ProvocAções Narrativas: Quem conta um conto, aumenta um ponto



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Redação do Site Inovação Tecnológica - 28/08/2009. Humanos aprimorados versus humanos comuns

Transcrição:

ProvocAções Narrativas: Quem conta um conto, aumenta um ponto Cláudia Roberta Ferreira Liana Arrais Seródio Campinas, São Paulo Brasil clauferreira72@gmail.com e liana@mpc.com.br Doutorandas pelo GEPEC Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Continuada no Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação UNICAMP e Professoras no Colégio de Aplicação Pio XII da PUC-Campinas Eixo: Formação de Educadores(as)

ProvocAções Narrativas: Quem conta um conto, aumenta um ponto Cláudia Roberta Ferreira Liana Arrais Seródio Iniciamos nosso artigo tomando por empréstimo um ditado popular muito comum entre brasileiros: Quem conta um conto, aumenta um ponto. E esta apropriação deve-se a uma das proposições e fundamentações teóricas do grupo de pesquisa do qual fazemos parte (GEPEC), que é o uso de narrativa como um possível instrumento de ensino e de pequisa na formação de professores(as). A breve narrativa que apresentaremos neste texto representa um ponto aumentado no conto outrora narrado. É uma nova história na passagem da história que contamos porque fomos provocadas pelo outro. Uma das atividades que o GEPEC tem realizado e da qual participamos é um círculo de estudos bakhtinianos. Nestes encontros-acontecimentos lemos, dialogamos, escrevemos e, daquilo que cada outro presente (mesmo ausente fisicamente) também lê, escreve e põe em diálogo, criamos significados e sentidos possíveis pelo sujeito que irrompe em nós dado nosso repertório pessoal (nossas experiências, concepções, representações etc.) na interação com esta multiplicidade de eus e outros. Somos seres de palavra dita e escrita e nos constituímos por palavras e, uma vez que elas têm dimensões alegóricas, mexem com nossos sentidos, nos tocam de alguma forma. Por isto, respondemos ao outro. E, nos provocamos mutuamente pelas nossas próprias escritas dos encontros-acontecimentos no círculo de estudos bakhtinianos, em movimento dialógico, nos formamos e formamos o outro. E assim, inicia o 'conto': Por Cláudia Ferreira 30 agosto 2010 Segundas com Bakhtin... viver a partir de si não significa viver para si, mas significa ser, a partir de si, responsavelmente participante... (BAKHTIN, 2010, p.108) e, por isso mesmo, implicado com e pelo outro. Então, quando penso na experiência de minha profissionalidade (e sua (re)constituição permanente dado nosso próprio inacabamento) e na opção por investigar o próprio trabalho como um dos dispositivos de formação profissional, compreendo que isto pode representar uma possibilidade de 'viver a vida responsavelmente participante'. Porque dialogicamente implicada em um eu para mim (sou o próprio autor contar de mim mesma naquilo que vivo), eu para o outro (sou o narrador narro para o outro, conto de mim para o outro) e outro para mim (incorporar naquilo que tenho como excedente em relação ao outro e do que ele excede em relação a mim, quando volto a expor isto tudo para mim mesmo). E isto na experiência de constituição da própria profissionalidade, bem como na da pesquisa sobre ela.

