Crescimento sustentado e desenvolvimento da economia portuguesa 1

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Transcrição:

Congresso Nacional dos Economistas 8 de outubro de 2013 Intervenção do Governador do Banco de Portugal, Carlos da Silva Costa Crescimento sustentado e desenvolvimento da economia portuguesa 1 Senhor Primeiro Ministro, Senhor Bastonário da Ordem dos Economistas, Senhores Embaixadores, caros colegas, É uma honra participar na abertura desta Conferência por duas ordens de razão. Em primeiro lugar, porque é promovida pela Ordem da minha profissão. Em segundo lugar, pela estreita relação de cooperação que existe entre o Banco de Portugal e a Ordem, que passa designadamente pela realização de conferências conjuntas, refletindo o reconhecimento dos benefícios de um entendimento comum sobre temas da nossa preocupação. A reflexão que quero hoje partilhar tem como tema: Crescimento sustentado e desenvolvimento da economia portuguesa. Estamos atualmente a menos de um ano de concluir o Programa de Assistência Económica e Financeira (PAEF) e é importante começar a olhar para o futuro. Tendo em conta que a grande maioria dos colegas exerce hoje em dia (e bem) funções de economista de empresa, 1 Preparado para apresentação. 1

proponho-me abordar este tema fazendo um paralelismo com a gestão de empresas. De facto, as questões que se colocam à gestão de uma empresa são as mesmas que nos devemos colocar enquanto país: Onde estamos? Para onde queremos ir? Qual a estratégia para lá chegar? Como nos organizamos? Quer a nível nacional quer de empresa, para conseguir atingir os objetivos é sempre necessário uma motivação coletiva. A minha apresentação está estruturada em quatro pontos. O primeiro ponto o ajustamento macroeconómico procura responder à questão: onde estamos? O segundo ponto desafios de médio prazo da economia portuguesa aborda a questão: para onde queremos ir?. O terceiro e quarto pontos da apresentação transformação estrutural do tecido empresarial português e sistema nacional de inovação numa lógica de procura respondem principalmente à questão: qual a estratégia para lá chegar?. A questão de como nos organizamos? não é aprofundada nesta intervenção, sendo um tema que abordei em intervenções anteriores, nomeadamente na SEDES, em 19 de março, e na Fundação Calouste Gulbenkian, em 24 de maio 2. 1. O ajustamento macroeconómico Onde estamos? Estamos em pleno processo de ajustamento dos desequilíbrios macroeconómicos que nos conduziram a uma restrição financeira absoluta, isto é, a uma situação em que, sem a ajuda das instituições internacionais, teríamos cessado pagamentos 2 Intervenção do Governador do Banco de Portugal, Carlos Silva Costa, no ciclo de conferências da SEDES - Pensar Portugal: Que Política Macroeconómica depois do Programa?. Intervenção do Governador Carlos da Silva Costa na Conferência "Consensus e Reforma Institucional". 2

externos e internos. Enveredámos, assim, por um processo de ajustamento no contexto de uma relação contratualizada com quem nos assistiu. No plano das empresas, esta situação é análoga à que se verifica quando a empresa entra em dificuldades e tem de negociar com o banco um plano de restruturação. Há condições e metas a cumprir que fazem parte da relação de confiança entre quem fornece a assistência financeira e quem dela beneficia. Estamos a fazer um ajustamento em condições muito diferentes das vigentes nos anteriores programas de assistência financeira, em 1977 e 1983, quer em termos do quadro institucional da política macroeconómica quer das estruturas produtiva e financeira. Mas a maior diferença decorre da situação de partida, que é muito mais desfavorável no período recente. Apesar disso, o ajustamento do desequilíbrio externo evoluiu em linha com o observado nos programas anteriores (Figura 1). Este desenvolvimento é notável, tendo em conta que teve lugar sem recurso à desvalorização nominal da taxa de câmbio e com um crescimento bastante reduzido da procura externa. As exportações, embora não tendo crescido tanto como nos anteriores episódios de ajustamento, aumentaram as quotas de mercado. Saliento aqui o esforço das empresas portuguesas do setor transacionável (incluindo o turismo) no incremento da penetração nos mercados e no redireccionamento da oferta para novos mercados. Adicionalmente, a evolução da taxa de câmbio efetiva real evidencia que, mesmo na ausência de desvalorização cambial nominal, a economia portuguesa revelou a flexibilidade necessária ao ajustamento por via da variação dos custos unitários de trabalho relativos. Este é um importante feito para a Europa como um todo, porque comprova que é possível fazer um ajustamento num contexto de moeda única. 3

