Grandes Nomes da Mídia Brasileira



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Transcrição:

Nara Damante Grandes Nomes da Mídia Brasileira midiap3.indd 3 12/7/2006 10:49:04

Tributo a Altino João de Barros Otto de Barros Vidal Waldemar Lichtenfels midiap3.indd 5 12/7/2006 10:49:05

Títulos da Biblioteca Grupo de Mídia Já publicados A essência do planejamento de mídia: um ponto de vista mercadológico (maio de 2001) Arnold M. Barban, Steven M. Cristol, Frank J. Kopec Planejamento de mídia: aferições, estratégias e avaliações (junho de 2001) Jack Z. Sissors e Lincoln J. Bumba Praticando o planejamento de mídia 36 exercícios (setembro de 2001) William B. Goodrich e Jack Z. Sissors Gerenciamento de mídia:ajudando o anunciante a ampliar seus conhecimentos em mídia (dezembro de 2001) Herbert Zeltner Como vender a mídia: o marketing como ferramenta de venda do espaço publicitário (setembro de 2002) Mary Alice Shaver A conquista da atenção:a publicidade e as novas formas de comunicação (dezembro de 2002) Richard P. Adler e Charles M. Firestone A publicidade como negócio: operações criatividade planejamento de mídia comunicação integrada (abril de 2003) John Philip Jones (org.) Media handbook: um guia completo para eficiência em mídia (maio de 2004) Helen Katz Midialização: o poder da mídia (abril de 2006) Angelo Franzão Uma visão de mídia para gestores de marca (junho de 2006) Larry D. Kelley e Donald W. Jugenheimer midiap3.indd 8 12/7/2006 10:49:08

Sumário Apresentação 11 Altino João de Barros O desbravador das marés midiáticas 13 Nasce um mídia 19 O amigo ítalo-americano 22 Ao vivo e em cores 24 O tio do GRP 27 Rumo à Paulicéia 30 Carioca no grupo paulista 32 O futuro da mídia 35 A amizade com Roberto Marinho 36 Otto de Barros Vidal Mídia, uma paixão corintiana 41 Uma outra paixão 46 Os anos dourados da Alcântara 49 O pai do GRP 53 A mídia e o futebol 58 Novos rumos 62 Waldemar Lichtenfels O cientista da mídia 67 Influência do rádio 71 Conselheiro multifacetado 73 Leitor, ouvinte e telespectador 77 midiap3.indd 9 12/7/2006 10:49:08

Grupo de pioneiros 82 Parceiro da criação 84 Sincretismo midiático 88 midiap3.indd 10 12/7/2006 10:49:08

Apresentação Em todos esses anos de atividade do Grupo de Mídia São Paulo, e lá se vão quase 40 anos, tive a chance de acompanhar o desenvolvimento de um sofisticado instrumental de planejamento de mídia que nos permite a cada dia melhorar a qualidade dos trabalhos desenvolvidos pelos profissionais da área. Além desse instrumental, o que mais tem me chamado a atenção é o surgimento de uma grande quantidade de novos e jovens profissionais que vai se estabelecendo em nosso mercado de uma forma marcante e compromissada. É uma geração que vem com muita força, garra e determinação. A mídia entrou na vida deles de uma forma definitiva, como aconteceu com grande parte de nossa geração de veteranos. Muitos desses jovens trazem na bagagem experiências de quem teve a oportunidade morar fora do país, o que lhes confere uma visão de mundo mais ampliada e bastante diversificada. Naturalmente, não são somente os jovens que tiveram a chance de viver no exterior que conseguem boas colocações em nosso mercado. Muitos que não tiveram esse privilégio buscam a informação através de leitura, seminários, workshops, internet, livros e principalmente na convivência com profissionais de mídia que hoje lideram as operações nas principais agências do país e conquistam sua oportunidade. E a esses jovens profissionais é que dedicamos, particularmente, o primeiro livro de biografias que estamos publicando. Grandes nomes da mídia brasileira será uma publicação anual que contemplará a cada edição os leitores com a biografi a de três 11 midiap3.indd 11 12/7/2006 10:49:08

