PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE LETRAS DIEGO TEIXEIRA DE SOUZA



Documentos relacionados
AS DIFICULDADES ENCONTRADAS POR OUVINTES NA AQUISIÇÃO DA LIBRAS COMO L2 E A INTERFERÊNCIA DA MARCAÇÃO NÃO-MANUAL NA MUDANÇA DE SIGNIFICADO

Língua Brasileira de Sinais LIBRAS

Círculo Fluminense de Estudos Filológicos e Linguísticos

PARÂMETROS DA LIBRAS

LINGUAGEM, LÍNGUA, LINGÜÍSTICA MARGARIDA PETTER

ALFABETIZAÇÃO DE ESTUDANTES SURDOS: UMA ANÁLISE DE ATIVIDADES DO ENSINO REGULAR

Pesquisa com Professores de Escolas e com Alunos da Graduação em Matemática

III SEMINÁRIO EM PROL DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA Desafios Educacionais

Recomendada. A coleção apresenta eficiência e adequação. Ciências adequados a cada faixa etária, além de

MODELO DE APRESENTAÇÃO DE PROJETO DE PESQUISA

OS CONHECIMENTOS DE ACADÊMICOS DE EDUCAÇÃO FÍSICA E SUA IMPLICAÇÃO PARA A PRÁTICA DOCENTE

APRENDER A LER PROBLEMAS EM MATEMÁTICA

9 Como o aluno (pré)adolescente vê o livro didático de inglês

Decreto-Lei n.º 139/2012, de 5 de julho, na redação atual. Regulamento de Exames.

PRÓ-MATATEMÁTICA NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES

O olhar do professor das séries iniciais sobre o trabalho com situações problemas em sala de aula

Comunicação Empresarial e Processo Decisório. Prof. Ana Claudia Araujo Coelho

AVALIAÇÃO FONOLÓGICA EM DESTAQUE RESENHA DO LIVRO AVALIAÇÃO FONOLÓGICA DA CRIANÇA, DE YAVAS, HERNANDORENA & LAMPRECHT

Objetivos. Introdução. Letras Português/Espanhol Prof.: Daniel A. Costa O. da Cruz. Libras: A primeira língua dos surdos brasileiros

GUIA DE INTERPRETAÇÃO DO CELLA DA FLÓRIDA

AGENDA ESCOLAR: UMA PROPOSTA DE ENSINO/ APRENDIZAGEM DE INGLÊS POR MEIO DOS GÊNEROS DISCURSIVOS

INTERPRETANDO A GEOMETRIA DE RODAS DE UM CARRO: UMA EXPERIÊNCIA COM MODELAGEM MATEMÁTICA

Prof. Dr. Guanis de Barros Vilela Junior

O uso de Objetos de Aprendizagem como recurso de apoio às dificuldades na alfabetização

Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais/ NÚCLEO DE APOIO À INCLUSÃO DO ALUNO COM NECESSIDADES EDUCACIONAIS ESPECIAIS

SAÚDE E EDUCAÇÃO INFANTIL Uma análise sobre as práticas pedagógicas nas escolas.

Agrupamento de Escolas de Terras de Bouro

Fabíola Féo Período: Abril, Maio e Junho. NAPNE Núcleo de Atendimento as Pessoas com Necessidades Especiais.

Daniele Marcelle Grannier, UnB Tércia A. F. Teles, UnB. Introdução

O PIPE I LÍNGUAS ESTRANGEIRAS

PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO: ELABORAÇÃO E UTILIZAÇÃO DE PROJETOS PEDAGÓGICOS NO PROCESSO DE ENSINO APRENDIZAGEM

1 ROTEIRO PARA PROJETO DE PESQUISA

AS LEIS DE NEWTON PROFESSOR ANDERSON VIEIRA

1 Introdução. 1.1 Apresentação do tema

Guia do professor. Introdução

Planejamento - 7. Planejamento do Gerenciamento do Risco Identificação dos riscos. Mauricio Lyra, PMP

Desfazendo Mitos e Mentiras Sobre Línguas de Sinais

Engenharia de Software III

JANGADA IESC ATENA CURSOS

A CRIANÇA BILÍNGUE: INFLUÊNCIAS DO BILINGUISMO SOBRE O DESENVOLVIMENTO INFANTIL ESCOLA PAN AMERICANA DA BAHIA. Profa. Conchita Kennedy Dantas

O E-TEXTO E A CRIAÇÃO DE NOVAS MODALIDADES EXPRESSIVAS. Palavras-chave: texto, , linguagem, oralidade, escrita.

SOCIEDADE E TEORIA DA AÇÃO SOCIAL

2 Diagrama de Caso de Uso

Pedagogia. Comunicação matemática e resolução de problemas. PCNs, RCNEI e a resolução de problemas. Comunicação matemática

A IMPORTÂNCIA DAS DISCIPLINAS DE MATEMÁTICA E FÍSICA NO ENEM: PERCEPÇÃO DOS ALUNOS DO CURSO PRÉ- UNIVERSITÁRIO DA UFPB LITORAL NORTE

INSTITUTO FLORENCE DE ENSINO COORDENAÇÃO DE PÓS-GRADUAÇÃO CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM (TÍTULO DO PROJETO) Acadêmico: Orientador:

A realidade dos alunos trazida para a sala de aula. Ao ser perguntado Que possibilidade(s) de escrita(s) os seus alunos

Questão 1: SignWriting é:

3 Metodologia Tipo de pesquisa

Elvira Cristina de Azevedo Souza Lima' A Utilização do Jogo na Pré-Escola

MÓDULO 6 INTRODUÇÃO À PROBABILIDADE

Orientação a Objetos

4 ESTRUTURA E APRESENTAÇÃO DE ARTIGO CIENTÍFICO

A Educação Bilíngüe. » Objetivo do modelo bilíngüe, segundo Skliar:

Análise e Desenvolvimento de Sistemas ADS Programação Orientada a Obejeto POO 3º Semestre AULA 03 - INTRODUÇÃO À PROGRAMAÇÃO ORIENTADA A OBJETO (POO)

Como redigir o projeto de pesquisa? Identificação

REGULAMENTO DE PROJETOS INTERDISCIPLINARES Curso de Letras Tradutor e Intérprete Bacharelado Currículo: LTI 00001

OLIVEIRA, Luciano Amaral. Coisas que todo professor de português precisa saber: a teoria na prática. São Paulo: 184 Parábola Editorial, 2010.

COMO ELABORAR UM ARTIGO CIENTÍFICO RESUMO. Palavras-chave: Artigo Científico. Normalização. NBR 6022/03.

PR 2 PROCEDIMENTO. Auditoria Interna. Revisão - 2 Página: 1 de 9

Linguística P R O F A. L I L L I A N A L V A R E S F A C U L D A D E D E C I Ê N C I A D A I N F O R M A Ç Ã O

O PAPEL DA CONTAÇÃO DE HISTÓRIA NA EDUCAÇÃO INFANTIL

PROJETO LÍNGUA DE FORA

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS CURSO DE PSICOLOGIA UNIDADE SÃO GABRIEL

5 Considerações finais

Reflexões sobre as dificuldades na aprendizagem de Cálculo Diferencial e Integral

Etapas da Introdução do Projeto de Pesquisa Científica. Maria da Conceição Muniz Ribeiro Mestre em Enfermagem pela UERJ

Tópico 02: Movimento Circular Uniforme; Aceleração Centrípeta

ATUAÇÃO DO TRADUTOR E INTÉRPRETE DE LÍNGUA DE SINAIS/ LÍNGUA PORTUGUESA NO IES 1

Especificação do 3º Trabalho

Um espaço colaborativo de formação continuada de professores de Matemática: Reflexões acerca de atividades com o GeoGebra

Informação-Prova de Equivalência à Frequência

Comunidades de prática

4 Segmentação Algoritmo proposto

SITUAÇÃO DE PRODUÇÃO DA RESENHA NO ENSINO SUPERIOR

LIBRAS E A AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM PARA SURDOS

Processos Técnicos - Aulas 4 e 5

ELABORAÇÃO DE PROJETOS

CURSO: LICENCIATURA DA MATEMÁTICA DISCIPLINA: PRÁTICA DE ENSINO 4

PEDIDO DE AUTORIZAÇÃO DE PROCEDIMENTOS MÉDICOS - MANUAL DO USUÁRIO

O ensino da cultura nos livros didáticos de Espanhol como Língua Estrangeira

Sistema para Visualização dos Resultados de Pesquisas de Clima Organizacional. PERSPECTIVA Consultores Associados Ltda.

