PROPOSTA DE REDAÇÃO A ÚLTIMA FLOR DO LÁCIO: 800 ANOS DA LÍNGUA PORTUGUESA



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Transcrição:

PROPOSTA DE REDAÇÃO A ÚLTIMA FLOR DO LÁCIO: 800 ANOS DA LÍNGUA PORTUGUESA Língua portuguesa - 800 anos! Conteúdo especial "Língua portuguesa - 800 anos!" Prof. Aquias Valasco Em 2014, a língua portuguesa completa 800 anos. É uma oportunidade ímpar para celebrarmos e exaltarmos a beleza da última flor do Lácio. Por que 800 anos? Depois de afirmada a independência de Portugal no séc. XII e de estabelecidas as fronteiras do reino em meados do séc. XIII, estavam reunidas condições para que o romance galegoportuguês(1) fosse promovido a língua nacional. O primeiro passo era tornar-se língua escrita (da documentação oficial, da literatura e também do uso diário). O mais antigo documento oficial, datado, escrito em português, que chegou até nós (o Testamento de Afonso II, de 1214) prova, devido às suas convenções gráficas mais ou menos estáveis, que no ambiente da corte já se escrevia em português há algum tempo. Com isso se harmoniza a datação da mais antiga cantiga trovadoresca, Ora faz ost o senhor de Navarra, de João Soares de Paiva: o ano de 1196. E a Notícia de Torto, um documento privado sem data, mas situável à volta de 1214, atesta como a língua portuguesa era já usada, pontualmente, para registar apontamentos informais e efémeros; esta prática foi recentemente comprovada por uma Notícia de Fiadores de 1175. Mas é a partir de 1255 que começa a produção regular de documentos escritos em português, primeiro na chancelaria régia, depois por toda a parte. A abundante produção escrita em português torna possível, desde então, observar com mais pormenor as mudanças que a língua vai sofrer entre os sécs. XIII e XV e que, por graduais transições, a levarão a transformar-se de língua medieval em língua clássica. (PORTUGAL, 2014). Embora o mais antigo documento régio escrito em português seja o Testamento de D. Afonso II, de 1214, é o ano de 1255, em tempo de D. Afonso III, que assinala o reaparecimento dos textos escritos em português no âmbito da chancelaria régia. Ivo Castro (1991, 2004a, 2004b) elege-a como marco cronológico para estabelecer o limite final da fase mais antiga da produção escrita em português: antes de 1255 existiu também uma diminuta produção primitiva em português, constituída por documentos de carácter notarial escritos em português. (MARTINS, 2007). Existe um Dia da Língua Portuguesa? Sim, desde 20 de julho de 2009, por resolução da XIV Reunião Ordinária do Conselho de Ministros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa CPLP, comemoramos o Dia da Língua Portuguesa e da Cultura no dia 5 de maio. O que significa "última flor do Lácio"? Para Olavo Bilac, em um de seus poemas, a língua portuguesa é a "última flor do Lácio, inculta e

bela". Lácio é como era chamada na antiguidade a região da península itálica onde hoje fica Roma e adjacências. Foi a partir dali que o domínio cultural da língua latina começou a surgir, vindo a formar o que Rodolfo Ilari (1996), em sua Filologia românica chama de "România" - ou o domínio cultural relacionado à língua latina. Como sabemos, o latim deu origem a várias línguas (na verdade, cerca de sessenta), dentre as quais destacam-se (como línguas nacionais) o italiano, o francês, o espanhol, o romeno e o português. Este é colocado em último lugar por ter sido a "última língua neolatina formada a partir do latim vulgar" (1). O que foi o latim vulgar? Segundo Ilari (op cit), o latim vulgar era falado pelo povo, bem como pelos soldados (oriundos de classes desprestigiadas). A palavra "vulgar", em latim, não tem caráter depreciativo, necessariamente. Esse termo significa "relacionado com o povo". O latim da nobreza e do governo (o sermo urbanus, que só sobreviveu até o século VIII) hoje só existe em forma escrita, modificado. Assim, nenhuma das línguas neo-latinas proveio do latim clássico (de Cícero, por exemplo); são derivações de uma forma mais simples do latim. Quem "faz" a língua? Quem efetivamente "faz" a língua são seus usuários. Como vemos na história das línguas neolatinas, o que determina a trajetória, a forma de um idioma é o