ANAIS DO II SEMINÁRIO SOBRE GÊNERO: Os 10 anos da lei Maria da Penha e os desafios das políticas públicas transversais

Documentos relacionados
ANAIS DO II SEMINÁRIO SOBRE GÊNERO: Os 10 anos da lei Maria da Penha e os desafios das políticas públicas transversais

Módulo ABORDAGEM EM SITUAÇÕES DE VIOLÊNCIA. Unidade: 2 - Violência doméstica

OBJETIVO: Apresentar e discutir o fenômeno da violência doméstica.

PANORAMA DA VIOLÊNCIA CONTRA MULHER NO RIO GRANDE DO SUL. BLANK, Dionis Mauri Penning¹; TADEU, Silney Alves². 1. INTRODUÇÃO

Violência doméstica e familiar contra a mulher em Manaus: análise dos casos atendidos pelo Projeto Ronda Maria da Penha.

LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL

Lei Maria da Penha completa 12 anos em agosto, porém, políticas públicas ainda são ineficientes e muitas cidades

Direito Penal. Lei nº /2006. Violência doméstica e Familiar contra a Mulher. Parte 1. Prof.ª Maria Cristina

SESSÃO DA TARDE PENAL E PROCESSO PENAL Lei Maria da Penha. Professor: Rodrigo J. Capobianco

ÁREA TEMÁTICA: GÊNERO E SUBJETIVIDADE MULHERES VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA: DISCUTINDO AS RELAÇÕES CONJUGAIS

FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ CENTRO DE PESQUISAS AGGEU MAGALHÃES - CPqAM DEPARTAMENTO DE SAÚDE COLETIVA NESC

3. Roteiro de perguntas para serem aplicadas na tomada de declarações ou oitivas dasvítimas indiretas e testemunhas

TEXTO COMPLEMENTAR PARA LEITURA DA AULA 03 PROFESSORA ANDRÉA ZELAQUETT - CURCEP ENTREVISTA COMPLETA COM MARIA DA PENHA

QUERIDO(A) ALUNO(A),

16º CONEX - Encontro Conversando sobre Extensão na UEPG Resumo Expandido Modalidade B Apresentação de resultados de ações e/ou atividades

Violência de Género: Violência sobre os idosos e as idosas

TIPIFICAÇÃO DAS AGRESSÕES SOFRIDAS PELAS MULHERES DA CIDADE DE JUAZEIRO DO NORTE CEARÁ

LEI MARIA DA PENHA E A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER NO AMBIENTE PROFISSIONAL. Flamingos, CEP , Apucarana Paraná.

TÍTULO: VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER: TIPOS DE VIOLÊNCIA, PERFIL DA VÍTIMA, SUA DISTRIBUIÇÃO NO BRASIL E NA REGIÃO SUDESTE NOS ÚLTIMOS ANOS.

14. Violência contra a pessoa idosa

Adriana Beserra Silva 1 Tânia Rocha de Andrade Cunha 2

VIOLÊNCIA CONTRA AS MULHERES

VIOLÊNCIA CONTRA AS MULHERES

09/06/2017 WALLACE FRANÇA LEI MARIA DA PENHA

COPAPI POLÍTICA DE GÊNERO VIOLÊNCIA CONTRA AS MULHERES E GÊNERO NA UNIVERSIDADE. Profª Drª ANA CLAUDIA FIGUEIREDO 1REBOLHO

Direito Penal. Lei nº /2006. Violência doméstica e Familiar contra a Mulher. Parte 4. Prof.ª Maria Cristina

GÊNERO E VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA AS MULHERES

União Popular de Mulheres de Campo Limpo e Adjacências.

VIOLÊNCIA CONTRA MULHERES: UMA ANÁLISE A PARTIR DO CENTRO DE REFERÊNCIA PARA MULHERES VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA PATRÍCIA ESBER

ONDE MEUS TALENTOS E PAIXÕES ENCONTRAM AS NECESSIDADES DO MUNDO, LÁ ESTÁ MEU CAMINHO, MEU LUGAR ARISTÓTELES

III contra a criança e o adolescente; IV contra a pessoa com deficiência; VI contra o portador do vírus HIV;

DIREITO PROCESSUAL PENAL

O ATENDIMENTO PSICOLÓGICO ÀS MULHERES EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA NO CENTRO DE REFERÊNCIA MARIA DO PARÁ: UM BALANÇO APÓS DOIS ANOS DE FUNCIONAMENTO

DEFENSORIA PÚBLICA DE MATO GROSSO DO SUL DEFENSORIA PÚBLICA-GERAL DO ESTADO RESOLUÇÃO DPGE Nº 093/2015, DE 19 DE MAIO DE 2015.