E quem lê o conto, aumenta um ponto e puxa fios para e de outras histórias... Por Liana 31 agosto/13 setembro 2010 Ainda tratando do tema do gosto musical. E do papel da coordenadora na escola. O que tem a ver um e outro? Não dá para esperar que os gostos sejam comuns até que se revertam em desejo de trabalho. É o caminho inverso, que o trabalho/estudo e a escuta/interpretação possibilitem um gosto. Para tratar de gosto musical ou de trabalho de coordenação pedagógica, ou da escolha de caminhos seja para onde se quiser ir, um saber é preciso: quem é esse ser, qual a visão de ser humano, temos? Para mim, talvez entre as maiores dificuldades com a filosofia bakhtiniana, esteja em lidar cientificamente com uma intuição que compartilhamos, como humanos: que outro-para-mim, eu-para-outro, eu-paramim são essência do Ser em ato do hombre en permanente interacción con sus semejantes mediante el lenguaje entendido como acto ético, como acción, como comunicación dinámica, como energeia (BUBNOVA, p.4 (100)). Isto é, à medida que converso com alguém vou percebendo pelo clima se o assunto é bem recebido, antes mesmo da resposta, confirmadas nas entrelinhas, gestos, silenciamentos, modo de falar e isso determina sua continuidade, se concordo ou não e a tempo para continuar ou encerrar a conversa. Desde este ponto de vista são vozes capazes de transmitir los sentidos de este diálogo ontológico posto que según Bajtín ser es comunicarse dialógicamente (BUBNOVA, p.4 (100)). Imagine que por falta de uso, por ojeriza a clima ruim, para evitar discussão, a conversa passa a não rolar : nós, seres falantes, deixamos de conversar. Sem essa prática, não há como nos desenvolvermos emocionalmente como esses seres humanos que somos nos últimos milhares de anos e que ainda não entendemos. Talvez evolua um outro mais descomplicado. Mas enquanto isso... Falar em três enfoques para explicar esse acontecimento, a tripla ótica, é falar do entendimento da herança genética da línguapensamento, segundo Bakhtin. É o outro que me constrói, me dá meu nome, minhas palavras, músicas e as metáforas, a polifonia que ressoa na corrente de sentidos da interação humana e sua identidade. São vozes construtoras e condutoras de sentidos nas enunciações que incitam respostas. Para forjar un nuevo sentido a partir de las voces ajenas nos involucramos en un proceso de compresión de lo que se dijo antes de nosotros, y tratamos de oír, anticipándola, la posible respuesta de nuestros interlocutores (BUBNOVA, p.6 (102-103)). Quando assumo perante os outros (e a escola, como professora que sou) um gosto musical, digo para mim e para o outro, quem sou; o que sou e o que o outro é, para mim. Sou o que outro vê quando me olha e como vejo o que ele vê de mim... E eu, nascida e formada nessa escuta e numa escola,

nesse olhar alheio, fico a representar o papel que suponho ser meu pelo prazer que sinto (ou a ira que provoco). Sendo professora de música, assumindo que o aluno é o centro para o qual se dirigem as propostas formativas produzidas de maneira a que venham a desenvolver autonomia na produção de conhecimento e criação artística, me esforço para lidar com uma realidade inadiável: a cultura que forma e se forma na linguagem, assim como o conceito triplo do Ser do Homem, tem em si as várias faces das expressões humanas. A Música é uma das formas de pensamento já que é linguagem 1, uma linguagem cujo signo é piú resistente, irridicibile, in questo senso, piú altro. Um segno che risponde a queste caratteristiche, com il suo relativo linguaggio, (...) che si sottrae all imperialismo della parola e che risulta quindi intrattabile da uma semiotica glottocentrica. 2 Mas para que serve, essa professora ter consciência dessa realidade para a escola e para a criança-aluno/a? Que a experiência musical é o que trará a consciência da linguagem musical. Intermediada por tudo o que atravessa o caminho, produz resistências, pelas condições das escolas e seu entorno. É nessa realidade que a professora de música vai se infiltrar e é nela que vai proporcionar uma vivência musical para cada aluno, mesmo que não aconteça ao mesmo tempo, no tempo das aulas, pois ser tocado estética e pessoalmente pelo fazer musical depende muito mais do que de uma possível organização do conteúdo específico e da maneira de disponibilizá-la. Não é linear, embora algumas condutas indiquem algumas lógicas. Como, por exemplo, a imersão na cultura (midiática, capitalista) na pré-adolescência sofre muito influência da televisão, que provocam conflitos entre as crianças e com a professora: que música escolher, o que fazer com ela etc., destilam amor ou ódio. Às vezes na mesma aula, o tempo é um fluir e refluir de sentido. Não há nenhum outro meio de comunicação em que a força do que já foi dito seja tão visível como a televisão, basicamente porque o que já foi dito ainda está sendo dito. (COLLINS, 1992, p. 333) A não tradutibilidade da Música tem levado à interdisciplinaridade e ao trabalho coletivo na maioria das visões sobre seu uso. Um caminho alternativo poderoso. Só que pode desviar a escuta. Tem muitos outros no caminho. Esta é somente parte do que compõe o(s) meu(s) gosto(s) por determinada(s) música(s), mas nesse momento é a escolha que quero e posso expressar. Sei disso pela capacidade de me ver diante dos valores que valorizei e me esforcei para conquistar, de modo que eu e os outros olhemos para mim e digamos: essas condutas são Belas, combinam com o que admiro e quero manter em mim, para que quando alguém me olhar, possa ver essas qualidades e se/me identifique. Como resultado possível, talvez aproxime-se e nos façamos companhia, quiçá, juntos, ampliemos o mundo. É imaginando como serei para o outro (como quando na frente de um espelho experimento o drama de escolher a roupa para um encontro, ou escolhendo uma música para o natal que vem chegando), extrapolando o que 1 Tanto quanto é linguagem aquela desenvolvida pelos bosquímanos ou hotentotes juntamente com o seu povo, bem próxima da extinção. Para saber mais, consulte <http://www.survival.es>. Acessado em 17/09/2010. 2 PONZIO, Augusto. Tesi per il futuro anteriore della semiotica. Documento disponível em pdf. S.d.