ÁGORA, Porto Alegre, Ano 4, Dez ISSN EDUCAR-SE PARA O TRÂNSITO: UMA QUESTÃO DE RESPEITO À VIDA

ROTEIRO PARA ELABORAÇÃO DE PROJETOS

TÍTULO: ALUNOS DE MEDICINA CAPACITAM AGENTES COMUNITÁRIOS NO OBAS CATEGORIA: CONCLUÍDO ÁREA: CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E SAÚDE

FACULDADE INTERNACIONAL DO DELTA PROJETO PARA INCLUSÃO SOCIAL DOS SURDOS DA FACULDADE INTERNACIONAL DO DELTA

INFORMAÇÃO PROVA DE EQUIVALÊNCIA À FREQUÊNCIA INGLÊS LE I (2 anos) 2015

GÍRIA, UMA ALIADA AO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA PARA ESTRANGEIROS Emerson Salino (PUC-SP) João Hilton (PUC/SP)

Unidade: Os Níveis de Análise Linguística I. Unidade I:

PARANÁ GOVERNO DO ESTADO

Português- Prof. Verônica Ferreira

FLUXOGRAMA DA PESQUISA

Pré-texto. Texto. Pós-texto. Estrutura do Trabalho Final de Curso. A estrutura do Trabalho Final de Curso compreende: pré-texto, texto e pós-texto.

PLANO DE CURSO REFERENCIAL LÍNGUA PORTUGUESA/GESTAR 6ª SÉRIE (7º ANO)

ARTIGO CIENTÍFICO. O artigo científico pode ser entendido como um trabalho completo em si mesmo, mas possui dimensão reduzida.

3 Dicas MATADORAS Para Escrever s Que VENDEM Imóveis

Transcrição:

0 PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE LETRAS DIEGO TEIXEIRA DE SOUZA LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS: AS DIFICULDADES ENCONTRADAS POR UTENTES DE LÍNGUA PORTUGUESA NA EXECUÇÃO DA MARCAÇÃO NÃO-MANUAL E SUA IMPLICAÇÃO NA MUDANÇA DE SIGNIFICADO Porto Alegre 2008

1 DIEGO TEIXEIRA DE SOUZA LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS: AS DIFICULDADES ENCONTRADAS POR UTENTES DE LÍNGUA PORTUGUESA NA EXECUÇÃO DA MARCAÇÃO NÃO-MANUAL E SUA IMPLICAÇÃO NA MUDANÇA DE SIGNIFICADO Monografia apresentada como requisito parcial à conclusão do curso de Licenciatura em Letras, com habilitações em Línguas Portuguesa - Espanhola e respectivas Literaturas, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Orientadora: Profª. Dr. Valéria Pinheiro Raymundo Porto Alegre 2008

2 DIEGO TEIXEIRA DE SOUZA LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS: AS DIFICULDADES ENCONTRADAS POR UTENTES DE LÍNGUA PORTUGUESA NA EXECUÇÃO DA MARCAÇÃO NÃO-MANUAL E SUA IMPLICAÇÃO NA MUDANÇA DE SIGNIFICADO Monografia apresentada como requisito parcial à conclusão do curso de Licenciatura em Letras, com habilitações em Línguas Portuguesa - Espanhola e respectivas Literaturas, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Aprovada em de de BANCA EXAMINADORA Profª. Dr. Valéria Pinheiro Raymundo (orientadora) Prof. Me. André Ribeiro Reichert PUCRS Profª. Dr. Anamaria Kurtz de Souza Welp PUCRS

3 Aos meus pais, Orestes e Cleusa, pela dedicação e incentivo que sempre me deram nesta caminhada. À minha avó, Teresa, pelo amor incondicional. À minha noiva, Mônica, pela compreensão, amor e fundamental apoio. E ao meu irmão, Tiago, pelo apoio e pelas ajudas prestadas neste percurso.

4 AGRADECIMENTOS Primeiramente, a Deus e ao seu filho pela realização deste sonho e pelos muitos que virão. Agradeço a ajuda incessante da minha orientadora, Valéria Raymundo, pela paciência e dedicação na elaboração deste trabalho. Aos docentes da Faculdade de Letras, em especial às professoras: Alice Therezinha Campos Moreira, Marina Tazón Volpi e Regina Kohlrausch, pelo muito que me ensinaram, pelos constantes incentivos e pelas palavras amigas. À Cláudia Brescancini pela sabedoria, pelo exemplo e por incentivar-me aos estudos lingüísticos. À Carina Rebello, que conheci há poucos meses, agradeço pela ajuda, incentivo e compreensão neste novo desafio. À professora, de LIBRAS, Janaína Pereira pela ajuda e pelas aulas cedidas. À professora Rosane Vargas, da Faculdade de Educação, pelo auxílio e pelas conversas esclarecedoras acerca do tema. Aos meus colegas: Bernardo Pacheco, Gabriela Pinheiro, Luciane Comunal, Rafael Saraiva e Stella Freitas pelo apoio e amizade. À Débora Mainardo de Souza pela amizade, fundamental apoio e dedicação na finalização deste trabalho. À direção e coordenações da Faculdade de Letras pelo estímulo dado aos alunos. E finalmente, aos estudantes de LIBRAS que me auxiliaram no desenvolvimento deste trabalho.

5 A pesquisa é uma vocação, um chamado profundo que tem seu germe no mais íntimo da pessoa. Ela deve surgir do âmago de cada um, há uma vocação para a investigação, como há para a sala de aula. Ir. Elvo Clemente

6 RESUMO Este trabalho tem como objetivo verificar algumas das principais dificuldades que falantes de língua portuguesa apresentam na execução da marcação nãomanual da Língua Brasileira de Sinais e avaliar se, a partir de uma execução inadequada, poderá haver alguma interferência na estrutura da frase e, consecutivamente, a mudança de significado de palavras. Palavras-chave: LIBRAS. Sintaxe espacial. Marcação não-manual.

7 RESUMEN Este trabajo tiene como objetivo verificar algunas de las principales dificultades que hablantes de lengua portuguesa tienen en la ejecución de la marcación no manual de la Lengua Brasileña de Señas y evaluar si, a partir de una ejecución inadecuada, habrá alguna interferencia en la estructura de la frase e, por tanto, el cambio de significado de palabras. Palabras-clave: LIBRAS. Sintaxis espacial. Marcación no manual.