Figura 1 Comparação com anteriores programas de assistência financeira: evolução das contas externas 5 Saldo da Balança Corrente e Capital (%PIB) 110 Taxa de Câmbio Efetiva Real (com base em ctup) 0 t-1 t t+1 t+2 1977 100 90-5 -10 1983 2011 80 70 60 1977 1983 2011-15 50 t-1 t t+1 t+2 140 Quota de Mercado de Exportações 115 Procura Externa 130 120 110 1977 1983 110 105 1977 1983 100 2011 100 2011 90 t-1 t t+1 t+2 95 t-1 t t+1 t+2 Nota: t corresponde ao ano do início do programa (variável=100 em t-1 e dados em termos reais, exceto onde indicado) Fonte: Banco de Portugal O comportamento da componente externa não foi, contudo, suficiente para compensar o impacto da contração da despesa interna no PIB. De facto, a despesa interna contraiu-se mais do que nos programas anteriores, sendo a diferença mais notória no comportamento do consumo privado (Figura 2). A significativa redução da despesa das famílias no contexto atual reflete a contração do rendimento disponível e o impacto das condições restritivas de acesso ao crédito e do elevado nível de endividamento sobre a capacidade de alisamento do consumo. Adicionalmente, o desaparecimento do fenómeno da ilusão monetária contribuiu para uma revisão em baixa das expectativas de rendimento permanente dos agentes privados, o que acelerou e ampliou o impacto das medidas de política sobre a despesa interna. Com efeito, nos ajustamentos anteriores, a ilusão monetária permitiu uma grande redistribuição de riqueza de forma silenciosa: os detentores de ativos monetários e os que tinham rendimentos fixos perderam poder de compra, mas, como se registaram aumentos dos rendimentos nominais, não se aperceberam de imediato e muito menos anteciparam - a perda em 4

termos reais. Num processo anestésico deste tipo, a reação da procura privada tende a ser menos intensa e imediata do que num processo em que os cidadãos observam que o seu rendimento está a cair. Não é, pois, surpreendente que, no contexto atual, os multiplicadores que são uma medida da conversão de um impulso num efeito sejam maiores do que o inicialmente esperado. A perceção da natureza mais permanente do ajustamento é também visível no comportamento da taxa de poupança, que aumentou mais do que nos ajustamentos de 1977 e 1983. A forte contração da procura doméstica, juntamente com o ajustamento do desequilíbrio da estrutura produtiva anterior setor não transacionável sobredimensionado relativamente ao setor transacionável teve como consequência um aumento mais marcado do desemprego. Uma parte muito significativa do desemprego tem carácter estrutural, dada a dimensão e a natureza duradoura da queda da procura dirigida a vários setores não transacionáveis, como o imobiliário e a construção. Figura 2 Comparação com anteriores programas de assistência financeira: evolução da despesa interna 125 120 PIB 5,0 Taxa de Desemprego (variação em p.p.) 115 110 105 100 95 90 1977 1983 2011 4,0 3,0 2,0 1,0 1977 1983 2011 85 t-1 t t+1 t+2 0,0 t-1 t t+1 t+2 125 120 115 110 105 100 95 Consumo Privado 1977 1983 2011 3,0 2,0 1,0 0,0-1,0-2,0-3,0 Taxa de Poupança das Famílias (variação em p.p.) 1977 1983 2011 90-4,0 85 t-1 t t+1 t+2-5,0 t-1 t t+1 t+2 Nota: t corresponde ao ano do início do programa (variável=100 em t-1 e dados em termos reais, exceto onde indicado) Fonte: Banco de Portugal 5