VIII Jornada de Estágio de Serviço Social NÚCLEO DE ESTUDOS DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER NA CIDADE DE PONTA GROSSA

DISCUTINDO VIOLÊNCIA DE GÊNERO NA ESCOLA: REFLEXÕES E EXPERIÊNCIAS

O ACOLHIMENTO REALIZADO PELO PSICÓLOGO FRENTE AO GRUPO DOS HOMENS AUTORES DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

Rui Abrunhosa Gonçalves

Constitucionalidade e Poder Judiciário

MISSÃO. de famílias e indivíduos em situação de risco e. Coordenar e implementar a política de assistência social no município para a proteção

ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTE

UMA CULTURA INTOLERÁVEL UM RETRATO DA VIOLÊNCIA CONTRA AS MULHERES NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

VIOLÊNCIA BASEADA NO GÉNERO: Histórias de superação e sobrevivência

Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher. Pesquisa de opinião pública nacional

Ministério do Desenvolvimento Social MDS Secretaria Nacional de Assistência Social SNAS

Lei Maria da Penha completa 8 anos

Dados da Violência contra a mulher no Brasil

VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA CRIANÇA E ADOLESCENTE

II. Violência contra a mulher: dados 2015

CURSO PRÉ-VESTIBULAR DO CENTRO DE ESTUDOS E AÇÕES SOLIDÁRIAS DA MARÉ AULÃO DA MULHER VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER VOCÊ CONHECE A LEI?

VIOLÊNCIA SEXUAL. Entenda e ajude a combater SECRETARIA NACIONAL DE POLÍTICAS PARA AS MULHERES SECRETARIA DE GOVERNO

A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER NO MUNICÍPIO DE PANAMBI/RS E A EFETIVIDADE DA LEI MARIA DA PENHA 1. Sheila Lopes Da Silva 2, Ester Eliana Hauser 3.

VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA MULHERES: SAIBA O QUE FAZER E COMO AJUDAR. PROEXT/ MEC-SESu

BuscaLegis.ccj.ufsc.br

Violência Contra a Mulher no Brasil: análises de algumas características à luz da PNS, 2013

VISIBILIDADE DA VIOLÊNCIA DE GRUPOS VULNERÁVEIS NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE COM ÊNFASE NA PESSOA IDOSA: RELATO DE EXPERIÊNCIA

Sistematização e análise de casos notificados de violência contra a mulher em Viçosa-MG.

4/12/ das 8h às 12h. Número de identidade Órgão expedidor Número da inscrição

Projeto de Recuperação 1º Semestre - 1ª Série

VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E SEGURANÇA PÚBLICA

Balanço Anual Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres Ministério dos Direitos Humanos

PERFIL EPIDEMIOLÓGICO DAS VIOLÊNCIAS INTERPESSOAIS E AUTOPROVOCADAS EM IDOSOS. RECIFE, 2010 A 2017

VIOLÊNCIA SEXUAL DE CRIANÇAS EM IDADE ESCOLAR: EDUCAÇÃO BÁSICA

VIOLÊNCIA CONTRA IDOSOS: UMA DOR EM ASCENSÃO

ANÁLISE DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR EM ILHÉUS ( )

PROJETO DE LEI Nº de de 2015.

VIOLÊNCIA CONTRA AS MULHERES: O que podem fazer os profissionais de saúde?

SUMÁRIO 2. COMENTÁRIOS À LEI /2006 ARTIGO POR ARTIGO LEI , DE 7 DE AGOSTO DE 2006

ANAIS DO II SEMINÁRIO SOBRE GÊNERO: Os 10 anos da lei Maria da Penha e os desafios das políticas públicas transversais

ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

RETRATO FALADO DA VIOLÊNCIA DE GÊNERO: QUEIXAS E DENÚNCIAS NA DELEGACIA DA MULHER DE MARINGÁ ( ) 1

DOIS ANOS DA LEI MARIA DA PENHA: O QUE PENSA A SOCIEDADE?

