MORADIA E MOBILIÁRIO POPULAR: PROBLEMA ANTIGO SOLUÇÃO (IM)POSSÍVEL?



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MORADIA E MOBILIÁRIO POPULAR: PROBLEMA ANTIGO SOLUÇÃO (IM)POSSÍVEL? MELRI A. TOPOROWICZ SOARES Tecnóloga em Design de Móveis Universidade Tecnológica Federal do Paraná/UTFPR smelri@hotmail.com MARILZETE BASSO DO NASCIMENTO Professora Universidade Tecnológica Federal do Paraná/UTFPR marilzetenascim@utfpr.edu.br 69

MORADIA E MOBILIÁRIO POPULAR: PROBLEMA ANTIGO SOLUÇÃO (IM)POSSÍVEL? RESUMO O déficit habitacional no Brasil é um problema antigo, principalmente entre a população de baixa renda. Programas habitacionais são criados com o objetivo de tentar solucionar ou amenizar esta questão, porém estas moradias se tornam cada vez mais reduzidas, já que se procura construir mais, e não melhor. Os móveis populares são vistos como produtos que precisam ser baratos, mesmo que isso comprometa a durabilidade e a estética. Por outro lado, a prática do design não é considerada pela maioria das indústrias do setor moveleiro. O espaço reduzido destas habitações e a inadequada configuração do mobiliário comprometem o conforto, o bem-estar, a autoestima, enfim, a qualidade de vida dos moradores. O presente estudo tem como objetivo fazer um levantamento de moradias voltadas para população de baixa renda no Paraná e do mobiliário popular encontrado no mercado para este público. O estudo inicia com uma fundamentação teórica, abordando questões como habitação popular, conforto, antropometria e modularidade aplicada ao mobiliário. Na sequência, apresenta uma pesquisa de campo, onde são levantados projetos de habitações populares, o mobiliário voltado para o público de baixa renda e entrevistas com moradores destas casas. Finalmente, apresenta uma comparação entre as moradias e o mobiliário disponível. Palavras-chave: Moradia popular; mobiliário popular, conforto, mobiliário modulado. ABSTRACT The deficit habitacional into the Brazil that s a problem antique, especially among the populace of low income. Housing programs are created with the aim of trying to solve, or soften, this issue, but these houses are becoming increasingly limited, as it seeks to build more, not better. The popular furniture are seen as products that need to be cheap, even if it reduce the durability and aesthetics. The practice of design is not considered by most industries of furniture sector. The space reduced of these houses and inadequate configuration of furniture are compromising the comfort, welfare, self-esteem, finally, the quality of life of houses. This study aims to do a survey of housing geared to low-income population in Paraná and furniture found in the popular market for this people. The study begins with a theoretical basis, addressing issues such as housing popular, comfort, anthropometry and modularity applied to furniture. Then, it presents a survey, which are raised in housing projects popular, the furniture turned to low-income public and interviews with users of these homes. Finally, it presents a comparison between the houses and furniture available. Keywords: Home popular, popular furniture, comfort, modular furniture. 70 da Vinci, Curitiba, v. 5, n. 1, p. 69-96, 2008

Melri A. Toporowicz Soares e Marilzete Basso do Nascimento MORADIA E MOBILIÁRIO POPULAR: PROBLEMA ANTIGO SOLUÇÃO (IM)POSSÍVEL? MELRI A. TOPOROWICZ SOARES / MARILZETE BASSO DO NASCIMENTO 1 INTRODUÇÃO O déficit habitacional é um problema no Brasil. No Paraná, segundo Companhia de Habitação do Paraná (COHAPAR, 2008) o déficit é de 85,4% para quem tem renda mensal de até três salários mínimos. Com o objetivo de diminuir este déficit no Brasil, programas de habitação popular deram prioridade aos segmentos da população de baixa renda e 60% dos empreendimentos foram destinados a este público (IPEA, 2008). Em fevereiro de 2008, a Cohapar lançou o programa Mobiliário Popular, cuja ideia é criar uma linha de produção e financiamento de móveis adequados aos tamanhos das casas, proporcionando produção em larga escala, o que permite a redução dos preços dos móveis. Com o aquecimento da construção civil no Brasil, houve aumento na geração de emprego e renda para as classes C, D e E, que compõem a maior parte da população brasileira e, consequentemente, a maior parte de consumidores de móveis populares no Brasil. A iniciativa da Cohapar ocorreu devido à dificuldade das empresas em desenvolver uma linha de produtos com medidas adequadas aos espaços reduzidos das habitações. A condição para que o programa de financiamento do mobiliário seja efetivado é que os móveis tenham pelo menos três anos de garantia (DUARTE, 2008). A função da moradia é possibilitar abrigo, conforto e bem-estar ao morador, mas devido à redução do tamanho das habitações, esta função pode estar sendo comprometida. O espaço interno reduzido e a falta de móveis adequados comprometem o uso dos espaços e objetos. Ao se deparar com estes problemas, as pessoas reorganizam os espaços conforme suas necessidades e condições. 2 A HABITAÇÃO POPULAR E O MOBILIÁRIO POPULAR A indústria brasileira de móveis é formada por mais de 16 000 micros, pequenas e médias empresas que geram mais de 189 000 empregos, localizadas em sua maioria na Região Centro-Sul do país, com alguns pólos moveleiros, como Bento Gonçalves (RS), São Bento do Sul (SC), Arapongas (PR), Mirassol, Votuporanga e São Paulo (SP), Ubá (MG), Linhares (ES) (ABIMÓVEL, 2008). Uma característica do setor é o grande número de micro e pequenas empresas: 88,5% têm até 20 funcionários, sendo 57,5% até 4 funcionários. Apenas 13 empresas têm da Vinci, Curitiba, v. 5, n. 1, p. 69-96, 2008 71