O ajustamento orçamental registado em 2010-2012 compara bem com o que se verificou em 1983-1985 (Figura 3). O saldo primário estrutural das administrações públicas em 2010-2012 registou uma melhoria de 7 p.p. do PIB, o que é notável do ponto de vista de qualquer comparação internacional. Figura 3 Comparação com anteriores programas de assistência financeira: evolução do saldo primário estrutural das AP s (% do PIB) 2 1 0-1 -2-3 -4-5 -6-7 -8 t-1 t t+1 t+2 1977 1983 2011 Nota: t corresponde ao ano do início do programa. O saldo primário estrutural é corrigido dos efeitos cíclicos. Para o período mais recente, é também ajustado de medidas temporárias e efeitos especiais. Fonte: Banco de Portugal Um outro ponto que importa reconhecer é que o nosso ajustamento tem sido feito num contexto de ventos contrários. Durante o período de ajustamento verificouse uma deterioração das condições externas da economia portuguesa, com a procura externa a ficar aquém do inicialmente esperado. A título ilustrativo, vale a pena referir que num cenário macroeconómico em que a procura externa evoluísse de acordo com o que era expectável no início do Programa, a variação do PIB seria marginalmente positiva já em 2013, o défice orçamental situar-se-ia abaixo de 5 por cento em 2013, a dívida pública estaria a estabilizar e o emprego seria cerca de 1.5 p.p. superior ao observado nos últimos 3 anos (Quadro 1). Um ajustamento 6

com ventos contrários é sempre mais penoso e pode descredibilizar o processo de consolidação orçamental quando as metas são definidas em termos de rácio do PIB. As variáveis em rácio sofrem o efeito adverso de fatores que não são controláveis pelos decisores da política orçamental, podendo criar a perceção de falhanço do ajustamento. Por este motivo, tenho defendido que os objetivos orçamentais dos programas de ajustamento sejam fixados sob a forma de limites à despesa pública nominal, metas que são controláveis pelos decisores de política orçamental e que, por isso, permitem uma real avaliação dos resultados alcançados e a consequente responsabilização pelos fracassos. Em contraste com a situação atual, os ajustamentos de 1977 e 1983 beneficiaram de alguns ventos de feição. Com ventos de feição, o ajustamento orçamental torna-se mais fácil, porque recebe um impulso positivo quer do lado das receitas orçamentais quer do lado do PIB, o que permite inclusivamente compensar uma eventual menor perseverança em termos de controlo de despesa. Quadro 1 Cenário Macroeconómico contra-factual com procura externa do PAEF inicial Cenário Macroecómico contra-factual com procura externa PAEF inicial Diferença face ao verificado/estimado 2011-2013 2011 2012 2013 2011 2012 2013 (acum.) Procura externa 6,3 6,4 6,6 2,8 6,7 7,0 17,3 PIB -1,0-2,1 0,1 0,3 1,1 1,8 3,3 Consumo privado -3,2-5,1-1,4 0,1 0,4 0,7 1,2 Consumo público -5,1-4,8-2,0 0,0 0,0 0,0 0,0 FBCF -10,2-13,1-6,4 0,3 1,2 2,0 3,5 Exportações 8,7 8,4 12,7 1,8 5,2 6,9 14,5 Importações -4,4-3,8 5,9 0,9 2,9 3,9 7,8 Variáveis orçamentais (em % PIB) Saldo orçamental -4,3-6,0-4,7 0,1 0,4 1,2 Dívida pública 108,0 122,2 123,5-0,3-1,6-4,4 Outras variáveis IHPC 3,6 3,0 1,2 0,0 0,2 0,5 0,7 Emprego -1,4-3,8-2,8 0,1 0,4 0,8 1,4 Balança de bens e serviços (em % PIB) -3,5 1,1 4,2 0,3 1,1 2,1 Balança corrente e de capital (em % PIB) -5,5 2,0 5,6 0,3 1,2 2,6 Fonte: Banco de Portugal 7

Concluímos recentemente a 8ª e 9ª revisões trimestrais do PAEF. Temos agora um pequeno período a percorrer até ao final do Programa, durante o qual temos de assegurar o regresso aos mercados. Regressar aos mercados significa refinanciar a dívida que vence durante o ano de 2014 e financiar as necessidades adicionais da administração pública. Para nos financiarem, os mercados precisam de ter confiança na sustentabilidade das nossas finanças públicas; essa confiança será avaliada com base em três indicadores: 1) cumprimento do PAEF; 2) compromisso político de manutenção de uma trajetória de sustentabilidade das finanças públicas a prazo; e 3) determinação no cumprimento das nossas obrigações (e.g. vontade de pagar). Neste contexto, a mensagem que sai do país para o exterior é muito importante. As taxas de juro da dívida pública são atualmente convidativas e, quando houver uma credibilização efetiva da sustentabilidade das finanças públicas, haverá certamente investidores interessados na dívida pública portuguesa e, consequentemente, assistiremos a uma descida dos spreads face aos parceiros europeus, como aconteceu no caso da Irlanda. 2. Desafios de médio prazo da economia portuguesa Para onde queremos ir? Portugal enfrenta dois exigentes desafios de médio prazo: Assegurar um crescimento económico sustentado Absorver o elevado nível de desemprego estrutural. Refiro estes dois desafios separadamente porque pode acontecer que o crescimento económico esteja assente em aumentos da produtividade e, por isso, coexista com a manutenção de níveis elevados de desemprego estrutural. Este não é, do meu ponto de vista, um bom equilíbrio. O desemprego estrutural tem custos pessoais e sociais que ultrapassam em muito a ausência de rendimento, tendo um efeito corrosivo na coesão social. Necessitamos, pois, de assegurar um crescimento suportado em aumentos da produtividade e do emprego. 8