Paternidade e relações de violência intrafamiliar

PÓS GRADUAÇÃO PENAL E PROCESSO PENAL Legislação e Prática. Professor: Rodrigo J. Capobianco

II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;

Identificando entraves na articulação dos Serviços de Atendimento às mulheres vítimas de violência doméstica e familiar em cinco capitais*

Balanço 1 Semestre Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres. Ministério da Justiça e Cidadania

A violência de gênero no Estado do Rio de Janeiro

Mulheres e saúde: trabalhadoras rurais e vivências de violência - um estudo exploratório

VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A CRIANÇA E O ADOLESCENTE

FEDERATION INTERNATIONALE DES FEMMES DES CARRIERES JURIDIQUES

SMAB Nº (Nº CNJ: ) 2017/CRIME

Vigilância Social: Estudando os instrumentais a serem utilizados pelo PAIF/PAEFI

A JUDICIALIZAÇÃO COMO SOLUÇÃO PARA A RESOLUÇÃO DOS PROBLEMAS DE VIOLÊNCIA ESCOLAR DAS ESCOLAS PÚBLICAS DE CASCAVEL PR

CHEFIA FEMININA EM FAMÍLIAS MONOPARENTAIS EM SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE SOCIAL NO MUNICÍPIO DE NOVA ESPERANÇA PR.

coleção Conversas ESPECIAL Respostas que podem estar passando para algumas perguntas pela sua cabeça.

PSICOPATOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO

DIREITO PROCESSUAL PENAL

Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher. Pesquisa de opinião pública nacional

Superando Barreira. Enfª: Eclésia Fragoso Nogueira

01- De acordo com a lei /06 conhecida popularmente como lei Maria da Penha é correto afirmar que :

NOTIFICAÇÃO DE VIOLÊNCIA PARA EXTENSÃO DO CUIDADO COMO PROMOÇÃO DA SAÚDE SOB UM VIÉS EPIDEMILÓGICO

inaceitável violência conjugal o que fazer?

DESIGUALDADE DE GÊNERO. A violência doméstica contra a mulher. PALAVRAS-CHAVE: 1 DIFERENÇAS. 2 PRECONCEITO. 3 VIOLÊNCIA.

FEMINICÍDIO: UMA REALIDADE BRASILEIRA. Laylla Nayanne Dias Lopes Victor Augusto Cardoso FACULDADE ALFREDO NASSER

VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER: DETERMINANTES NO CONTEXTO FAMILIAR E GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS

A construção da rede de atendimento às pessoas em situação de violência

Programa Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes. Dados Sobre Violência Sexual Infanto-Juvenil.

CORPOS FEMININOS E VIOLÊNCIAS: UMA ANÁLISE A PARTIR DOS DADOS DE SANTA ROSA/RS. 1. Joice Graciele Nielsson 2, Camila Hertz 3.

Casos de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher cadastrados em Macapá

Transcrição:

UMA RELEITURA DA CONCEPÇÃO DAS MULHERES VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA ATENDIDAS PELO CENTRO DE REFERÊNCIA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL NO MUNICÍPIO DE NOVA ESPERANÇA. Daniele Moro (moro.dani@hotmail.com), Maria Inez Barboza Marques (marques@sercomtel.com.br), Rosani Borin (borinrosani@gmail.com) UNESPAR/Campus Paranavaí/PR Resumo: Essa pesquisa tem como objetivo uma releitura da concepção de mulheres vítimas de violência doméstica, atendidas pelo Centro de Referência de Assistência Social, no município de Nova Esperança- PR, com base em pesquisa realizada em 2009, e passados dois anos consecutivos, verificar qual a situação conjugal, ciclo da violência e se de fato houve a superação da violência sofrida. Demonstrou- se, através da pesquisa empírica, o contexto e a vivência da violência doméstica por parte das mulheres entrevistadas. Palavras chaves: Violência Doméstica; Ciclo da Violência; Superação da Violência. Introdução De acordo com Cavalcanti (2005) apud Pereira (2008), a violência doméstica pode ser considerada aquela praticada no lar ou na unidade doméstica. O autor da violência pode ser um membro da família que viva com a vítima, podendo ser este homem ou mulher, criança ou adolescente e também pessoas de diversas faixas etárias. A violência doméstica é reconhecida pela Constituição Federal de 1988, em seu parágrafo 8º, art. 226, que diz: O Estado assegurará a assistência à família, na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito das relações. Segundo a Lei 11.340/06 Lei Maria da Penha, em seu artigo 5, a violência doméstica configura- se em (...) qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial, e tipifica os vários tipos, a saber: Violência psicológica ou emocional, física, sexual, moral, patrimonial e social. Saffioti (2001) apud Rocha (2007), aponta um outro tipo de violência que se qualifica como Violência Simbólica. Seu conceito está ligado à relação de dominação masculina; sua contribuição serve para fundamentar a rejeição as tendências que consideram a mulher cúmplice de um processo histórico de dominação. Importante salientar, que os movimentos feministas tiveram uma grande contribuição para a construção da identidade feminina no Brasil, com peso na ampliação da cidadania das mulheres

