Lapa, 07 de fevereiro de 2015. Versusiano que luta valorize o saber popular Conhecimento, experiência e amadurecimento pessoal e consequentemente profissional, me tornando um ser humano mais humano foi a minha frase inicial da vivencia, no primeiro dia, durante a abertura. O início do projeto foi muito tocante, uma vez que fui a única acadêmica de Odontologia participante, e pretendo levar para o colegas de classe o amor pelo SUS, a vontade de lutar e se manter na militância por um sistema melhor em prol do coletivo. O VER-SUS através da inserção de alunos da graduação nos mecanismos do SUS, busca incentivar a formação de trabalhadores para o sistema, ou seja, comprometidos com os princípios, dispostos a lutar e a defender o direito do povo, se tornando multiplicadores do saber. Nos dias seguintes, sábado e domingo, os versusianos estiveram reunidos em roda de conversa com alguns convidados para debater assuntos variados, dentre os quais, formação sobre a cidade da Lapa, tendo um panorama da área territorial, da distribuição dos serviços, entre outros. Também tivemos um debate sobre a história do Assentamento, tendo a fala de um dos representantes, o qual relatou que a comunidade existe à 16 anos, usam da agroecologia como forma de renda e de sobrevivência, sendo uma cultura em que o alimento não é visto como mercadoria e sim como um bem disponível ao ser humano. Os moradores do local vivem de forma organizada e coletiva, realizam o puxirão quando necessário, trabalham em núcleos e fazem parte de uma cooperativa, além disso oferecem no assentamento, educação desde a pré escola até a graduação, entretanto existe uma dificuldade de manter a população jovem no campo, ocorrendo o êxodo rural mesmo com todas as condições necessárias para viver com qualidade longe da cidade. Percebi um detalhe que me fez pensar em como viver a partir da experiência da vivencia, em relação a organização e coletividade, uma vez que, o grupo tinha horário para cumprir (café, almoço e jante), além de manter a limpeza do local, sendo as tarefas distribuídas entre os participantes. Ainda sobre o assentamento, a saúde é algo primordial e valorizada na comunidade, uma vez que, uma das assentadas tem voz ativa no Conselho Municipal de Saúde, além disso, o local recebe medico periodicamente, entretanto a comunidade alimenta a fé sobre o saber popular, realizando técnicas de bioenergia, homeopatia, acupuntura,
entre outros métodos alternativos que também resultam em saúde e mantem a tradição local, fato que é valorizado pelo Ver-Sus. Sobre a saúde, tivemos uma discussão sobre a saúde pública em foco e a privatização da saúde, enfatizando que a saúde deve ser vista como direito humano, entretanto a tendência atual é de enfraquecer a saúde pública e fortalecer a privada, fato que deve ser debatido e principalmente entendido como questão de desrespeito ao cidadão, e este deve ter o empoderamento de lutar pelos seus direitos e realizar suas escolhas. Finalizando, os dias de debates fortaleceram ainda mais os movimentos estudantis, a busca pelos direitos, a valorização do saber popular, a abolição de pré conceitos, a aceitação do próximo, a educação continuada como forma de evolução, ou seja, deve-se sempre ouvir o sujeito, não desconsiderando o saber do outro. Durante a semana, o grupo de 32 pessoas, foi dividido em três grupos menores para cumprir os cronograma de visitas aos diversos setores de saúde da Lapa e ao final do dia, todos se reuniam novamente para expor os achados diários e debater sobre os mais variados assuntos pontuados. No primeiro dia de visita, a equipe em que eu estava alocada se dirigiu até uma comunidade no interior para visitar a unidade de saúde, entretanto o território físico é uma antiga escola que serve de local para consulta medica, não tendo estrutura adequada e sendo mantida pela população local. O medico se mostrou ter uma formação mais humanizada, buscando exercer ações de prevenção e promoção de saúde, entretanto mesmo com todo o esforço pessoal, a unidade de saúde não realiza puericultura e pré-natal, sendo um ponto negativo, pois a população deve se deslocar até o centro da cidade para a realização dos mesmos. Finalizando a fala, o médico disse Nós somos felizes com o que nós temos), mostrando que sua formação é voltada para o bem do próximo, pela busca de saúde digna. Ainda neste dia, o grupo foi convidado a participar de uma reunião do Conselho Municipal de Saúde, no qual notou-se uma organização e representantes dos mais variados setores. Na terça-feira visitamos uma unidade de saúde alocada numa comunidade quilombola e tivemos a oportunidade de conversar com representantes da comunidade numa reunião de aproximadamente 40 pessoas, as quais levantaram como pontos de necessidade a presença de mais agentes comunitários de saúde, maior agenciamento de transporte, falta de manutenção da unidade, ausência de equipe odontológica e necessidade