De facto, um crescimento sustentado corresponde a atingir quatro objetivos em simultâneo: (i) (ii) (iii) (iv) Sustentabilidade da dívida pública; Sustentabilidade da dívida externa; Aumento do nível de rendimento per capita; Aumento do emprego; A reafectação dos recursos humanos entre o setor não transacionável e o transacionável vai levar tempo, sendo por isso necessário reforçar ou criar mecanismos que mitiguem os efeitos deste ajustamento sobre a coesão social. O processo será tanto mais demorado quanto menos claros ou mais desalinhados forem os incentivos da política económica e social. Cabe à sociedade no seu todo estabelecer ou reforçar mecanismos de coesão que amenizem os efeitos do desemprego, nomeadamente o risco de exclusão social por ausência de rendimento. Adicionalmente, é necessário criar mecanismos de apoio à requalificação dos desempregados de longo prazo, de forma a evitar a sua passagem à inatividade, por obsolescência de conhecimentos anteriormente adquiridos. É desejável que a requalificação e a aquisição de novas qualificações sejam geridas junto das empresas. Do ponto de vista da coesão social, é fundamental salvaguardar dois aspetos: por um lado, é preciso evitar que as pessoas fiquem condenadas a permanecer fora do mercado de trabalho; por outro lado, é necessário garantir que os mecanismos de requalificação dos trabalhadores são eficientes e que o emprego criado não é artificial mas sim economicamente sustentável. No mesmo sentido, é preciso assegurar um equilíbrio entre os mecanismos de suporte ao rendimento e os estímulos para regressar ao mercado de trabalho. Isto é, os mecanismos de apoio ao rendimento não podem desincentivar o beneficiário a regressar ao mercado de trabalho. Para responder a estes desafios, a economia tem de ser capaz de atrair investimento doméstico e estrangeiro que seja reprodutivo. É preciso reforçar o tecido produtivo de bens e serviços transacionáveis e melhorar o padrão de especialização da economia portuguesa, tanto em termos setoriais como de gamas 9

de produto. As infra-estruturas e serviços de apoio estão disponíveis, há que os rentabilizar. 3. Transformação estrutural do tecido empresarial português Qual a estratégia para lá chegar? A meu ver, a estratégia deve ser desenvolvida em quatro linhas de atuação: 1) Otimização da utilização da capacidade produtiva instalada; 2) Melhoria endógena do padrão de especialização intrassectorial; 3) Melhoria endógena do padrão de especialização intersectorial; 4) Atração de Investimento Direto Estrangeiro 3.1. Otimização da utilização da capacidade produtiva instalada A otimização da utilização da capacidade produtiva instalada significa tirar partido do investimento já realizado, aumentando a produção, indo à procura de novos mercados e de novos clientes. Nos sectores produtores de bens transacionáveis, é essencial continuar a redirecionar a produção para os mercados externos. No setor dos serviços, a utilização da capacidade instalada deverá ser potenciada através da prestação de serviços a não residentes. No setor do turismo, é preciso conceber uma abordagem que aumente a densidade da oferta (isto é, que cubra os vários segmentos do mercado compatíveis com os nossos custos de produção) e que garanta, ao longo de todo o ano, uma elevada taxa de utilização da capacidade instalada. Em paralelo, é necessário evitar uma degradação dos segmentos de mercado onde já estamos situados. Além do setor do turismo, é necessário tirar maior partido da crescente mobilidade internacional dos indivíduos para potenciar as atividades de setores como o da saúde, educação e conhecimento. Neste contexto, a resolução rápida da situação das empresas que, sendo economicamente viáveis, estão com contenciosos financeiros é uma prioridade. 10

