ANÁLISE DO PROCESSO DE AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM NO MATERIAL INSTRUCIONAL EM EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA: TEXTOS IMPRESSOS 1 44 Maria da Penha dos Santos Oliveira 2 Resumo: O trabalho relatado objetiva apresentar uma análise sobre as atividades pré-estabelecidas como processo de avaliação da aprendizagem, para serem desenvolvidas pelos professores e técnicos em educação, do Estado do Espírito Santo, durante a realização do Curso de Especialização para Formação de Orientadores Acadêmicos (tutores), na Universidade Federal do Espírito Santo. Essas atividades, juntamente com os textos didáticos compõem o material instrucional textos impressos para Educação a Distância. O trabalho está embasado no estudo e reflexão dos módulos utilizados no curso e no referencial teórico da área. Palavras-chave: Avaliação; Reflexão; Educação a distância; Processo. Introdução O objetivo deste estudo é analisar as atividades de avaliação da aprendizagem propostas nos textos impressos, também chamados de guias didáticos, que foram utilizados no Curso de Especialização para Formação de Orientadores Acadêmicos ou Tutores, da Universidade Federal do Espírito Santo em convênio/parceria com a Universidade Federal do Mato Grosso. Desenvolver tal análise pressupõe estudar a natureza e concepção do processo avaliativo, refletindo sobre os aspectos técnicos, políticos e pedagógicos utilizados para a elaboração das atividades e fundamentalmente identificar quais concepções permeiam a avaliação da aprendizagem, parte integrante das unidades didáticas do curso. Pretende-se ainda apresentar uma reflexão sobre Educação a Distância, o processo de avaliação da aprendizagem em EAD e o uso do material impresso como um dos mediadores na sistematização e elaboração dos conhecimentos. A EAD - Contexto A educação a distância, conhecida desde o século XIX em sua forma empírica, assumiu uma posição de destaque nas últimas décadas face aos fatores tais como: a urgência da formação escolar, a necessidade de atualização continuada e a deficiência do sistema convencional, de ensino com metodologias pouco inovadoras e má formação profissional, por exemplo, e principalmente com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional Nº. 9.394/96, que aponta a EAD 1 Trabalho apresentado em Seminário, outubro de 2002, no Curso Mestrado em Educação, da Universidade Salgado de Oliveira - Rio de Janeiro. 2 Professora e Coordenadora do Curso de Pedagogia CESAT 2009. Email: moliveira@cesat.br
como estratégia de ampliação das possibilidades de acesso à educação, para aprofundar o compromisso do projeto pedagógico com o projeto histórico, político e cultural da sociedade brasileira (LOBO NETO, 2000, p. 11). Desse modo a EAD assume uma posição diferenciada, deixa de ser considerada uma panaceia para os males da educação, como também deixa de ser alvo de preconceitos oriundos dos chamados cursos por correspondências, como pode ser constatado na afirmação de Lobo Neto (2000): A EAD é, por todos os títulos e modos, a mesma educação de que sempre tratamos e que sempre concebemos como direito preliminar de cidadania, dever prioritário do Estado democrático, política pública e obrigatória para ação de qualquer nível de governo, conteúdo e forma do exercício profissional de educadores. (p. 10) Nesse sentido, a EAD além de maximizar as oportunidades de acesso à educação, se constitui num instrumento de qualificação do processo ensino aprendizagem, quando da sua utilização para formação inicial e continuada dos profissionais da educação além da especialização em outras áreas e em outras profissões, como preconiza Armengol (1982, apud SENAI, 1997, p. 37): A expressão educação a distância cobre um amplo espectro de diversas formas de estudo e estratégias educativas, que têm em comum o fato de que não se cumprem mediante a tradicional e contínua contiguidade física de professores e alunos em locais especiais para fins educativos; esta nova forma educativa inclui todos os métodos de ensino nos quais, devido à separação existente entre alunos e professores, as fases interativas e pré-ativas do ensino são conduzidas mediante a palavra impressa e/ou elementos mecânicos e eletrônicos. 45 Recursos didáticos em Educação a Distância É sabido que a Educação a Distância se realiza por intermédio da comunicação mediada, onde os recursos e os meios didáticos têm uma função substancial. Recursos didáticos, entendidos aqui como materiais impressos, recursos tecnológicos, operadores didáticos, meios, dispositivos para transmitir as informações, etc., caracterizando a EAD pela conversação didática, guiada e bidirecional. Rompendo barreiras de tempo e espaço, psicológicas e sociológicas, a EAD se propõe chegar a todos, o que requer um material didático com a função principal de facilitar a auto-aprendizagem. Sobre este material didático, Javier Keyes esclarece: [...] o material didático é concebido como elemento chave no processo ensino aprendizagem. Ele incide de forma direta na qualidade do processo educativo. Sua ação é tão poderosa que alguns tutores o têm considerado como modelo de funcionamento intelectual que condiciona uma determinada relação com a realidade, assim como o manejo da informação e as formas de organizar o conhecimento. (apud SENAI, 1997, p. 95) Mesmo estando em uma época de grande desenvolvimento da informática, com a conjuntura política e tecnológica tão favorável à expansão da EAD, o material didático impresso auto-instrucional primeira geração de recursos didáticos em EAD permanece exercendo um papel essencial nessa modalidade de ensino aprendizagem, comprovada aqui pela afirmação: Mesmo impressos ou informatizados os materiais escritos constituem a principal proposta para aquisição de informações (SOLETIC, 2001, p.