uma creche visto que muitas mães trabalham na região metropolitana e não tem suporte para cuidado dos seus filhos, entretanto esta comunidade também se mostrou muito solidaria, além de fazer o uso dos saberes tradicionais e terem como forte marco a crença na religião. Na quarta-feira, o grupo visitou uma unidade de saúde localizada num bairro periférico da cidade e também a Vigilância Epidemiológica, assim que entramos na unidade percebemos a falta de acesso à cadeirantes, pois o local possui apenas escadas e caso alguém necessite de uma rampa deve dar uma volta maior, também notamos que o local possui um consultório odontológico desativado pois a rede de energia elétrica não possui capacidade de atender a demanda dos aparelhos, ou seja, não tem equipe odontológica porque não tem condição de trabalho devido a falta de energia, fato que os pacientes relataram ser muito triste pois os mesmos precisam se deslocar a outro bairro para receber atendimento. A proposta previamente combinada era que seriam realizadas visitas domiciliares, entretanto as mesmas só ocorrem no período da tarde, então a equipe decidiu participar do grupo de hiperdia que estava sendo realizado, entretanto, na teoria se chama grupo mas na pratica a interação entre profissionais e pacientes através de troca de informações não existe, pois o paciente realizava exames básico e retirava a medicação, devido a este acontecimentos os viventes enfatizaram a importância de um espaço informativo-terapêutico, de forma a aproveitar a reunião dos usuários. Ainda no período da manhã, visitamos um grupo de ciganos que estava alocado ao lado da unidade de saúde, e de forma interativa tivemos uma pequena conversa a respeito da cultura, do modo de vida e do acesso aos serviços de saúde, os quais nos expuseram situações de preconceito vivenciados na área da saúde, o que nos fez pensar na necessidade de uma formação dos profissionais da saúde sobre os princípios do SUS, enfatizando a Universalização do cuidado. No período da tarde durante a visita à Vigilância Epidemiológica, uma vez que, produção de alimento e ambiente de trabalho também produzem saúde, enquanto o grupo ficou na roda de conversa com as funcionárias, eu e mais uma versusiana, fomos realizar uma visita juntamente com uma equipe da vigilância, e a comunidade visitada era composta por aproximadamente vinte famílias que formam uma agro cooperativa, das quais, sete trabalham na confecção de produtos caseiros que são vendidos nas proximidades. A visita foi
muito interessante, uma vez que, é conferida a procedência dos alimentos, modo de armazenagem, manipulação, validade, estrutura física do local, formação e capacitação profissional, limpeza e organização, entre outros fatores que de forma unificada resultam em produção de saúde para os consumidores. Na sequência da programação da semana, visitamos a UPA, Clinica Odontológica e Clinica da Mulher, sendo que no período da manhã fomos recepcionados na UPA por dois enfermeiros e um técnico, e através de uma roda de conversa com resultados muito satisfatórios, sai com esperanças de um SUS melhor e com a certeza de que existem profissionais capazes de mudar o mundo através do amor pela saúde. Os profissionais com os quais conversamos, se mostraram em busca e aperfeiçoamento do humanismo, tornando um lugar de agitação e doença, em saúde e bem estar, através da formação de equipe voltada para o acolhimento, para a atenção e o cuidado com o usuário. A UPA é uma conquista recente do município, oferecendo serviços de urgência e emergência, além de consular clinicas quando necessárias. Um dos fatos interessantes é a rotatividade de profissionais, principalmente de médicos, não favorecendo a criação de vínculos, uma vez que, a UPA difere-se da ESF por não oferecer cuidado continuo. O local possui estrutura física ideal, com um ambulância que pode funcionar como UTI móvel devido ao investimento e cuidado por parte dos enfermeiros, entretanto um problema detectado foi o uso do serviço por meio dos usuários como unidade básica (atenção primária), ou seja, o pacientes procuram o local para consultas de baixa complexidade ou em busca de tratamento continuado, os quais são ofertados pela ESF e evitam a lotação da urgência e emergência. Finalizando o dia, cheguei a conclusão que trabalhar com humanização e o bem estar do próximo é essencial a qualquer lugar que faz saúde, tornando o ambiente um transmissor de paz. Finalizando a semana, a proposta foi de uma devolutiva à cidade, e através de uma mística realizamos um debate proveitoso e muito construtivo, onde foram selecionadas palavras chaves para expor a condição de saúde do município, dentre as quais, pode-se enfatizar as estruturas físicas adequadas e inadequadas que encontramos pelo caminho, o caráter profissional, humanizado ou não, a medicalização principalmente no campo e consumo excessivo de psicotrópicos, a forte organização e coletividade das comunidades visitadas, o esquecimento e a não valorização dos