Alternativas como a venda da empresa ou a transferência da gestão devem ser consideradas, para evitar perder o capital social da empresa, que é muito mais importante que o capital financeiro. Temos de fazer com que os mecanismos de recuperação de empresas que já estão em prática funcionem de forma ágil, o que depende muito da atitude de todos os intervenientes no processo. 3.2. Melhoria endógena do padrão de especialização intra-setorial A segunda linha de atuação consiste em promover uma melhoria endógena do padrão de especialização intrassectorial, através da absorção da chamada inovação incremental. Quer isto dizer que temos de evoluir para segmentos superiores do mercado nos setores onde já estamos instalados. O setor do calçado é um bom exemplo do sucesso deste tipo de atuação. Este setor fez uma evolução notável na cadeia de valor, progrediu para segmentos superiores e está hoje muito próximo do topo dos segmentos de mercado. Para pôr em prática esta estratégia, é crucial que as empresas tenham capacidade para aumentar a sua escala de produção e tirar partido de novos conhecimentos e qualificações ao nível dos produtos e dos processos de produção, isto é, tenham capacidade para absorver a inovação incremental. De facto, existem várias restrições que limitam o crescimento das empresas portuguesas funcionam como uma espécie de teto de cristal. Desde logo, o elevado nível de alavancagem, mas também a fraca qualidade de gestão, que se traduz numa ausência de estratégia, de organização e de capacidade endógena para acompanhar os mercados e a inovação. Neste contexto, é necessário e urgente promover as seguintes alterações do tecido empresarial português: a) Geração de uma dinâmica de escala PME maiores 11

b) Reforço da autonomia financeira c) Reforço da capacidade de absorção do conhecimento d) Reforço da organização interna e) Separação clara entre propriedade e gestão f) Profissionalização da gestão. Estas seis linhas de transformação estão interligadas. Não é possível ter uma organização funcionalmente complexa e capaz de absorver conhecimento e responder ao mercado se não existir escala. A geração de uma dinâmica de escala e de crescimento implica a disponibilidade de fundos, mas também exige uma gestão profissionalizada, claramente separada da propriedade, que seja capaz de fornecer informação transparente e fiável aos diferentes stakeholders. Geração de dinâmica de escala No que diz respeito à dimensão das empresas, é conhecido que o tecido empresarial português apresenta uma excessiva fragmentação. De acordo com dados do Eurostat 3, em 2010, 95 por cento das empresas não financeiras empregavam entre um e nove trabalhadores, enquanto menos de 1 por cento empregava mais de 50 trabalhadores. Esta condição limita a possibilidade de otimizar processos, captar recursos humanos qualificados, de afirmação em mercados externos e condiciona a capacidade endógena das empresas para acompanharem os mercados e a inovação tecnológica. Em suma, limita os ganhos de produtividade. Os resultados de vários estudos empíricos sugerem que as diferenças de dimensão das empresas entre os vários países estão relacionadas com as diferenças na qualidade do seu capital social. Por exemplo, os estudos de Bloom et al (2009) e Garicano (2000) 4 revelam que os países/regiões onde os níveis de confiança 3 Eurostat Structural Business Statistics (3 September 2013). 4 Bloom, N., Sadun, R., Reenen, J. (2012) "The Organization of Firms across Countries," The Quarterly Journal of Economics, Oxford University Press, vol. 127(4), pages 1663-1705. Garicano, L. ( 2000) Hierarchies and the Organization of Knowledge in Production, Journal of Political Economy 108 (5):874 904. 12

mútua são mais elevados têm tipicamente empresas de maior dimensão. Esta é uma das explicações para a existência de muitas grandes empresas nos EUA e nos países do norte da Europa, em oposição aos países do sul da Europa e da Ásia (nomeadamente a Índia), onde as empresas têm uma dimensão muito reduzida. De facto, a abertura do capital e a descentralização da gestão, condições fundamentais ao crescimento das empresas, têm como pressuposto uma relação de confiança. Como é sabido, Portugal faz parte do grupo dos países onde a confiança entre os agentes económicos é globalmente baixa. Autonomia financeira Para crescerem, as empresas portuguesas necessitam de aumentar os seus capitais próprios. As empresas portuguesas apresentam na generalidade níveis de autonomia financeira muito baixos. De acordo com dados da central de balanços do Banco de Portugal, em 2012, o nível de autonomia financeira das sociedades não financeiras situou-se, em média, em 36%, e mais de metade registou níveis inferiores a 25 por cento (Quadro 2). A autonomia financeira é muito semelhante entre empresas de diferente dimensão (micro, PME e grandes empresas) e também entre empresas de diferentes setores de atividade (apenas as SGP apresentam graus de autonomia financeira mais elevados). Acresce que, em 2012, o peso dos juros em termos do cash flow era, em média, superior a 60 por cento (estando acima dos 10 por cento em mais de metade das empresas) e mais de metade das empresas portuguesas tinham um rácio de dívida/ebitda superior a 3.5. 13