46 30). Numa análise mais detalhada Angeles Soletic (2001) esclarece a importância e significação da busca da aprendizagem e da elaboração do pensamento pautada no uso dos materiais escritos, e continua: [...] a centralidade dos materiais escritos expressa uma concepção da cognição em que o pensamento e o conhecer estão limitados a formas de atividade mental exclusivamente discursiva e por isso os textos escritos constituem a fonte mais legítima de conhecimento. (p. 33) Nessa perspectiva, para planejar e elaborar o material didático/textos impressos, deve-se cuidar para estabelecer a relação dialógica entre os participantes, despertar interesse, gerar perguntas, antecipar dificuldades, apresentar resoluções, estimular a agir, ou seja, fazer uma educação dialogada, com uma linguagem clara e direta capaz de transmitir ao educando a ideia de que ele é o interlocutor permanente do professor. Portanto, para a elaboração dos guias didáticos/módulos didáticos, a grande preocupação é fazê-los não apenas auto-suficientes, mas e principalmente reflexíveis e com possibilidades de serem constantemente renováveis e atualizados. A avaliação da aprendizagem em Educação a Distância A avaliação da aprendizagem em EAD como processo sistemático e contínuo para obtenção de informação sobre o aluno e sua aprendizagem, deve estar de forma extremamente integrada ao processo formativo, à construção dos conhecimentos pelos alunos e ao trabalho dos professores. É um compromisso de todos os pares envolvidos no processo de ensino e aprendizagem, conforme avalia Demo (1998) qualquer processo profundo e comprometido de aprendizagem há de considerar a avaliação como seu componente intrínseco e permanente (p. 283). O que é axiomático também na educação a distância. Ou seja, em EAD este compromisso se faz mais evidente para garantir a seriedade do processo, que por sua natureza apresenta extrema necessidade de prever e antecipar os possíveis percalços e questionamentos por quais os alunos irá confrontarem-se. A avaliação da aprendizagem em EAD, realizada com espaço e situação livres para o educando, com ou não data limite para entrega dos trabalhos, deve garantir a sistematização e a eficácia da aprendizagem e o desenvolvimento de competências e habilidades para auto-formação do aluno, numa perspectiva de construção permanente de conhecimentos, resultado da reflexão e da pesquisa em materiais diversos, como pontua Romão (1998): A avaliação da aprendizagem é um tipo de investigação e é também, um processo de conscientização sobre a 'cultura primeira' do educando, com suas potencialidades, seus limites, seus traços e seus ritmos específicos (p. 101). O processo avaliativo no material impresso: Módulos Como indicado na inicial, o objetivo deste trabalho é analisar o processo avaliativo desenvolvido no material instrucional impresso/módulos de estudos ou guias didáticos, e elegemos como foco da análise os módulos do Curso de Especialização para Formação de Orientadores Acadêmicos oferecido pela Universidade Federal do Espírito Santo em parceria com a Universidade Federal de Mato Grosso, realizado no período de maio de 2001 a julho de 2002, cujo objetivo era formar profissionais, com
habilitação em EAD, para implantar e implementar cursos nesta modalidade, ou seja, formar mão de obra capacitada para atuar em cursos ministrados a distância. O material instrucional impresso utilizado no curso são módulos/guias didáticos, configurando-se como dinamizadores da construção curricular e também como elemento balizador do curso. Esses guias didáticos são organizados e elaborados de forma a possibilitar o auto gerenciamento dos estudos e contém um texto básico e inicial gerador do processo ensino e aprendizagem, e a partir deste, outros textos que objetivam abrir links de estudos, disponibilizando para o professor cursista, materiais considerados essenciais e outros textos como indicação de leitura complementar. Os módulos são sistematizados em quatro estruturas interdependentes: uma relativa às discussões propostas através de questões problematizadoras; outra dedicada às leituras consideradas essenciais; uma outra de indicação de leituras complementares; e, a ultima relacionada à avaliação, que será foco deste estudo. A primeira atividade de avaliação, que foi identificada para ser analisada, está no módulo dois, cuja disciplina é denominada Fundamentos da Educação a Distância, com carga horária de 60 horas, sob a responsabilidade da professora Kátia M. Alonso, que dá a seguinte orientação: Para avaliação deste primeiro momento, estou propondo a feitura de um bloco de anotações, ou o