profissionais de mídia que tenham contribuído e ainda contribuem para o aperfeiçoamento de nossa área profissional, dedicando por anos a fio seu trabalho ao negócio da propaganda. Neste primeiro livro, por unanimidade de escolha, teremos um pouco da trajetória brilhante de três dos principais homens de mídia de todos os tempos: Altino João de Barros, Otto de Barros Vidal e Waldemar Lichtenfels. Todos terão a oportunidade de conhecer as dificuldades dos primórdios da mídia, quando os instrumentos para avaliação e aferição dos veículos de comunicação eram precários ou inexistentes e os profi ssionais que se aventuraram nesse universo foram verdadeiros desbravadores, abrindo caminho para facilitar o trabalho dos que os seguiram. Todos terão a oportunidade de conhecer muitos dos passos de cada um deles. É uma leitura muito agradável e inspiradora. Tenho certeza de que vocês gostarão. Claudio Venâncio Conselho Superior do Grupo de Mídia São Paulo midiap3.indd 12 12/7/2006 10:49:08

O desbravador das marés midiáticas Altino João de Barros midiap3.indd 13 12/7/2006 10:49:09

O forte apelo emocional das radionovelas provocava uma verdadeira febre midiática nos brasileiros, nos anos 1940. E não era diferente para aquele garoto carioca que ia à escola às 11 horas da manhã, mas saía de casa no último minuto para não perder o final da trama diária. Em 1941, a Rádio Nacional lançava a primeira radionovela chamada Em busca da felicidade, roteiro original do cubano Leandro Blanco, adaptado por Gilberto Martins a pedido da Standard Propaganda para seu cliente Unilever. O hábito de juventude fez que Altino João de Barros tornasse o rádio seu companheiro inseparável por toda a vida, a ponto de não dormir sem o aparelhinho junto ao ouvido. Apesar da aposta ousada da multinacional no horário matinal, considerado de baixa audiência, a empresa fazia promoções com os ouvintes dando brindes a quem lhe enviasse rótulos de creme dental Kolynos, por carta. Por coincidência, Altino nunca tinha usado Colgate, preferia a marca Kolynos, que viria a ser cliente da agência McCann-Erickson multinacional da qual ele se transformou no mais antigo funcionário, com 60 anos de casa. Sua dedicação foi tamanha que a história de sua vida se confunde com a da agência e até da própria evolução da mídia no Brasil, dado o seu pioneirismo e espírito inovador. Reconhecido dentro e fora do país, recebeu inúmeros prêmios na área de mídia, como o Prêmio Colunistas Homem de Mídia (1975), o Internacional Award The Harrison K. McCann Professional Leadership (1976), Grande Prêmio de Mídia Gazeta Mercantil (1976), Prêmio Caboré Profissional de Mídia (1983), Publicitário Latino-Americano no Festival Mundial de Publicidade de Gramado (1997), Prêmio de Mídia Estadão (2002), Libertae Prêmio ABA de Contribuição à Comunicação (2003), Prêmio Especial da ESPM Senhor Mídia (2005), Homenagem da ABAP pelas seis décadas de contribuição ao desenvolvimento e modernização da Mídia no Brasil 15 midiap3.indd 15 12/7/2006 10:49:09

16 (2005), entre tantos outros. Além disso, transformou-se em imortal da Academia Nacional de Economia (ANE), ocupando a cátedra n o 98 e assumindo posto também no Conselho Supremo da ANE, em 2005. Foi co-autor na área de mídia dos livros Técnica e prática da propaganda e História da propaganda no Brasil, além de McCann 50 Anos em 2, com Jens Olesen, ex-presidente da McCann no Brasil. Altino foi diretor nacional de mídia da agência até 1995, quando passou a se dedicar à vice-presidência de assuntos corporativos da McCann, atuando como braço direito de Olesen na representação da agência junto a diversos órgãos, como Associação Brasileira de Agências de Propaganda (Abap), Conselho Executivo das Normas-Padrão (Cenp), Instituto Verificador de Circulação (IVC) e Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária (Conar), entre outros. Com a mudança de gestão na McCann, no final de 2005, Altino não só continuou na agência como permaneceu no mesmo cargo. Altino nasceu no Rio de Janeiro, fi lho de dona Aracy de Carvalho Barros e de João de Barros, português naturalizado brasileiro, que lhe incutiu princípios éticos e retidão de caráter. Ele e o irmão, Paulo, tiveram de aprender a dominar muito bem a língua pátria. Estudaram no Externato São José, escola pertencente à Congregação Marista. Seu João era dono de um negócio de laticínios, mas nenhum dos dois filhos aceitou trabalhar com o pai. Paulo enveredou pela engenharia e Altino optou por estudar comércio e propaganda na Universidade Mauá, então mantida pela Associação Comercial do Rio de Janeiro, formando-se em 1944. Embora fosse radionoveleiro de carteirinha, seu interesse pela propaganda foi despertado enquanto ouvia o Repórter Esso, com seu slogan O primeiro a dar as últimas, produzido pela McCann. Seu pai tinha um sócio, sr. Sarmento, pai de um rapaz que, mesmo com pouca idade, já era gerente da McCann Rio. Armando de Moraes Sarmento tinha estudado na Inglaterra e falava inglês fluentemente, sendo depois o primeiro presidente brasileiro da McCann mundial. A primeira agência a se instalar no Brasil, a J. Walter Thompson, já estava por aqui havia 10 anos quando Altino começou na publicidade. Na midiap3.indd 16 12/7/2006 10:49:09

