CAROLINA ROTTILI DAGUANO EFEITO DA MUDANÇA POSTURAL NA PRESSÃO INTRAOCULAR DE CRIANÇAS SAUDÁVEIS DA REGIÃO SUL DO BRASIL - PROJETO GLAUCOMA

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Transcrição:

CAROLINA ROTTILI DAGUANO EFEITO DA MUDANÇA POSTURAL NA PRESSÃO INTRAOCULAR DE CRIANÇAS SAUDÁVEIS DA REGIÃO SUL DO BRASIL - PROJETO GLAUCOMA Curitiba 2011

Carolina Rottili Daguano Efeito da mudança postural na pressão intraocular de crianças saudáveis da região Sul do Brasil - Projeto Glaucoma Orientador: Lisandro Massanori Sakata Curitiba 2011 2

SUMÁRIO RESUMO 4 INTRODUÇÃO 5 MÉTODOS 6 RESULTADOS 8 DISCUSSÃO 9 REFERÊNCIAS 12 ANEXOS 14 3

RESUMO Objetivo: Avaliar o efeito da mudança postural na pressão intraocular (PIO) de crianças saudáveis Métodos: Esse estudo transversal observacional incluiu crianças cursando o ensino fundamental da cidade de Almirante Tamandaré, na região metropolitana de Curitiba PR. Todas as crianças foram submetidas a um exame de triagem, o qual incluiu anamnese, acuidade visual, tonometria com Perkins e retinoscopia sob cicloplegia, se necessário. As medidas da PIO com o tonômetro de Perkins foram realizadas na posição sentada e após 2 minutos na posição supina. Apenas os dados do olho direito foram considerados para análise. Resultados: No total, 460 crianças foram incluídas neste estudo; com idade média de 10.48±0.14 anos (variação 5-17 anos); 63% da população estudada era da raça branca (conforme auto-descrição) e 27.3% não-branca (maioria negra e mestiça). Nenhuma doença oftalmológica, exceto erros refrativos, foi detectada. A PIO média na posição sentada e supina (IC 95%) foi 12.17 (11.98 a 12.26) e 13.34 (13.13 a 13.50) mmhg respectivamente. A média da diferença da PIO entre as posições sentada e supina foi +1.16 (1.02 a 1.31) mmhg e a diferença postural da PIO variou entre -4 a +6 mmhg (p<0.05). O aumento da PIO limitou-se a 2 mmhg em 75% dos sujeitos e 6,74% da amostra mostrou um aumento da PIO maior ou igual a 4 mmhg na posição supina. Após ajuste para idade, sexo e raça, não foi observado variação da PIO significativa em meninos e meninas (1.02 vs. 1.23 mmhg, p=0.16, respectivamente), brancos e nãobrancos (1.26 vs 0.98 mmhg, respectivamente). A variação da PIO não foi associada com idade, sexo ou raça (p>0.09) Conclusões: Foi detectado um aumento estatisticamente significativo, porém pequeno, da PIO entre a posição sentada e supina nessa grande amostra de crianças saudáveis. Esses dados podem ajudar na interpretação da variação da PIO observada na mudança da posição sentada para a posição supina. 4

INTRODUÇÃO A pressão intraocular (PIO) é um dos principais fatores de risco para o desenvolvimento do glaucoma e representa o único fator modificável que comprovadamente previne ou atrasa o aparecimento de glaucoma em hipertensos oculares e inibe a progressão do glaucoma em todos os estágios da doença 1-4. O entendimento do comportamento da PIO durante as atividades diárias representa uma importante informação nas decisões da necessidade de tratamento bem como da sua eficácia. Estudos prévios mostraram que a PIO varia significativamente durante o ciclo sono-vigília e que o pico da PIO tende a ocorrer durante o período noturno, quando os sujeitos estão na posição supina 5-6. Muitos estudos anteriores reportaram que a simples mudança da posição em pé para a supina pode levar à elevação da PIO 6-14, e a magnitude dessa variação na PIO esteve associada com a severidade e progressão do defeito de campo visual 9,10. Mosaed e cols. observaram que a avaliação da PIO na posição supina pode estimar melhor o pico de PIO que ocorre durante a noite 15. Assim, é provável que a avaliação da PIO na posição supina represente uma informação adicional sobre a perfil da PIO, e que essa informação pode ser usada para auxiliar na determinação do manejo clínico no glaucoma. Entretanto, poucos estudos avaliaram a influência da posição corporal da PIO em indivíduos saudáveis, e o tamanho da amostra nesses estudos foi limitada 6,7,8,10,13. O objetivo desse estudo foi avaliar a mudança postural da PIO em crianças saudáveis. 5

