Enxerto gengival livre: recobrimento de recessão associado ao aumento da mucosa ceratinizada



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Transcrição:

0 Enxerto gengival livre: recobrimento de recessão associado ao aumento da mucosa ceratinizada João Nilton Lopes de Sousa* Layse da Silva Dantas** Renato Lopes de Sousa*** RESUMO O objetivo do estudo foi descrever o tratamento de recessão gengival com enxerto gengival livre (EGL). Ao exame clinico, observou-se presença de sangramento à sondagem e cálculo no elemento 31. Foram realizados os procedimentos periodontais básicos e a paciente foi reavaliada após 5 semanas, quando foi observada a presença de recessão gengival classe I de Miller de 2mm e ausência de tecido gengival ceratinizado nesse elemento. Após esta etapa de planejamento, decidiu-se realizar o tratamento cirúrgico, por meio da técnica EGL, com o objetivo de recobrir a recessão e aumentar a faixa de tecido ceratinizado. Como resultado do tratamento, observou-se, após 60 dias, o recobrimento total da recessão e um ganho de 5 mm de mucosa ceratinizada. Pôde-se concluir que, quando bem indicada, a técnica de enxerto gengival livre pode ser um recurso aplicável para o recobrimento radicular e aumento do tecido ceratinizado, permitindo alcançar uma adequada morfologia do periodonto. Palavras-chaves: Recessão gengival; Enxerto gengival livre; recobrimento radicular. ABSTRATC - This study aims at describing a clinical case of chirurgical treatment on gingival recession through the technic of free gingival graft (FGG). In the clinical exam, it was observed the presence of blood the poll and calculus of the element 31. Basic periodontal procedures were applied and the patient was reassessed 5 weeks later, when it was possible to verify the presence of gingival recession in Miller s class I measuring 2mm and the absence of gingival tissue keratinized in this element. After this stage of the planning, we decided to do the chirurgic treatment, through EGL technic, aiming at recoating the recession and increase the strip of keratinized tissue. As result of treatment, we observed, 60 days later, the total recoating of recession and the increase of 5mm of keratinized mucosa. It is possible to conclude that, when well indicated, the technic of free gingival graft can be an applicable resource for radicular recoating and the increase of keratinized tissue, which enables the achievement of an adequate morphology of the periodontal. Keywords: gingival recession, free gingival graft, radicular recoating. * Doutorando em Lazerterapia pala Universidade Cruzeiro do Sul- UNICSUL São Paulo SP; Mestre em Odontologia pala Universidade Potiguar UnP- Natal RN; Especialista em Periodontia pelo COESP João Pessoa PB; Professor do Departamento de Odontologia das faculdades Integradas de Patos Fip Patos PB ** Graduando em Odontologia pelas Faculdades Integradas de Patos FIP. ** Graduando em Odontologia pela Universidade Federal da Paraíba UFCG. E-mail: jnlopesodonto@gmail.com