8 LISTA DE ILUSTRAÇÕES Quadro I: Alfabeto dactilológico 16 Quadro II: Configurações de mão da LIBRAS 22 Quadro II: Categorias de movimento 24 Quadro IV: Pontos de articulação da LIBRAS 26 Quadro V: Expressões não-manuais da LIBRAS 28 Tabela I: Número de informantes de acordo com o sexo 39 Tabela II: Levantamento da idade dos informantes 40 Tabela III: Levantamento do número de ocorrências 42 Quadro VI: Análise da produção do Informante 1 46 Quadro VII: Análise da produção do Informante 2 47 Quadro VIII: Análise da produção do Informante 3 48 Quadro IX: Análise da produção do Informante 4 49 Quadro X: Análise da produção do Informante 5 50 Quadro XI: Análise da produção do Informante 6 51

9 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO 10 2 LÍNGUA DE SINAIS 12 2.1 O que são línguas naturais? 12 2.2 Língua de Sinais 13 2.3 Língua Brasileira de Sinais 15 2.4 A aquisição da LIBRAS como L2 17 2.5 Diferenças entre Aprendizagem e Aquisição 20 3 FONOLOGIA 21 3.1 A presença da fonologia na LIBRAS e na língua de sinais 21 3.2 Configuração de mão 22 3.3 Movimento 23 3.4 Locação 25 3.5 Pares mínimos 26 3.6 Expressões não-manuais 27 4 SINTAXE ESPACIAL 29 4.1 Características 29 4.2 Os dois tipos verbais da LIBRAS 31 4.3 Verbos manuais 34 4.4 Tipos de frases na LIBRAS 35 4.4.1 Forma afirmativa 35 4.4.2 Forma interrogativa 35 4.4.3 Forma exclamativa 36 4.4.4 Forma negativa 36 4.4.5 Forma negativa/interrogativa 37 4.4.6 Forma exclamativa/interrogativa 38 5 METODOLOGIA DA PESQUISA 39 5.1 Procedimentos adotados 39 5.2 Amostragem 39 5.3 Informantes 39 5.4 Descrição do Instrumento 1 40 5.5 Aplicação dos Instrumentos 1a, 1b e 1c 41 5.5.1 Análise dos dados 42 5.6 Filmagens (Instrumento 2) 43 5.7 Descrição do Instrumento 2 44 5.8 Aplicação do Instrumento 2 44 5.8.1 Análise dos dados: Instrumento 2 45 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS 52 REFERÊNCIAS 54 ANEXOS

10 1 INTRODUÇÃO No processo de aquisição de uma segunda língua oral, é verificado que alguns aprendizes apresentam diversas dificuldades, tais como: conjugações verbais, ordem das sentenças, concordâncias etc. Tais dificuldades não estão longe da Língua Brasileira de Sinais, embora focada em outro âmbito. Na língua de sinais um dos problemas encontrados se refere à execução das marcações não-manuais. Estas fazem referência à posição de cabeça, movimentação corporal e expressão facial. Em meio a este contexto, o presente trabalho tem por objetivo levantar e analisar, através de instrumentos de pesquisas aplicados em acadêmicos de Educação da PUCRS, algumas das principais dificuldades encontradas por falantes na execução da marcação não-manual, apresentando uma análise crítica dos dados obtidos. A escolha pelos tópicos abordados, abrangendo tipos de frases da língua de sinais, marcações não-manuais e mudança de significado, deve-se ao fato de serem temas suscetíveis de dúvidas gerando, muitas vezes, a incompreensão por parte dos alunos. O presente estudo é desenvolvido em seis capítulos. O Capítulo 2 apresenta a origem da Língua Brasileira de Sinais e conceitos sobre: línguas naturais, línguas de sinais, aquisição da Língua Brasileira de Sinais como L2. Ademais, apresenta a diferença entre aprendizagem e aquisição, sendo este um assunto de constantes indagações. No Capítulo 3, apresentamos os pressupostos básicos da Fonologia da língua de sinais, mais especificadamente, da Língua Brasileira de Sinais.

11 O Capítulo 4 apresenta os pressupostos sobre a sintaxe espacial, os tipos verbais da Língua Brasileira de Sinais e os tipos de frases nela encontrados. No Capítulo 5, será apresentada a metodologia de pesquisa, assim como o levantamento e análise crítica dos dados obtidos. As considerações finais são apresentadas no Capítulo 6. Finalmente, seguem-se as Referências e os Anexos.

12 2 LÍNGUAS DE SINAIS 2.1 O que são línguas naturais? O estudo científico da língua natural humana pode ser definido como lingüística, esta que, por sua vez, é a ciência que descreve línguas em todos os seus aspectos e, também, formula teorias de seu funcionamento. Mas, o que é língua? Qual é a diferenciação entre língua e linguagem? Freqüentemente o vocábulo linguagem é empregado em uma variedade de sentidos, como: linguagem musical, linguagem corpórea etc. A palavra language, em inglês, encontra-se, no português, em dois vocábulos: língua e linguagem. A distinção entre essas palavras está relacionada com a diferença entre os dois sentidos da palavra. O vocábulo linguagem aplica-se não somente às línguas portuguesa, russa, húngara, espanhola, mas também a diversos sistemas de comunicação, notação ou cálculo, que são sistemas artificiais e não naturais. A palavra língua, em português, não é tão abrangente quanto o vocábulo linguagem, pois este pode ser utilizado para referir-se às diversas linguagens, além de poder ser aplicado aos sistemas de comunicação, naturais ou artificiais, humanos ou não. Utilizaremos neste trabalho a palavra linguagem para designar o sistema lingüístico, que é geneticamente determinado para desenvolver-se no ser humano. As pessoas podem utilizar uma língua de acordo com a sua produção e sua modalidade de percepção modalidade oral-auditiva ou modalidade visuoespacial. A priori, os lingüistas lidam com línguas naturais. Segundo Lyons (1987), a indagação o que é língua e linguagem? traz a pressuposição de que cada uma das inúmeras línguas não-orais, distintas, é um caso especifico de algo mais geral. O estudioso da linguagem, o lingüista, quer saber se as línguas naturais possuem em comum algo que não pertença a outros sistemas comunicacionais, humano ou não, de maneira que seja correto aplicar a cada uma delas a palavra língua, recusando a aplicação deste termo a outros sistemas comunicacionais.

13 De acordo com Saussure (1995, p.17): [...] língua não se confunde com linguagem: é somente uma parte determinada, essencial dela, indubitavelmente. É, ao mesmo tempo, um produto social da faculdade de linguagem e um conjunto de convenções necessárias, adotadas pelo corpo social para permitir o exercício dessa faculdade nos indivíduos. Já Chomsky apud Quadros e Karnopp (2004), afirma que: Doravante considerei uma língua[gem] como um conjunto (finito ou infinito) de sentenças, cada uma finita em comprimento e construída a partir de um conjunto finito de elementos. Para Chomsky, o conceito de língua pode ser analisado em duas abordagens: a língua externa e a língua interna. A primeira refere-se ao conceito difundido por Bloomfield, relacionado à definição de langue por Saussure, associando o som à palavra e, consecutivamente, ao seu significado. Este é um conceito técnico que considera as línguas como instâncias da linguagem externalizada. A segunda, a língua interna, define a noção de estrutura como parte da sentença estável, livre de expressões que podem variar de pessoa para pessoa. Na seqüência apresentaremos a língua de sinais como uma língua natural, utilizada em grupos específicos de usuários. 2.2 Língua de Sinais As línguas de sinais são línguas naturais utilizadas pelas comunidades surdas. Durante muito tempo, essas línguas foram consideradas apenas gestuais ou pantomimais, incapazes de expressar conceitos abstratos. Hoje, ainda, há um grande preconceito e desconhecimento sobre estas línguas, pois as pesquisas nesta área são limitadas e/ou inexistentes, prejudicando assim o seu conhecimento. No ano de 1960, houve a publicação do livro Sign Language Structure (Willian Stokoe) onde ficou explícito que as línguas de sinais eram consideradas línguas naturais. Esse descobrimento auxiliou a inserção das línguas não-orais e seus usuários na universidade.