MORADIA E MOBILIÁRIO POPULAR: PROBLEMA ANTIGO SOLUÇÃO (IM)POSSÍVEL? mais de 500 funcionários, que empregam 6,3% do total do setor. A média de funcionários por estabelecimento formal é de 11, abaixo da média industrial, que é de 15 pessoas por unidade (FINEP, 2007). O mercado que abrange as classes C, D e E tem crescimento contínuo e movimentou R$ 550 bilhões em 2007. Investir em produtos voltados à classe popular é uma das estratégias adotadas para vencer a concorrência entre empresas (FIEP, 2008). 2.1 Móveis Populares Com os espaços residenciais mais reduzidos existe a necessidade de buscar soluções no design de mobiliário para garantir a melhor utilização destes espaços, com mobiliário mais confortável, além de manter baixo custo. A diminuição do espaço, em contraste com o aumento de atividades, requer propostas inovadoras no design de mobiliário. Algumas das propostas desenvolvidas foram os armários e camas embutidos, e móveis específicos para computador (VERÍSSIMO, 1999). Porém, soluções como estas, na maioria das vezes, não são viáveis para a população de baixa renda. Sobre os móveis populares, Devides (2006) comenta que: Os móveis retilíneos populares, produzidos de maneira seriada, são exemplos de produtos distanciados das necessidades do usuário. Sua configuração final representa muito mais as restrições impostas pelo modo de produção industrial, as limitações da matéria- -prima utilizada e as buscas pelas soluções industriais mais vantajosas economicamente para o mercado, do que um produto desenvolvido visando as necessidades práticas e socioculturais do usuário, agravando-se porque, ao produto final acrescenta-se revestimentos ou acabamentos brilhantes, aplica-se formas e acessórios extravagantes, evocados no último instante, na tentativa de diferenciá-lo ou melhorá-lo perante a concorrência, atribuindo este procedimento, mais ligado a cosmética, o nome de design (DEVIDES, 2006, p. 14). Para Folz (2003), a alternativa para baixar os custos do móvel foi o sacrifício da qualidade, economizando matéria-prima, substituindo materiais adequados por outros mais baratos, utilizando acessórios menos resistentes, acabamento insatisfatório e pouco investimento em design. Estes fatores exemplificados por Folz (2003) estão sintetizados no quadro 1. Quadro 1 Comparativo de materiais nos móveis. 72 da Vinci, Curitiba, v. 5, n. 1, p. 69-96, 2008

Melri A. Toporowicz Soares e Marilzete Basso do Nascimento A primeira experiência em produção seriada foi a de Celso Martinez Carrera, que desenhou uma linha de móveis em madeira vergada, que possibilitava a racionalização da produção e preços mais acessíveis (DEVIDES, 2006). A cama patente (figura 1) foi uma experiência pioneira em mobiliário no país e conquistou o mercado brasileiro. Os modelos populares eram muito difundidos, tendo como principais usuários a classe operária. Eram comercializados em lojas de departamentos e no interior do país eram vendidas até mesmo em feiras e armazéns (SANTOS, 1995). O design envolve aspectos como diminuição do uso de materiais, tempo de fabricação e ainda pode incorporar no produto: a multifuncionalidade; melhor adequação ao espaço ao qual é destinado; dimensões e formas mais adequadas para suas funções, fatores que beneficiam tanto o usuário como a indústria. Atualmente, a maioria das indústrias moveleiras não incorpora o design na sua produção, vendo-o como algo dispensável (FOLZ, 2003). Os espaços também estão sendo reduzidos em habitações de classe média, porém, neste caso, há a solução de adequá-los por meio da aquisição de móveis projetados, modulados ou sob medida. Essa solução é inviável economicamente para as camadas mais populares. 2.2 Moradia Popular Figura 1 Cama patente Fonte: Oliveira, 2008. A habitação popular é definida por Folz (2002) como aquela voltada para a classe trabalhadora que vive na cidade e que possui renda familiar de até cinco salários mínimos, sejam estas moradias construídas por iniciativa pública ou privada. No Brasil, o conceito de habitação evoluiu segundo as características socioculturais de cada período. As transformações sociais decorrentes da Abolição da Escravatura e da Proclamação da República também influenciam no modo de morar. Compactam-se os espaços, pois não há mais o escravo para as tarefas consideradas servis, que passam a ser responsabilidade direta ou indireta da mulher (VERÍSSIMO, 1999, p. 24). A urbanização implicou no adensamento demográfico e, então, surgiram os cortiços, favelas e vilas de operários. Nos anos 1920, surgiram os edifícios de apartamentos, abrigando os segmentos mais baixos da população, que ocupam os conjuntos habitacionais. As propostas de habitação popular surgiram depois que as favelas proliferaram, com o objetivo de tentar erradicá-las (VERÍSSIMO, 1999). Aparentemente, a política habitacional se concentra em procurar reduzir o déficit habitacional, mas não considera as questões culturais e hábitos dos moradores, que também são importantes para a estratégia de inclusão social, o que acaba interferindo no dia a dia além de trazer prejuízo no que diz respeito ao conforto e ao bem-estar das famílias nas moradias. da Vinci, Curitiba, v. 5, n. 1, p. 69-96, 2008 73