Quadro 2 Indicadores da situação financeira Empresas não financeiras 2008 2012 Rácio de Autonomia Financeira Mediana 23,0 24,0 Média Ponderada 39,3 36,4 Juros em % do cash-flow Mediana 18,3 10,7 Média Ponderada 49,1 63,7 Dívida Financeira em % do EBITDA Mediana 281,0 367,1 Média Ponderada 670,6 1172,6 Fonte: Banco de Portugal (Central de Balanços) Os elevados rácios de alavancagem das empresas portuguesas, quando comparados com os das empresas na maioria dos países da Europa continental, traduzem uma dupla fragilidade do nosso tecido empresarial: fragilidade financeira, porque as empresas ficam particularmente vulneráveis a alterações nas condições de financiamento, tanto em termos de volume como de custo; e fragilidade estratégica, porque os elevados rácios de alavancagem das empresas portuguesas não são consistentes com uma aposta no crescimento sustentado da empresa. É, pois, fundamental desenvolver instrumentos financeiros de reforço da autonomia financeira das empresas e definir um quadro de política económica, nomeadamente fiscal, que favoreça o interesse pela abertura e aumento do capital social das empresas. Qualidade da gestão e separação entre propriedade e gestão Nos últimos anos surgiram alguns estudos internacionais que avaliam quantitativamente a qualidade da gestão das empresas em vários países. Os resultados destes estudos confirmam que, no caso de Portugal, as empresas são, 14

em média, mal geridas. Por exemplo, Bloom et al (2012) 5 concluem que os Estados Unidos têm a maior pontuação, em média, em termos de práticas de gestão, seguidos pelo Japão e pela Alemanha; na parte inferior do ranking, encontram-se países do sul da Europa nomeadamente a Grécia e Portugal - e países em desenvolvimento, como o Brasil, China e Índia. Este estudo mostra ainda que, no caso da Grécia e de Portugal, existe uma grande dispersão da qualidade da gestão das empresas, sendo particularmente grande a percentagem de empresas mal geridas (a distribuição tem uma grande cauda ). Outro resultado deste estudo que gostaria de salientar é que, em todos os países analisados, as empresas geridas pelos fundadores ou pelos seus descendentes mais diretos tendem a ser mal geridas. Nas empresas familiares, observa-se uma degradação da qualidade de gestão na passagem da gestão do fundador para a segunda geração e da segunda para a terceira geração. Quando se chega à terceira geração, é grande a probabilidade de se entrar num fenómeno entrópico, por falta de condutor, por disputas de gestão ou mesmo por disputas de rendas. Estes resultados ilustram claramente a necessidade de profissionalizar a gestão das empresas portuguesas e de separar a sua gestão da sua propriedade. Neste contexto, há que encontrar mecanismos que agilizem a transmissão das empresas entre herdeiros ou para terceiros, por exemplo, através de operações de Management Buy-Out Operations (MBO). 3.3 Melhoria endógena do padrão de especialização intersectorial A diversificação setorial é outra linha fundamental de atuação para o sucesso da nossa estratégia de crescimento sustentado. Trata-se do desenvolvimento de novos produtos e novas tecnologias, através da absorção da inovação radical. Com efeito, a inovação radical tem a capacidade de alterar completamente as oportunidades de negócio. 5 Bloom, N., Genakos, C., Sadun, R., Van Reenen, J. (2012) Management Practices across firms and countries, WP 17850 NBER. 15

