GISELE GOTARDI DE OLIVEIRA ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO NOS DISTÚRBIOS DE VOZ

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Transcrição:

GISELE GOTARDI DE OLIVEIRA ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO NOS DISTÚRBIOS DE VOZ Tese apresentada à Universidade Federal de São Paulo Escola Paulista de Medicina, para obtenção do Título de Doutor em Ciências São Paulo 2009

GISELE GOTARDI DE OLIVEIRA ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO NOS DISTÚRBIOS DA VOZ Tese apresentada à Universidade Federal de São Paulo Escola Paulista de Medicina, para obtenção do Título de Doutor em Ciências Orientadora: Profa Dra Mara Behlau Co-orientadora: Profa Dra Latife Yazigi São Paulo 2009

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO ESCOLA PAULISTA DE MEDICINA DISTÚRBIOS DA COMUNICAÇÃO HUMANA Chefe do Departamento: Profa Dra Maria Cecília Martinelli Iório Coordenadora do Curso de Pós-graduação: Profa Dra Brasília Maria Chiari iii

GISELE GOTARDI DE OLIVEIRA ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO NOS DISTÚRBIOS DA VOZ Presidente da banca: Profa Dra Mara Behlau BANCA EXAMINADORA Profa Dra Adriana Campos Balieiro Panico Profa Dra Anna Elisa de Villemor-Amaral Profa Dra Iára Bittante de Oliveira Profa Dra Maria Aparecida Bernardo Cavalcanti Coelho Suplentes Profa Dra Ingrid Gielow Profa Dra Elisabete Carrara-De Angelis iv

Agradecimentos Quantas letras digitadas que foram imediatamente apagadas, quantas palavras escritas que foram excluídas em seguida, quantas frases completas que foram eliminadas, na tentativa de expressar o sentimento tão sincero e forte que tenho pela minha admirada e venerada tutora de graduação, mestre, parceira e amiga, Profa Dra Mara Behlau. Mesmo que eu tente, nunca vou conseguir agradecê-la por tudo o que representa para mim, por toda a transformação que promoveu em minha vida, por compartilhar comigo sem restrições seu conhecimento, carinho, apoio, sucesso e tudo mais que humanamente pôde! Quero agradecê-la por representar a pessoa que me modelou como profissional e que me conduziu no caminho da excelência! A ela todo meu reconhecimento e reverência eternos! À Profa Dra Brasília Chiari por fazer parte da minha formação acadêmica desde a graduação e por me acompanhar com seriedade e nobreza na pós-graduação. À Profa Dra Latife Yazigi por me auxiliar a percorrer uma área desconhecida com paciência e doçura. À Profa Dra Ruth Epstein e ao Prof Dr Shashivadan Hirani pela orientação e suporte essenciais para a execução desse trabalho. Ao Prof Dr Euro Barros por todo o auxílio na análise estatística da pesquisa. Aos queridos bolsistas Sayuri Tutya, Felipe Moreti, Camila Saúda, Letícia Pifaia, Maíra Padilha, Mariana Alves, Jéssica Kim, Clara Rocha e em especial, à Sabrina Mazzer Paes e Luana Curti, que sempre tão dispostos, com um sorriso estampado no rosto, me ajudaram em tudo o que solicitei, principalmente com as infindas referências! Eles realmente fazem da nossa vida no CEV um paraíso! Às amigas Ana Cláudia Guerrieri e Fabiana Zambon pela amizade sincera e pela imensa ajuda no encaminhamento de participantes para a pesquisa. Às queridas Valéria Oliveira e Maria Aparecida dos Santos por estarem sempre prontas a ajudar-me e por viabilizarem o meu dia-a-dia no CEV. A todos os amigos e colegas que me ajudaram no desafio da coleta. Aos alunos do CECEV por serem o meu estímulo para buscar o conhecimento. Às companheiras fonoaudiólogas da pós-graduação: Anna Alice Almeida, Sylvia Leão, Marina Lang e Kelly Park por todo conhecimento e momentos compartilhados. v

Às grandes amigas: Miriam Moraes, Marina Padovani e Glaucya Madazio e Rosiane Yamasaki pela amizade e por compartilhar comigo o que de melhor cada uma delas tem. Ao meu irmão Francis, meu porto seguro, por ser minha força e segurança nos momentos mais difíceis da minha vida e minha alegria nos momentos gostosos que compartilhamos juntos. Por substituir em minha vida a presença de um grande homem que se foi! A ele minha gratidão e admiração infinitas! Aos meus pais, Antonio e Ivanilde por seu amor e cuidado incondicionais, e pelo apoio firme que me faz lutar sempre pelos meus sonhos. À minha família e aos agregados, em especial a minha vózinha, por compartilharem o amor sublime da união de grandes amigos. Ao meu querido Rodrigo, meu anjo na terra, por aparecer na minha vida durante o processo de execução do meu doutorado e me ajudar em tantas atividades essenciais: na confecção dos protocolos eletrônicos de avaliação, na compreensão dos dados numéricos e no manuseio do obscuro Excel. Minha gratidão a ele, por passar os intermináveis finais de semana estudando comigo e acima de tudo, por me permitir viver um amor completo que eu não sabia que podia existir. vi

Sumário Agradecimentos... v Lista de Tabelas... viii Resumo... x 1 INTRODUÇÃO... 1 1.1 Objetivos... 6 2 CONSIDERAÇÕES GERAIS... 7 3 LITERATURA... 17 4 MÉTODOS... 20 5 RESULTADOS... 30 6 DISCUSSÃO... 44 7 CONCLUSÕES... 57 8 ANEXOS... 58 9 REFERÊNCIAS... 64 Abstract Bibliografia consultada vii