MORADIA E MOBILIÁRIO POPULAR: PROBLEMA ANTIGO SOLUÇÃO (IM)POSSÍVEL? 2.2.1 Conforto Veríssimo (1999) define casa como: [...] a casa é o reduto da família, portanto, seu próprio espelho, refletindo também, numa maneira mais abrangente, a sociedade da qual essa mesma família faz parte, ao mesmo tempo em que é sua geradora (VERÍSSIMO, 1999, p. 21). A casa é onde vivemos e nos sentimos protegidos, por isso, o espaço deve contribuir para o bem-estar de quem o ocupa e é fundamental a utilização de soluções eficientes para promover o conforto. Schmid (2005) comenta que: A casa acolhe. Atende a um conjunto de necessidades básicas de segurança, envolvimento, orientação no tempo e, principalmente, no espaço. É como se oferecesse consolo interminável ao ser humano, lançado no mundo. E na casa, a qualidade mais importante parece ser o conforto (SCHMID, 2005, p. 13). Rybczynski (1999) comenta que na Idade Média os pobres moravam mal e não tinham água ou saneamento, praticamente não tinham móveis ou objetos pessoais, situação que na Europa durou até o século XX. As casas eram tão pequenas que a vida familiar ficava comprometida. Os casebres de um cômodo eram pouco mais que abrigos e falar de conforto nestas circunstâncias era um absurdo, pois se tratava de sobrevivência. Após o fim da Idade Média, a vida doméstica começou a mudar, e as comodidades foram melhorando. Antes desse período, a casa não possuía divisões e a maioria das atividades era realizada num mesmo ambiente. A sala principal ainda servia para diversas atividades, mas já se cozinhava em um compartimento separado. Ainda havia quem dormisse na sala em camas desmontáveis, mas já havia um quarto só para dormir. Outra mudança foi a separação do local de trabalho e de morar, que tornou a casa um lugar mais privado (RYBCZYNSKI, 1999). O conforto apresenta-se como um conceito que teve significados diferentes em épocas diferentes. No século XVII significava privacidade, que levou à intimidade, que por sua vez levou à domesticidade. O século XVIII passou a enfatizar o lazer e o bem-estar e o século XIX enfatizou a eficiência e a conveniência. Assim, o conforto doméstico envolve os seguintes atributos: conveniência, eficiência, lazer, bem-estar, prazer, domesticidade, intimidade e privacidade, características que, juntas, contribuem para a atmosfera de tranquilidade que é parte do conforto. Como afirma Rybczynski (1999, p. 223), O bem-estar doméstico é uma necessidade humana fundamental, que está profundamente enraizada em nós e precisa ser satisfeita. Assim, para atingir conforto e bem-estar nos interiores domésticos, uma questão importante é a observação da antropometria, por isso, serão levantados os conceitos e as recomendações encontradas na literatura relacionadas aos ambientes domésticos. 2.2.2 Antropometria Desde o final do século XVIII havia estudos sobre a antropometria, mas somente a partir dos anos 1940 é que a necessidade de estudos antropométricos se desenvolveu. A Segunda Guerra Mundial trouxe grande impulso às pesquisas e ainda hoje a indústria militar utiliza-se da antropometria (PANERO; ZELNIK, 2002). Devido a variações existentes, é importante que os dados selecionados sejam adequados ao usuário do espaço ou mobiliário a ser projetado. 74 da Vinci, Curitiba, v. 5, n. 1, p. 69-96, 2008