14 Stokoe apud Cruz (2008), diz que visto como um sistema completo, a língua de sinais é semelhante ao inglês ou a qualquer outra língua. Seus elementos combinam uns com os outros, de modo visual em vez de auditivo. Essas combinações, sinais, possuem significado como os vocábulos ou fonemas. Suas construções combinam sinais que, por sua vez, acabam expressando idéias mais completas e complexas. As línguas de sinais, como qualquer língua oral, possuem sua própria estrutura, isto é, abarcam a gramática em seus diversos níveis: fonológico, semântico, sintático e pragmático. Quanto à sua estrutura, seus princípios gerais são iguais aos das línguas orais e são próprias para a tradução de quaisquer assuntos e conceitos, sejam eles concretos ou abstratos. De acordo com Quadros e Karnopp (2004), a diferença básica entre língua de sinais e línguas faladas diz respeito à estrutura simultânea de organização dos elementos das línguas de sinais. Enquanto as línguas orais são lineares, isto é, apresentam uma ordem linear entre os fonemas, nas línguas não-orais, além da linearidade, os fonemas são articulados simultaneamente. Os sinais são formados por três parâmetros que não carregam significados quando isolados. As unidades menores constituintes dos sinais são: configuração de mão, locação de mão e movimento. Uma configuração de mão e um mesmo movimento, mas com locação diferente, poderá resultar em uma mudança de significado, formando assim um par mínimo. Estudos atuais das línguas de sinais adicionam dois tópicos ao estudo da fonologia de sinais: a orientação de mão e as marcações não-manuais. Estas serão desenvolvidas em capítulos posteriores.

15 2.3 Língua Brasileira de Sinais O costume de se usar as mãos para soletrar palavras já era praticado pelos egípcios, romanos, gregos e hebreus. Durante a Idade Média, monges beneditinos espanhóis, na tentativa de conservar seu voto de silêncio, inventaram um alfabeto dactilológico, ou manual, com intuito de comunicar-se entre si. Com o passar dos anos, surgiram, na Europa, vários alfabetos dactilológicos de uma só mão e, na Inglaterra, um segundo alfabeto que utilizava duas mãos, para ser sinalizado. No século XVI, ouvintes e educadores surdos passaram a utilizar esse alfabeto no ensino. De acordo com Hortêncio (2005), o abade francês L Epée, educador de surdos do século XVIII, combinou, no seu ensino, o alfabeto dactilológico dos monges beneditinos, sinais que aprendeu com os surdos nas ruas de Paris. Esse método de ensino, denominado Método Combinado, deu origem à Língua Francesa de Sinais. Mais tarde, esta língua migrou para a América do Norte, onde foi ampliada, codificada e sistematizada, fornecendo, assim, a base para a estruturação das línguas de sinais, inclusive da LIBRAS. A difusão deste alfabeto dactilológico, de uma só mão, gerou a hipótese de que esse alfabeto seria a própria língua de sinais e que ela poderia ser universal. No entanto, esse alfabeto é apenas um suplemento das línguas não-orais, cuja função é soletração das línguas orais, como exemplo: nomes próprios, siglas, empréstimos lingüísticos etc. O alfabeto manual utilizado no Brasil possui vinte e sete formatos, de configuração diferente, sendo que cada configuração equivale a uma letra do alfabeto português, incluso o ç.

16 Quadro I: Alfabeto dactilológico É bastante comum aos falantes implicar que as línguas de sinais sejam versões sinalizadas das línguas orais. No entanto, apesar de existirem semelhanças ou aspectos comuns entre as línguas de sinais e as línguas orais, as línguas de sinais são autônomas, pois possuem peculiaridades que as diferenciam uma das outras e das línguas orais. A partir disto, vemos que a Língua Brasileira de Sinais é um sistema lingüístico de modalidade gestual-visual e com uma estrutura gramatical independente da língua portuguesa brasileira. Atualmente, o Brasil possui duas línguas de sinais: a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) 1 e a Língua de Sinais Brasileira Kaapor (LSBK). A LSBK é utilizada por índios da tribo Urubu-Kaapor, na selva amazônica. Esta língua é pertencente à família tupi-guarani, sendo utilizada por ouvintes e surdos. A LSBK distingue-se da LIBRAS sociolinguisticamente e em detalhes estruturais. A LIBRAS, como as outras línguas de sinais, possui seu canal de comunicação visuoespacial, em oposição ao oral-auditivo das línguas orais. A sinalização se dá no espaço entre os sinalizadores. 1 A partir deste capítulo, passaremos a denominar de LIBRAS a Língua Brasileira de Sinais.

17 A fim de que a mensagem sinalizada possa ser entendida e vista com nitidez, a forma de expressão visuoespacial das línguas de sinais exige o uso de grande parte do corpo do sinalizador. Para que tal ação ocorra é necessário que o espaço de sinalização esteja desobstruído. A origem e a evolução de cada língua não-oral está unida à história da educação da comunidade surda nativa desta língua. Já no Brasil, a chegada do conde Ernest Huet, (surdo francês e educador) a convite de Dom Pedro II, deu origem à história da LIBRAS. Ernest trouxe o alfabeto manual francês e alguns sinais. Da combinação dos sinais e do alfabeto manual trazidos por ele originou-se a LIBRAS. 2 2.4 A aquisição da LIBRAS como L2 O termo L2 refere-se a qualquer idioma aprendido posteriormente à língua materna. Neste tópico, abordaremos a LIBRAS como L2, pois esta é adquirida como segunda língua por ouvintes, carregando muitas vezes a característica de uma língua estrangeira. da L2: Quanto à aquisição da L2, basicamente existem três maneiras de aquisição a aquisição simultânea da L1 e da L2; a aquisição espontânea da L2 e não simultânea; a aprendizagem da L2 de forma sistemática. A aquisição simultânea da L1 e da L2 pode ocorrer com infantes que são filhos de pais que utilizam duas línguas distintas ou utilizam uma língua diferente na comunidade onde residem. Já a aquisição espontânea poderá ocorrer em pessoas que, depois de um tempo, acabam mudando-se para outro país de língua diferente. 2 Revista da Feneis, ano III, nº 25.

18 E, por último, a aquisição sistemática da L2 que se dá nas escolas de línguas estrangeiras. A diferenciação entre aquisição da L1 e a aquisição da L2 está intrinsecamente relacionada com a forma de exposição do aprendiz. Quando uma criança é exposta à sua língua materna (L1), a aquisição ocorre de forma natural, isto é, espontânea. Por outro lado, a aquisição da L2 ocorre, muitas vezes, em um ambiente artificial e de forma sistemática, através das metodologias de ensino. Chamemos a atenção, quanto ao ambiente acadêmico, para tais variáveis: a aquisição da L1, a aquisição da L2, a idade do aprendiz, o tempo de exposição à L2 e o fato de estar incluído ou não nesta comunidade de minoria. O processo de aquisição, neste contexto, ocorre de forma menos natural. A educação sistemática envolve um processo distinto da aquisição da L1. Scliar-Cabral apud Quadros, 1997, observa que a não-exposição à língua nativa, no período de aquisição da L1, causa danos irreparáveis à organização psicossocial do indivíduo. Isto não ocorre na L2, pois uma pessoa que se expõe a um grupo que fala um idioma diferente do seu, não corre risco de ter danos irreversíveis em relação ao mecanismo da linguagem. Embora não conheça o idioma, ela já tem o domínio de uma língua que lhe garante o total funcionamento do mecanismo lingüístico. Referente à importância das características da interação no ambiente em que ocorre o processo de aquisição de L2, Damhuis apud Quadros, 1997, aponta três aspectos de interação verbal que podem ser diferenciados: o input (a recepção), o output (a produção) e o feedback. O input é a linguagem oferecida para o aprendiz por falantes nativos, professores ou por outros estudantes; os estudantes de L2 utilizam o input para formar hipóteses sobre a linguagem. O output é a linguagem utilizada pelos próprios discentes. Por meio da própria produção, os alunos poderão testar suas hipóteses. O feedback é a reação oferecida na conversação frente à produção do aprendiz; este recurso ajuda o aprendiz a avaliar suas hipóteses. O papel do input é inquestionável. Para que o discente possa ativar o desenvolvimento da língua é necessário o input auditivo e visual.