e na consciência de seus direitos enquanto sujeitos de uma sociedade. Assim, a luta desses movimentos veio possibilitar e colaborar para a reelaboração das representações femininas, bem como para a desconstrução de modelos historicamente a elas destinados, possibilitando criar resistência ao processo de dominação (ROCHA, 2007). Segundo o Instituto Patrícia Galvão (2007) apud Orlandini (2007), existem fases da violência doméstica e estas compõem um ciclo que pode se tornar vicioso, repetindo-se ao longo de meses ou anos. Este ciclo composto por três fases: A primeira é considerada a de tensão, que tem seus primeiros vestígios na ocorrência de atritos, insultos e ameaças, muitas vezes recíprocos. A segunda fase é a da agressão, com a descarga e a perda do controle de toda aquela tensão acumulada, na qual o agressor atinge á vitima com empurrões, socos e pontapés, ou, às vezes, utiliza objetos, como garrafas, pau, ferro, entre outros. A terceira fase é a da reconciliação, na qual o agressor pede desculpas e se mostra arrependido; promete mudar de comportamento ou finge que não houve nada. Nesta fase, o agressor tenta convencer a mulher de que nunca mais irá fazer nada para machuca - lá, mostrando-se carinhoso, tenta alegrar a vítima com presentes e demonstrações de afeto. Materiais e Métodos Essa pesquisa teve como base uma abordagem qualitativa (Minayo, 2000), com entrevistas, semiestruturadas (Triviños, 1997), seguindo um roteiro composto por questões abertas, divididas em três eixos de análises: Situação conjugal; Ciclo da violência; Superação das violências vividas. Realizou-se entrevista por meio de questionamentos básicos, sendo direcionada pelas respostas das informantes. Seguiu-se a linha do pensamento e das experiências vividas pelas entrevistadas, dentro do foco principal colocado pela investigadora. Os dados foram coletados em 2011, individualmente, nas residências de três mulheres (Maria 1, 2, 3), com idade entre 30 a 40 anos, atendidas no Centro de Referência de Assistência Social- CRAS, em Nova Esperança- PR, moradoras em bairros periféricos do mesmo município, e que denunciaram seus agressores ou que sofreram violência doméstica, no primeiro semestre de 2009, e após decorridos dois anos consecutivos. Resultados e Discussões

A pesquisa foi satisfatória, pois alcançou todos os objetivos propostos. No que se refere ao conhecimento sobre a problemática da violência, todas as entrevistadas, mesmo no senso comum, tinham clareza a respeito do tema, inclusive de algumas tipologias, principalmente, a física, a psicológica e a sexual. Os dados coletados demonstraram que, apos dois anos, a situação das mulheres entrevistadas é pertinente de reflexões específicas, pois, duas delas (Maria 1 e 2) passaram novamente por situações extremamente difíceis. Segundo Strey, M.N; Azambuja, M. P.R; Jaeger, F.P; (2004) violência contra a mulher não é uma ocorrência isolada. Costuma acontecer repetidamente, fazendo parte intrínseca da vida das mulheres que a sofrem. Maria 1, retomou o relacionamento e novamente sofreu violência física e psicológica, ficando com marcas físicas visíveis. Ela disse que não superou a violência sofrida e acredita que nunca irá supera - lá. No entanto, verificou-se que ela está com expectativas de uma nova vida sem violência com o novo relacionamento, iniciado recentemente. Conforme Larouche (1989) apud Pereira (2008), o ciclo recomeça e as tensões reaparecem progressivamente. Em concordância, Rocha (2007) esclarece que em algumas circunstâncias, para a mulher, permanecer vivendo com o agressor representa um ato de resistência. Ela quer preservar a unidade da família, o casamento e a convivência de seus filhos com o pai. Importa salientar, ainda conforme o mesmo autor, no que se refere a espiral da violência conjugal, que a mulher constrói várias e diferentes estratégias de sobrevivência em meio a condições profundamente desfavoráveis, que a faz percorrer um longo caminho, julgado, muitas vezes, como ineficaz, ambíguo e até como consentimento à violência. Maria 2, retomou o relacionamento com o companheiro, mesmo ele estando preso. A mesma encontra-se em uma situação bastante difícil, pois vive sozinha e perdeu a guarda dos filhos que estão em instituição de acolhimento. A entrevistada demonstra estar com depressão, sem autoestima e, segundo informação de uma técnica do Conselho Tutelar de Nova Esperança, nesse ínterim ocorreu uma gravidez, sendo que o bebê também foi recolhido pelo Conselho Tutelar e encaminhado para a instituição de acolhimento.