eu vejo para imaginar o que o outro vê de mim, dou ao outro aquilo que ele vê de si, o que é provavelmente ilusão, que eu veja do outro o que ele mesmo não vê; que eu saiba de segredos que nunca poderei saber a não ser que o outro me diga ou se me mostre ostensivamente. E aí sei que mesmo num ato ostensivo há outras faces. Para o outro, que vai sentir o clima no que escuta/vê/sente do que eu digo/gesticulo/expresso, vai surgir uma ideia de quem sou, mas nesse momento já não sou só o que eu digo; o que sou se mistura no que o outro passou a ser para si, diante do que percebe em mim o que ele é de si para mim, numa sucessão de momentos singulares e polissêmicos, porque geradores de sentidos. Novamente, a que leva ter consciência dessa realidade? Que a igualdade que não há entre nós, que nos distingue, nos assemelha, que não podemos ser mais ou menos e sim maismenos no mesmo mundo das coisas que nos rodeiam e nos invadem. Quando alguém espera que eu conheça todas as músicas, já que sou professora de música, digo logo quais minhas escolhas, coloco uma barreira, uma defesa: prefiro admitir o que pode se passar como uma falha profissional do que entrar no mérito dos diversos outros gostos. Algo para o que o senso comum tem uma ótima saída e nem Kant desconsiderou totalmente: gosto não se discute, se objetiva. Claro que o que mais se discute é justamente questão de gosto, de escolha, de preferência, de identificação, que tem tudo a ver com o hábito, a geografia, a história, que fundamenta e se fundamenta nas lógicas da cultura. No outroparamim, no quê o outromedá. Indicio, nessa escolha, meus conhecimentos, valores e preferências estéticas. E completo com uma visão da formação profissional como algo em contínuo movimento. Que tem na coordenadora pedagógica, uma profissional que atua como especialista na escola básica brasileira, muito mais que uma baliza, uma confidente que inspira confiança. Alguém em quem meu gosto, assim indic(i)ado satisfaz a um tempo a trilogia, a trifonia, a trifocal (re)flex(aç)ão polifônica ressonante no outroparamim, no euparaooutro, no euparamim. Um euparamim que Ora é condescendente, ora carrasco, Ora ambos ao mesmo tempo. Porque não há tempo nesse lugar. Um euparaquem me enfeito ou enfeio E me vê ou nem. Que me eleva ou arrasa num só Olhar que é delemeu. De um outroparamim Que altera o euparamim Me fazendo outrademim Na confluência das linguagens. Lógica narrativa da palavra-signo-pensamento.

Na música só há música. Então é a cultura que se deve e vai, aos poucos, se modificar, alterando as relações na alteração das relações, como diria Maturana (1998, p.27) a linguagem é um domínio de coordenações consensuais de condutas de coordenações consensuais de condutas.... Daí a importância de sujeitos instituintes (SOLIGO, 2008) na coordenação do trabalho pedagógico na e da Escola, que possibilitem não a disputa, mas a construção. Não é fácil, mas sujeitos instituintes não procuram a facilidade. A(s) música(s), na sua materialidade instaurada no presente da escuta carrega toda uma complexidade (fios sonoros tramados com ideologia) que tinge os ouvidos. Transforma movimentos, imagens, lembranças, estados de alma por meio de padrões re-conhecidos portanto existentes. Lida com o contexto ideológico interno e externo sem passar por limites dos signos conceituais verbais. Passa a ser valorada esteticamente como produto ou obra de arte. Daí a importância de uma coordenação pedagógica instituinte. Utopia e arte. Pontos que contam e ampliam o mundo... E deixam brechas... fios a puxar em novas-outras histórias. Por Cláudia Ferreira 04 outubro 2010 Pensando com e através Bakhtin apoio-me em alguns pensares-e-fazeres e em um exercício exotópico, me possibilito (na verdade, tento...) ir além. Ir além em outras-novas histórias cujos sentidos podem ser vários, entretanto, dada certas condições de produção, não podem e não são quaisquer um. E assim, provocado pelo outro, irrompem sentidos que vão se produzindo nos entremeios, nas articulações das múltiplas sensibilidades, sensações, emoções e sentimentos dos sujeitos que se constituem como tais nas interações. (SMOLKA, 2004, p.45). Quem conta um conto, aumenta um ponto e revela um amálgama entre os escritos, os pensados e os ditos, possibilitando encontro(s)- acontecimento(s) que tem relação com a história de vida do outro. Um outro que conta outro conto e adensa a experiência de puxar fios dos muitos emaranhados nas histórias contadas e, na relação com seus outros, entretecem-nos produzindo sua próprias histórias. E assim, A história vai ganhando muitos fios que podem ou não serem tecidos, rompidos, arrematados, e com isso atinge seu objetivo principal que é capturar a atenção do outro. Dessa

