Lesão periférica de células gigantes em mucosa palatina

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CASO CLÍNICO Lesão periférica de células gigantes em mucosa palatina Giant cell peripheral granuloma in palatinal mucosa Ângelo Rafael Calábria TANCREDI* Carlos Henrique DÁGUILA** Abrão RAPOPORT*** Waldyr Antônio JORGE**** Irineu Gregnanin PEDRON***** RESUMO São conhecidas diversas lesões que apresentam particular predileção pelo periodonto. A lesão periférica de células gigantes é um processo proliferativo reacional não neoplásico, apresentando-se relativamente freqüente na clínica estomatológica, podendo atingir dimensão variada e, subseqüentemente necessidades terapêuticas particulares. O propósito deste trabalho foi relatar um caso de uma paciente que apresentou uma lesão de tamanho avançado, localizada em mucosa palatina de prémolares e molares, na qual dificultou a fonação e a deglutição. A lesão foi removida pela exérese cirúrgica e o diagnóstico foi lesão periférica de células gigantes. Foram discutidas as características clínicas e histopatológicas, incidência e freqüência, diagnóstico diferencial, etiopatogênese, modalidades de tratamento e prognóstico. Palavras-chave: Granuloma Periférico de Células Gigantes; Gengiva; Periodonto. ABSTRACT Many lesions with periodontal predilection are known. The giant cell peripheral granuloma is a reaction proliferative process, non neoplasic, that is relatively frequent in stomatologic clinic, can arrive variable size and, subsequently, needs particulary therapeutic. The purpose of this work is to report a patient case that show an advanced size lesion, localized in palatine mucous of molar and premolar teeth that complicated deglutition and phonation. The lesion was removed by surgical excision and the diagnosis was giant cell peripheral granuloma. Clinical and histopatological characteristics, incidence and frequency, differential diagnosis, etiopathogenesis, therapeutic modalities and follow-up were discussed. Keywords: Giant Cell Peripheral Granuloma; Gingiva; Periodontium. * Especialista em Estomatologia. Mestre em Diagnóstico Bucal (Sub-Área: Semiologia) pela Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo. ** Especialista em Implantodontia. Mestrando do Programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde do Complexo Hospitalar Heliópolis. *** Coordenador do Programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde do Complexo Hospitalar Heliópolis. **** Professor Doutor Associado da Disciplina de Clínica Integrada da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo. ***** Especialista em Periodontia. Mestrando da Disciplina de Clínica Integrada da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo. 86 Revista Odonto v. 17, n. 33, jan. jun. 2009, São Bernardo do Campo, SP, Universidade Metodista de São Paulo

TANCREDI, A. R. C.; DÁGUILA, C. H.; RAPOPORT, A.; JORGE, W. A.; PEDRON, I. G. INTRODUÇÃO A lesão periférica de célula gigante pode ser definida por processo proliferativo exofítico não neoplásico, reacional, normalmente relacionado ao periodonto de proteção (gengiva queratinizada ou mucosa alveolar) 1-3,5-13,15, atingindo tanto áreas dentadas como edêntulas. Sua denominação deriva por grande quantidade de células gigantes benignas multinucleadas, provavelmente de origem inflamatória 3. Particularmente foi considerada como contraparte mucoperiosteal da lesão central de célula gigante 1,15, tendo sido denominado por vasta sinonímia como fibro-epúlide, epúlide gestacional, pólipo, epúlide fissuratum, epúlide mielóide, granuloma reparativo periférico de célula gigante 3,7,10. Contudo, o termo reparativo é obsoleto, foi posteriormente abandonado e não deve ser utilizado, pois a lesão apresenta-se reparativa histologicamente, mas possui natureza clínica destrutiva 1,5,7,10,11. Comumente associada ao periósteo ou ligamento periodontal, as células gigantes parecem ser derivadas de osteoclastos, embora haja outras possíveis origens. Esta lesão apresenta-se relativamente frequente e pode ser incluída num grupo de lesões, genericamente denominados tumores gestacionais 1,6,10, sendo incluídos neste grupo o granuloma piogênico (gravídico), hiperplasia fibrosa ou fibroma focal e fibroma