19 Quadros (1997) afirma que no caso da aquisição da LIBRAS, o input visual é extremamente importante. O input visual deve ser explorado qualitativamente e deve ser avaliado o tempo necessário de exposição para que o processo de aquisição ocorra adequadamente. Sobre o input, estudos sobre o ambiente lingüístico ao qual o aprendiz está exposto mostraram que o input recebido é não é suficiente para a aquisição da linguagem. Lydia White apud Andréa Mattos apresenta três problemas acerca do input: a subdeterminação, a degeneração e a ausência de evidência negativa. A subdeterminação se refere ao fato de que vários aspectos da língua são subdeterminados pelo input, isto é, o conhecimento que a pessoa adquire da sua língua, chamado de competência lingüística, inclui noções que não são óbvias no input recebido e que não são ensinadas diretamente. O conhecimento implícito subjacente ao uso da linguagem vai muito além daquilo que uma pessoa qualquer estaria realmente exposta, e este conhecimento não poderia ser adquirido através de estratégias gerais de aprendizagem ou habilidades de solução de problemas. A degeneração se refere ao fato de que o input que o aprendiz recebe nem sempre é perfeito. Na verdade, este input é cheio de erros, hesitações e interrupções, incluindo frases agramaticais e formas parciais tanto quanto frases gramaticais. A ausência de evidência negativa, ou seja, ausência de informações explícitas sobre que frases seriam agramaticais constitui outro problema para a aprendizagem da língua. Chomsky propôs que isto é possível porque a Gramática Universal tem uma base biológica, ou seja, mecanismos inatos da mente que permitem a aquisição da linguagem. Estes mecanismos constituiriam os princípios e parâmetros da Gramática Universal e estariam presentes na forma de estruturas mentais inatas, que foram chamadas de Dispositivo de Aquisição da Linguagem. Este dispositivo conteria os princípios universais inerentes a todas as línguas humanas e também os parâmetros universais que permitem suas variações e, por isso, seria responsável por construir a competência lingüística a partir dos dados lingüísticos do input.

20 2.5 Diferenças entre Aprendizagem e Aquisição Esta hipótese está fundamentada na premissa de que aprendizagem e aquisição são dois fenômenos distintos, com fins diferentes, podendo ocorrer simultaneamente, uma não sendo causa da outra. A aprendizagem não se transforma em aquisição. Então, qual será a distinção entre esses dois fenômenos? A aquisição é um processo que ocorre no subconsciente, funcionando por necessidade de comunicação, como impulso vital, uma função que o cérebro não pode evitar cumprir, quando exposto aos impulsos auditivos identificados como mensagem codificada de uma língua. Segundo Carla Murad (2004, p.39.) Aprendizagem significa saber as regras, ter consciência delas, poder falar sobre elas, exigindo, portanto, um esforço consciente. Em suma, uma significa saber utilizar a língua, enquanto a outra é saber sobre a língua. Existem teorias que supõem que enquanto as crianças adquirem uma língua, os adultos só podem aprender o conhecimento sobre a língua através do uso desta. Tal hipótese que distingue aquisição de aprendizagem pressupõe que adultos também adquirem uma segunda língua, quase com a perfeição dos nativos, sem nenhum conhecimento consciente das regras gramaticais. Ademais, esta hipótese afirma que a aquisição é um processo poderoso em adultos, afirmativa autenticada pelas observações e estudos dos casos que indicam que esses dois fenômenos são processados diferentemente, cada um com a sua função específica. No processo inicial do aprendizado, é comum os aprendizes apresentarem dificuldades na produção. Tais dificuldades vão desaparecendo assim que o estudante adquire tal língua.

21 3 FONOLOGIA 3.1 A presença da fonologia na LIBRAS e na língua de sinais As definições de fonologia, comumente, referem-se ao estudo dos sons. As formas organizacionais dos sons são descritos e analisados, em cada língua, de acordo com sua estrutura e funcionamento, considerando um determinado sistema. A fonologia das línguas de sinais se estabelece a partir de unidades mínimas surdas, que formam os sinais. Stokoe (1960) apud Cruz (2008), ao investigar acerca dos aspectos estruturais da American Sign Language (ASL), identificou os parâmetros: configuração de mão (CM), locação (L), movimento (M), que, ao serem analisados individualmente, não são possuidores de significado. Hust (1993) citado por Cruz (2008), propõe que esses três parâmetros são fonemas que se constituem em morfemas, assim como os morfemas são formados nas línguas orais. Ferreira-Brito (1995) classifica como parâmetros primários a configuração da(s) mão(s), o ponto de articulação 3 e o movimento e, como parâmetros secundários, a região de contato, a orientação das mãos e a disposição das mesmas. Ademais, refere que os componentes não-manuais são elementos de suma importância ao lado dos parâmetros primários e secundários, pois existe a possibilidade de que as expressões não-manuais, como expressão facial e movimento de corpo, sejam parâmetros devido ao valor na distinção de significado. Os estudos de fonologia da língua de sinais visam determinar quais são as unidades mínimas que formam sinais. 3 Ponto de articulação refere-se, também, ao parâmetro de locação.

22 3.2 Configuração de mão De acordo com Ferreira-Brito, a LIBRAS apresenta quarenta e seis CMs (quadro II), mas nem todas as línguas de sinais partilham o mesmo número de configurações. As CMs da LIBRAS foram descritas a partir de coletas de dados realizadas nos principais centros urbanos brasileiros, sendo agrupadas verticalmente segundo a semelhança existente entre elas, mas sem uma identificação definida enquanto CMs básicas ou CMs variantes. Quadro II: Configurações de mão da LIBRAS Fonte: Ferreira-Brito e Langevin (1995, p.220).

23 3.3 Movimento Para que aconteça movimento, é necessário que haja objeto e espaço. As mãos do enunciador, nas línguas de sinais, são o objeto, por outro lado, o espaço em que o movimento realiza-se (espaço da enunciação) é a área em torno do corpo enunciador. 4 O movimento é visto como um complexo parâmetro que poderá envolver uma grande gama de formas e direções, desde movimentos internos da mão, movimentos do pulso e movimentos direcionais no espaço. Algumas variações no movimento são significativas na gramática da língua de sinais. Podemos exemplificar esta afirmação com as cores na ASL - azul, verde, amarelo e roxo -, articuladas em um espaço neutro. O movimento do sinal azul na ASL envolve um pequeno contorno na mão. Mas, se este movimento for alterado, ocorrerá uma mudança de significação do sinal: A exemplificação mostra que, na ASL, o movimento pode variar, resultando um significado distinto, mas relacionado ao da forma base. Mudanças do movimento servem para diferenciar itens lexicais. 4 Ferreira-Brito e Langevin,1995, apud Quadros e Karnopp, 2004.