registro da navegação realizada por você. Cada um dos momentos de análise será acompanhado de proposições de algumas atividades que serão registradas. No entanto, o mais importante seria que todo o seu percurso de trabalho fosse documentado, considerando suas reflexões, dúvidas, leituras complementares realizadas e, claro, suas impressões pessoais, compondo assim o que poderíamos denominar de seu diário de bordo. É esse registro que servirá para avaliação de disciplina. A partir dessa consigna, são indicadas para cada texto deste módulo, outras questões que objetivam orientar a leitura como também problematizar o estudo. No módulo seguinte, o número três, Planejamento e Produção de Materiais Didáticos para EAD, é indicado através dos objetivos, uma reflexão sobre como elaborar material didático para EAD no âmbito curricular: suas características e aplicabilidade. Para avaliação desse estudo propõe-se a realização de varias atividades referentes ao texto básico, como anotações e questionamentos para serem registrados no diário de bordo, habilitando o cursista para efetiva participação nas discussões no momento presencial estabelecido como dois dias por mês, e também para a elaboração de um guia didático, que é a solicitação para o trabalho final. Seguem-se outras atividades avaliativas nos módulos quatro e cinco. Todas com a intencionalidade de compreensão, análise e síntese operações dos pensamentos fundamentais para a construção e aplicação dos conhecimentos, e produção de trabalhos, como por exemplo: Elaborar uma proposta para atuar como gestor de uma Universidade a Distância, durante um bimestre; Escrever sobre possibilidades e dificuldades na Educação Continuada (permanente) de adultos que já estão no mercado de trabalho; Elaborar um texto que contemple a análise dos três tipos de funções do tutor, comparando com o 47
48 sistema da UFES e da UFMT. Esses trabalhos devem ser realizados após as leituras dos textos apresentados nos módulos, com ou sem a orientação dos professores/tutores, que disponibilizam meios de contato como telefone e e-mail. No módulo seis, o penúltimo, a disciplina de estudo é Avaliação, e as atividades, para serem desenvolvidas foram elaboradas a partir dos seguintes objetivos: Explicitar os pressupostos históricos e filosóficos da avaliação no sentido de analisar os elementos que a compõe; Compreender a dinâmica do processo de avaliação, a partir de algumas reflexões sobre o que é avaliação. E, para avaliar a consecução destes objetivos são indicadas algumas atividades de aprendizagem que devem ser registradas no diário de navegação, e como tarefa final, desenvolver um trabalho de análise de como ocorre o processo de avaliação na unidade da qual o aluno faz parte. Nesse trabalho deverão ser consideradas questões, tais como: 1. Que tipo de avaliação é feito? 2. Se esta avaliação permite fazer diagnostico do processo ensino aprendizagem? 3. Permite-se tomada de decisões para o replanejamento do trabalho? 4. Quais os instrumentos são utilizados? Se a avaliação é processual? 5. Se a avaliação desenvolvida tem o sentido de construção do conhecimento? 6. E outras questões? E por último, o módulo número sete, que conclui o curso, com a disciplina Pesquisa em Educação, quando espera que o aluno após o estudo do mesmo, elabore um projeto de pesquisa, seguindo as orientações dos textos contidos nos módulos, como também as explicações e orientações dos professores especialistas/tutores. A avaliação como processo deve possibilitar a construção do conhecimento, e principalmente gerar referências para a tomada de decisões acerca das práticas educativas, com vistas a uma aprendizagem que seja o resultado de construções contextualizadas e reflexões, pode se afirmar que durante o percurso de estudo com os módulos, há um grande número de indicações de atividades que possibilitem tanto a construção de conhecimentos, como a concretização real do ensino e das aprendizagens, numa perspectiva progressista. A análise que ora faço baseia-se em um paradigma construtivista, onde é crucial a interação entre o educador e o educando. A abordagem construtivista considerada uma abordagem madura, que vai além da ciência, porque também captam os aspectos humanos, políticos, sociais, culturais e éticos, envolvidos no processo (PENNA FIRME, 1998, p. 18). Essa abordagem insere-se na tendência denominada progressista, que vê a escola como uma nova função social capaz de desenvolver a solidariedade de classe e a unificação nacional da educação pública (GADOTTI, 1994). E, ainda sobre