Melri A. Toporowicz Soares e Marilzete Basso do Nascimento Se o projeto requer que o usuário alcance algo a partir de uma posição em pé ou sentada, o dado percentil 5 deve ser utilizado. Este dado, referente ao alcance do braço, indica que 5% da população terá uma distância menor de alcance, enquanto que 95%, ou a grande maioria, terá maiores graus de alcance. [...] Em projetos onde a principal preocupação é o espaço livre deve-se utilizar o maior percentil, ou seja, 95, devido a uma lógica muito simples. Se o projeto oferecer um espaço livre adequado para usuários com maiores dimensões corporais, também oferecerá um bom espaço livre para usuários com menores dimensões corporais (PANERO; ZELNIK, 2002, p. 37). As atividades que ocorrem dentro de espaços residenciais são diversas e esta variedade de funções, com a diminuição dos espaços residenciais, tornam necessário otimizar a utilização do espaço, e que a interface entre o homem e o ambiente seja bem planejada, para evitar situações de fadiga e acidentes (PANERO; ZELNICK, 2002). 2.2.3 Os ambientes das casas A) Cozinha e área de serviço A cozinha é a um dos ambientes mais propícios a acidentes, pois utiliza gás, fogo e elementos pontiagudos, o que torna necessário observar uma circulação adequada (GURGEL, 2003). Segundo Veríssimo (1999), nos apartamentos, as cozinhas atingem dimensões mínimas, onde a racionalização deve ser máxima, e nestes espaços reduzidos é preciso esforço e imaginação para acomodar um pequeno refrigerador e um fogão. Figura 2 Organização da cozinha em triângulo Fonte: Gurgel, 2003, p. 187. De acordo com Gurgel (2003), a cozinha é uma estação de trabalho composta de três atividades básicas: armazenar, preparar e cozinhar, que são representadas respectivamente por geladeira, pia e fogão. A melhor forma de organizar as três atividades é a triangular (figura 2). A soma entre as três distâncias deve ser inferior a 6,50 m e a distância entre a pia e a geladeira deve ser a menor delas. Uma organização espacial adequada pode estruturar a rotina diária, sem desperdício de esforços físicos. Estudos para tornar a cozinha mais eficiente são parâmetros, como a utilização de cozinhas menores, alturas certas das bancadas, localização correta de eletrodomésticos e organização nas prateleiras para armazenagem (WEY, 2007). Em 1950, Le Corbusier criou para a prefeitura de Marseille, 750 células habitacionais, destinadas a acomodar a população operária da França. Cada célula continha cozinha de 4 m², com pia, fogão e geladeira. Mas o ápice da compactação das cozinhas ocorreu em 1963, quando Joe Colombo desenvolveu uma minicozinha móvel, que consiste em duas chapas de fogão elétrico, refrigerador, guarda-louças e gavetas, alojados em um metro cúbico (WEY, 2007). da Vinci, Curitiba, v. 5, n. 1, p. 69-96, 2008 75

MORADIA E MOBILIÁRIO POPULAR: PROBLEMA ANTIGO SOLUÇÃO (IM)POSSÍVEL? A cozinha mostra-se ao longo da história como um ambiente de grande importância. É nesse local que se procura inovar, promover melhorias continuamente e onde materiais, ferragens e acabamentos são aplicados primeiramente. Atualmente a cozinha está cada vez mais próxima da área de serviço (GURGEL, 2003). A proximidade entre estes ambientes não é uma solução adequada porque se perde qualidade na função dos dois ambientes. A tabela 1 apresenta as medidas indicadas por Panero, Zelnik (2002) e Neufert (1976) para cozinha e área de serviço. Nestas indicações, são observados: altura adequada das bancadas e os espaços de circulação e acesso. Tabela 1 Alcances e distâncias em cozinhas. B) Sala estar/jantar Nas moradias populares não há divisão entre a sala de estar e jantar e, geralmente, as funções desses ambientes são compartilhadas no mesmo espaço, às vezes, conjugadas à cozinha. A sala foi alvo de transformações no decorrer dos séculos, mas não perdeu sua característica principal, a de ser o centro social da casa, mesmo que agregada a sala de jantar. Nesse ambiente se encontra o melhor mobiliário da casa, os utensílios mais aparatosos, sendo o espaço doméstico onde se admite o visitante (VERÍSSIMO, 1999). As várias atividades e o mobiliário associados com espaços de estar, resultam em diversos níveis de interface entre o corpo humano e os componentes físicos do espaço, como é o caso da interface entre o corpo humano e cadeiras ou sofás (PANERO; ZELNICK, 2002). Na sala de estar, as dimensões consideradas neste ambiente são relacionadas à circulação e alcance, largura e movimentação corporal e aberturas de portas e gavetas. Para as áreas de refeições, os dados mais relevantes são o espaço livre em volta da mesa e o número de pessoas que vão utilizá-la. Para garantir boa interface entre corpo humano e mesa para refeições, deve-se considerar as dimensões antropométricas, o corpo humano e suas movimentações, a cadeira e a área individual de acesso à mesa (PANERO; ZELNICK, 2002). A tabela 2 apresenta dimensões indicadas para a sala de estar e jantar. 76 da Vinci, Curitiba, v. 5, n. 1, p. 69-96, 2008