MÉTODOS O Projeto Glaucoma é um programa de prevalência populacional conduzido desde 1999 em algumas cidades da região metropolitana de Curitiba-PR e, de 2003 a 2008, estudou a população infantil. Durante o ano de 2008, o Porjeto Glaucoma foi conduzido em Almirante Tamandaré, uma cidade com população estimada em 2007 de 93.055 habitantes. Todos os protocolos foram aprovados pelo Comitê de Ética da Universidade Federal do Paraná e os métodos descritos estão de acordo com os princípios da Declaração de Helsinki. O Consentimento Informado foi obtido de todos os participantes. Exame de triagem Esse estudo transversal observacional incluiu crianças cursando o ensino fundamental de Almirante Tamandaré. Todas as crianças foram convidadas a participar do projeto de triagem. Todas as crianças foram submetidas ao exame de triagem em um ginásio de esportes local. Identificação e dados demográficos foram obtidos e os grupos raciais foram definidos por auto-descrição (baseado na classificação usada pelo IBGE) 16. O exame de triagem incluiu anamnese médica, acuidade visual, tonometria de Perkins na posição sentada e retinoscopia sob cicloplegia, se necessário. A tonometria foi realizada por residentes em Oftalmologia devidamente treinados. Participantes do estudo e método de avaliação da PIO A tonometria foi realizada com o tonômetro de aplanação de Perkins após uma gota de colírio anestésico e uma gota de colírio fluorosceína. O critério de inclusão para participar do estudo foi realizado de maneira aleatória, onde uma em cada 3 crianças em 5 dias separados foi randomicamente submetida às medidas de PIO na posição supina. As medidas da PIO foram realizadas na posição sentada e após 2 minutos na posição supina. Apenas os dados do olho direito foram utilizados para análise. 6

Colaboração pobre durante a tonometria, presença de anormalidades corneanas ou qualquer anormalidade oftalmológica dificultando a medida precisa da PIO foram considerados critérios de exclusão. Análise Estatística Testes paramétricos e não-paramétricos foram usados para comparar variáveis contínuas, de acordo com a distribuição das variáveis contínuas. O teste do quiquadrado foi usado para comparar dados categorizados. Para propósito de análise, classificamos todos os participantes em grupos de brancos e não-brancos. O valor de P<0.05 foi considerado estatisticamente significativo. A análise estatística foi realizada com o programa JMP versão 5 (Institute, Inc, Cary, NC) e Medcalc para Windows (Mariakerke, Belgium). Foi avaliada a associação do efeito da mudança postural na PIO entre crianças do sexo feminino e masculino, bem como entre crianças brancas e não-brancas. 7