uso que seus falantes lhe dão. Não há, portanto, controle mais eficaz do que o controle exercido por quem de fato utiliza a língua. Esse controle não é normativo, já que para o falante (entendido como o usuário da forma oral ou escrita da língua) o que mais importa é se comunicar, fazer-se entendido, e é a partir dessa baliza que ele mantém ou modifica os elementos do idioma. Assim, embora existam órgãos que visem preservar e engrandecer o idioma, os representantes de um idioma são seus usuários. A Academia Brasileira de Letras, o Museu da Língua Portuguesa (em São Paulo) ou o Instituto Camões (Portugal) são algumas das organizações importantes que têm como "objetivo o cultivo da língua e da literatura nacionais" no contexto atual (ABL, 2014). É essencial que essas organizações existam, principalmente quando o inglês, o mandarim e outros idiomas se mostram cada vez mais fortes por conta do contexto mundial, figurando como elementos que representam domínios culturais e econômicos sempre em tensão. Qual a importância da língua portuguesa no mundo hoje? Embora o império português não exista mais, o domínio cultural a que ele se relaciona, representado principalmente pelo idioma português, permanece e é presente em vários continentes. A comunidade dos países de língua portuguesa compõe-se de: Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e até do Timor-Leste, localizado no sudeste asiático. (CPLP, 2014). Além disso, o aprendizado a língua tem se popularizado em países como Inglaterra e Estados Unidos. (OBSERVATÓRIO, 2014). Quais os principais nomes da língua portuguesa? A literatura produzida na língua portuguesa (como em qualquer outra língua) é um elemento essencial para firmar pontos de referência. Assim, e para falar apenas da produção europeia e brasileira, a obra de Luís de Camões (1524-1580), Eça de Queiroz (1845-1900), Fernando Pessoa (1888-1935), Machado de Assis (1839-1908), Euclides da Cunha (1866-1909), Graciliano Ramos (1892-1953), Cecília Meireles (1901-1964), Jorge Amado (1912-2001), Clarice Lispector (1920-1977) e os curitibanos Paulo Leminski (1944-1989) e Lucy Collin são alguns dos nomes que figuram entre aqueles marcos a partir dos quais "bailamos" a dança da constante transformação do idioma.

O que eu tenho a ver com isso? O fato de lembrarmos de nomes como Eça e Euclides não significa que a literatura produzida por esses "patrícios linguísticos" se esgota. Todos eles e elas foram crianças, estudantes, jovens, antes de se consagrarem pela pena. Assim, todos nós temos potencial para figurar entre aqueles que contribuem para a preservação da língua, bastando que assumamos uma postura de respeito e de responsabilidade como usuários do idioma. http://www.portugues.seed.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=1260 Manifesto 2014 800 anos da Língua Portuguesa 13/06/2014-02:06 A língua que falamos não é apenas comunicação ou forma de fazer um negócio. Também é. Mas é muito mais. É uma forma de sentir e de lembrar; um registo, arca de muitas memórias; um modo de pensar, uma maneira de ser e de dizer. É espaço de cultura, mar de muitas culturas, um traço de união, uma ligação. É passado e é futuro; é história. É poesia e discurso, sussurro e murmúrios, segredos, gritaria, declamação, conversa, bate-papo, discussão e debate, palestra, comércio, conto e romance, imagem, filosofia, ensaio, ciência, oração, música e canção, até silêncio. É um abraço. É raiz e é caminho. É horizonte, passado e destino. Na era da globalização, falar português, uma das grandes línguas globais do planeta, que partilha e põe em comum culturas da Europa, das Américas, de África e da Ásia e Oceânia, com centenas de milhões de falantes em todos os continentes, é um imenso património e um poderoso veículo de união e progresso. Em 27 de Junho de 2014, passam oitocentos anos sobre o mais antigo documento oficial conhecido em língua portuguesa, a nível de Estado - o mais antigo documento régio na nossa língua, o testamento do terceiro rei de Portugal, Dom Afonso II. Neste dia, queremos festejar esses oito séculos da nossa língua, a língua do mar, a língua da gente, uma grande língua da globalização. Fazêmo-lo centrados nesse dia e ao longo