Lista de Tabelas Tabela 1 - Caracterização do grupo com e sem queixa vocal de acordo com a idade (anos), tabagismo (anos) e etilismo (anos)... 20 Tabela 2 - Caracterização do grupo com e sem queixa vocal de acordo com a distribuição do sexo e estado geral de saúde auto-referido... 21 Tabela 3 - Distribuição numérica e percentual do tipo de queixa no grupo com queixa vocal... 22 Tabela 4 - Distribuição numérica e percentual de sintomas fonatórios e laringofaríngeos de acordo com o grupo com e sem queixa vocal... 23 Tabela 5 - Média, desvio-padrão e valores mínimo e máximo de sintomas fonatórios e laringo-faríngeos de acordo com o grupo com e sem queixa vocal... 23 Tabela 6 - Distribuição numérica e percentual da auto-avaliação vocal de acordo com o grupo com e sem queixa vocal... 24 Tabela 7 - Média, desvio-padrão e distribuição numérica e percentual da análise perceptivo-auditiva de acordo o grau de desvio vocal presente na tarefa de fala, para o grupo com e sem queixa vocal... 25 Tabela 8 - Escore total do Protocolo de Estratégias de Enfrentamento nas Disfonias PEED de acordo com o sexo, para os grupos com e sem queixa vocal... 32 Tabela 9 - Distribuição numérica e percentual dos itens do Protocolo de Estratégias de Enfrentamento nas Disfonias PEED, de acordo com a escala de frequência de respostas, para os grupos com e sem queixa vocal... 33 Tabela 10 - Distribuição numérica e percentual da ocorrência das respostas dos itens do Protocolo de Estratégias de Enfrentamento nas Disfonias PEED de acordo com o grupo com e sem queixa vocal... 34 Tabela 11 - Análise perceptivo-auditiva da voz e escore total do Protocolo de Estratégias de Enfrentamento nas Disfonias PEED, de acordo com a autoavaliação vocal, para os grupos com e sem queixa vocal... 38 Tabela 12 - Tipo de queixa de acordo com o número de sintomas e os escores do Protocolo de Estratégias de Enfrentamento nas Disfonias PEED, para o grupo com queixa vocal... 39 viii

Tabela 13 - Escores do Inventário de Depressão de Beck, da Escala de Autoestima de Rosenberg, do Inventário de Ansiedade Traço-Estado, da Escala Multidimensional de Lócus de Controle de Levenson de acordo com o grupo com e sem queixa vocal... 40 Tabela 14 - Correlações dos escores do Protocolo de Estratégias de Enfrentamento nas Disfonias - PEED, análise perceptivo-auditiva e escalas de depressão, ansiedade, autoestima e lócus de controle para os grupos com e sem queixa vocal... 41 ix

RESUMO Objetivos: O objetivo do presente estudo é pesquisar estratégias de enfrentamento em indivíduos com queixa vocal e verificar a relação dos tipos de estratégias com queixa vocal e sintomas vocais, auto-avaliação da voz, análise perceptivo-auditiva, assim como estados de ansiedade, depressão e aspectos relacionados a lócus de controle e autoestima. Métodos: Participaram 178 indivíduos, distribuídos em dois grupos: com e sem queixa vocal. O grupo com queixa vocal foi composto por 87 indivíduos adultos brasileiros, 19 homens e 68 mulheres, com idade média de 34,1 anos. O grupo sem queixa vocal teve 91 indivíduos adultos brasileiros, 29 homens e 62 mulheres, com idade média de 32,4 anos. Os indivíduos foram solicitados a realizar os seguintes procedimentos: questionário de identificação e caracterização, auto-avaliação vocal, análise perceptivo-auditiva, Protocolo de Estratégias de Enfrentamento na Disfonias - PEED, Escala de Autoestima de Rosenberg, Inventário de Depressão de Beck BDI, Inventário de Ansiedade Traço-Estado - IDATE e Escala Multidimensional de Lócus de Controle de Levenson. Para adaptação cultural o PEED foi administrado a 14 pacientes que não fizeram parte da composição final da amostra. A faixa etária (p=0,219) e a distribuição do sexo (p=0,132) de ambos os grupos foram estatisticamente semelhantes. A média de sintomas do grupo com queixa foi 6,28 e do grupo sem queixa 1,27. Os sintomas mais relatados pelo grupo com queixa foi rouquidão (81,6%), fadiga vocal (67,8%), pigarro e garganta seca (57,5). Já os sintomas mais relatados pelo grupo sem queixa foi rinite (26,4%), azia (20,9%) e coceira na garganta (18,7%). O tipo de queixa mais freqüente apresentou-se relacionado com modificações na qualidade vocal natural ou habitual (73,6%). De acordo com os resultados de autoavaliação, os grupos apresentaram diferenças estatisticamente significantes, sendo que o grupo com queixa vocal apresentou maior ocorrência de voz razoável (46%). Quanto à análise perceptivo-auditiva, houve diferença estatisticamente significante entre os grupos nas duas tarefas de fala, tanto para as médias como para o grau de desvio, com exceção do grau leve na tarefa de vogal sustentada. Resultados: Os escores do PEED foram estatisticamente diferentes nos dois grupos (Escore do grupo com queixa 51,86; do grupo sem queixa 23,18 - p<0,001), e sem diferença entre os sexos. Os indivíduos com queixa vocal referem utilizar mais estratégias com foco no problema (63,6%). De acordo com as escalas de avaliação dos estados de ansiedade, depressão e aspectos relacionados a lócus de controle e autoestima, os grupos não apresentaram escores estatisticamente diferentes. O escore médio para o grupo com queixa do BDI foi 7,71; da Escala de Autoestima foi 6,63; do Inventário de Ansiedadeestado foi 41,55 e de Ansiedade-traço foi 42,20, da Escala Multidimensional de Lócus de Controle de Levenson externo-acaso foi 27,97; externo-poderosos 29,56 e Interno 18,20. No grupo com queixa vocal o PEED apresentou correlação positiva com a análise perceptivo-auditiva dos números (p=0,036), os escores do BDI (p=0,006) e do Inventário de Ansiedade Estado (p=0,022); e negativa com o lócus de controle externoacaso (p=0,001) e externo-poderosos (p=0,001). A análise de componentes principais das respostas do PEED do grupo de indivíduos com queixa de voz gerou 4 subescalas: busca de informação, suporte sócio-emocional, fuga-evitação e auto-controle. Conclusões: Indivíduos com queixa vocal usam estratégias de enfrentamento variadas, em particular estratégias com foco no problema. O enfrentamento de um distúrbio de voz se correlaciona positivamente com a avaliação clínica da voz, com aspectos de depressão e ansiedade estado, e negativamente com lócus de controle externo-acaso e externo-poderoso. O protocolo brasileiro proposto apresenta 10 itens e quatro subescalas: busca de informação, suporte sócio-emocional, fuga-evitação e auto-controle. x