Melri A. Toporowicz Soares e Marilzete Basso do Nascimento Tabela 2 Distâncias, alcances e dimensões para sala estar/jantar. Fonte: Adaptado de Panero e Zelnick, (2002). C) Quarto O quarto é um ambiente privativo, em que diversas atividades são realizadas, como dormir, estudar, ver televisão e organizar os pertences (GURGEL, 2003). Segundo Panero e Zelnik (2002), nos dormitórios deve-se observar a circulação em volta da cama, o espaço para arrumá-la e para fazer a limpeza do quarto, espaço livre entre aquela e a cômoda ou armário com portas e gavetas abertas, além de seu tamanho adequado. Em casos em que se procura otimizar o espaço nos ambientes, utiliza-se gavetas sob as camas, e neste caso é importante um espaço livre adequado para a abertura e acesso a estas gavetas. O beliche é outra opção para otimizar espaços. Na sua utilização é preciso considerar o espaço livre necessário entre as duas camas para acomodar o corpo humano sentado. A tabela 3 apresenta as medidas utilizadas em quartos, de acordo com Panero e Zelnik (2002), Neufert (1976) e Gurgel (2003). da Vinci, Curitiba, v. 5, n. 1, p. 69-96, 2008 77

MORADIA E MOBILIÁRIO POPULAR: PROBLEMA ANTIGO SOLUÇÃO (IM)POSSÍVEL? Tabela 3 Dimensões indicadas para dormitórios. 2.3 Modularidade Aplicada ao Mobiliário Móveis adaptáveis para ambientes reduzidos podem ser alcançados por meio da multifuncionalidade e modularidade. De acordo com Folz (2003), o móvel modulado apresenta vantagens para a indústria na produção, diminuindo o número de peças do móvel, reduzindo o custo, e para o consumidor, que pode adaptá-lo melhor ao espaço que possui. A partir da década de 1950, o móvel moderno iniciou a transição de uma produção artesanal para uma produção seriada (DEVIDES, 2006). De acordo com Santos (1995), as soluções industriais para produção em série no Brasil são marcadas pelas seguintes empresas: Fábrica de Móveis Z, Ambiente Indústria e Comércio de Móveis S.A; Móveis Branco e Preto, L Atelier Móveis e a Unilabor Ind. de Artefatos de Ferro e Madeira Ltda. Zanine Caldas, na Fábrica de Móveis Z, procurou baixar o custo do móvel por meio da industrialização e a utilização da madeira compensada. Sua produção foi orientada pela modulação e aproveitamento das chapas (SANTOS, 1995). Foi um tipo de produção que se articulou bem com as condições industriais da época. Porém, os produtos desenvolvidos por essa empresa não atingiram as classes mais populares. A Unilabor, empresa criada em 1954, integrante da Comunidade de Trabalho Unilabor, projeto social-religioso, reuniu profissionais de diversas áreas, entre eles o designer Geraldo de Barros, responsável pelo desenho da produção. A modulação era utilizada com o objetivo de aumentar a produção e baixar o custo, desenvolvendo um mínimo de peças com o maior número de combinações. A produção era voltada para a classe média (SANTOS, 1995). A figura 3 apresenta uma estante e um buffet produzidos pela Unilabor. A linha é composta por componentes produzidos separadamente e em escala, montadas com o nú- 78 da Vinci, Curitiba, v. 5, n. 1, p. 69-96, 2008

Melri A. Toporowicz Soares e Marilzete Basso do Nascimento mero de prateleiras, gavetas e portas que o usuário define. Esses produtos demonstram a preocupação em proporcionar flexibilidade ao móvel, em que o usuário pode interferir, personalizando de acordo com seu desejo. Figura 3 buffet e estante produzidos pela Unilabor Fonte: MCB, 2008. De acordo com Santos (1995), a produção de Michel Arnoult, na Mobília Contemporânea, é considerada exemplo da racionalização na produção de móveis no Brasil. A empresa lançou uma linha de móveis a preços médios, composta por elementos que permitiam a qualquer um criar seu próprio ambiente. A flexibilidade dessa mobília se devia à aplicação de uma medida comum de 45 cm, que permitia a combinação e o encaixe de vários elementos. Outras variáveis importantes na produção da Mobília Contemporânea são: múltipla função de uso de cada modelo e de cada peça; desmontabilidade total; reposição das peças; homogeneidade na usinagem e acabamento e um móvel resistente aos modismos. Nesta linha, cem peças podiam compor cinquenta e três móveis diferentes. A mobília contemporânea se caracterizou pela preocupação com a modulação e o móvel em série, e a sua principal característica é que apresenta a possibilidade de permanência no mercado, rejeitando a obsolescência do produto. Michel Arnoult acreditava ser negativa a tentativa de criar hábitos de compra de nação rica em país pobre. A empresa desenvolveu a poltrona Peg-Lev (figura 4), construída em pau-ferro, com assento e encosto em couro natural, que seria comercializada em supermercados, a preços acessíveis, e com montagem simplificada, que poderia ser realizada pelo próprio usuário. Arnoult foi precursor do projeto de móveis modulados e desmontáveis, defensor da democratização do design, tendo sonhado com o design bom e barato, acessível a amplas camadas da população (MCB, 2008). Figura 4 Poltrona desmontável linha Peg-Lev Fonte: Folz, (2003, p. 79). da Vinci, Curitiba, v. 5, n. 1, p. 69-96, 2008 79