RESULTADOS No total, 460 crianças foram incluídas no estudo. Houve 40 crianças excluídas, principalmente devido à baixa colaboração durante a tonometria. A idade média dos participantes incluídos foi 10.48±0.14 anos (variação 5-17 anos), e 50.2% eram meninos. 63.9% declararam-se da raça branca, 27.3% da raça negra ou mestiça e 8.8% descreveram-se como de outras raças (Tabela 1). Todas as crianças incluídas no estudo completaram o exame de triagem e não apresentaram nenhuma doença oftalmológica (glaucoma ou hipertensão ocular) além de pequenos erros refrativos (-3.00 DE a +3.00 DE) e nenhuma doença sistêmica conhecida (hipertensão arterial sistêmica, cardiopatia ou diabetes). A PIO média na posição sentada (IC 95%) foi 12.17 mmhg (11.98 a 12.36), variando de 8 a 18 mmhg. A PIO média na posição supina (IC 95%) foi 13.34 mmhg (13.13 a 13.50), variando de 8 a 20 mmhg. A diferença média da PIO entre a posição sentada e supina foi +1.16 mmhg (1.02 a 1.31) [Tabela 2]. A diferença postural da PIO variou de -4 a +6 mmhg. Quase 75% dos sujeitos apresentaram um aumento da PIO igual ou menor que 2 mmhg e em torno de 20% das crianças não mostraram nenhuma diferença da PIO entre as posições sentada e supina. Aproximadamente 20% dos sujeitos mostraram um aumento da PIO maior que 2 mmhg e apenas 6,73%% deles mostraram um aumento da PIO maior ou igual a 4 mmhg (p>0,05) [Figura 1]. Em vinte e três crianças foi observado um aumento da PIO de 4 mmhg, enquanto que, em 6 crianças, esse aumento foi de 5 mmhg e em apenas 2 crianças foi de 6 mmhg. Após o ajuste para idade, sexo e raça, não foi observado diferença da PIO significativa entre meninos e meninas (1.02 vs 1.23 mmhg, p=0.16, respectivamente), brancos e não-brancos (1.26 vs 0.98 mmhg, respectivamente0 [Tabela 1]. A diferença da PIO não foi associada com idade, sexo ou raça (p>0.09). Com relação ao efeito da mudança postural da PIO nas diferentes raças auto-descritas, observou-se um aumento médio da PIO na raça amarela de 0.63 mmhg, na raça mestiça de 1.02 mmhg, na raça nega de 0.86 mmhg e nos índios de 1.33 mmhg. 8

DISCUSSÃO Nesse grupo de crianças saudáveis com nenhuma doença oftalmológica exceto pequenos erros refrativos, encontramos um aumento médio da PIO na posição supina de +1.16 mmhg. Esse estudo apresenta a maior amostra de dados sobre o aumento da PIO na posição supina e pode ser útil como uma referência para esse parâmetro na população saudável, provavelmente com um sistema cardiovascular sem alterações. A variação da PIO durante as 24 horas do dia representa uma informação clínica relevante para avaliar o risco de surgimento do glaucoma ou progressão do mesmo. Muitos estudos mostraram que medidas únicas da PIO realizadas durante os horários de consulta podem falhar para detectar os picos de PIO e testes como a curva tensional diária, teste de sobrecarga hídrica e medidas na posição supina tem sido sugeridos como métodos alternativos para melhor avaliar o perfil da PIO 15,17,18. A mudança postural da PIO foi estudada em muitos estudos prévios. Alguns estudos investigaram a correlação entre mudança postural da PIO e defeito de campo visual em pacientes com glaucoma primário de ângulo aberto (GPAA) e glaucoma de pressão normal (GPN) e eles observaram uma variação média da PIO de 4.0 e 3.8 mmhg (respectivamente), com correlação positiva entre a magnitude da variação da PIO e defeito de campo visual 9,10. Yamabayashi e cols estudaram 16 olhos com hipertensão ocular, 23 olhos com GPN e 18 olhos normais e encontraram uma média de aumento da PIO de 4.0, 4.1 e 4.4 mmhg respectivamente 7. Outro estudo comparou 77 olhos normais e 65 olhos com glaucoma e observou um aumento de 2.9 mmhg em normais e 3.9 mmhg em glaucomatosos 8. O presente estudo observou um menor aumento da PIO quando comparado com esses outros estudos. Apesar de o presente estudo ter uma amostra muito maior quando comparado com esses estudos prévios, as diferenças na idade e raça podem ajudar a explicar pelo menos parte dessas diferenças encontradas, particularmente devido a possíveis diferenças na resposta vascular na posição supina entre adultos e crianças. Os mecanismos responsáveis pela variação da PIO durante a mudança postural permanecem incertos, apesar de o tema ter sido previamente estudado por muitos autores. O mecanismo mais aceito para o aumento da PIO na posição supina seria a elevação da pressão venosa episcleral 11-13. Outra hipótese consideraria a existência de 9