Muitas mulheres sofrem vários tipos de violência ao mesmo tempo, o que tira delas suas características humanas, impedindo que reajam, tornando-as espécies de robôs sem vontade e sem aspirações na vida que não seja sofrer o mínimo possível e não conseguem ver que a felicidade pode estar em ficar longe da presença intimidante de seus algozes. (STREY, M.N; AZAMBUJA,M. P.R; JAEGER, F.P; 2004). Quanto a Maria 3, pelo relato, a situação de violência doméstica foi superada, e ela manteve o relacionamento. Porem, durante a entrevista a mesma priorizou falar do filho que foi preso e pouco quis responder sobre as questões relativa ao trabalho. As respostas foram objetivas e sucintas, dando margem para dúvidas sobre a harmonia relatada por ela. De fato, não foi possível concluir especificamente a situação atual. Notadamente, nos três casos pesquisados, configurou-se o ciclo da violência doméstica, que para Priori (2007), contempla três fases, já anteriormente citadas: a inicial, que é a da acumulação de tensão ; o segundo momento, denominado de episódio violento e, por último, a fase da lua-de-mel, ou seja, a fase da reconciliação. Foram identificadas na pesquisa diferentes posições, ora de submissão, ora de resistência, no que concerne à questão das mulheres agredidas por seus parceiros. Duas das três mulheres deram continuidade ao processo judicial. Elas consideram as medidas protetivas um mecanismo de contribuição para o rompimento do ciclo da violência. Entretanto, é possível verificar que estas medidas, por si só, não representam um fator determinante para o rompimento deste ciclo. Considerações Finais A compreensão do complexo fenômeno da violência conjugal, familiar e doméstica, deve considerar fatores tais como pobreza, violência, gênero, classe social, nível de escolaridade e status ocupacional das mulheres vitimadas. A saída da relação de dominação e violência, envolve múltiplos elementos, dentre eles, o reconhecimento dos direitos das mulheres pela sociedade e pelo Estado. Contudo, embora a violência esteja localizada em sua grande maioria no âmbito doméstico, privado, em geral restrito a quatro paredes e ao mais íntimo segredo, na realidade esse fenômeno

e um problema público, legal, merecedor de atenção das diversas políticas públicas e sociais, da sociedade em geral e do poder publico. REFERÊNCIAS BRASIL. Constituição Federal de 1988. Brasília: Senado, 2005. BRASIL. Lei Maria da Penha. Lei N. 11.340, de 7 de Agosto de 2006. CAVALCANTI, S. V. S. DE F. A Violência Doméstica como Violação dos Direitos Humanos. 2005. INSTITUTO PATRÍCIA GALVÃO. Violência Contra as Mulheres. Campanha onde tem violência, todo mundo perde. São Paulo, 2007. LAROUCHE, Ginette. Agir contre La violence. Montral, Juillet: La Pleine Lune, 1989. MINAYO, M.C DE S. A Pesquisa qualitativa IN: Pesquisa Social, Teoria, Métodos e Criatividade. 16ª Ed. Petrópolis & Vozes, 2000. ORLANDINI, Maria Stella Inocenti. Aplicabilidade da Lei Maria da Penha em Londrina. 2007. 49 fls. (Trabalho de Conclusão de Curso) Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2007. PEREIRA, Beatriz dos Santos. O ciclo da violência e a contribuição das medidas protetivas de urgência, previstas na lei Maria da Penha, para o seu rompimento. 2008. 90 f. Trabalho de Conclusão decurso (Serviço Social) Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2008. PRIORI,Claudia. Retratos da Violência de Gênero: Denuncias na delegacia da Mulher de Maringá (1987-1996). 1 edição. Maringá: Eduem, 2007. ROCHA, Lourdes de Maria Leitão Nunes. CASAS-ABRIGO: No Enfrentamento da Violência de Gênero. 1 edição. São Paulo: Veras,2007. Saffioti, H.I.B. (2001) Contribuições feministas para o estudo da violência de gênero. Cadernos Pagu,16, p.115-136. STREY,M.N; AZAMBUJA,M.P.R; JAEGER, F.P (Organizadoras). Violência, gênero e políticas públicas. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2004. TRIVIÑOS. Augusto. Introdução à pesquisa em ciências sociais. São Paulo: Ed. Atlas, 1997.