MORADIA E MOBILIÁRIO POPULAR: PROBLEMA ANTIGO SOLUÇÃO (IM)POSSÍVEL? Este contexto demonstra que na década de 1950 havia iniciativas de designers voltados para a questão da modularidade, como forma de proporcionar maior flexibilidade, de uso e produção, ao mobiliário. Porém, essas iniciativas obtiveram pouco sucesso em relação ao mobiliário voltado para população de baixa renda, apesar de buscarem soluções mais econômicas e redução no custo de fabricação. 3 PESQUISA METODOLOGIA E PROCECIMENTOS A coleta de dados para a pesquisa foi realizada em três fases durante o ano de 2008: a primeira se refere ao levantamento de projetos de casas populares construídas pela Cohapar; na segunda foi realizado o levantamento do mobiliário popular, por meio dos sites das empresas e lojas de móveis; e na terceira foram realizadas as entrevistas com três moradores de conjuntos habitacionais construídos pela Cohapar. O termo moradia popular neste trabalho se refere às habitações destinadas às famílias de baixa renda 2 a 4 salários mínimos e às moradias com 40, 52 ou 63 metros quadrados, financiadas por órgãos do poder público, como a Cohapar. 3.1 Levantamento e Análise de Plantas de Casas Populares O levantamento das plantas de projetos de casas populares no Paraná aconteceu com a coleta física ou digital em construtoras de iniciativa pública e privada. Esse levantamento consta de um projeto da Cohapar e de outras duas construtoras voltadas para moradias populares, localizadas em Curitiba ou região metropolitana. a) Projeto Cohapar O primeiro projeto apresentado é o da Cohapar, com planta de 40 m² (figura 5). A planta do projeto apresenta dois quartos, cozinha, sala de estar/jantar e banheiro. Nesse projeto, a cozinha localiza-se próxima à sala e não há divisão entre Figura 5 Planta casa popular 40 m² Cohapar Fonte: Cohapar, (2008). os ambientes. Possui metragem quadrada de aproximadamente 4,82 m² e acomoda fogão de quatro queimadores, geladeira e pia com uma cuba, em um dos lados do ambiente, e um armário na parede frontal. O espaço destinado à área de serviço está localizado do lado externo. A sala possui metragem quadrada aproximada de 15 m². Esse ambiente é destinado a ser sala de estar, jantar e circulação. De acordo com disposição dos móveis na planta, é 80 da Vinci, Curitiba, v. 5, n. 1, p. 69-96, 2008

Melri A. Toporowicz Soares e Marilzete Basso do Nascimento possível colocar sofás de dois e três lugares, ou um sofá de canto, com quatro lugares. A mesa está com um lado encostado na parede e possui cinco lugares. Uma das cadeiras está próxima à estante, e não tem acesso confortável. O quarto de solteiro possui aproximadamente 7 m² de área e o projeto sugere a colocação de duas camas de solteiro e um armário de três portas. As camas estão posicionadas junto à parede e a circulação entre as camas é bastante limitada. No quarto de casal, a metragem quadrada é um pouco maior, aproximadamente 8,35 m². Conforme sugere o projeto, é possível colocar uma cama de largura de 145 cm e comprimento de 200 cm, duas mesas de cabeceira e um armário de três portas. b) Construtora B O próximo projeto apresentado pertence à outra construtora, também voltada para projetos habitacionais populares, de 36 m² (figura 6). Assim como no projeto anterior, consta de dois quartos, sala estar/jantar, cozinha e banheiro. Figura 6 Planta casa popular 41m² - Construtora B Fonte: Folder AW Imóveis, (2008)m A sala e a cozinha, juntas, possuem aproximadamente 15 m², acumulando funções de sala de estar, jantar, cozinha e circulação. De acordo com o projeto, no lado esquerdo desse ambiente é possível colocar um sofá de dois lugares, um balcão e um móvel para TV. O projeto sugere a colocação de uma mesa redonda, de quatro lugares. O espaço destinado à cozinha acomoda um balcão de pia com uma cuba e um armário. Esse projeto não indica a colocação de fogão e geladeira, demonstrando que não foi considerada uma disposição adequada dos eletrodomésticos básicos da casa. O projeto não apresenta uma área destinada à área de serviço. O quarto de solteiro possui aproximadamente 6,80 m² e o projeto sugere a colocação de apenas uma cama de solteiro, uma mesa de cabeceira e um armário de três portas. A cama está posicionada junto à parede e a circulação é bastante limitada entre a cama e o armário. No quarto de casal, a metragem quadrada é de aproximadamente 8,30 m². Conforme o que sugere o projeto, é possível colocar a cama de largura de 145 cm e comprimento de 200 cm, duas mesas de cabeceira, uma cômoda em frente à cama e um armário de quatro portas. Nesse ambiente, o maior problema de circulação está entre a cômoda e a cama. c) Construtora C O projeto apresentado a seguir pertence a uma terceira construtora e possui área de 54 m² (figura 7). Esse projeto também consta de dois quartos, sala estar/jantar, cozinha e banheiro. O espaço destinado à cozinha está separado da sala e possui metragem quadrada de aproximadamente 6,5 m², contando com a área destinada à lavanderia, que está separada por uma porta de correr. Esse espaço acomoda, segundo o projeto, fogão de quatro queimadores, geladeira e pia com uma cuba. da Vinci, Curitiba, v. 5, n. 1, p. 69-96, 2008 81