24 Segundo Ferreira-Brito (1990) citado por Quadros e Karnoop (2004), o movimento pode estar nas mãos, pulsos e antebraços; os movimentos direcionais podem ser unidirecionais, bidirecionais ou multidirecionais; a maneira é a categoria que descreve a qualidade, a tensão e a velocidade do movimento; a freqüência refere-se ao número de repetições de um movimento. Observe o quadro abaixo: Quadro III: Categorias de movimento TIPO DIRECIONALIDADE MANEIRA FREQÜÊNCIA Contorno ou forma geométrica - retilíneo - helicoidal - circular - semicircular - sinuoso - angular - pontual Interação - alternado - de aproximação - de separação - de inserção - cruzado Contato - de ligação - de agarrar - de deslizamento De toque (início, final, duplo) - de esfregar - de riscar -de escovar ou pincelar Torcedura de pulso - rotação (p/ dir. e esq.) - com refreamento (p/ dir. ou p/ esq.) Direcional - unidirecional (para cima) (para baixo) (para direita) (para esquerda) (para dentro) (para fora) (para o centro) (para lateral inferior esquerda) (para lateral inferior direita) (para lateral superior esquerda) (para lateral superior direita) (para específico ponto referencial) - bidirecional (para cima e baixo) (para esq. e dir.) (para dentro e fora) (para laterais opostas superior direita e inferior esquerda) - multidirecional Não-direcional Qualidade, Tensão e Velocidade - contínuo - de retenção - refreado Repetição -simples -repetido Dobramento do pulso - para cima ( supinate ) - para baixo ( pronate ) Interno das mãos - abertura simultânea/ gradativa - fechamento simultâneo/ gradativo - curvamento simultâneo./ alternado -dobramento simultâneo./alternado

25 3.4 Locação É o espaço em frente ao corpo ou a uma região próxima ao corpo, onde os sinais são articulados. Como em outras línguas de sinais, na LIBRAS o espaço de enunciação é uma localidade que contém todos os pontos dentro do raio de alcance das mãos (janela) em que são articulados os sinais. Dentro desse espaço, pode-se determinar um número limitado de locações, sendo que algumas são exatas ponta do nariz e outros mais abrangentes, como a frente do tórax. O espaço ideal é o de enunciação, no qual os interlocutores estejam face a face. Poderá haver situações em que o espaço de enunciação seja reposicionado e/ou reduzido. Podemos citar como exemplo: se um enunciador Y faz sinal para X, que está fisicamente distante, o espaço de enunciação será alterado. O quadro a seguir descreve as locações, que estão divididas em quatro regiões: espaço neutro, mão, tronco e cabeça.

26 Quadro IV: Pontos de articulação da LIBRAS CABEÇA TRONCO BRAÇOS MÃO ESPAÇO NEUTRO Topo da cabeça Testa Rosto Parte superior do rosto Parte inferior do rosto Orelha Olhos Nariz Boca Bochechas Queixo Pescoço Ombro Busto Estômago Cintura Braço Antebraço Cotovelo Pulso Palma Costas das mãos Lado do indicador Lado do dedo mínimo Dedos Ponta dos dedos Dedo mínimo Anular Dedo médio Indicador Polegar Fonte: Quadros e Karnopp (2005, p.58) Segundo afirmação feita por Kegl e Wilbur (1976) 5 e Sandler (1989) 6, cada sinal apresenta apenas uma locação específica. Os autores apresentam diferenças entre locações principais e subespaço. 7 As locações principais incluem categorias abrangentes, como cabeça, tronco, mão passiva e espaço neutro. Os subespaços incluem as distinções detalhadas, tais como nariz, boca, olhos, testa etc., e são subcategorizados por locuções principais. Portanto, se ocorre um movimento de direção, este, por sua vez, é o resultado da especificação de dois subespaços, os quais estão associados e ligados a uma locação principal. Tal distinção feita entre subespaços e locações principais sustenta a hipótese de que cada sinal tem uma única especificação para locação. 3.5 Pares mínimos Os parâmetros fonológicos da língua de sinais formam sinais que, em alguns casos, formam os pares mínimos, que em Português pode ser exemplificado pelos fonemas /t/ e /d/, que são primordiais na distinção de significado de dia e tia, ou de acordo com a transcrição fonética, observada em Porto Alegre, [ e 5 Apud Língua de Sinais Brasileira: Estudos Lingüísticos. p. 58 6 Idem, Ibidem. 7 Este termo pode ser referido como ponto específico.

27 Segundo Quadros e Karnopp (2004), a LIBRAS apresenta pares mínimos, nos quais a oposição de um parâmetro provoca mudança de significado: Pares mínimos na Libras. Fonte: Quadros e Karnopp (2004, p.52). 3.6 Expressões não-manuais Tais expressões referem-se aos movimentos de face, olhos, cabeça ou tronco. As expressões não-manuais possuem dois papéis de diferenciação nas línguas de sinais: marcação de construções sintáticas como marcação de sentença interrogativa orações relativas, topicalizações, concordância, foco e diferenciação entre os itens lexicais.

28 As expressões não-manuais que constituem componentes lexicais marcam referência específica, referência pronominal, partícula negativa, advérbio e grau ou aspecto. Rosto Parte superior sobrancelhas franzidas olhos arregalados lance de olhos sobrancelhas levantadas Quadro V: Expressões não-manuais da LIBRAS Parte Inferior bochechas infladas bochechas contraídas lábios contraídos e projetados e sobrancelhas franzidas correr da língua contra a parte inferior interna da bochecha apenas bochecha inflada contração do lábio superior franzir nariz Cabeça balanceamento para frente e para trás (sim) balanceamento para os lados (não) inclinação para a frente inclinação para o lado inclinação para trás Rosto e cabeça cabeça projetada para a frente, olhos levemente cerrados, sobrancelhas franzidas cabeça projetada para trás e olhos arregalados Tronco para frente para trás balanceamento alternado dos ombros balanceamento simultâneo dos ombros balanceamento de um único ombro Fonte: Ferreira-Brito e Langevin, 1995, apud Quadros e Karnopp, 2005

29 4 SINTAXE ESPACIAL 4.1 Características A Língua Brasileira de Sinais é organizada espacialmente de forma tão complexa quanto às línguas orais-auditivas. Segundo Quadros e Karnopp (2004, p.127.): Analisar alguns aspectos da sintaxe de uma língua de sinais requer enxergar esse sistema que é visuoespacial e não oral-auditivo. De certa forma, tal desafio apresenta certo grau de dificuldade aos lingüistas. A organização espacial da LIBRAS apresenta possibilidades de estabelecimento de relações gramaticais espaciais em variadas formas. O estabelecimento nominal e o uso do sistema pronominal são essenciais para as relações sintáticas. De acordo com Quadros (1997, p. 127): Qualquer referência usada no discurso, na LIBRAS, requer o estabelecimento de um local no espaço de sinalização (espaço definido na frente do corpo sinalizador) observando várias restrições. Esse local poderá ser referido através de indicação ostensiva (pronomes). Tal local espacial pode ser referido através de uma diversificada gama de mecanismos espaciais. Como exemplo, temos:

30 Fazer o sinal em um local particular; Em uma localização particular, direcionar a cabeça, olhos e talvez o corpo simultaneamente com o sinal de um substantivo; Usar a apontação ostensiva antes do sinal específico (exemplificando: apontar para o ponto IX associando esta apontação com o sinal CASA; logo IX passa a referir CASA);

31 Na LIBRAS, os sinalizadores estabelecem os referentes associados à localização espacial, sendo que os referentes poderão ou não estar presentes. Após a introdução dos referentes no espaço, os pontos específicos podem ser referidos posteriormente no discurso. 4.2 Os dois tipos verbais da LIBRAS Os verbos na Língua Brasileira de Sinais estão divididos em duas classes: verbos sem concordância e verbos com concordância. Os verbos sem concordância exigem argumentos explícitos na sentença, uma vez que não há marca alguma no verbo com os argumentos da frase. São exemplos destes verbos: ter, falar, amar, conhecer. Verbos sem concordância: Temos, por outro lado, os verbos com concordância que estão associados a marcações não-manuais e ao movimento direcional. Os verbos dizer, entregar, ajudar, remeter são exemplos desta categoria. Observe tais verbos, a seguir:

32 Verbos com concordância: As sentenças com verbos com concordância apresentam, em um primeiro momento, mais liberdade em sua ordenação do que as sentenças contendo verbos sem concordância. Observe, abaixo, que o corpo acompanha a direção do olhar. Observando o comportamento dos verbos com e sem concordância na língua de sinais, constatou-se que os verbos com concordância comportam-se como os verbos auxiliares do inglês, os verbos sem concordância comportam-se como verbos principais da língua inglesa. Segundo Quadros e Karnopp (2004, p. 162): Os verbos principais não podem preceder a negação (*John likes not Mary). O mesmo é observado na Libras com os verbos sem concordância: JOÃO <GOSTAR NÃO CARRO>. No entanto, esta distribuição é sempre agramatical.