de um ano, para festejar com o mundo inteiro esta nossa língua: a terceira língua do Ocidente, uma língua em crescimento em todos os continentes, uma das mais faladas do mundo, a língua mais usada no Hemisfério Sul. Celebramos o futuro. Em qualquer lugar onde se fala Português, 27 de Junho de 2014 ABEL BAPTISTA, presidente da Comissão de Educação, Ciência e Cultura da Assembleia da República (Portugal); e outros. http://www.publico.pt/culturaipsilon/noticia/manifesto-2014--800-anos-da-lingua-portuguesa- 1639671 O preconceito linguístico deveria ser crime Basta ser homem, estar em sociedade e estar rodeado de pessoas falantes que a língua - este sistema de comunicação inigualável - emerge. Ela se instaura e toma conta de todos nós, de nossos pensamentos, de nossos desejos e de nossas ações. Falar faz parte do nosso cotidiano, de nossa vida. A troca por meio das formas linguísticas é a nossa dádiva maior, nossa característica básica. É por meio de uma língua que o ser humano se individualiza, em um movimento contínuo de busca de identidade e de distinção. É isso, enfim, que nos torna humanos e nos diferencia de todos os outros animais.

Não existe homem sem língua. Mesmo as pessoas com deficiências diversas adotam um sistema de comunicação. Quem é surdo, por exemplo, usa a linguagem de sinais. Sendo assim, não existe razão para que tenhamos preconceito com relação a qualquer variedade linguística diferente da nossa. Preconceito linguístico é o julgamento depreciativo, desrespeitoso, jocoso e, consequentemente, humilhante da fala do outro ou da própria fala. O problema maior é que as variedades mais sujeitas a esse tipo de preconceito são, normalmente, as com características associadas a grupos de menos prestígio na escala social ou a comunidades da área rural ou do interior. Historicamente, isso ocorre pelo sentimento e pelo comportamento de superioridade dos grupos vistos como mais privilegiados, econômica e socialmente. Então, há críticas negativas em relação, por exemplo, à falta de concordância verbal ou nominal (As coisa tá muito cara); ao "r" no lugar do "l" (Framengo); à presença do gerúndio no lugar do infinitivo (Eu vô tá verificano); ao "r" chamado de caipira, característico da fala de amplas áreas mineiras, paulistas, goianas, mato-grossenses e paranaenses - em franca expansão, embora sua extinção tenha sido prevista por linguistas. Depreciando-se a língua, deprecia-se o indivíduo, sua identidade, sua forma de ver o mundo. O preconceito linguístico - o mais sutil de todos eles - atinge um dos mais nobres legados do homem, que é o domínio de uma língua. Exercer isso é retirar o direito de fala de milhares de pessoas que se exprimem em formas sem prestígio social. Não quero dizer com isso que não temos o direito de gostar mais, ou menos, do falar de uma região ou de outra, do falar de um grupo social ou de outro. O que afirmo e até enfatizo é que ninguém tem o direito de humilhar o outro pela forma de falar. Ninguém tem o direito de exercer assédio linguístico. Ninguém tem o direito de causar constrangimento ao seu semelhante pela forma de falar. A Constituição brasileira estabelece que "ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante''. Sendo assim, interpreto eu que qualquer pessoa que for vítima de preconceito linguístico pode buscar a lei maior da nação para se defender. Até porque, sob essa ótica, o preconceito linguístico se configura como um tratamento desumano e degradante - uma tortura moral. Se necessário for, poderíamos até propor uma lei específica contra esse tipo de preconceito, apenas para ficar mais claro que qualquer pessoa tem o direito de buscar a justiça quando for vítima de qualquer iniciativa contra o seu modo de se expressar. Sei que muitos devem achar que isso é bobagem, que todos devem deixar de falar errado. Mas todo mundo tem direito de se expressar, sem constrangimento, na forma em que é senhor, em que tem fluência, em que é capaz de expressar seus sentimentos, de persuadir, de manifestar seus conhecimentos. Enfim, de falar a sua língua ou a sua variante dela. MARTA SCHERRE, linguista e pesquisadora do CNPQ http://revistagalileu.globo.com/revista/common/0,,emi110515-17774,00- O+PRECONCEITO+LINGUISTICO+DEVERIA+SER+CRIME.html