Das atividades de investigação e desenvolvimento surge normalmente o detentor de uma ideia. Mas, para que a ideia dê origem à criação/lançamento de novas empresas, é necessário encontrar um empreendedor e um financiador. E, para aumentar a probabilidade de o projeto ser bem-sucedido, é necessário assegurar capacidade de gestão e de organização. De facto, muito embora a taxa de criação de novas empresas em Portugal seja semelhante à dos nossos parceiros europeus, a sua taxa de sucesso é mais reduzida. Esta estratégia exige antes de mais o desenvolvimento de uma cultura que assegure que quem tem uma ideia a confia a alguém que a promove. Um quadro institucional que garanta os direitos de propriedade e que promova a confiança entre os indivíduos é, por isso, uma condição essencial. Por outro lado, é necessário promover a capacidade empreendedora. O empreendedorismo não se inventa de um dia para o outro, depende da história, educação, cultura de inovação e de risco, bem como da atitude de resposta e adaptação aos desafios da competitividade. Temos, pois, de fomentar um quadro institucional que favoreça o empreendedorismo. Enquanto não existir uma forte capacidade empreendedora, é necessário gerá-la, por exemplo, através da criação de fóruns de apresentação de ideias de negócio a potenciais investidores (business angels, seed forum). Também não é fácil encontrar investidores dispostos a financiar empresas inovadoras e assentes no conhecimento nas fases de arranque. No caso da inovação radical, o resultado do investimento é altamente incerto e normalmente envolve longos períodos de maturação antes de dar frutos. Enquanto a inovação incremental é normalmente suscetível de obter financiamento bancário, a banca tradicional não está vocacionada para o financiamento da inovação radical. Assim, é necessário impulsionar novas formas de financiamento e desenvolver instrumentos financeiros alternativos, incluindo o capital semente e de risco. 16

3.4 Atrair Investimento Direto Estrangeiro O Investimento Direto Estrangeiro (IDE) apresenta benefícios para o país destinatário que vão muito além dos efeitos diretos sobre a produção e o emprego. Tipicamente, o IDE envolve transferência de tecnologia, introdução de novas técnicas de gestão e de cultura empresarial, potenciando mudanças na estrutura produtiva dos países e nos respetivos quadros institucionais. Isto significa que temos de criar condições que tornem a economia portuguesa um local atrativo para investir e trabalhar. A questão que se coloca é: quais são as condições que atraem os fatores de produção internacionais? Existem numerosos estudos (teóricos e empíricos) que investigam por que razões o fluxo de capitais dos países desenvolvidos para os países em desenvolvimento é relativamente limitado, apesar de estes últimos terem níveis mais baixos de capital por trabalhador o chamado Paradoxo de Lucas. As principais conclusões destes trabalhos apontam explicações associadas às diferenças nos fundamentos que afetam a estrutura produtiva das economias mais pobres, tais como a qualidade do capital humano, a estabilidade macroeconómica, regulamentar e fiscal e a qualidade das instituições. Deste modo, para atrair IDE é necessário investir em educação e formação profissional, assegurar um quadro de estabilidade e de certeza e um bom ambiente institucional. A qualidade do capital humano A aposta na educação e no capital humano é central como fonte de crescimento económico e elemento explicativo das diferenças entre países em termos de trajetórias de crescimento e de rendimento per capita. Este resultado é robusto a várias abordagens teóricas sobre crescimento económico, mas é também robusto a uma multiplicidade de abordagens empíricas que assentam em metodologias de análise e amostras muito diferenciadas. Na realidade, é fácil perceber que trabalhadores mais qualificados são mais produtivos. A educação facilita a transmissão de conhecimentos necessários à 17

adoção de novos métodos de trabalho e de novas tenologias, mas a educação também aumenta a capacidade de inovação de uma economia através do desenvolvimento de novas ideias. Quadro de estabilidade e de certeza O investimento é uma aposta inter-temporal que exige graus de confiança e de certeza elevados. De acordo com o recente relatório de competitividade global para 2013-2014, do World Economic Forum, Portugal desceu da 49ª para a 51ª posição, entre 148 países. Para esta diminuição contribuiu em larga medida a instabilidade macroeconómica, perda de confiança nos políticos e no governo e a dificuldade de acesso a financiamento. Temos de estar conscientes de que a incerteza é um dos principais inibidores do investimento em Portugal. Não conseguimos controlar as condições que resultam da procura, mas devemos assegurar um quadro macroeconómico, legislativo, regulamentar e fiscal estável. A estabilidade induz mais investimento e confere mais qualidade ao investimento. Qualidade das instituições Nos últimos anos surgiu uma vasta literatura económica que destaca o papel da qualidade das instituições nos diferentes resultados dos países em termos de crescimento e desenvolvimento económico. Com efeito, o quadro de valores, normas e instituições denominado na literatura económica capital social tem um lugar central no desenvolvimento económico, ao potenciar o impacto produtivo do capital físico, da qualificação da população ativa e da acumulação de conhecimento técnico e organizacional. Este quadro inclui as leis que sustentam o estado de direito e garantem os direitos de propriedade, mas também as que definem as instituições políticas e a interação entre os parceiros sociais. O quadro de valores, normas e instituições influencia a confiança com que os agentes económicos interagem e os níveis de segurança que colocam no relacionamento com terceiros. Isto significa que esse quadro condiciona a maneira como a economia funciona e também os incentivos que motivam os indivíduos. 18