forma o narrador, envolve-se com a história, com ele mesmo e com os sujeitos outros, (re)memorando fatos, (re)construindo acontecimentos, interagindo coletivamente com todos que estão na escuta. A cada desfecho, o narrador resgata algo valioso, seja individual ou coletivamente, que pode ter sido esquecido, (re)significando-o de acordo com a sua conveniência, ou seja, por meio da narrativa o narrador tem a possibilidade de desconstruir uma experiência e reconstruí-la. (FERREIRA et al, 2008, p.19). Neste emaranhado, exercitamos nosso pensamento, o disponibilizamos ao(s) outro(s) e por causa das interlocuções possíveis, visíveis e invisíveis... e hipervisíveis, e diante do exercício reflexivo realizado, nos formamos e formamos. Um fio de pensamento Que tece palavras, frases, textos Tece Sentidos... falas, escritas, produções, Um fio de pensamento Sempre na eminência de partir, de unir-se a outros pensamentos, Outros significados... De transformar-se em outros fios. Adriana Ofretorio, 2008 Referências Bibliográficas BAKHTIN, Mikhail M. Estética da criação verbal. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes, 2003. BAKHTIN, Mikhail M. Para uma filosofia do ato responsável. (Trad. Valdemir Miotello e Carlos Alberto Faraco). São Carlos: Pedro & João Editores, 2010. BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. Primeira edição em russo: 1979. Introdução e tradução do russo: Paulo Bezerra. Prefácio à edição francesa: Tvetan Todorov. Primeira edição brasileira: 1992. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003. BENJAMIN, Walter. O narrador: considerações sobre a obra de Nikolai Leskov. In Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. Trad.: Sérgio Rouanet. 7. ed. São Paulo: Brasiliense, 1994. (Obras escolhidas, v.1). p.197-221. BRAIT, Beth. (Org.). Bakhtin: conceitos-chave. 4. ed. São Paulo: Contexto, 2008. BUBNOVA, Tatiana. Voz, sentido y diálogo en Bajtín. In Acta Poetica 27 (1), PRIMAVERA, 2006. p.97-114. FERREIRA, Cláudia R. Pensando com e através de Bakhtin. Campinas. 30 agosto 2010. Notas prévias. FERREIRA, Cláudia R. Pensando com e através de Bakhtin. Campinas. 04 outubro 2010. Notas prévias. FERREIRA, Cláudia R.; MARTIN, Adriana Ofretorio de O.; MONTEIRO, Francisca P. T; PRADO, Guilherme do Val Toledo; UNTALER, Lindomar de

Oliveira; MUNHOZ, Lucianna Magri de M. Narrativa na Formação de Professores: Costuras e Misturas. 2008. Campinas. Notas prévias. MATURANA, Humberto. Emoções e linguagem na educação e na política. Belo Horizonte: UFMG, 1998. PONZIO, Augusto. A revolução bakhtiniana: o pensamento de Bakhtin e a ideologia contemporânea. (Coord. e Trad. Valdemir Miotello). São Paulo: Contexto, 2008. PONZIO, Augusto. Tesi per il futuro anteriore della semiótica. Programa di ricerca della Scuola de Bari-Lecce. Disponível em: <http://www.augustoponzio.com/letture%20in%20rete/tesi%20per%20il%20fut uro%20anteriore.pdf>. Acessado em: 23 nov. 2010. SERODIO, Liana A. Uma questão de gosto. Campinas. 16 agosto 2010. Notas prévias. SERODIO, Liana A. É tudo questão de gosto? Campinas. 30 agosto 2010. Notas prévias. SERODIO, Liana A. É tudo questão de gosto? Campinas. 13 setembro 2010. Notas prévias. SMOLKA, A. L. B. Sentido e significação. Parte A sobre significação e sentido: uma contribuição à proposta de Rede de Significações. In: ROSSETTI- FERREIRA, M. C. (Org.). Rede de Significações e o estudo do desenvolvimento humano. Porto Alegre: Artmed, 2004. p.35-49. SOLIGO, Rosaura Angélica. Quem forma quem? - Instituição de sujeitos. 2007. Dissertação (Mestrado em Educação). Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas, Campinas-SP, Brasil.