1 INTRODUÇÃO O impacto de uma alteração de voz na vida de um indivíduo tem sido estudado sob as mais variadas perspectivas e sabe-se que as implicações da disfonia vão muito além de uma simples restrição vocal; desta forma, um problema de voz pode limitar desde a expressão inteligível de uma mensagem até comprometer sua participação em atividades sociais e profissionais (Epstein et al. 2008; Morrison, Rammage, 1994). Ajustes de adaptação são necessários, em maior ou menor grau, para que se possa lidar com um distúrbio vocal e controlar o estresse produzido por tal condição. As formas pelas quais pacientes enfrentam seu problema de saúde produzem conseqüências que influenciam a evolução do quadro e o resultado de seu tratamento (Epstein, 1998). O modo pelo qual uma pessoa lida com situações estressantes em sua vida é chamado enfrentamento e, embora tal aspecto tenha sido pesquisado em diversos problemas de saúde, na área da comunicação humana e particularmente nos distúrbios da voz, o conhecimento é ainda muito limitado. Alterações vocais geralmente indicam condições benignas e podem ser transitórias, sendo que em documento recente (Schwartz et al., 2009) a AAO-HNSF (American Academy of Otolaryngology - Head and Neck Surgery Foundation) ressalta que pelo menos um terço da população americana apresentará rouquidão em algum momento na vida. Contudo, uma alteração de voz pode ser prolongada e exigir diagnóstico, tratamento e produzir uma série de modificações comportamentais. Os termos rouquidão, disfonia e distúrbio da voz, embora sejam algumas vezes utilizados de forma intercambiável, têm significado diferente: rouquidão é um sintoma; disfonia um diagnóstico; e, distúrbio de voz um transtorno da comunicação oral, no qual a voz não desempenha sua função para conduzir a mensagem verbal e emocional de um indivíduo (Behlau et al., 2001). Desta maneira, no presente texto, optou-se por utilizar o termo distúrbio de voz, para indicar uma condição vocal que merece um diagnóstico e pode aparecer em qualquer idade, do nascimento à senescência. Indivíduos com distúrbios vocais apresentam dificuldades de se comunicar com interlocutores distintos e em diversas situações sendo que, como conseqüência podem apresentar uma redução em seu bem-estar e qualidade de vida, e podem gerar implicações tais como isolamento social, depressão, perda de dias de trabalho, gastos financeiros, entre outros (Schwartz et

2 al., 2009). Portanto, o enfrentamento desse problema de saúde torna-se fundamental no processo de adaptação do indivíduo à condição apresentada. Traduzido para o português brasileiro o termo inglês coping, significa enfrentamento e é definido como esforços cognitivos e comportamentais, que podem ser compostos por pensamentos e ações, direcionados para lidar com demandas externas ou internas de um evento estressante específico que esteja excedendo ou sobrecarregando os recursos de adaptação do indivíduo (Lazarus, Folkman, 1984; Folkman, 1984; Folkman, Lazarus, 1985, Folkman, Lazarus et al., 1986; Lazarus, 1993, 1998). O enfrentamento é tido como um processo de adaptação a um evento estressante, e não como um objetivo, sendo que os ajustes que acompanham o estresse podem ser de natureza emocional, biomecânica, fisiológica, cognitiva e comportamental (Baum, 1990; Lipp, 2003; Taylor, Stanton, 2007). Nos últimos anos houve um aumento no número de pesquisas sobre esse assunto nas áreas da ciência social e comportamental, medicina, saúde pública, enfermagem e outras. O panorama dessas pesquisas é bastante diverso, envolvendo desde estudos com amostras muito pequenas até experimentos com população de grande escala, além de estudos que exploram tanto relações teóricas como ensaios clínicos (Coyne, Racioppo, 2000). Muitos pesquisadores se envolveram nessas investigações com a esperança de que o conceito de enfrentamento pudesse explicar porquê alguns indivíduos se dão bem melhor que outros quando se deparam com eventos estressantes de sua vida (Folkman, Moskowitz, 2004). Alguns outros aspectos como cultura, história de desenvolvimento ou personalidade também podem ajudar a explicar essas diferenças individuais, contudo, o enfrentamento se diferencia desses outros aspectos, pois pode ser utilizado em determinadas intervenções, como as terapias cognitivas. Portanto, sua importância se dá não somente por sua relação com a variabilidade de resposta ao estresse, mas também por ser um instrumento de tratamento (Carver et al., 1989; O'Brien, DeLongis, 1996; Suls, David,1996; Fierro-Hernández, Rodríguez; 2002; Connor-Smith, Flachsbart; 2007). A literatura na área de enfrentamento é ampla e controversa, com diferentes modelos teóricos, propostas de classificações e instrumentos de medidas. O conhecimento fundamental é que o processo de enfrentamento é complexo e multidimensional, sensível ao ambiente e às características de personalidade (Bolger, 1990; Folkman, Moskowitz, 2000a; Folkman, Moskowitz, 2004; Connor-Smith, Flachsbart, 2007).

3 Existem diversas classificações das estratégias de enfrentamento, entretanto a maioria das propostas diferencia as de natureza ativa das de natureza passiva. As estratégias de natureza ativa são dirigidas para a resolução do problema e as de natureza passiva são esforços para evitar o problema em si. O marco histórico nesta área foi o desenvolvimento da teoria cognitiva de estresse e enfrentamento de Lazarus e Folkman (1984). Nessa teoria o enfrentamento é considerado um fator estabilizante que pode auxiliar na manutenção dos ajustes psicossociais durante períodos difíceis da vida, para que o bem-estar do indivíduo seja preservado. Um desequilíbrio no bem-estar pode levar ao desenvolvimento de certos transtornos, como depressão, ansiedade, baixa autoestima e fazer com que o indivíduo não tenha um desempenho adequado na sociedade. A teoria cognitiva de Lazarus e Folkman (1984) classifica o enfrentamento em estratégias com enfoque no problema, que são os esforços para modificação da fonte de estresse, e estratégias com enfoque na emoção, que são as tentativas de regulação do estresse emocional causado pelo agente estressor. Embora a maior parte dos fatores estressantes conduza à utilização dos dois tipos de estratégias de enfrentamento, as que focam o problema tendem a predominar quando as pessoas sentem que algo produtivo pode ser feito e as que focam a emoção tendem a predominar quando o indivíduo sente que algo deve ser suportado (Folkman et al., 1986). O controle do evento estressante e de suas conseqüências são fatores decisivos no enfrentamento (Holahan, Moos, 1987; Carver et al.,1989; David, Suls, 1999; Hagger, Orbell, 2003). Tendo em vista o valor do controle do evento no enfrentamento, é importante compreendê-lo em determinadas doenças sob a óptica do lócus de controle, que é a crença que o indivíduo tem de quem ou o que exerce controle sobre os acontecimentos de sua vida (Levenson, 1973). Estudos mostram que a intervenção psicológica pode trazer benefícios no tratamento do estresse, embora também apontem para o fato de que ainda se deve buscar uma compreensão melhor sobre a aplicação de determinadas estratégias de enfrentamento nos diferentes problemas de saúde (Coyne, Racioppo, 2000; Antoni et al., 2001; Ridder, Schreurs, 2001; Cruess et al., 2002; Chesney et al., 2003; Roberts et al., 2006). Outro aspecto importante que deve ser levado em consideração no estudo do enfrentamento é o papel da cultura. Dentro de uma determinada cultura certos tipos de estratégias são mais ou menos efetivas para a promoção do bem-estar emocional e abordagem de problemas que causam estresse, sendo que essa informação pode