ossificante periférico 6. Lesões com células gigantes, tanto central como periférica, são relacionadas ao diagnóstico diferencial do tumor marrom do hiperparatireoidismo, sendo indistinguíveis histologicamente 12. RELATO DO CASO Paciente melanoderma, gênero feminino, 32 anos, compareceu a clínica particular queixando lesão em boca. Clinicamente, a paciente apresentou crescimento tumoral; de base pediculada; de coloração rósea à eritematosa; superfície lisa; com formato irregular, na região de mucosa palatina dos dentes 15 a 17; medindo aproximadamente 20 mm de diâmetro (Figura 1). FIGURA 1: Aspectos clínicos iniciais. Não foram constatadas alterações radiográficas inerentes à lesão. Não foram reportadas alterações sistêmicas. Frente a lesão, foi recomendada a realização da biópsia excisional, com as hipóteses diagnósticas clínicas de hiperplasia gengival, granuloma piogênico e lesão periférica de células gigantes. Sob anestesia local infiltrativa (cloridrato de lidocaína a 3%), foi realizada a incisão do pedículo, com o cuidado de curetar a região rente ao periósteo, a propósito de evitar a recorrência da lesão. Foi ainda procedido scrapping, para a melhor reparação da ferida cirúrgica e a região foi recoberta por cimento cirúrgico, o qual permaneceu por 7 dias. Não foram reportadas complicações pós-operatórias pela paciente e a região reparou satisfatoriamente. A lesão foi fixada em formol a 10% e encaminhada ao Laboratório de Patologia Cirúrgica da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo. O exame histopatológico revelou fragmento de mucosa revestido por epitélio pavimentoso estratificado paraqueratinizado, esporadicamente hiperplásico e acantótico. O tecido conjuntivo subjacente apresentou-se denso, altamente celularizado, exibindo áreas focais bem circunscritas, caracterizadas por aglomerados de células gi- Revista Odonto v. 17, n. 33, jan. jun. 2009, São Bernardo do Campo, SP, Universidade Metodista de São Paulo 87

gantes multinucleadas, entremeadas por células, ora arredondadas, ora fusiformes, e grande quantidade de hemácias; e vasos congestos e depósitos de hemossiderina. Áreas de ossificação estiveram presentes, em permeio ao estroma fibroso e, próximo aos vasos, foi observado infiltrado inflamatório crônico. O diagnóstico foi lesão periférica de células gigantes (Figura 2). FIGURA 2: Aspecto histopatológico da lesão periférica de células gigantes (Coloração original: HE; maior aumento). Observar a presença de células gigantes. A proservação vem sendo realizada, sem sinais de recidiva em 36 meses do tratamento. DISCUSSÃO A lesão periférica de células gigantes caracteriza-se clinicamente por massa tumoral firme; de consistência elástica; com superfície lisa; base séssil ou pediculada; de coloração azulada, amarronzada ou eritematosa; localizada normalmente na gengiva queratinizada ou mucosa alveolar, podendo ainda acometer áreas edêntulas; pode atingir dimensões variáveis (de 10 a 50 mm); e estar associados aos dentes inclusos 1,7-9,11. Pode provocar destruição local da cortical óssea, observada radiograficamente por erosão superficial 3,7,8,12,13. Em indivíduos com doença periodontal, é impossível atribuir a perda óssea pela lesão ou pela própria doença periodontal. A possibilidade de causar movimentação patológica dentária foi reportada 7,8,12. A presença de cálculos, sangramento gengival, bolsa periodontal e xerostomia foram os sinais clínicos mais prevalentes associados à lesão periférica de células gigantes, sugerindo que, os indivíduos que apresentaram higiene bucal precária e xerostomia foram mais suscetíveis a desenvolver a lesão de grandes dimensões 2. A lesão periférica de células gigantes apresentou maior prevalência, particularmente entre a 4ª e a 7ª décadas de vida 1,2,7,8,11-13, embora haja frequência relativamente elevada nas primeiras quatro décadas de vida, pelas cargas hormonais serem mais pronunciadas 7,15. O gênero feminino foi o mais atingido (65%) 1,2,5,7,9,11-13,15. Houve maior predileção pela mandíbula (64,2%), principalmente na região posterior (pré-molares e molares) 1-3,11. Contudo, alguns trabalhos indicaram a região anterior como a de maior incidência 1,3,8,10,13,15. Não houve predileção por raça, acometendo caucasianos, asiáticos