um aumento no fluxo sanguíneo coroideo não-pulsátil na região subfoveal quando o paciente se deita, sugerindo uma resposta passiva da circulação coroidea durante a mudança postural 14. Alguns autores investigaram os parâmetros no fluxo sanguíneo durante a mudança postural em indivíduos normais e glaucomatosos. Há alguma evidência que a artéria ciliar posterior curta seria um dos vasos retrobulbares mais hermeticamente autoregulados no olho humano e essa artéria constitui a principal fonte de suprimento sanguíneo para a cabeça do nervo óptico 19. Em adultos saudáveis sem história de doença vascular, a variação hidrostática teve diferentes efeitos nas velocidades de fluxo sanguíneo nos vasos retrobulbares após 10 minutos de mudança postural. Esses achados sugerem que a capacidade de controle autoregulador dos vasos sanguíneos pode variar devido às diferenças na inervação autônoma e outros mecanismos intrínsecos de cada indivíduo 19. Evans e cols observaram que, na posição supina, a resistência vascular distal da artéria oftálmica cai tanto em indivíduos normais quanto em glaucomatosos, entretanto, o descréscimo na resistência vascular na artéria central da retina só ocorreu em sujeitos normais 20. Essa observação levou à hipótese que pacientes glaucomatosos podem exibir uma autoregulação deficiente no fluxo sanguíneo ocular durante a variação postural 20. Digno de nota, uma limitação desses estudos concerne nas dificuldades em acessar precisamente o volume de fluxo sanguíneo na parte posterior do olho. O presente estudo possui algumas limitações. As medidas da PIO foram realizadas após somente 2 minutos de mudança postural e a magnitude da variação em diferentes tempos não foi avaliada. Os examinadores não estavam mascarados para as medidas na posição sentada, e isso pode ter influenciado nossos resultados. A espessura central corneana não foi parte do protocolo desse estudo. Contudo, esse estudo comparou as mudanças da PIO com a variação postural em cada sujeito individualmente e, dessa maneira, a espessura corneana provavelmente afetou a PIO de maneira semelhante tanto na posição supina quanto na sentada. A mudança postural da PIO em crianças saudáveis nesse estudo pode ser considerada pequena, em quase 75% dos casos o aumento da PIO limitou-se a 2 mmhg. Entretanto, aproximadamente 6% da amostra apresentou um aumento da PIO maior que 4 mmhg na posição supina. Essa análise representa o maior estudo avaliando a variação 10

da PIO na posição supina em crianças saudáveis e ela pode ser útil para pesquisadores como um valor de referência para interpretar a influência da variação postural na PIO. 11

REFERÊNCIAS 1. The Advanced Glaucoma Intervention Study (AGIS): 7.The relationship between control of intraocular pressure and visual field deterioration. Am J Ophthalmol. 2000;130(4):429-40. 2. Heijl A, Leske C, Bengtsson B, Hyman L, Bengtsson B, Hussein M. Reduction of intraocular pressure and glaucoma progression. Results from the Early Manifest Glaucoma Trial. Arch Ophthalmol. 2002;120:1268-79. 3. Collaborative Normal-Tension Glaucoma Study Group. The effectiveness of intraocular pressure reduction in the treatment of normal-tension glaucoma. Am J Ophthamol. 1998;126(4):498-505. 4. Kass MA, Heuer DK, Higginbothan EJ, et al. The Ocular Hypertension Treatment Study: a randomized trial determines that topical hypotensive medication delays or prevents the onset of primary open-angle glaucoma. Arch Ophthamol. 2002;120:701-13. 5. Zeimer RC. Circadian variations in intraocular pressure. In: Ritch R, Shields MB, Krupin T, eds. The Glaucomas. St. Louis: Mosby; 1996: 429-445. 6. Liu JHK, Kriplke DF, Hoffman RE, et al. Nocturnal elevation of intraocular pressure in young adults. Invest Ophthalmol Vis Sci. 1998;39:2707-12. 7. Yamabayashi S, Aguilar RN, Hosoda M, Tsukahara S. Postural change of intraocular pressure and blood pressures in ocular hypertension and low tension glaucoma. Br J Ophthalmol. 1991;75:652-55. 8. Krieglstein GK, Langham ME. Influence of body position on the intraocular pressure of normal and glaucomatous eyes. Ophthalmologica. 1975;171(2):132-45. 9. Kiuchi T, Motoyama Y, Oshika T. Relationship of progression of visual field damage to postural changes in intraocular pressure in patients with normal-tension glaucoma. Ophthalmol. 2006;113(12):2150-5. 12