4 também ser utilizada para o desenvolvimento de intervenções (Folkman, Moskowitz, 2004). A literatura sobre o assunto não apresenta pesquisas multicêntricas com amostras de diferentes países, contudo há alguns estudos que comparam diferentes grupos étnicos em uma mesma sociedade (Anderson et al., 2009; Côté et al., 2009). Essas pesquisas apresentam desenhos distintos e utilizam instrumentos de avaliação diversos, de modo que os achados produzidos por elas são variados e os resultados tornam-se muitas vezes incomparáveis. A capacidade para o enfrentamento de doenças tem recebido maior atenção na última década, quando se buscou entender os tipos de estratégias utilizadas por indivíduos com doenças crônicas como SIDA, diabete, câncer, asma, doenças cardiovasculares, dor crônica e artrite reumatóide, e suas relações com outras características de comportamento, personalidade ou fatores ambientais. Uma revisão sistemática dessas pesquisas permitiu identificar que estes pacientes são inclinados a utilizar estratégias com foco na emoção para tentar reduzir o impacto negativo causado pela doença; contudo, tais estratégias parecem ser menos ajustáveis em longo prazo que as estratégias focadas no problema (Ridder, Schreurs, 2001; Chesney et al., 2003). A intervenção psicológica pode ser uma ferramenta para a modificação dessas estratégias pouco adaptadas. O reconhecimento dos problemas enfrentados pelo paciente e a seleção das melhores estratégias para lidar com a doença e suas conseqüências, podem contribuir para o desenvolvimento de habilidades auto-reguladoras (Antoni et al., 2001; Ridder, Schreurs, 2001; Cruess et al., 2002; Chesney et al., 2003; Tuncay et al., 2008). A literatura sobre enfrentamento nos distúrbios de voz teve seu foco inicial no efeito das emoções sobre a voz (Moses, 1948; Bloch, 1965; Brodnitz, 1976; Aronson, 1990) e não no efeito de uma alteração vocal nas emoções e no papel do enfrentamento. A comunicação e a linguagem têm uma função importante na adaptação e integração familiar, social e profissional (Bury, 1991). Portanto, parece plausível que a maneira como indivíduos enfrentam seu problema vocal pode influenciar o resultado do tratamento. Ainda não se compreende muito bem quais as estratégias que os indivíduos disfônicos utilizam para enfrentar sua alteração de voz, assim como qual o papel da reabilitação fonoaudiológica na modificação das estratégias a fim de aperfeiçoar o resultado do tratamento. Estudos sugerem que o estresse esteja presente em certas populações de indivíduos com distúrbios vocais ou até mesmo que ele seja a causa. A voz reflete não

5 somente a personalidade do indivíduo, mas também o seu estado emocional (Moses, 1956; Aronson, 1990; Coelho et al. 1996; Roy, Bless, 2000). Desta forma, algumas mudanças e alterações na voz podem ser entendidas como uma reação ao estresse emocional (Bauer, 1991; Coelho, 1996; Seifert, Kollbrunner, 2005; Dietrich et al., 2008). Pesquisas indicam que a maior parte das alterações vocais tem certo componente psicológico e pode resultar em mudanças no bem-estar do indivíduo, na sua identidade pessoal e na sua autoestima (Aronson, 1990). A pesquisa pioneira que investigou o enfrentamento nas disfonias realizada por Epstein (1998), buscou caracterizar as estratégias de enfrentamento utilizadas por indivíduos com disfonia espasmódica e disfonia por tensão muscular. Os achados desse trabalho foram utilizados na elaboração de um protocolo que avalia as estratégias de enfrentamento nos distúrbios vocais (Epstein et al., 2008), o único instrumento de avaliação do enfrentamento nas disfonias. Deste modo, no presente estudo optou-se por investigar a influência de certos traços pessoais ou situacionais, como depressão, autoestima, ansiedade e lócus de controle no enfrentamento dos distúrbios de voz (Endler, Parker, 1990). Embora a literatura seja escassa sobre o assunto, alguns estudos investigaram o papel desses correlatos na disfonia (Coelho et al., 1996; Goldman et al., 1996; Roy et al., 2000; Seifert, Kollbrunner, 2005; Taira, Behlau, 2008; Dietrich et al., 2008; Almeida, 2009; Almeida et al., 2009). Tendo em vista as informações limitadas sobre o processo de enfrentamento de indivíduos com distúrbios vocais, a proposta no presente estudo é investigar os recursos utilizados por indivíduos brasileiros com queixa vocal e explorar as relações com características vocais, auto-avaliação da voz e análise clínica perceptivo-auditiva, assim como com os estados de depressão, ansiedade e aspectos relacionados a autoestima e lócus de controle.

6 1.1 Objetivo O objetivo do presente estudo é pesquisar estratégias de enfrentamento em indivíduos com queixa vocal e verificar a relação entre os tipos de estratégias, queixa vocal, sintomas vocais, auto-avaliação da voz, análise perceptivo-auditiva, assim como estados de depressão, ansiedade e aspectos relacionados a autoestima e lócus de controle.