mídia, era prática comum os jornais darem de 20% a 30% de desconto aos corretores, que cobravam o preço que queriam dos anunciantes. Também a Associação Brasileira de Agências de Propaganda (Abap) já tinha nascido em 1949, tendo entre seus fundadores Sarmento e Armando de Almeida, presidente da Interamericana. As agências tinham redatores específicos para peças de rádio, e a mídia era dividida entre impressa (jornal e revista) e eletrônica (rádio). O mídia era um orçamentista. Quem fazia a mídia era o contato. Negociávamos o custo dentro da verba delimitada pelo contato da agência (atendimento) e o chefe de propaganda do anunciante, conta Altino. Definidos os espaços, o contato e o cliente elaboravam o blue sheet (papel azul), que servia para o redator e o profissional da arte se orientarem. O redator discutia o título com o contato ou o dono da agência, que eram senhores absolutos da conta na agência. A partir daí, o contato levava título e texto para o arte-finalista montar o layout, para depois levar ao cliente, que dava aprovação. Voltando à agência, o material ia para a produção, onde se escolhia a tipografia e as cores, seguindo depois para a clicheria, feita fora da agência, para ser reproduzida em estéreo (a chamada impressão a quente, feita em chumbo). E foi como offi ce-boy do departamento de produção que Altino começou na McCann, no Rio de Janeiro, em 1944. Muitas vezes, o serviço não ficava a contento ou era necessária alguma alteração, o que o obrigava a fazer quatro ou cinco viagens carregando anúncios pesados sob o calor carioca. Seus pesadelos eram os reclames de página inteira, que chegavam a pesar de dois a três quilos cada. Se tivesse de levá-los a cinco jornais diferentes, eram quase 15 quilos a ser carregados a pé da agência, na rua Frei Caneca, no centro, até a Lapa, onde ficava a clicheria Latt-Mayer, já que a agência não lhe pagava o bonde por conta da fama de pão-duro de Sarmento. Depois, Altino soube o motivo da economia: a McCann foi deficitária em seus primeiros 15 anos no Brasil. Ao fi n al do processo de idas e vindas dos clichês, o anunciante levava dois meses para fazer uma campanha. Como não havia inflação, os contratos com os veículos eram longos, em média de dois anos de 17 midiap3.indd 17 12/7/2006 10:49:09