MORADIA E MOBILIÁRIO POPULAR: PROBLEMA ANTIGO SOLUÇÃO (IM)POSSÍVEL? Figura 7 Planta ap. 54 m² - Construtora C Fonte: Casaredo, (2008). As salas de jantar e estar estão numa mesma área, com metragem quadrada aproximada de 15,5 m². De acordo com disposição dos móveis na planta, no lado do ambiente destinado à sala de estar é possível colocar um sofá de três lugares, duas poltronas e um móvel para TV. Para a área da sala de jantar, o projeto sugere a colocação de mesa retangular para seis lugares. A organização sugerida no projeto não apresenta problemas de circulação. O quarto de solteiro possui 7 m² de área e o projeto sugere a colocação de duas camas de solteiro, uma mesa de cabeceira e dois armários de duas portas cada. As camas posicionadas junto à parede permitem uma circulação central de apenas 50 cm. No quarto de casal, a metragem quadrada é de 8,9 m². Conforme o projeto, é possível colocar cama de largura de 145 cm e comprimento de 200 cm, duas mesas de cabeceira e um armário de quatro portas. A circulação está de acordo com o mínimo indicado na literatura. Com o levantamento de projetos habitacionais populares, nota-se que os ambientes necessitam de soluções adequadas de mobiliário para otimizar os espaços e favorecer conforto aos usuários. 3.2 Levantamento de Mobiliário Popular Para o levantamento de peças do mobiliário popular, foi necessário selecionar os fabricantes encontrados no mercado. Para isso, optou-se por empresas localizadas no polo moveleiro de Arapongas ou na região metropolitana de Curitiba. A seguir apresenta-se o levantamento de mobiliário popular encontrado no mercado. Os dados considerados neste levantamento foram: dimensões, materiais e acabamento dos produtos. Para a realização de uma breve análise da forma desses produtos, foram colocadas também algumas imagens. 82 da Vinci, Curitiba, v. 5, n. 1, p. 69-96, 2008

Melri A. Toporowicz Soares e Marilzete Basso do Nascimento 3.2.1 Cozinha Para as cozinhas populares, encontram-se os kits, que são compostos por balcão (duas portas e um gaveteiro), armários compostos por paneleiro alto e armários superiores com portas, ou os kits compactos, compostos geralmente por quatro portas e quatro gavetas inferiores e quatro portas superiores, sendo uma delas mais alta (quadro 2). Quadro 2 Cozinhas. tabela 4. As dimensões mais encontradas em mobiliário para cozinha são apresentadas na Tabela 4 Comparativo entre móveis de cozinha. O MDP (Medium Density Particleboard, ou Painel de Partículas de Média Densidade) é a matéria-prima predominante e o MDF (Medium Density Fiberboard, ou Painel de Fibras de Média Densidade) é encontrado em portas. O acabamento é realizado em impressão UV (Ultravioleta). Em relação às cores, o branco é utilizado em todas as marcas na fabricação da caixaria, e para as portas, é utilizada grande variação: verde, laranja, azul, tabaco, marfim, pérola e branco. da Vinci, Curitiba, v. 5, n. 1, p. 69-96, 2008 83

MORADIA E MOBILIÁRIO POPULAR: PROBLEMA ANTIGO SOLUÇÃO (IM)POSSÍVEL? 3.2.2 Sala estar/jantar Os quadros 3 e 4 apresentam o levantamento de estantes e racks. Quadro 3 Levantamento de estantes. Quadro 4 Levantamento de racks. O mobiliário para sala, racks e estantes (quadro 4), apresentam semelhanças em matéria-prima e acabamento, porém em relação à forma e à dimensão, é possível perceber variação maior. As estantes e racks possuem dimensões que variam conforme a tabela 5. Tabela 5 Comparativo entre as dimensões de racks e estantes O principal material encontrado é o MDF e o MDP e o acabamento em impressão UV. Apenas um fabricante destaca o uso do tamburato (painel robusto, produzido com camadas externas de partículas finas de madeira prensada, com espessura de 7 mm, e miolo Honeycomb colmeia de papel reciclado) em partes do móvel, tampos e prateleiras mais espessas. No caso dos móveis em tamburato, as peças são revestidas em BP (acabamento dado aos painéis de madeira, com melamina aplicada em baixa pressão). Os sofás de dois lugares e de três lugares (quadro 5) apresentam dimensões que variam na largura, na altura a variação é menor e a profundidade varia em um modelo, conforme apresenta a tabela 6. 84 da Vinci, Curitiba, v. 5, n. 1, p. 69-96, 2008