2 CONSIDERAÇÕES GERAIS O presente capítulo foi incluído com o objetivo de apresentar um panorama sobre o tema enfrentamento, conceito pouco explorado na área dos distúrbios da comunicação. Portanto, o texto não caracteriza uma revisão de literatura e sim uma exposição resumida para favorecer a leitura de fonoaudiólogos. O capítulo compõe-se dos itens seguintes: notas históricas sobre o enfrentamento; o conceito de estresse; as respostas fisiológicas ao estresse; estresse, bem-estar psicológico, estados de ansiedade, depressão, aspectos relacionados a lócus de controle e autoestima e distúrbios de voz; a teoria cognitiva de estresse e enfrentamento de Lazarus e Folkman; diferentes classificações de enfrentamento; o enfrentamento e a cultura; e, o papel do enfrentamento na intervenção terapêutica. 7 1. Notas históricas sobre o enfrentamento As pesquisas sobre enfrentamento foram iniciadas com o objetivo de desenvolver um conceito que permitisse explicar a razão pela qual alguns indivíduos tem melhores resultados que outros quando submetidos ao estresse. Esse tema vem sendo pesquisado desde o século passado (Vaillant, 1994). A concepção de enfrentamento como sendo uma característica estável e relativamente contínua foi se transformando ao longo dos anos de pesquisas e o enfrentamento passou a ser reconhecido como o comportamento utilizado em resposta a situações específicas de estresse e não como uma característica permanente de personalidade (Lazarus, 1993; Antoniazzi et al., 1998). Lazarus, Folkman (1984) conceberam a teoria cognitiva de estresse e enfrentamento, na qual o enfrentamento é descrito como um processo dinâmico que se modifica ao longo do tempo, e o estresse como a relação dinâmica e bidirecional entre a pessoa e o ambiente. O conceito dos processos de enfrentamento é um aspecto central das teorias modernas de estresse (Holahan, Moos, 1987). 2. O conceito de estresse Uma das primeiras definições de estresse foi proposta por Hans Selye, em 1936, um médico endocrinologista que estudou extensivamente o assunto. O autor define estresse como toda resposta não específica a qualquer demanda sobre o corpo (Selye,

8 1982). Lipp (2003), outra pesquisadora sobre o assunto, define o estresse como uma resposta de adaptação e defesa a todo acometimento que perturbe o equilíbrio homeostático do organismo, independente da natureza do evento: interna ou externa, física ou química, psíquica ou social (Lipp, 2003). Qualquer mudança que ocorra na vida de uma pessoa produz estresse, que por sua vez gera efeitos tanto positivos como negativos, sendo que a tolerância a situações estressantes varia de indivíduo para indivíduo (Savóia, 1999). Quando o estresse aumenta o desempenho, é considerado positivo e chamado de eustresse ; quando produz efeitos demasiados, altera a capacidade do indivíduo de se relacionar com o ambiente, é considerado negativo e chamado de distresse. O estresse caracteriza-se por eventos ou pensamentos que podem causar perigo, impor ameaças ou desafios e exigem mais que adaptações rotineiras para remover ou reduzir as pressões geradas. Ele está associado a uma variedade de conseqüências negativas, como depressão, ansiedade, sintomas físicos, doenças e, em alguns casos, até morte (Folkman, Moskowitz, 2000b). A forma pela qual as pessoas avaliam ou lidam com situações estressantes pode também influenciar no tempo de duração do estresse (Baum, 1990). 2.1 Respostas fisiológicas ao estresse O estado de ansiedade produzido por um evento estressante é uma reação temporária acompanhada de apreensão, nervosismo e preocupação, que intensifica a atividade do sistema nervoso autônomo, o qual controla as funções neurovegetativas por meio das vias simpática e parassimpática. O estresse promove um estado de estimulação central, além de modificar o metabolismo e a neurotransmissão sináptica. A ativação do eixo hipotalâmico-pituitário-adrenal leva à produção de corticosteróides, necessários para mobilizar energia. O sistema nervoso simpático ativado vai estimular a secreção de adrenalina e noradrenalina por meio da supra-renal, produzindo mudanças sistêmicas no organismo, como o aumento da freqüência cardíaca e da pressão sanguínea, dilatação da pupila, entre outros, o que caracteriza a reação de luta ou fuga. A reação de luta ou fuga é uma resposta reflexa do organismo a qualquer ameaça que desestabilize o seu equilíbrio. A fuga está geralmente associada ao medo e a luta à raiva (Cannon, 1914). Embora em curto-prazo essas mudanças sejam protetoras, uma ativação crônica pode

9 afetar de modo negativo a saúde mental e física ao longo do tempo, por exemplo, depressão e doenças infecciosas, respectivamente. Se esse estímulo estressante for persistente, alterações mais intensas podem ocorrer como a diminuição da resistência às infecções, atraso da cicatrização, inibição de anticorpos, do número de leucócitos e de alguns hormônios (Cannon, 1914; Medeiros, Peniche, 2006; Taylor, Stanton, 2007). Além da etapa biológica sobre a qual o indivíduo não tem controle, o estresse tem outra fase em que ocorre a participação de funções cognitivas, emocionais e comportamentais, na qual o enfrentamento tem o papel de promover o equilíbrio orgânico e emocional (Lorencetti, Simonetti, 2005; Medeiros, Peniche, 2006; Taylor, Stanton, 2007). 2.2 Estresse, bem-estar psicológico, estados de ansiedade, depressão, aspectos relacionados a lócus de controle e autoestima, e distúrbios de voz De maneira geral, se reconhece que os efeitos de um problema de voz na vida de um indivíduo são difusos e não se restringem apenas a uma limitação vocal (Morrison, Ramage, 1994). Um dos aspectos a ser considerado na vigência de um distúrbio de voz no dia-a-dia do indivíduo é o seu bem-estar emocional. Nesta seção são discutidas algumas das questões que surgem quando se aborda o impacto de uma alteração de voz no bem-estar do indivíduo e a influência dos estados de depressão, ansiedade e aspectos relacionados a autoestima e lócus de controle. Conceitualmente, o bem-estar psicológico é descrito de diferentes maneiras. Um dos conceitos propostos na literatura define o bem-estar psicológico como a busca da excelência pessoal, e não a busca de prazer, como motivação central da existência e é determinado pela interação entre as oportunidades e as condições de vida, de acordo com a maneira como as pessoas organizam o conhecimento sobre si e sobre os outros, e mediante as formas como respondem às demandas pessoais e sociais (Keyes et al., 2002; Queroz, Néri, 2005). Pouco se sabe sobre o papel das dimensões do contexto social no estresse, no enfrentamento e nos ajustes utilizados; entretanto, ao longo dos anos tornou-se cada vez maior o reconhecimento de que fatores interpessoais também influenciam quase todos os aspectos desse processo, incluindo a avaliação de eventos estressantes, a seleção e a eficácia de estratégias de enfrentamento e o impacto do estresse no bem-estar psicológico