33 Os verbos principais não podem ser seguidos da negação sem a presença de do-support (*John not likes Mary e John does not like Mary). O mesmo é observado na Língua Brasileira de Sinais: com um verbo com concordância a sentença é boa, mas com um verbo sem concordância a sentença será boa somente com um auxiliar AUX: As diferenças podem ser explicadas pela análise de Lasnik (1995) apud Rebello 2008, para a assimetria morfológica observada entre os verbos principais e auxiliares da língua inglesa. De acordo com Quadros e Karnopp (2004, p.162): Lanisk propôs que os verbos principais seriam os que apresentam uma operação fonológica de afixação de sua desinência verbal durante o processo de derivação, enquanto os verbos auxiliares seriam inseridos totalmente flexionados no processo de derivação. O verbo auxiliar na LIBRAS é uma expressão pura de concordância estabelecida através do movimento de um ponto ao outro. Não é um item lexical isolado, mas um item que deve ser sinalizado junto com um verbo sem concordância. Por meio da direção, o auxiliar expressa a relação estabelecida entre

34 os argumentos da sentença. Tal auxiliar apenas é utilizado quando houver ordenações irregulares dos constituintes da sentença, portanto, ordenações que não sejam SVO (sujeito, verbo, objeto). Assim como com as sentenças contendo um verbo com concordância, aquelas contendo um auxiliar necessitam estar associadas às marcações não-manuais de concordância, isto é, a direção dos olhos acompanhando a direção do movimento. 4.3 Verbos manuais Os verbos manuais são realizados em uma configuração de mão no qual se representa estar segurando um objeto. Esses verbos são utilizados nas seguintes sentenças: Como podemos observar, os verbos manuais concluem a sentença. A classe dos verbos manuais poderia inserir os classificadores que incorporam a informação verbal da sentença, mas também incorporam ao objeto, nestes casos rolo e pincel.

35 4.4 Tipos de frases na LIBRAS As línguas de sinais utilizam as expressões faciais e corporais para estabelecer os vários tipos de frases, semelhante às entonações da língua portuguesa. Para perceber a tipologia da frase, isto é, se a sentença é afirmativa, exclamativa, interrogativa ou negativa o sinalizador precisa estar atento às expressões faciais e corporais que, geralmente, são associadas simultaneamente com outros sinais da frase ou com toda a frase. 4.4.1 Forma afirmativa Neste tipo de frase, a expressão facial se mantém neutra. Podemos exemplificar tal afirmação, através da ilustração abaixo: 4.4.2 Forma interrogativa Diferentemente da forma afirmativa, a frase interrogativa possui algumas expressões faciais que a difere dos demais tipos frasais. Geralmente, na forma interrogativa as sobrancelhas permanecem franzidas e essa expressão é acompanhada por uma ligeira inclinação da cabeça. Observe o desenho a seguir:

36 4.4.3 Forma exclamativa A forma exclamativa é caracterizada pelo levantamento das sobrancelhas e pelo ligeiro movimento de cabeça que se inclina para cima e para baixo. Esta pode ser precedida por um intensificador representado pelo fechamento da boca com um movimento para baixo. 4.4.4 Forma negativa A sentença negativa possui algumas particularidades, pois pode ser representada de três maneiras diferentes: Acrescida do sinal NÃO à frase afirmativa: nesta forma o sinalizador apenas insere o movimento de negação, sinalizado pelo movimento de cabeça, simultaneamente com a execução do sinal.

37 Pode ser executado com a incorporação de um movimento contrário ou desigual ao sinal negado. Esta última maneira de execução da forma negativa pode ser realizada com um aceno de cabeça que pode ser feito simultaneamente com a ação que está sendo negada. 4.4.5 Forma negativa/interrogativa Tal frase é sinalizada com as sobrancelhas franzidas e um aceno de negação, realizado pela cabeça.

38 4.4.6 Forma exclamativa/interrogativa A sinalização deste tipo de frase se dá pelo levantamento das sobrancelhas e pela inclinação da cabeça. Ao longo deste capítulo, observamos que a organização espacial da LIBRAS apresenta possibilidades de estabelecimento de relações gramaticais no espaço, através das diferentes formas vistas.

39 5 METODOLOGIA DA PESQUISA 5.1 Procedimentos adotados Os procedimentos metodológicos, que derivam da natureza deste trabalho, foram realizados através de três fases: pesquisas bibliográficas, entrevistas e filmagens. A primeira fase, pesquisas bibliográficas, teve como objetivo a construção do referencial teórico deste trabalho que, por sua vez, abrange três campos da lingüística: a aquisição da linguagem, a fonologia da Língua Brasileira de Sinais e a sintaxe espacial. As entrevistas tiveram um papel importante no levantamento das dificuldades que adultos ouvintes apresentam na realização das marcações nãomanuais; e, finalmente, as filmagens que proporcionaram a análise das execuções das marcações não-manuais por ouvintes. 5.2 Amostragem A amostra da pesquisa foi constituída por discentes do nível inicial do curso de LIBRAS, oferecido pela Faculdade de Educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, no segundo semestre de 2008. Para a composição dessa amostra, foram entrevistados, na primeira fase, 21 alunos de ambos os sexos. A tabela abaixo mostra o número de informantes do sexo masculino e feminino participantes da primeira fase da pesquisa: levantamento das dificuldades encontradas por ouvintes na aquisição das marcações não-manuais. Tabela I - Número de informantes de acordo com o sexo Sexo Nº de Informantes Masculino 06 Feminino 15 Total de Informantes: 21 pessoas 5.3 Informantes De acordo com a tabela acima, podemos constatar que grande parte dos informantes são pertencentes ao sexo feminino. Os informantes são estudantes oriundos de diversos cursos de graduação oferecidos pela PUCRS, que, por sua

40 vez, afirmaram em conversas informais que procuraram o curso de LIBRAS com intuito de conhecer melhor o mundo surdo e romper muitos tabus existentes. O grupo entrevistado possui uma diversificação de idade, sendo assim um grupo heterogêneo. A tabela abaixo ilustra tal afirmação. Tabela II: Levantamento da idade dos informantes Idade Nº de Informantes 19 01 20 05 21 06 22 02 23 01 26 01 30 01 34 01 36 01 41 02 5.4 Descrição do Instrumento 1 Nesta primeira etapa da pesquisa, foram utilizados três instrumentos, sendo cada um direcionado a um grupo específico de pessoas. O primeiro instrumento, que se encontra no Anexo A, denominado Instrumento 1a, direcionado aos estudantes iniciais de LIBRAS, teve como objetivo o levantamento das principais marcações não-manuais, nas quais apresentaram maior dificuldade na aquisição. Este instrumento foi composto por duas perguntas. Na primeira questão, solicitamos aos estudantes que apontassem quais foram as maiores dificuldades encontradas na aquisição da marcação não-manual da Libras e, posteriormente, na segunda questão solicitamos que listassem em quais marcações não-manuais tais dificuldades se mostraram presentes.