Melri A. Toporowicz Soares e Marilzete Basso do Nascimento Quadro 5 Levantamento sofás dois lugares. Tabela 6 Comparativo entre as dimensões de sofás. Como matéria-prima para a fabricação das estruturas dos sofás, é utilizada madeira maciça de pinus ou eucalipto. Para o revestimento são utilizados tecidos ou couro sintético. As cores variam bastante: verde, mostarda, marrom, bege, laranja, azul, vermelho, preto e branco. Em relação às mesas, a maioria dos modelos encontrados possui estrutura tubular, conforme mostra o quadro 6. Quadro 6 Levantamento de mesas quadradas. da Vinci, Curitiba, v. 5, n. 1, p. 69-96, 2008 85

MORADIA E MOBILIÁRIO POPULAR: PROBLEMA ANTIGO SOLUÇÃO (IM)POSSÍVEL? As dimensões das mesas quadradas variam pouco, já as mesas retangulares e redondas apresentam maior variação, conforme apresenta a tabela 7. Tabela 7 Comparativo entre as dimensões de mesas O material predominante na estrutura das mesas é o aço com acabamento em pintura epóxi ou cromado. As cores ficam entre o branco e o metálico. Nos tampos, encontram- -se vidro, granito ou MDF com impressão UV. As cadeiras geralmente são vendidas em conjunto com as mesas, e assim, o material mais utilizado também é o aço com pintura epóxi e as ponteiras em plástico. Os assentos são em MDF com pintura UV ou revestidos em couro sintético. As cores dos assentos são azul, verde, branco, laranja; mas a estrutura varia pouco, sendo branco ou cor metálica. Os modelos são apresentados no quadro 7. Quadro 7 Levantamento de cadeiras. As dimensões mais encontradas em cadeiras são apresentadas na tabela 8. Tabela 8 Comparativo entre as dimensões de cadeiras. Tanto as mesas quanto as cadeiras apresentam pouca diferenciação formal entre os fabricantes, com predominância de estrutura tubular. 3.2.3 Quartos Com o levantamento de camas de casal, de solteiro e beliches, foi possível constatar que os produtos apresentam semelhanças tanto na questão formal, quanto nas dimensões e matéria-prima. As camas de solteiro e casal possuem cabeceiras altas e peseiras baixas (quadro 8). Alguns dos modelos de beliches (quadro 9) apresentam baús ou gaveteiro e outros possibilitam a compra opcional de uma cama inferior. As dimensões têm pouca variação, conforme 86 da Vinci, Curitiba, v. 5, n. 1, p. 69-96, 2008

Melri A. Toporowicz Soares e Marilzete Basso do Nascimento mostra a tabela 9. A maior diferença encontrada em beliches é o comprimento, no modelo com estante na cabeceira. Quadro 8 Levantamento de camas de solteiro. Quadro 9 Levantamento de beliches. Tabela 9 Comparativo entre as dimensões das camas. A matéria-prima mais utilizada em camas é o MDF. Apenas um dos fabricantes informou a utilização de MDP, combinado com o MDF. O acabamento é bastante similar entre os fabricantes, processo de impressão UV nos padrões mogno, marfim, tabaco, maple (padrão madeirado claro) e branco, e ainda, combinações entre os padrões, como tabaco e branco ou tabaco e maple. Os produtos tubulares foram encontrados em menor quantidade e utilizam o aço SAE 1020 (tipo de aço com baixo teor de cabono). O acabamento, neste caso, é dado por meio da pintura epóxi, que pode ser feita em branco, bege, marfim, vinho e preto. da Vinci, Curitiba, v. 5, n. 1, p. 69-96, 2008 87

MORADIA E MOBILIÁRIO POPULAR: PROBLEMA ANTIGO SOLUÇÃO (IM)POSSÍVEL? O levantamento de roupeiros demonstrou que os produtos também apresentam semelhanças entre os fabricantes, na questão formal, dimensões, matéria-prima e acabamento (quadro 10). Os roupeiros de três portas de correr apresentam maior variação. As dimensões mais encontradas são apresentadas na tabela 10. Quadro 10 Levantamento de roupeiros. Tabela 10 Comparativo entre as dimensões de roupeiros. 88 da Vinci, Curitiba, v. 5, n. 1, p. 69-96, 2008