10 do indivíduo. Portanto, fatores situacionais e pessoais apresentam um papel importante na determinação do enfrentamento (Endler, Parker, 1990; O'Brien, DeLongis, 1996). Uma das formas de avaliar o bem-estar psicológico é diagnosticar alguns quadros clínicos, como depressão ou ansiedade. Geralmente, a aplicação de protocolos de autoavaliação não é considerada adequada para a realização do diagnóstico clínico desses transtornos (Newman et al., 1996). Apesar disso, a maioria dos estudos emprega este método para investigar o bem-estar psicológico (Creed, 1990). Nas duas últimas décadas, pesquisas na área de voz têm permitido conhecer, com maior profundidade, a influência da personalidade e de problemas psicológicos no desenvolvimento de certos distúrbios vocais, e também de que forma os distúrbios vocais produzem alterações psicológicas e modificações na expressão da personalidade e emoções. Além de expressar a personalidade, a voz também reflete diretamente o estado emocional do indivíduo, logo, eventos estressantes vão causar modificações na produção da voz (Coelho, 2002; Seifert, Kollbrunner, 2005; Almeida, 2009, Almeida et al., 2009). A depressão tem sido um dos focos de pesquisas sobre o bem-estar psicológico do indivíduo com problema vocal, sendo que a depressão discreta parece ser uma condição comum em pacientes disfônicos (Aronson, 1990). Contudo, ainda não está claro se o quadro de disfonia é a condição inicial ou se é a depressão (Scott et al., 1997). A ansiedade também tem sido pesquisada e alguns estudos revelam que a ansiedade excessiva é a característica psicológica mais comum nos distúrbios vocais (Aronson, 1990; Butcher et al., 1993). A literatura também apresenta o efeito da intervenção vocal sobre a ansiedade em pacientes disfônicos (Brodnitz, 1969; Koufman, Blalock, 1982). Tais pesquisas mostram que a maioria dos pacientes (90-95%) responde bem ao tratamento, tanto em relação aos sintomas vocais como aos de ansiedade. Em outro estudo foi observado que mulheres com nódulos apresentaram mais ansiedade e queixas somáticas, e mulheres com disfonia hiperfuncional mais estresse e também mais queixas somáticas quando comparadas a mulheres com voz saudável (Goldman et al., 1996). Aparentemente, disfônicos conferem maior importância a eventos estressantes que pessoas com voz saudável, como foi observado em um estudo brasileiro que investigou a relação entre ansiedade, estresse, eventos de vida, padrões de comportamento e distúrbios de voz (Coelho et al., 1996). Possivelmente o estresse, a ansiedade e a depressão podem fazer parte do perfil de um conjunto de pacientes com alterações vocais; contudo, é evidente que fatores

11 individuais anatômicos, fisiológicos, de personalidade, entre outros, também estejam envolvidos nesses distúrbios (Dietrich et al., 2008). A autoestima também é um aspecto do bem-estar psicológico que pode ser influenciado por uma alteração vocal, principalmente se a voz representa uma das fontes principais de autoestima da pessoa, como nos casos de profissionais da voz (Rose net al., 2005). A literatura sobre o bem-estar psicológico de pacientes com problemas de voz apresenta resultados contraditórios (Scott et al., 1997; Deary et al., 2003), provavelmente, porque nessas pesquisas tenham sido utilizadas diferentes medidas psicométricas como instrumento de avaliação. Alguns estudos que investigaram doenças crônicas indicam que o impacto de uma desvantagem no bem-estar psicológico é mediado por diversos fatores psicológicos e sociais (Cassileth et al., 1984), tais como o enfrentamento (Newman et al., 1996). O lócus de controle é a crença que o indivíduo tem de quem ou o que exerce controle sobre sua vida. Refere-se à extensão com a qual o indivíduo acredita que pode controlar os acontecimentos de sua vida (Levenson, 1973; Dela Coleta, 1987). Sabe-se que as estratégias de enfrentamento utilizadas perante um evento estressante dependem da percepção que o indivíduo tem sobre o controle da situação (Hagger, Orbell, 2003). Quando a pessoa percebe que as situações de estresse são controláveis, tendem a predominar estratégias de adaptação (David, Suls, 1999; Hagger, Orbell, 2003). A literatura mostra que pessoas que apresentam escores elevados de lócus de controle interno, as quais acreditam que os acontecimentos são resultados de seu comportamento e ações, têm níveis mais elevados de bem-estar psicológico (Newman et al., 1996) e utilizam mais estratégias de enfrentamento diretas e menos tentativas de supressão, ao passo que indivíduos com lócus de controle externo apresentam o padrão oposto (Holahan, Moos, 1987; Carver et al., 1989). Um estudo pioneiro no Brasil investigou a relação entre lócus de controle e distúrbios vocais (Taira, Behlau, 2008) por meio da Escala Multidimensional de Lócus de Controle de Levenson, em 68 indivíduos com alteração de voz e 77 indivíduos com voz saudável. Os achados mostraram que não houve associação direta entre os dois aspectos pesquisados, contudo, disfônicos pareceram ser menos suscetíveis a fatores externo-poderosos e se deixam permear por fatores externo-acaso.

12 A competência e a eficiência autopercebidas pelo indivíduo para o manejo de determinadas situações o fazem sentir-se capaz de lidar efetivamente com questões relacionadas a sua saúde (Folkman, Moskowitz, 2004). Este conceito pode ser um prognosticador importante do resultado de tratamento de distúrbios vocais. 3. A teoria cognitiva de estresse e enfrentamento de Lazarus e Folkman A formulação da teoria cognitiva de estresse e enfrentamento de Lazarus e Folkman permitiu ampliar os limites do enfrentamento e realçar o papel da avaliação cognitiva na formatação da resposta ao estresse que é iniciada em um ambiente emocional. Uma das primeiras tarefas do enfrentamento é diminuir as emoções negativas (Folkman, Moskowitz, 2004). Essa concepção valoriza as diferenças individuais, o contexto da situação específica, a noção de processo, e o caráter flexível do enfrentamento, dando menos destaque para estilos pessoais (Lazarus, 1993; Seidl et al., 2001). Enfrentamento consiste em esforços cognitivos e comportamentais para controlar, reduzir ou tolerar demandas internas ou externas geradas por uma situação estressante (Folkman, Lazarus, 1985). As duas grandes funções do enfrentamento são regulação das emoções por meio de estratégias com foco na emoção e administração do problema que está causando a angústia, por meio de estratégias com foco no problema. O controle da situação apresenta um papel muito importante nos processos de avaliação e seleção das estratégias (Folkman, 1984; Folkman, Lazarus, 1985; Folkman et al., 1986b). Tal teoria identifica dois processos distintos como mediadores das relações estressantes entre o indivíduo e o ambiente: a avaliação cognitiva do evento e o enfrentamento em si. O processo de avaliação cognitiva determina o significado de um evento e é dividido em duas partes: avaliação primária, na qual a pessoa avalia a importância e o risco que o evento representa para o seu bem-estar, e a avaliação secundária, por meio da qual o indivíduo avalia seus recursos de enfrentamento e suas opções. Ao passo que na avaliação primária o indivíduo analisa a significância do evento estressante, na secundária ele analisa o quanto o evento é controlável e quais são suas habilidades para enfrentá-lo (Folkman, 1984; Folkman, Lazarus, 1985; Folkman et al., 1986b).