Quando não há confiança, há transações que não se realizam. Um estudo da OCDE, de 2011, mostra que a confiança mútua é maior nos países mais ricos e com menores desigualdades na distribuição de rendimento. Os países da Europa do Norte são os países com níveis mais elevados de confiança. Um bom ambiente institucional é geralmente sinónimo de um ambiente legal transparente e imparcial, que protege o direito de propriedade, com baixos níveis de corrupção, com prestação de serviços públicos que asseguram condições equitativas para todos e a participação dos indivíduos nas atividades que melhor se adaptam aos seus talentos e competências. Deste modo, a introdução de melhorias nos sistemas legal e judicial, na execução de contratos, ou a adoção de leis que estabelecem a escolaridade obrigatória são exemplos de áreas nas quais se podem tipicamente gerar ganhos relevantes em termos de potencial de crescimento. Um estudo recente do Banco de Portugal (Júlio, Alves e Tavares, 2013) 6 indica que melhorias no desempenho institucional em Portugal, no sentido de convergência para as melhores práticas europeias, podem aumentar o IDE direcionado a Portugal em cerca de 60 por cento. 4. Sistema Nacional de Inovação assente numa lógica de Procura A dinâmica do setor produtivo de bens e serviços transacionáveis da economia portuguesa depende muito da capacidade para absorver e tirar partido da inovação. Mas tirar partido da inovação depende da capacidade empresarial endógena e do investimento direto estrangeiro que conseguirmos captar, os quais, por sua vez, dependem do quadro de valores, atitudes, comportamentos, qualidade de governo e do desempenho do sistema nacional de inovação. O sistema nacional de inovação é constituído pelos centros produtores de conhecimento, educação e formação profissional. Este sistema condiciona o padrão de especialização da economia e, em particular, a produtividade e a inovação, tanto incremental como radical. Por isso, tem de ser concebido e dirigido em função das 6 Júlio, P., Alves, R.P., Tavares, J. (2013), Investimento estrangeiro e reforma institucional: Portugal no Contexto Europeu, Boletim Económico do Banco de Portugal, Primavera. 19

necessidades presentes e futuras do sistema produtivo e tem de ter capacidade para detetar essas necessidades e para se articular entre si e com o tecido empresarial. É fundamental para Portugal alterar o sistema nacional de inovação para uma lógica de procura, de resposta às necessidades do sistema produtivo nacional. O sistema nacional de inovação deve ser comandado pelas necessidades presentes e futuras do tecido produtivo de uma economia competitiva. A concluir, vale a pena olhar para os resultados de uma análise conduzida pelo Banco de Portugal sobre o desempenho relativo das empresas com investimento em investigação e desenvolvimento (I&D) em Portugal. Independentemente da relação de causalidade, é de notar que as empresas com investimento em I&D têm melhor comportamento em termos de exportações, maior rendibilidade e melhor perceção de risco por parte do sistema bancário (Figura 4). Figura 4 As empresas com I&D em Portugal Peso das exportações no volume de negócios 28% 33% 100% 80% Empresas com rendibilidade positiva 81,3% 77,9% 17% 20% 60% 40% 57,5% 49,6% 20% 2006 2007 2008 2009 2010 2011 Total de empresas Empresas com I&D 0% 2006 2007 2008 2009 2010 2011 Total de empresas Empresas com I&D 25% 20% 15% 10% 5% 0% -5% -10% Variação do crédito de IC residentes 4,9% 4,4% 4,6% 5,5% 5,8% 6,2% 5,9% 6,5% 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2012 (1.º Peso do crédito a empresas com I&D no crédito total Trim.) Empresas com I&D Total 2013 (1.º Trim.) 30% 25% 20% 15% 10% 5% 0% Empresas com crédito vencido 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2012 (1.º Empresas com I&D Total Trim.) 2013 (1.º Trim.) Fonte: Banco de Portugal 20