18 duração. Os anúncios publicados em jornais do interior, por exemplo, eram encaminhados uma vez por ano, mudando-se semanalmente apenas os títulos durante todo o ano. Sem falar que essas publicações mentiam deslavadamente sobre os números de circulação sem que houvesse uma auditoria ou IVC para confirmar. Após um ano na luta diária com os clichês, Altino conseguiu ser transferido para a mídia propriamente. Em seu departamento, havia ele, um boy, uma assistente, o responsável pelo checking e o chefe. Sob sua responsabilidade ficavam o envio dos clichês para os veículos impressos e o arquivo de jornais. Depois de seis meses, todos tinham saído da agência. Como chefe da mídia, ingressou o escritor Guilherme Figueiredo irmão do então futuro presidente do Brasil João Batista Figueiredo, que acumulava também a missão de contato da Coca-Cola. Atender esse importante cliente da agência e escrever colunas para jornais lhe ocupava todo o tempo, não sobrando nada para a mídia. Foi assim que Altino passou a atender aos telefonemas dos contatos da agência (atendimento) pedindo informações de preços para veiculação em jornais e começou a fazer programações de mídia impressa em veículos como Correio da Manhã, Diário de Notícias e O Jornal dos Diários Associados, os de maior circulação no Rio, além de O Globo, Diário da Noite, Jornal do Brasil e Jornal do Commercio, entre outros. A chamada mídia da mãe (veículos de maior audiência) era a Rádio Nacional e a revista O Cruzeiro, no Rio de Janeiro. No caso das revistas, eram os próprios contatos que tomavam as rédeas da mídia. E foi aí que Altino percebeu que as tabelas de preços eram mera formalidade, passando a entender melhor o negócio da mídia. No entanto, depois de dois anos, já conhecia todo o trâmite e passou a ser uma espécie de faz-tudo do departamento. Um dia, foi até a sala de Sarmento pedir-lhe que oficializasse seu posto na agência como chefe de mídia. O presidente da McCann falou-lhe que não iria ter memorando algum porque ele só seria chefe quando os todo-poderosos donos das contas, os contatos da agência, o respeitassem profissionalmente. Ainda que desapontado, Altino aprendeu a lição e começou a trabalhar para que a aceitação acontecesse. midiap3.indd 18 12/7/2006 10:49:09

Nasce um mídia Além de consumidor da Kolynos, foi desse cliente que Altino fez, em 1946, sua primeira negociação de mídia. A marca era importada pela Paul J. Cristoph e, como grande anunciante, tinha condições especiais de preço nos jornais, com descontos de até 50% sobre o preço de tabela. Na época, os representantes dos veículos retinham suas porcentagens para remuneração e ganhavam mais 15% como comissão de agência. Seu desafio foi conseguir mais que os 15% e dar alguma vantagem ao cliente, o que acabou acontecendo. O normal era adicionar o líquido de 17,65%, que equivalia a 15% sobre o preço bruto, uma vez que os jornais já davam descontos de 20% a 30% para a McCann, que tinha poder de barganha por contar com grandes anunciantes, como Coca- Cola e Esso. Mas o departamento de rádio era um dos mais fortes da agência. E não cabia ao setor apenas criar e veicular comerciais para esse meio, como também desenvolver o conteúdo dos programas. Colgate-Palmolive, Gessy Lever, Kolynos e Sidney Ross disputavam audiências em plena era das radionovelas, na qual o anunciante escolhia tema e elenco. A agência ajudou a criar programas como Repórter Esso, Um milhão de melodias e Rádio Almanaque Kolynos. E os comerciais tinham de estar de acordo com o marketing regional do cliente, envolvendo um complexo aparato de mídia. Depois de quatro anos de veiculação do Rádio Almanaque Kolynos, transmitido pela Rádio Nacional, o cliente cismou que o programa não era ouvido em todo o Brasil. Foi então que Altino, muito sagazmente, lhe sugeriu que oferecesse um copo plástico a quem escrevesse ao programa. O cliente concordou prontamente em fornecer o brinde, e a agência comprometeu-se a fazer o envio. O dono da idéia passou um mês inteiro recebendo cartas de todo o Brasil. A quantidade e a representatividade de todos os estados da nação eram tão grandes que ele e mais duas datilógrafas, além de dois colegas da agência, passaram seis meses dedicando-se à tarefa. Mas valeu dormir muitas vezes em cima do monte de cartas para dar conta do serviço. O cliente renovou o contrato com a Rádio Nacional por mais um ano. 19 midiap3.indd 19 12/7/2006 10:49:09