13 As pessoas utilizam o enfrentamento de uma maneira complexa, combinando as estratégias com foco no problema e na emoção em cada um dos estágios do acontecimento estressante. Diferentes estratégias podem ser utilizadas ao mesmo tempo para o manejo de uma situação estressora específica, portanto elas não são excludentes. Um indivíduo pode inicialmente negar certo acontecimento de sua vida e mais tarde, resolver lidar ativamente sobre o problema (Folkman, Lazarus, 1985; Antoniazzi et al., 1998; Seidl et al., 2001; Folkman, Moskowitz, 2004). Essa teoria se diferencia das abordagens relacionadas aos traços de personalidade, pois valoriza o contexto psicológico e ambiental. Na abordagem relacionada ao traço de personalidade, assume-se que o enfrentamento é primariamente uma propriedade da pessoa e variações na situação estressante têm pouca importância (Folkman et al., 1986a; Folkman et al., 1986b). 4. Diferentes propostas de classificações de enfrentamento A classificação de enfrentamento da teoria apresentada acima é uma das mais aplicadas na psicologia e se baseia no foco da estratégia, contudo, há outras propostas de classificação de enfrentamento na literatura. Uma delas classifica as estratégias de enfrentamento em padrões diretos e indiretos, sendo que as de padrão direto estão relacionadas à solução do problema com ações dirigidas às demandas, e as de padrão indireto incluem estratégias que não modificam as demandas, mas alteram a forma pela qual a demanda é vivida (Lorecetti, Simonetti, 2005). Essas últimas estratégias são utilizadas, sobretudo em situações que não podem ser resolvidas e incluem mecanismos de negação, repressão, isolamento ou fuga. Outra classificação divide o enfrentamento em estratégias de natureza ativa, direcionadas ao confronto do problema e estratégias de natureza passiva, direcionadas à redução da tensão causada pelo fator estressante. As estratégias de natureza ativa moderam a influência adversa dos eventos negativos no funcionamento psicológico e estão associadas à redução de depressão. As estratégias de natureza passiva mostram associação com estresse psicológico (Holahan, Moos, 1987).

14 5. O enfrentamento e a cultura A cultura também é um aspecto que foi pesquisado no processo de enfrentamento, porém os dados sobre esse assunto ainda são escassos e merecem maior exploração. Estudos que investigaram estratégias de enfrentamento em populações de diferentes nacionalidades observaram diversas semelhanças e diferenças, que podem ser justificadas por causa das diversidades culturais (Savóia et al., 1996). Shaw et al. (1997) compararam estratégias de enfrentamento de familiares cuidadores de pacientes com Alzheimer na China e nos EUA. Quatro estratégias de enfrentamento foram consistentes para ambos os grupos: confronto comportamental, distanciamento/suporte social, confronto cognitivo e distanciamento cognitivo. Os participantes chineses apresentaram menos sintomas de depressão e ansiedade que os americanos. Embora as estratégias tenham sido parecidas, alguns aspectos parecem reduzir o impacto psicológico no cuidador chinês, como ideais culturais que promovem a dependência familiar, veneração aos membros mais velhos da família e aceitação de regras familiares. Um estudo que comparou relatos de enfrentamento de crianças tailandesas e americanas com idade entre 6 e 14 anos permitiu verificar que, embora várias semelhanças tenham sido observadas entre elas, houve também evidência da influência de aspectos culturais nas estratégias relatadas, sugerindo que o contexto sociocultural seja crucial para a compreensão do enfrentamento na infância (Olah, 1995). Os resultados apóiam o desenvolvimento de um modelo de enfrentamento, no qual há interação de características culturais e dos estressores, sendo que as diferenças sociais provavelmente apareçam em situações nas quais regras e normas são evidentes (McCarty et al., 1999). Uma motivação importante para o estudo do enfrentamento é a crença de que, em certa cultura, determinadas formas de enfrentamento vão ser mais ou menos efetivas na promoção do bem-estar emocional e no manejo dos problemas que causam estresse, sendo que tal informação pode ser utilizada no desenvolvimento de intervenções para ajudar pessoas a lidar, de forma mais efetiva, com o estresse em suas vidas (Folkman, Moskowitz, 2004).

15 6. O papel do enfrentamento na intervenção terapêutica Estratégias de enfrentamento podem oferecer um ponto potencial na intervenção terapêutica por estarem ligadas ao funcionamento psicológico (Holahan, Moos, 1987; Coyne, Racioppo, 2000; Ridder, Schreurs, 2001; Folkman, Moskowitz, 2004). Contudo, para modificar a tendência de um indivíduo no uso dessas estratégias, é necessário conhecer o contexto individual e do ambiente em que elas ocorrem (Cruess et al., 2002). Apesar do grande número de pesquisas realizadas para a compreensão dos processos e recursos de enfrentamento, ainda não se sabe muito bem como transformálos em estratégias para intervenções psicológicas, nem como o enfrentamento afeta os resultados psicológicos, fisiológicos e comportamentais tanto em curto como em longo prazo (Folkman, Moskowitz, 2004). Contudo, a literatura mostra que a intervenção para a mudança de estratégias de enfrentamento inadequadas pode incluir o suporte social, informações sobre estratégias de enfrentamento específicas ou o ato de firmar um compromisso de mudança (Coyne, Racioppo, 2000). O objetivo comum de quase todas as intervenções comportamental-cognitivas é afastar o indivíduo de estratégias que não promovam adaptação e levá-lo a utilizar as que são adequadas para a modificação psicológica do estresse (Cruess et al., 2002). No enfrentamento de doenças crônicas, os pacientes são particularmente inclinados a usar estratégias com foco na emoção para reduzir o efeito causado por ela. Contudo, tais estratégias em longo prazo mostram-se menos adaptadas que aquelas com foco no problema, sendo que o tratamento psicológico pode ser um instrumento para modificar essas estratégias (Ridder, Schreurs, 2001). De acordo com dados da literatura, as estratégias de enfrentamento podem, ou não, produzir ajustes ou adaptações na vida do indivíduo (Chesney et al., 2003). As estratégias que promovem adaptações ocorrem quando há um ajuste entre a escolha do tipo de enfrentamento e a reversibilidade da situação estressante. As estratégias que não promovem ajustes são aquelas que ocorrem quando a pessoa responde a eventos estressantes passíveis de modificação por meio de estratégias com foco na emoção ou quando responde a eventos que não podem ser modificados por meio de estratégias com foco no problema (Strentz, Auerbach, 1988; Vitaliano et al., 1990). Quando as estratégias não são apropriadas as pessoas, apresentam mais sintomas psicológicos, do que quando são adequadas (Park et al., 2001).