e negros 12. Referente às características histopatológicas, a lesão periférica de células gigantes é constituído por estroma bem celularizado, não encapsulado, apresentando grande quantidade de células gigantes. Ulcerações ou erosões foram características comuns. Paraqueratina, infiltrado inflamatório, hemorragia intersticial, material calcificado (amorfo, osteóide ou osso maduro) foram achados significantes. Depósitos de hemossiderina normalmente encontrados, conferem a coloração eritematosa a amarronzada da lesão 1-4,7,9,11-13,15. Fagócitos (macrófagos), perícitos, fibroblastos, miofibroblastos, histiócitos, endoteliócitos e células fusiformes também foram relacionados 1,2,4,9,10,15. A etiopatogênese da lesão é indefinida, havendo diversas hipóteses. As células gigantes teriam sua origem a partir de osteoclastos ou osteoblastos latentes 1,2,4,11,12,15, bem como a origem do material calcificado encontrado nas lesões 2, podendo explicar por que a lesão não é encontrada em áreas sem arcabouço ósseo (língua, soalho e palato mole, por exemplo) 11. Foi proposto o 88 Revista Odonto v. 17, n. 33, jan. jun. 2009, São Bernardo do Campo, SP, Universidade Metodista de São Paulo

TANCREDI, A. R. C.; DÁGUILA, C. H.; RAPOPORT, A.; JORGE, W. A.; PEDRON, I. G. mecanismo patogênico distinto da lesão central de células gigantes, nas quais as células oriundas da gengiva queratinizada ou da mucosa alveolar permitiriam o crescimento da lesão periférica de células gigantes, mesmo em áreas edêntulas 12. Geralmente, há condições clínicas locais associadas, como fatores irritativos traumáticos (exodontias traumáticas recentes, cirurgias periodontais, aparelhos ortodônticos, próteses e restaurações mal adaptadas, retenção alimentar, má higiene bucal, periodontite, biofilme e cálculos dentários) 1,2,5-13. Foi sugerido ainda que a lesão periférica de células gigantes seja uma resposta fagocitária à hemorragia pré-existente no tecido de granulação 10,11. Foi citado o potencial dos fatores de crescimento presentes nos tecidos de granulação dos alvéolos após a exodontia, podendo originar a lesão periférica de células gigantes 12. O fator sistêmico, representado por influências hormonais, pode colaborar na explicação do maior acometimento em mulheres 5-7,10,15. Associados ao estado de imunossupressão durante a gestação 3,5,10,15, elevados níveis de hormônios sexuais femininos (estrógeno, progesterona e gonadotropina coriônica) produzidos durante a gestação 6, apresentam efeitos trópicos na mucosa bucal, elevada deposição de glicogênio no epitélio gengival (produzidos pelos estrógenos), alterações vasculares (induzidas por progesterona), resultando inicialmente em gengivite hiperêmica e hiperplasia da papila, podendo contribuir ao desenvolvimento de processos proliferativos nos sítios com gengivite pré-existente 3,6. Esta associação entre biofilme dentário, inflamação gengival crônica de baixo grau e fatores de crescimento no exsudato inflamatório com estrógeno poderiam contribuir à resposta granulomatosa/fibrótica, característica da epúlide gestacional 10,14. As células gigantes podem apresentar, ocasionalmente, receptores para hormônios sexuais femininos (estrógeno e progesterona). Foi reportado que a minoria dos casos das lesões poderia ser influenciada hormonalmente, pois foram achados receptores em mulheres não grávidas e homens 6,10,15. Desta forma, os hormônios sexuais podem influenciar secundariamente 10,15. A lesão periférica de células gigantes de rápido crescimento na gestação, provavelmente representou extensão periférica de granuloma central de células gigantes, que é possivelmente influenciado por hormônios sexuais 3. Dentre as lesões que compõem o diagnóstico diferencial clínico, foram relacionadas o granuloma piogênico, fibroma ossificante periférico, parúlide, fibromatose, ameloblastoma periférico e tumor marrom do hiperparatireoidismo 2,8,9. Este último deve ser considerado pela agressividade, e por lesões e recorrências múltiplas, além da associação com outras condições sistêmicas, como cálculos renais, distúrbios gastrintestinais, psiquiátricos e anormalidades neuromusculares 8,13. A modalidade terapêutica normalmente empregada é a exérese cirúrgica, e a eliminação de fatores