20 Essa é apenas uma das inúmeras lembranças da precariedade de pesquisas existentes no Brasil nos anos 1950. Para selecionar emissoras de outras cidades, o mídia era obrigado a ir até Belém do Pará e prosseguir numa trajetória de norte a sul do país, ponto a ponto. Altino atuava na agência quando foi criado o primeiro outdoor impresso (antes eram pintados) da Coca-Cola, exibido no Rio e em São Paulo. A peça trazia uma mulher, com um turbante na cabeça, bebendo o refrigerante. A mídia decidiu colocar o anúncio na parte da frente dos bondes, em placas medindo 80 x 50 centímetros, o que exigiu controle da agência nas garagens, à noite, para as devidas manutenções por conta de chuva e do vandalismo, além da substituição dos cartazes descolados ou descorados pelo tempo. Logo depois, veio a inovação: cartazes standard de 24 folhas em locais isolados e emoldurados, tal qual os moldes americanos, impressos em português pelo cliente nos Estados Unidos. Isso porque as gráficas locais ainda não tinham capacitação para imprimir em grandes formatos. A curiosidade é que os textos vinham sem til e cedilha e invariavelmente o pessoal da arte tinha de pintá-los um a um. Outra dificuldade era que as exibidoras não conseguiam seguir o modelo americano e as colas brasileiras não suportavam o calor local. A importação das estruturas dos Estados Unidos sairia caríssima. Foi então que Altino sugeriu à McCann a criação de uma empresa de outdoor dentro da agência, a Empresa Federal de Anúncios (EFA), e a descoberta de uma fórmula brasileira para a colagem. Sem querer, acabou arranjando mais trabalho para os finais de semana, o de escolher e contratar locais para a instalação dos cartazes da Coca-Cola. Quando o mercado passou a adotar o formato-padrão do cliente americano, a EFA deixou de ter razão de existir e a McCann a vendeu à exibidora Época. Outra preocupação de Altino eram as colagens de painéis gigantes da General Motors, Esso e Goodyear nas estradas, que exigiam manutenção e checagem. Duas vezes por ano, ele, sua equipe e um representante do cliente chegavam às cidades do interior tarde da noite. Era 1950 e Altino havia acabado de se casar com Yedda, que seria sua companheira por toda a vida e com quem teria os filhos Fernando, Vera Maria, Octávio e midiap3.indd 20 12/7/2006 10:49:10

Eduardo Xocante. E não é que com 15 dias de casado, lá se foi Altino para mais uma dessas incursões sofridas ao interior do Brasil, a bordo de uma Rural Willis? Mais tarde, ele resolveu comprá-la da McCann. Assim, a prosaica Rural foi seu primeiro automóvel. Os filhos trataram de alcunhá-la de Violeta, e ela servia para transportá-los de Santa Tereza à praia de Ipanema. As ensolaradas praias da zona sul carioca serviram de inspiração para Altino e Leon Feighembaum, responsável pelo meio outdoor na McCann, para a montagem de um negócio inovador nos anos 1950. Foram os primeiros vendedores de Coca-Cola nas praias de Copacabana a Ipanema. Por conta do bom relacionamento com o presidente da multinacional no Brasil, montaram uma pequena estrutura para armazenar e distribuir o refrigerante em pequenas carrocinhas. Mas acabou não dando certo porque, inexperientes, não conseguiam prever a grande demanda nos dias quentes e a perda com os finais de semana chuvosos. Corriam os anos 1960 e a McCann já tinha se mudado para a sede da rua México, no centro do Rio, em frente ao prédio da Esso e a menos de 500 metros da Coca-Cola, seus dois maiores clientes. O Ibope foi outro vizinho muito bem-vindo para a agência. Para fazer as pesquisas de flagrante de audiência de rádio, os entrevistadores do Ibope iam para as ruas visitar as casas. Perguntavam ao morador a qual emissora estava assistindo e há quanto tempo estava vendo o programa. Na manhã seguinte, levavam as planilhas ao Ibope. Altino conta que muitas vezes chegava mais cedo e já passava no instituto de pesquisa para saber de antemão os resultados das audiências dos programas de rádio. Não raro ajudava na compilação dos números que ainda estavam sendo tabulados. Ou, quando o anunciante desconfiava da pesquisa, Altino ou um representante da mídia acompanhava os entrevistadores. O rigor com as pesquisas era uma das características da McCann desde os anos 1950. Só que circulação de jornal e idade de uma senhora eram assuntos indelicados. E como não havia ainda o Instituto Verificador de Circulação (IVC), Altino bolou um jeito de tentar descobrir a circulação líquida paga (sem o encalhe) dos principais jornais do Rio. Prontamente 21 midiap3.indd 21 12/7/2006 10:49:10