16 A capacidade de enfrentar com adequação uma doença crônica, por exemplo, a SIDA, é influenciada por diversos fatores psicossociais, como isolamento social, depressão, ansiedade e outros (Folkman, Moskowitz, 2000b). Os novos avanços na pesquisa do enfrentamento apontam para a ocorrência simultânea de estados psicológicos positivos e negativos, e reconhecem a importância de encorajar os processos de enfrentamento que suportam estados psicológicos positivos no contexto do estresse (Folkman, 1997; Chesney et al., 2003).

17 3 REVISÃO DA LITERATURA McHugh-Munier et al. (1997) exploraram a relação entre enfrentamento, personalidade e voz em mulheres com nódulos ou pólipos, utilizando um questionário de identificação (circunstâncias na época do início da disfonia, história médica e vocal, uso de voz, profissão, condições de trabalho, ambiente familiar e estilo de vida), a análise acústica, o Coping Index COP-I, o Personality Index PERS-I. Eles observaram que os pacientes usam mais estratégias com foco na emoção, além de uma correlação entre enfrentamento e personalidade com a qualidade vocal. Os autores acreditam que, fundamentados nos achados dessa pesquisa, a terapia vocal deve abordar não somente os aspectos comportamentais e laríngeos, mas também os emocionais, sociais e o estilo de vida dos pacientes. Epstein (1998) realizou uma pesquisa para investigar o impacto de injeções de toxina botulínica em 40 pacientes com disfonia espasmódica adutora DEA. Para comparação, um grupo de 40 indivíduos com disfonia funcional também participou da pesquisa. Foram realizados os procedimentos seguintes: Análise perceptivo-auditiva; Voice Disability Questionnaire; Inventário de Depressão de Beck; da Escala de Autoestima de Rosenberg, do Inventário de Ansiedade Traço-Estado; da Escala Multidimensional de Lócus de Controle de Levenson; Interview Schedule for Social Interaction, auto-avaliação da expectativa com relação ao tratamento e por fim o Voice Impairment Coping Questionnaire. Cinco componentes foram derivados do Voice Impairment Coping Questionnaire: evitação física, busca de informação, comparação social/distração, busca de novo significado e religião/pensamento positivo. Os resultados do estudo confirmam o papel mediador do enfrentamento entre o processo de doença e o resultado do tratamento. Deary et al. (2003) realizaram uma pesquisa com 204 indivíduos que apresentavam rouquidão como queixa primária, e exploraram aspectos de auto-avaliação vocal, análise perceptivo-auditiva, análise acústica e sua correlação com personalidade e enfrentamento, afeto e somatização. Para avaliação dos aspectos de personalidade e enfrentamento foram utilizados o Eysenck Personality Questionnaire-Revised, o Toronto Alexthyimia Scale-20 e o Coping with Health Injuries and Problems. O afeto e somatização foram avaliados por meio do Clinical Interview Schedule-Revised (CIS-R) e a escala de somatização do DNM-III-R. Os resultados mostraram que a auto-avaliação da voz esteve

18 relacionada com a personalidade, enfrentamento e medidas clínicas. Os indivíduos que referiram mais problemas de voz apresentaram maior neuroticismo e alexitimia, mais estresse psicológico, pior qualidade de vida, mais sintomas médicos no passado e tiveram uma tendência a usar mais estratégias com foco na emoção. Jong et al. (2003) pesquisaram fatores de manutenção e estratégias de enfrentamento em um grupo de professores com problemas persistentes de voz. Os aspectos de enfrentamento foram avaliados por um psicólogo que utilizou o Psychological Cascade Model. Eles observaram que a maioria dos pacientes que estava na fase inicial da evolução da doença apresentou uma combinação de dois tipos de enfrentamento: externalização e falta de conscientização, como o principal fator de risco para essa população. Os autores mencionam que a cronicidade difere do que é crônico, porque, ao passo que a cronicidade é composta por uma combinação de fatores que mantêm o distúrbio e fatores de enfrentamento (emocional, físico e sócio-emocional), o crônico se refere simplesmente à duração da doença. Epstein et al. (2008) desenvolveram o VDCQ (Voice Disability Coping Questionnaire), um instrumento que permite avaliar as estratégias de enfrentamento utilizadas por indivíduos disfônicos. O VDCQ foi construído apoiado em respostas de entrevistas com pacientes disfônicos, escalas de avaliação de estratégias de enfrentamento existentes e estratégias específicas sugeridas por um grupo de fonoaudiólogos e otorrinolaringologistas especialistas. Para validação do VDCQ, aplicaram o questionário em 40 indivíduos com disfonia espasmódica de adução - DEA e em 40 com disfonia por tensão muscular - DTM. Foram utilizadas escalas adicionais: Voice Disability Questionnaire, Escala de Lócus de Controle, Inventário de Depressão de Beck, Inventário de Estado-Traço Ansiedade de Spielberg e a Escala de Autoestima. As respostas aos itens do questionário VDCQ foram submetidas à Análise de Componentes Principais com rotação oblíqua para investigar o componente latente da estrutura do questionário e como um mecanismo de redução, para refinar a medição dos componentes. A Análise de Componentes Principais gerou quatro subescalas de enfrentamento medidas por meio de 15 itens: suporte social, enfrentamento passivo, evitação e busca de informação. Os achados indicam que as estratégias de enfrentamento passivo e evitação podem estar associadas a piores resultados. Evitação também mostrou relação com estado depressivo, o que reforça a conclusão de que resultados negativos estejam associados a essa estratégia. A terapia de voz poderia, portanto, abordar estratégias de enfrentamento