É papel da escola, em algum momento, chamar a atenção para o fato de que há diferenças entre as diversas formas de falar e o que elas significam: pessoas urbanas não falam como as rurais, jovens não falam como idosos, mulheres não falam como homens. Um modo de apresentar-se como jovem é falar como um jovem. Outro, vestir-se como tal. Mas a escola não precisa ensinar algumas das formas de falar, porque as pessoas as aprendem ao natural. O que a escola precisa ensinar é fundamentalmente a escrita. O que ela faz pouco, a meu ver. Ensina-se de verdade a gramática da língua culta lendo e escrevendo, corrigindo. O livro que está na berlinda fala em adequação: escrever tem muito a ver com adequar a linguagem a cada tipo de texto. Num trabalho de biologia, não só se usa um léxico do campo, como o texto se estrutura de forma específica, que é diferente da de uma narração, de um convite, de uma propaganda. O padrão é uma exigência da sociedade, em muitos casos, e a escola deve incluir práticas que levam o aluno a escrever como se espera em cada campo. Mas, para fazer isso, não é necessário tachar outras maneiras de falar de erradas ou de feias. Aliás, esse comportamento, mais do que revelar preconceito, revela ignorância do que seja uma

língua. Se quisermos uma escola mais bem-sucedida, não é necessário ensinar as formas populares orais aos alunos. Eles já as conhecem. Diante dessas variedades, a gente deveria aprender a se maravilhar, o que aconteceria se soubéssemos analisá-las, como se aprende a analisar plantas ou animais. Devese ensinar a -escrita-padrão da única forma que funciona: conseguir que o aluno produza um texto e, a partir dele, por mais precário que seja ou pareça, reescrever até que ele fique adequado, correto e, se possível, elegante. O que consolida o desconhecimento da norma culta é continuar fazendo o que se faz: considerar errados os que só falam diferente, ensinar uma gramática precária. E fazer exercícios que não fazem sentido. O que ensina é ler e escrever analisando o que se lê e se escreve. É fácil. E é barato. Ensinar só faz sentido para conhecer que tipo de bichos são as línguas, como elas se organizam de fato, e não como deveriam se organizar; isso é etiqueta. Em cada ano se poderia eleger um (ou alguns) tipo de estrutura e dar atenção privilegiada a ela. Os alunos deveriam aprender a coletar dados, classificar, encontrar regularidades. Pode-se estudar a gramática da fala da região em que a escola está. Os professores poderiam ser linguistas curiosos: levar em conta como se fala na região em que são professores até para saber o que falta ensinar. Se é para ensinar gramática apenas para que a conclusão dos alunos seja que eles não sabem português, confundindo, aliás, língua e gramática, seria melhor nem incluir no currículo. Sírio Possenti, pesquisador da UNICAMP In: Língua, que bico é esse? http://www.cartacapital.com.br/carta-fundamental-arquivo/lingua-que-bicho-e-esse A Língua Portuguesa, a última flor do Lácio, comemora, em 2014, 800 anos. Oito séculos de evolução de algo vivo que se transformou e se recriou constantemente. Que foi matéria-prima de genialidades artísticas que legaram aos falantes do idioma verdadeiros monumentos em prosa e verso. No entanto, uma língua não é só matéria para obras literárias memoráveis. Ela também é símbolo de status e poder. Sobre ela também se abre um palco de disputas de classes sociais de falantes do idioma, em que o preconceito linguístico se manifesta como forma de hierarquizar os diversos grupos sociais que se comunicam dentro de uma língua. A última flor do Lácio é também a flor de propriedade privada apenas de certos grupos de falantes? E como o ensino de Língua Portuguesa deve valorizar esta história de 800 anos em que a democracia do idioma deva fazer parte da vida e da mentalidade de todos os falantes? Com base em tais reflexões e nos textos da coletânea, escreva uma dissertação-argumentativa sobre o tema: 800 anos da Língua Portuguesa entre a história e a beleza de um idioma e sua aplicabilidade no cotidiano social - Dê um título para sua redação. - Apresente uma proposta de intervenção que não desrespeite os direitos humanos.