22 o dr. Roberto Marinho, dono de O Globo, revelou suas informações de circulação e de todos seus livros de registro à McCann, começando aí uma grande amizade com Altino, que durou até a morte do fundador das Organizações Globo. A abertura tão detalhada se justificava porque a agência vistoriava até as entradas de caixa pela venda de jornais pelos jornaleiros. E, para checar o consumo de papel, Altino pesava o exemplar saído da gráfica com o número de páginas em média. Logo percebeu que o sistema não funcionava para a contagem da circulação porque os jornais, sabedores de que estariam sendo auditados, faziam um café da manhã de confraternização e aumentavam a tiragem naquele dia. Aos poucos, os demais jornais também passaram a declarar seus números, abrindo caminho para a criação do IVC. Para Altino, foi Marinho quem deu o impulso necessário para o desenvolvimento das agências de propaganda. Isso porque foi dele a idéia de substituir gradativamente os corretores comissionados que levavam os anúncios para o jornal O Globo, transferindo a comissão para as agências. A mesma prática repetiu-se quando ele fundou as rádios e a Rede Globo de Televisão. Ele foi o primeiro a reconhecer o benefício que as agências bem estruturadas dariam ao cliente e ao jornal, oferecendo suporte ao crescimento da publicidade brasileira, comenta. O amigo ítalo-americano Em 1950, veio visitá-lo na McCann um senhor que falava português com forte sotaque, misto de italiano com espanhol. Ele lhe disse que tinha adquirido os direitos para editar no Brasil as revistas criadas por Walt Disney, como Pato Donald e Mickey. Contou também que tinha um filho, Roberto Civita, que estava nos Estados Unidos estagiando na revista Time. Altino não sabia, mas dali saiu o primeiro anúncio do Pato Donald. Conquistou a simpatia de seu interlocutor, Victor Civita, nascido em Nova York (EUA), mas que ainda criança se mudara para midiap3.indd 22 12/7/2006 10:49:11

Milão (Itália), embora tenha voltado aos Estados Unidos para estudar. Ao chegar definitivamente ao Brasil, em 1949, ele tinha muitos sonhos de vencer no país, tantos que depois acabou se naturalizando brasileiro. Entre suas ambições estava lançar a Capricho, uma revista de fotonovelas para concorrer com Grande Hotel, que era um sucesso editorial no Brasil. Confiando no novo amigo, pediu a Altino que lhe indicasse alguém para comandar o escritório carioca da Editora Abril, que ficava quase na esquina da avenida Franklin Roosevelt com a Presidente Antonio Carlos, no centro. Como não surgisse ninguém, fez a proposta para Altino, que recusou por não querer se desligar da McCann. Diante disso, Civita pediu a ele que passasse pelo escritório da Abril pelo menos uma vez por semana. E Altino se atirou nesse free-lance não remunerado com a aquiescência da McCann, que não via o fato como uma operação antiética. Afinal, Altino não chegava a figurar como representante de fato, mas como uma espécie de gerenciador durante um ano e meio, sem maiores interesses comerciais. Isso numa época em que os donos de agência pagavam muito mal seus mídias porque sabiam que os veículos davam bola (comissionamento), o que se transformava numa espécie de complementação de salário. Na McCann, isso nunca aconteceu. E Civita também não costumava dar brindes para incrementar seu faturamento publicitário à custa da credibilidade do mídia. Com isso, tanto o italiano quanto Altino ganharam credibilidade no mercado. A partir daí, é a história que todos conhecem: o filho de seu Victor, Roberto Civita, veio para o Brasil e engrandeceu ainda mais o negócio, mantendo a amizade com Altino. Nesse tempo em que a Abril apenas engatinhava, a grande disputa entre anunciantes era pela quarta capa das revistas semanais. O Cruzeiro liderava a preferência, cuja programação Altino fazia no início do ano para a Coca-Cola, garantindo veiculação para metade das edições anuais. Em 1954, lembra que a publicação tinha cerca de 200 mil exemplares semanais. Ele acompanhou de perto a trajetória de Adolpho Bloch que, da impressão de revistas em quadrinhos, folhetos, revistas e house organs, ousou editar a revista semanal de maior popularidade no país. 23 midiap3.indd 23 12/7/2006 10:49:11