conhecimentos tradicionais e dos saberes populares, a forte presença e disseminação das doenças crônicas não transmissíveis, a importância das agentes comunitárias de saúde como um elo entre unidade de saúde e população, a necessidade de educação continuada dos profissionais de saúde pensando na ética e no bem estar do próximo, o inicio da formação de redes intermunicipais como ponte de ligação e fornecedora de benefícios para o usuário, o êxodo rural e a não valorização do morador do campo, a agroecologia como projeto de vida, entre outros pontos destacados que foram expostos a população, usuários e gestores do SUS presentes na devolutiva. No sábado, também realizamos uma devolutiva para o MST, contamos sobre os preconceitos que existiam antes da vivencia, elogiamos a organização da comunidade e enfatizamos que levaremos isso como modelo de vida para o futuro, agradecemos por todo o acolhimento e por nos mostrarem o quão lindo e prazeroso é trabalhar no campo e fazer da agroecologia um exemplo de saúde e amor pela terra, desta forma elaboramos uma carta que pode ser lida a seguir: Somos todos SEM-TERRA! Nós, viventes do projeto VER-SUS (Vivência e Estágio na Realidade do SUS) e o Coletivo InspiraSUS organizadores da vivência na Lapa 2015, realizamos uma carta sobre algumas considerações que não poderíamos deixar de compartilhar, que segue abaixo: Gratidão é a palavra chave! Aceitar um grupo de pessoas dispostas a conhecer, a buscar e amadurecer, é um desafio grande e que foi aceito de peito aberto pelo MST. Durante os oitos dias em que o grupo esteve alojado no Assentamento do Contestado, discutiu-se saúde em todos os sentidos, abrangendo saber popular, organização, preconceito, representatividade, identidade, agroecologia e tantos outros paradigmas que compõem o fazer saúde da forma mais digna e ideal para a comunidade, acreditando na fé e na tradição que é mantida ao longos de anos de luta. Aprendemos aqui a não julgar antes de conhecer, aprendemos a respeitar a opinião alheia e fazer dela um disparador de discussão visando melhorias para o coletivo, abrindo mão de certos confortos individualistas. Levamos da vivência a possibilidade de se livrar dos ideais capitalistas impregnados na cultura atual, acreditando que é possível garantir o direito a qualquer cidadão, de terra, saúde, acessibilidade, e tantos outros que dizem respeito a garantia dos direitos humanos, e que podemos acreditar em um mundo melhor. Os olhares da vivência revelaram que a memória e a identidade se fazem presente em todos os agregados do movimento, passando de geração em geração através do equilíbrio de pensamentos coletivos e em prol do bem alheio. Deixamos aqui uma sugestão: que tal nos unirmos e fortalecermos ainda mais a representatividade e continuarmos na luta pela valorização do nossa diversidade de saberes, trabalhos e das diversas histórias que nos compõem, nunca desistirmos da militância e assim como pudemos aprender com o MST que completou 30 anos de movimento e resistência? Que pena que passamos por pouco tempo, mas que bom que o tempo vivido foi suficiente para tocar em cada coração, em cada pensamento e em cada discussão, formando seres humanos e profissionais organizados, dispostos a observar, apontar e solucionar problemas. E finalmente, nosso mais singelo obrigado por acolherem 32 olhares, 32 curiosos e 32
apaixonados pela saúde, pela terra e pela luta, nós somos um coletivo e buscamos pelos mesmos ideais. Atenciosamente, Ver-Sus Lapa, 07 de fevereiro de 2015. Meu eterno agradecimento por poder me apaixonar pelo SUS! Atenciosamente, Ana Elisa Ribeiro
São memórias, bons momentos! Roda de conversa formação para melhor entender o SUS
Amizades do VER-SUS para a vida! Reunião do Conselho Municipal de Saúde Melancia orgânica Conhecendo a Agroecologia e um modelo de vida
Sala Odontológica desabilitada por falta de suporte de energia elétrica Sempre juntos, sempre conversando, sempre questionando, sempre ajudando!
Visita à uma comunidade juntamente com a equipe de Vigilância Epidemiológica Devolutiva para a cidadã da Lapa Teatro Municipal Assentamento do Contestado Lapa PR
Misticas uma inspiração para inspirar!
Uma família chamada VER-SUS!