a teoria progressista definida aqui como uma das duas tendências gerais do pensamento educacional brasileiro a outra denominada de liberal que desde a década de 70, vêm em busca de outro caminho para a educação: o de superar as teorias reprodutivistas e construir uma pedagogia social crítica, pois a escola é sem dúvida um elemento não só de continuidade, mas também de ruptura, como local onde é possível lidar com as contradições sociais e problematizar a realidade (ARANHA, 1998). Com base nesses pressupostos, argumenta-se de forma veemente que em EAD, não pode ser diferente, já afirmado anteriormente por Lobo Neto, pois um dos objetivos fundamentais é desenvolver a capacidade crítica do aluno, frente às situações concretas do seu cotidiano e frente a suas próprias experiências. Na análise e estudo dos módulos, percebe-se essa interação na constante dualidade da teoria e prática, demonstrada de forma imperativa no tratamento dado aos conteúdos e também na relação dialógica do orientador e cursista, mediada pelos textos, através das atividades de aprendizagem e avaliação. É possível perceber ainda que o processo avaliativo desenvolvido nos módulos, proporciona atitudes críticas, envolvendo o cursista tanto na assimilação dos conteúdos, como para o repensar da sua prática profissional, quando permite e o induz a complementar seus conhecimentos in loco, referendado pelas teorias propostas nos textos e atividades dos módulos, numa relação dialética da ação-reflexão-ação. Essa movimentação é desenvolvida, em parte, através de leituras orientadas dos textos, considerações e questionamentos que induzem à discussão, face aos objetivos delineados, e principalmente, pelas atividades de avaliação propostas. 49 Considerações finais Baseado na afirmação de Freire (1980, p. 10) a finalidade de qualquer ação educativa deve ser a produção de conhecimentos que aumenta a consciência e a capacidade de iniciativas transformadoras dos grupos, e também sob toda visão teórica aqui resumidamente apresentada, é possível sumariar, numa perspectiva interpretativa, algumas considerações a respeito dos procedimentos de avaliação pontuados nos módulos/guias-didáticos. Todas as atividades caracterizam-se como um processo de descrição, análise e crítica de uma dada realidade, visando transformá-la à luz de referenciais teóricos e de experiências pedagógicas vividas pelo grupo. O compromisso principal desse processo é o de fazer com que os professores cursistas construam suas próprias práticas, suas próprias alternativas de ações, evitando a presença de uma relação autoritária marca que caracteriza a avaliação da aprendizagem num paradigma tradicional, contrapondo o paradigma construtivista, conforme Penna Firme expressa anteriormente. Ainda com base em um dos pressupostos da EAD, sobre o auto gerenciamento de estudo na formação do indivíduo, é possível indicar apenas como forma de sugestão, a possibilidade de uma maior
diversidade nas atividades e ênfase à auto-avaliação, resgatando o caráter da relação bidirecional da comunicação. Sem a pretensão de concluir, penso que outras considerações importantes e interessantes possam ser resultados da percepção dos professores e técnicos cursistas (ex-alunos), o que seria um outro estudo, talvez complementar a este, para o futuro, tendo em vista ser um início do caminhar da educação a distância no estado do Espírito Santo. 50 Referências: ARANHA, Maria Lucia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna, 1998. ALONSO, Kátia Morosou et ali. Licenciatura em Educação Básica: 1ª a 4ª série do 1º grau, através da modalidade da Educação a Distância. NEAD, Cuiabá: EdUFMT, 1996. DEMO, Pedro. Questões para teleducação. Petrópolis: Vozes, 1998. FREIRE, Paulo. Educação e mudança. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979. GADOTTI, Moacir. Histórias das idéias pedagógicas: o pensamento pedagógico brasileiro. São Paulo: Ática, 1994. LEITE, Vera Lúcia Marques et al. Módulos para Curso de Especialização: Formação de Orientadores Acadêmicos para a Modalidade de Educação a Distância. Universidade Federal de Mato Grosso / Instituto de Educação / Núcleo de Educação Aberta e a Distância. Cuiabá/ MT, 2001. LITWIN, Edith (Org.). Educação a Distância: temas para o debate de uma nova agenda educativa. Porto Alegre: Artmed, 2001. LOBO NETO, Francisco J. S. Educação a Distância: regulamentação. Brasília: Plano, 2000. PENNA FIRME, Thereza (1998). Módulo de Avaliação. Curso de Especialização para Orientadores Acadêmicos, UFMT/UFES, 2001. ROMÃO, José Eustáquio. Avaliação dialógica: desafios e perspectivas. São Paulo: Cortez, 1998. SENAI. DN. Uma introdução a Educação a Distância. Rio de Janeiro, 1997.