traumáticos locais, incluindo controle do biofilme dentário e procedimentos periodontais básicos, que podem reduzir o processo inflamatório, mas não solucionar totalmente a lesão 1,3,8,9,11,12. Exodontias são esporadicamente necessárias, dependendo da dimensão atingida 7,13. Contenção, goteira 13 e enxerto gengival 8 foram procedimentos adicionais, realizados por necessidades particulares. A taxa de recorrência foi estimada de 5 a 70,6%, sendo fortemente relacionada à persistência dos fatores irritativos locais e excisão incompleta 8,11-13. A recorrência durante a gestação não foi um achado incomum 6. CONCLUSÕES Baseado nas evidências clínicas pode-se concluir que a lesão periférica de células gigantes apresenta características clínicas variáveis, mas que a incidência e freqüência e características radiográficas podem auxiliar na condução do diagnóstico, que somente é elucidado pelo exame histopatológico. A lesão é facilmente removida, devendo-se tomar o cuidado de remover a base da Revista Odonto v. 17, n. 33, jan. jun. 2009, São Bernardo do Campo, SP, Universidade Metodista de São Paulo 89

lesão, evitando-se a recorrência. O follow-up deve ser realizado freqüentemente, haja vista que a elevada taxa de recidiva foi considerada relativamente elevada. A remoção dos fatores irritativos locais e a manutenção da higiene bucal, através do controle de biofilme dentário e procedimentos básicos periodontais possibilitaram a saúde gengival. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. BINNIE, W.H. Periodontal cysts and epulides. Periodontol 2000 v. 21, p.16-32, 1999. 2. BODNER, L.; PEIST, M.; GATOT, A.; FLISS, D.M. Growth potential of peripheral giant cell granuloma. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod v. 83, n. 5, p. 548-551, 1997. 3. CAILLOUETTE, J.C.; MATTAR, N. Massive peripheral giantcell reparative granuloma of the jaw: A pregnancy dependent tumor. Am J Obstet Gynecol v. 131, n. 2, p. 176-179, 1978. 4. CARVALHO, Y.R.; LOYOLA, A.M.; GOMEZ, R.S.; ARAÚJO, V.C. Peripheral giant cell granuloma. An immunohistochemical and ultrastructural study. Oral Dis v. 1, n. 1, p. 20-25, 1995. 5. CHAMBERS, C.B. Massive peripheral giant-cell reparative granuloma of the jaw: A pregnancy dependent tumor (Discussion). Am J Obstet Gynecol v. 131, n. 2, p. 178-179, 1978. 6. DALEY, T.D.; NARTEY, N.O.; WYSOCKI, G.P. Pregnancy tumor: an analysis. Oral Surg Oral Med Oral Pathol v. 72, n. 2, p. 196-199, 1991. 7. ERONAT, N.; AKTUG, M.; GIIMBAY, T.; UNAL, T. Peripheral giant cell granuloma: three case reports. J Clin Pediatr Dent v. 24, n. 3, p. 245-248, 2000. 8. FLAITZ, C. Peripheral giant cell granuloma: A potentially aggressive lesion in children. Pediatr Dent v. 22, n. 3, p. 232-233, 2000. 9. GIUSTO, T.J.; BAER, P.N. A peripheral giant cell granuloma mimicking a combined endodontic-periodontic lesion. Periodontal Clin Investig v. 18, n. 2, p. 17-19, 1996. 10. GÜNHAN, M.; GÜNHAN Ö.; CELASUN, B.; MUTLU, M.; BOSTANCI, H. Estrogen and progesterone receptors in the peripheral giant cell granulomas of the oral cavity. J Oral Sci v. 40, n. 2, p. 57-60, 1998. 11. KATSIKERIS, N.; KAKARANNTZA-ANGELOPOULOU, E.; ANGELOPOULOU, A.P. Peripheral giant cell granuloma. Clinicopathologic study of 224 new cases and review of 956 reported cases. Int J Oral Maxillofac Surg v. 17, n. 2, p. 94-99, 1988. 12. MIGHELL, A.J.; ROBINSON, P.A.; HUME, W.J. Peripheral giant cell granuloma: a clinical study of 77 cases from 62 patients, and literature review. Oral Dis v. 1, n. 1, p. 12-19, 1995. 13. PANDOLFI, P.J.; FELEFLI, S.; FLAITZ, C.M.; JOHNSON, J.V. An aggressive peripheral giant cell granuloma in a child. J Clin Pediatr Dent v. 23, n. 4, p. 353-355, 1999. 14. SOORY, M. Hormonal factors in periodontal disease. Dent Update v. 27, n. 8, p. 380-383, 2000. 15. WHITAKER, S.B.; BOUQUOT, J.E. Identification and semiquantification of estrogen and progesterone receptors in peripheral giant cell lesions of the jaws. J Periodontol v. 65, n. 3, p. 280-283, 1994. Recebimento: 10/9/2006 Aceito: 13/1/2009 Endereço para correspondência: Rua Flores do Piauí, 347 São Paulo SP CEP: 08210-200 E-mail: igpedron@usp.br 90 Revista Odonto v. 17, n. 33, jan. jun. 2009, São Bernardo do Campo, SP, Universidade Metodista de São Paulo