas à evolução de sua doença e à própria terapêutica instituída, constituindo uma população de risco para hiperalimentação e suas complicações. O diagnóstico de doença hepática, doença renal, doença pulmonar obstrutiva crônica e insuficiência cardíaca, a presença de resíduo gástrico, pouco parecem ter influenciado na prescrição final de energia, provavelmente por serem pouco freqüentes e representarem uma pequena parcela dos indivíduos neste estudo, comprometendo o poder estatístico. Por outro lado, o uso da via oral como rota assessória para nutrição também não teve influência sobre a quantidade de energia ofertada pela via enteral,

522 V.C. LUFT et al. embora o uso da via oral tenha sido freqüente (55%). Este estudo apresenta somente a oferta de energia prescrita por meio de nutrição enteral, sem considerar o total energético prescrito por via oral e parenteral. Sendo assim, é razoável estimar que, se todas as vias de fornecimento de energia fossem consideradas, se encontraria oferta energética ainda maior e, conseqüentemente, maior inadequação em relação à recomendação. Este estudo contribuiu para mostrar que, mesmo em um hospital de referência, onde os profissionais envolvidos com o acompanhamento nutricional desempenham importante papel na formação de futuros profissionais, há necessidade de revisar o processo de prescrição da nutrição enteral. Viu-se que prescrições não individualizadas, desconsiderando características clínicas, nutricionais e necessidades dietéticas, podem colocar os pacientes em risco de apresentarem complicações evitáveis. A adoção de mecanismos de vigilância clínica e epidemiológica pode assegurar que o melhor manejo nutricional seja instituído a pacientes hospitalizados em uso de nutrição enteral, considerando a oferta energética, protéica e de micronutrientes, nas rotinas hospitalares. A G R A D E C I M E N T O S Ao Fundo de Incentivo à Pesquisa e Eventos (FIPE) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, pelo apoio à pesquisa, e à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) que, por intermédio do Programa de Pós-Graduação em Epidemiologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, concedeu uma bolsa de estudos a um dos pesquisadores. C O L A B O R A D O R E S V.C. LUFT, M.G. BEGHETTO, C.A. POLANCZYK e E.D. MELLO participaram na concepção e no desenho, na análise e na interpretação dos dados. D.M. VIEIRA na análise e interpretação dos dados. R E F E R Ê N C I A S 1. Waitzberg DL, Caiaffa WT, Correia MI. Hospital malnutrition: the Brazilian national survey (IBRANUTRI): a study of 4000 patients. Nutrition. 2001; 17(7-8):573-80. 2. Mello ED, Beghetto MG, Teixeira LB, Luft VC. Desnutrição hospitalar: cinco anos após o IBRANUTRI. Rev Bras Nutr Clin. 2003; 18(2):65-9. 3. Naber TH, Schermer T, Bree A, Nusteling K, Eggink L, Kruimel JW, et al. Prevalence of malnutrition in nonsurgical hospitalized patients and its association with disease complications. Am J Clin Nutr. 1997; 66(5):1232-9. 4. Heymsfield SB, Bethel RA, Ansley JD, Gibbs DM, Felner JM, Nutter DO. Cardiac abnormalities in cachectic patients before and during nutritional repletion. Am Heart J. 1978; 95(5):584-94. 5. Arora NS, Rochester DF. Respiratory muscle strength and maximal voluntary ventilation in undernourished patients. Am Rev Respir Dis. 1982; 126(1):5-8. 6. Anderson CF, Moxness K, Meister J, Burritt MF. The sensitivity and specificity of nutrition-related variables in relationship to the duration of hospital stay and the rate of complications. Mayo Clin Proc. 1984; 59(7):477-83. 7. Reilly JJ, Hull SF, Albert N, Waller A, Bringardener S. Economic impact of malnutrition: a model system for hospitalized patients. JPEN J Parenter Enteral Nutr. 1988; 12(4):371-6. 8. Peter JV, Moran JL, Phillips-Hughes J. A metaanalysis of treatment outcomes of early enteral versus early parenteral nutrition in hospitalized patients. Crit Care Med. 2005; 33(1): 213-20. 9. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Portaria nº 31, de 8 de março de 2005. Define unidades de assistência de alta complexidade em terapia nutricional e centros de referência de alta complexidade em terapia nutricional e suas aptidões e qualidades. Diário Oficial da União. 2005 11 março. 10. Vinken AG, Bathalon GP, Sawaya AL, Dallal GE, Tucker KL, Roberts SB. Equations for predicting the energy requirements of healthy adults aged 18-81 y. Am J Clin Nutr. 1999; 69(5):920-6. 11. Stroud M, Duncan H, Nightingale J. Guidelines for enteral feeding in adult hospital patients. Gut. 2003; 52(Suppl 7):1-12. 12.ASPEN Board of Directors and the Clinical Guidelines Task Force. Guidelines for the use of parenteral and enteral nutrition in adult and pediatric patients. JPEN J Parenter Enteral Nutr. 2002; 26(Suppl 1):1-138.

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