Já a concorrente Seleções tinha maior circulação em decorrência do modelo americano utilizado para venda direta de assinaturas. Os Bloch ainda lançariam outros títulos que ficaram muito conhecidos entre os brasileiros, como a revista Manchete, Fatos e Fotos, Desfi le e Pais e Filhos. Muitos anos depois, foi Altino quem encorajou Pedro Jack Kapeller, o Jaquito, diretor da Bloch, a entrar no negócio de televisão com a TV Manchete. Apesar de sentir-se incomodado com o mau negócio dos amigos durante algum tempo, Altino sabe também que eles tiveram grandes alegrias com a emissora. Ao vivo e em cores 24 A televisão chegou ao Brasil em setembro de 1950 pelas mãos do polêmico Assis Chateaubriand, que criou um império da comunicação com vários jornais e emissoras de rádio e TV, além de várias revistas, como O Cruzeiro. O controvertido jornalista fundou a TV Tupi, que era líder absoluta de audiência no final dos anos 1950 e início dos anos 1960. Ainda não havia o recurso do videoteipe e os programas eram produzidos ao vivo e localmente, uma vez que nem tudo o que era sucesso no Rio tinha o mesmo êxito em outras praças. Da mesma forma que o rádio, as agências também produziam programas, inclusive a McCann, que tinha expertise internacional nessa área. Só que as agências sofriam com as gafes das garotas-propaganda e dos apresentadores, que muitas vezes erravam feio a mensagem ou até o nome do patrocinador. Altino viu nascer na agência programas como Esta é sua vida e O céu é o limite, com Jota Silvestre; Circo Bombril, com Carequinha e Fred; e Grande Teatro Nestlé, entre outros que contavam com a produção de Vicente Sesso, Ivani Ribeiro e Zaé Júnior. O anunciante Kolynos, da McCann, era o grande patrocinador, com programações garantidas em todas as emissoras. Em 1960, o mercado do Rio de Janeiro começou a sentir os impactos da mudança da capital do Brasil para Brasília. Apesar disso, a McCann midiap3.indd 24 12/7/2006 10:49:11

era considerada a grande universidade de propaganda do país, reunindo os melhores profissionais, formando talentos e incentivando sempre a criatividade, inclusive em televisão, relata Altino. Nesse período ele já ocupava a chefia-geral de mídia do departamento de mídia da McCann Rio que já integrava mídia impressa, rádio e TV e tinha em sua equipe Ary Lima, Manoel Costa, Heitor Perez e Osmar Gonçalves. Para comprovar sua percepção, Altino lembra que foi elaborado o livro Técnica e prática da propaganda segundo a visão da equipe da McCann- Erickson, coordenado por Eliezer Burla, diretor da McCann Rio e idealizador dos primeiros cursos da Associação Brasileira de Propaganda (ABP). O livro celebrou os 25 anos da McCann no Brasil. Como líder, a McCann também movimentou o mercado com sua Força Volante do Progresso Publicitário, caravana de profissionais da agência do Rio e de São Paulo que davam palestras e promoviam debates sobre propaganda pelo Brasil afora. E mais uma vez, lá se foi Altino, mesmo diante do risco de ser interpelado por agentes da ditadura militar. Movimentar-se pelo país diletantemente como essa equipe fez era por demais arriscado, provocando suspeitas de subversão nessa fase de regime político de exceção vivido pelo Brasil. Enquanto viveu no Rio, Altino invariavelmente estava nas emissoras de televisão a partir das 17 horas, porque as coisas aconteciam com muita rapidez, especialmente quando havia eventos, o que exigia a presença dos mídias para as tomadas de decisões. Ele recorda a tremenda guerra entre anunciantes, como Shell, que patrocinava o programa de Roberto Carlos, na Record, em São Paulo, e a Esso, cliente da McCann, que lançava o seu personagem-símbolo, o tigre, para contra-atacar. A partir de 1967, a Rede Globo entrou na era Walter Clark que, junto com Boni e Arce, comandou a emissora, sempre com total supervisão de Roberto Marinho. Essa convivência fez que, dois anos depois, quando o anunciante patrocinava a transmissão da chegada do Apolo-11 à Lua, Altino assistisse ao feito de camarote, na sede da Rede Globo. Quando, no dia 20 de julho de 1969, o astronauta norte-americano Neil Armstrong entrava para a história como o primeiro homem a pisar na Lua e avistar a Terra 25 midiap3.indd 25 12/7/2006 10:49:11