41 O segundo instrumento, Instrumento 1b, localizado no Anexo B, foi dirigido ao professor titular do curso de LIBRAS, sendo este surdo. Neste instrumento, o docente teve de apontar, baseado em suas observações, quais são as marcações não-manuais que seus alunos apresentam maiores dificuldades de execução. O terceiro instrumento, Instrumento 1c, que se encontra no Anexo C, foi direcionado a uma pessoa, ouvinte, proficiente na LIBRAS, que trabalha na educação de crianças/adolescentes surdos. Este questionário é muito semelhante ao Instrumento 1a, no qual, a informante teve de apontar as marcações nãomanuais que apresentou maior dificuldade de execução no período de sua aprendizagem e quais foram as suas principais dificuldades no processo de aquisição de tais marcações. 5.5 Aplicação dos Instrumentos 1a, 1b e 1c A aplicação do Instrumento 1a foi realizada no dia 18 de outubro, sábado, pela manhã, no início da aula, antes dos alunos receberem explicações sobre as marcações não-manuais. Os informantes se reuniram em duplas para responderem as perguntas. Ao aplicar o instrumento, constatamos que alguns dos informantes não apresentavam motivação em responder as questões propostas e que algumas respostas não correspondiam às perguntas. 8 A aplicação do Instrumento 1b foi efetuada na quarta-feira, dia 15 de outubro, pela noite. A partir de conversas informais, a informante começou a responder a questão proposta. Na aplicação deste instrumento, foi possível constatar que a informante mostrou-se bastante interessada em discutir quais são as marcações não-manuais em que seus alunos apresentam maiores dificuldades de aquisição. 8 A informante de número 20 recusou-se em participar da pesquisa.

42 O Instrumento 1c foi aplicado no dia 10 de outubro, quinta-feira, pela manhã. A informante mostrou-se interessada em saber se as suas dificuldades, quando estudantes de LIBRAS, são as mesmas dos aprendizes entrevistados. Nestes três instrumentos foram levantadas as principais dificuldades que o aluno tem em relação às marcações não-manuais. Abordaremos tais marcações no próximo item. 5.5.1 Análise dos dados Para o levantamento dos dados, primeiramente, foram analisadas as respostas oriundas do instrumento direcionado aos alunos. Neste instrumento, foi possível detectar que a maior dificuldade que estudantes ouvintes apresentam está relacionada à aquisição da expressão facial e à aquisição do movimento corporal. Grande parte dos informantes afirma que tais marcações não-manuais são difíceis, pois na língua oral tais expressões e movimentos podem ou não transmitir/enfatizar uma idéia. Ademais, afirmam que na oralidade a expressão facial e/ou o movimento corporal podem estar ausentes em diversas situações comunicacionais, mas não podem estar ausentes na comunicação por sinais, isto é, na Língua Brasileira de Sinais. A tabela abaixo mostra as marcações não-manuais apontadas pelos informantes e o número de ocorrências. Tabela III: Levantamento do número de ocorrências 9 Marcação não-manual Nº de ocorrências Direcionamento do olhar 03 Expressão facial 15 Movimento corporal 05 Não especificado 04 9 Houve informantes que apontaram mais de uma marcação não-manual

43 Os instrumentos que foram direcionados à professora de LIBRAS e à ouvinte proficiente em LIBRAS obtiveram os mesmos resultados. Ambas apontam a expressão facial como maior dificuldade de aquisição por ouvintes. Na análise do Instrumento 1b, pode-se constatar que a docente afirma que seus alunos possuem uma grande dificuldade na aquisição da expressão facial, pois o ouvinte, segundo ela, não necessita passar conceitos e/ou enfatizar, marcar sentenças a partir de tal expressão. Já a informante do Instrumento 1c afirma que apresentou maiores dificuldades na aquisição da expressão facial, pois os falantes não possuem esta capacidade desenvolvida. Quando um ouvinte quer enfatizar algo, geralmente altera o tom de voz e, assim, não se vale tanto da expressão facial. A observação destes casos nos leva a concluir que os aprendizes ouvintes, de LIBRAS, apresentam maior dificuldade na aquisição da expressão facial, pois, na Língua de Sinais, tal marcação não-manual é de fundamental importância para o entendimento real do sinal, sendo que a entonação em Língua de Sinais é feita pela expressão facial, diferentemente das línguas oral-auditivas. Por intermédio dos resultados obtidos do Instrumento 1, pode-se realizar a construção do Instrumento 2. Detalharemos tal ferramenta no próximo item. 5.6 Filmagens (Instrumento 2) Quanto às gravações, estas se deram em dois momentos. Primeiramente foi realizada a gravação com a professora, esta por sua vez, serviu como modelo para a análise das produções que seriam realizadas pelos alunos. A professora sinalizou cinco frases e duas palavras que utilizam marcações não-manuais, como: expressão facial, movimento corporal e direcionamento do olhar. No segundo momento, as gravações foram realizadas com os discentes. Para tal filmagem, foi pedido a eles que sinalizassem as mesmas cinco frases utilizadas, juntamente com os dois vocábulos, na gravação com a professora, com intuito de detectar possíveis mudanças de significado na sentença.

44 5.7 Descrição do Instrumento 2 O instrumento utilizado nesta segunda etapa da pesquisa, situado no Anexo D, é composto por duas partes. A primeira parte, composta por seis frases, cada uma destas tendo a forma: afirmativa, interrogativa, exclamativa, negativa, negativa/interrogativa e exclamativa /interrogativa. Teve como objetivo a sinalização das frases, por estudantes de LIBRAS, levando em conta as marcações não-manuais, mais especificadamente o uso da expressão facial como forma de diferenciação das formas frasais. A segunda parte, composta por dois vocábulos, teve como objetivo a sinalização de tais palavras para análise de possível mudança de significado expressada pela marcação não-manual. 5.8 Aplicação do Instrumento 2 A aplicação do Instrumento 2 foi realizada no dia 08 de novembro de 2008, sábado pela manhã, no período das 09h00min às 10h15min. Foram escolhidos seis alunos para a aplicação do referido instrumento. Na aplicação do Instrumento 1, houve pessoas que se recusaram a participar desta pesquisa e houve um grupo maior que se disponibilizou a realizar as filmagens. Os informantes pré-selecionados para a segunda etapa da pesquisa foram avisados, via e-mail, e apenas seis pessoas responderam ao chamado. Este grupo de informantes foi composto por três homens e três mulheres. Para a aplicação desta ferramenta de pesquisa, fez-se necessária a filmagem de um vídeo, pois os informantes tiveram de sinalizar seis frases e dois vocábulos da LIBRAS. Em seguida, foi pedido à professora que sinalizasse as mesmas frases e palavras, pois sua filmagem serviria como modelo comparativo na análise do instrumento.

45 Ao aplicar este instrumento pode-se observar que: os discentes mostraram-se incentivados em realizar as filmagens; os alunos demonstraram interesse em tentar realizar corretamente as sinalizações; a docente apresentou-se surpresa com as sinalizações realizadas por seus alunos. 5.8.1 Análise dos dados: Instrumento 2 Para uma análise minuciosa dos dados deste instrumento, foi necessária a avaliação individual de cada informante. A análise deu-se a partir de observações das gravações (Anexo E), realizadas na aplicação do instrumento. Passaremos às análises: Ao analisar as produções da informante 1, pode-se perceber que nas sentenças interrogativas a mesma não executa a marcação indicativa deste tipo de frase, isto é, o franzimento das sobrancelhas. Por outro lado, a informante apresenta uma marcação razoável nas frases do tipo: afirmativa, exclamativa e negativa. Ao sinalizar o vocábulo parar, a informante não realizou a expressão facial referente ao sentido desta palavra, alterando assim o seu significado. Esta passou-se a significar calma.