10. Hirooka K, Shiraga F. Relationship between postural change of the intraocular pressure and visual field loss in primary open-angle glaucoma. J Glaucoma. 2003;12(4):379-82. 11. Krieglstein GK, Waller WK, Levdhecker W. The vascular basis of the positional incluence of the intraocular pressure. Albrecht Von Graefes Arch Klin Exp Ophthalmol. 1978;206(2):99-106. 12. Friberg TR, Sanborn G, Weinreb RN. Intraocular and episcleral venous pressure increase during inverted posture. Am J Ophthalmol. 1987;103(4):523-6. 13. Sultan M, Blondeau P. Episcleral venous pressure in younger and older subjects in the sitting and supine position. J Glaucoma. 2003;12(4):370-3. 14. Longo A, Geiser MH, Riva CE. Posture changes and subfoveal choroidal blood flow. Invest Ophthalmol Vis Sci. 2004;45(2):546-51. 15. Mosaed S, Liu JH, Weinreb RN. Correlation between office and peak nocturnal intraocular pressures in healthy subjects and glaucoma patients. Am J Ophthalmol. 2005;139(2):320-4. 16. National Census Agency Website. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica [in portuguese]. Available at HTTP://www.ibge.gov.br. Accessed March 15, 2010. 17. Malerbi FK, Hatanaka M, Vessani RM, Susanna R Jr. Intraocular pressure variability in patients who reached target intraocular pressure. Br J Ophthalmol. 2005;89(5):540-2. 18. Barkana Y, Anis S, Liebmann J, Tello C, Ritch R. Clinical utility of intraocular pressure monitoring outside of normal office hours in patients with glaucoma. Arch Ophthalmol. 2006;124(6):793-7 19. Galambos P, Vafiadis J, Vilchez SE, et al. Compromised autoregulatory control of ocular hemodynamics in glaucoma patients after postural change. Ophthalmolol. 2006;113(10):1832-6. 20. Evans DW, Harris A, Garrett M, Chung HS, Kagemann L. Glaucoma patients demonstrate faulty autoregulation of ocular blood flow during posture change. Br J Ophthalmol. 1999;83:809-13. 13

ANEXOS TABELA 1 Dados demográficos da população estudada Sexo Masculino 231 (50.2%) Feminino 229 (49.8%) Raça Branca 294 (63.9%) Não-branca 140 (27.3%) Indeterminada 26 (8.8%) Todos 460 TABELA 2 Média da PIO nas posições sentada e supina. PIO posição sentada PIO posição supina Variação (mmhg 95% CI) (mmhg 95% CI) (mmhg 95% CI) Sexo Masculino 231 12.03 (11.77-12.29) 13.05 (12.76-13.34) +1.02 (0.82-1.21) Feminino 299 12.31 (12.05-12.59) 13.63 (13.33-13.93) +1.23 (1.10-1.55) Raça Brancos 294 12.18 (11.95-12.40) 13.43 (13.18-13.68) +1.26 (1.08-1.45) Não-brancos 140 12.29 (11.91-12.66) 13.22 (12.82-13.64) +0.98 (0.67-1.23) Todos 460 12.17 (11.98-12.36) 13.34 (13.13-13.50) +1.16 (1.02-1.31) 14

FIGURA 1 Frequência da magnitude da variação da PIO causada pela mudança postural sentada para supina. 15