1 INTRODUÇÃO Por muitos anos, a terapia periodontal teve como objetivo principal o tratamento de bolsas, eliminação de cálculo dentário e a retirada de tecidos inflamados. Atualmente, a estética do sorriso passou a ser valorizada na odontologia e cobrada aos profissionais pelos pacientes. Assim como outras especialidades odontológicas; na periodontia, a estética vermelha (tecido mole) tem sido motivos de estudos e aprimoramento de técnicas, principalmente na cirurgia plástica periodontal. Para Farias et al. (2009), as queixas mais comuns, entre os problemas relacionados à estética do sorriso, incluem-se: o sorriso gengival, assimetria do contorno gengival, recessões gengivais, hiper-pigmentação gengival e até mesmo freios anômalos. Na prática atual da periodontia, os clínicos têm o desafio de lidar com problemas biológicos e funcionais presentes no periodonto, como também, oferecer terapias que resultem em estética aceitável. A presença de problemas mucogengivais e recessões gengivais ao redor de dentes anteriores exemplificam uma situação na qual uma modalidade de tratamento exige tanto uma demanda biológica quanto estética do paciente (BOUCHARD; CORTI; BORGHETTI, 2001) Segundo a Academia Americana de Periodontologia (2001), a recessão gengival é definida como a migração apical da margem gengival em relação à junção amelocementária. Esta alteração periodontal apresenta alta prevalência na população adulta e em alguns casos o tratamento deve ser realizado com cirurgia plástica periodontal. Outro fator agravante proporcionado pela presença de recessões é a redução da faixa de gengiva inserida; que clinicamente, apresenta-se firme, resiliente e firmemente ligada ao periósteo do osso alveolar subjacente. Suas principais funções são: aumentar a resistência do periodonto de proteção às lesões externas, contribuir para estabilização da posição da margem gengival, auxiliar na dissipação de forças fisiológicas que são exercidas pelas fibras musculares da mucosa alveolar para o tecido gengival (CARRANZA; TAKEI; NEWMAN, 2007). Como opção para o tratamento cirúrgico das recessões gengivais, pode-se indicar o enxerto gengival livre, que é uma boa opção para aumentar a largura da faixa da gengiva inserida em pacientes que apresenta ausência ou deficiência, prevenir e paralisar o desenvolvimento de recessões e facilitar a higienização oral sem traumas na mucosa alveolar (SILVA; CASATI; SALLUM, 2006). Para Feitosa et al (2008), o enxerto gengival livre pode

2 ser indicado para o recobrimento de recessões gengivais, bem como aumentar a largura de gengiva queratinizada, eliminando a inserção de freios e aumento da extensão do vestíbulo. Este estudo teve como objetivo descrever um caso clínico de tratamento cirúrgico de recessão gengival pela técnica de enxerto gengival livre (EGL) e avaliar, após 60 dias de proservação, o recobrimento radicular e o ganho de tecido gengival queratinizado por meio desta cirurgia plástica periodontal. RELATO DE CASO Exame clínico A paciente, leucoderma, do sexo feminino e 26 anos de idade procurou atendimento odontológico queixando-se de dor à escovação na região dos incisivos inferiores. Ao exame clínico inicial, observou-se a presença de inflamação gengival por meio de sangramento à sondagem e cálculo. Inicialmente foi planejada a realização dos seguintes procedimentos periodontais básicos: raspagem e alisamento radicular, remoção dos fatores de retenção de placa e orientação de higiene bucal. Conforme Cezar Neto (2010), a higiene bucal aliada aos cuidados profissionais tem sido considerada como método mais efetivo contra a placa bacteriana, e os recursos rotineiramente usados são a escova dental convencional e o fio dental. Contudo para que haja um resultado qualitativo é necessário orientação ao paciente de maneira correta sobre utilização da escova e do fio dental. Durante a reavaliação, após 5 semanas da terapêutica periodontal inicial, verificou-se ausência de sangramento à sondagem e que a paciente manteve um bom padrão de higiene bucal (Figura 1), porém ainda se queixava de dificuldade de escovação devido à presença de sintomatologia dolorosa na região do elemento 31. Figura 1: Aspecto periodontal após a realização dos procedimentos periodontais básicos

3 Foi realizado um exame periodontal da região e observou-se a presença de recessão gengival classe I de Miller no elemento 31. A formação de recessão gengival pode estar relacionada a vários fatores como inflamação gengival decorrente da placa bacteriana, trauma de escovação, posição dentária, quantidade de mucosa ceratinizada e outros, não sendo possível associar clinicamente a sua presença a um fator isoladamente (PAREDES et al., 2008). A etiologia da recessão deste caso clínico parece está relacionada à estreita faixa de tecido gengival ceratinizado associada à inflamação gengival e trauma de escovação. Na reavaliação, também foi avaliado o biótipo periodontal, classificado como tipo 4 segundo a classificação de Maynard e Wilson (1980), e exame clínico da recessão, tais como: medida da altura do tecido queratinizado, 0 mm (Figura 2A); medida da altura da recessão, 2 mm (Figura 2B); medida da altura da coroa clínica, 11 mm (Figura 2B); medida da largura da recessão em sua parte mais larga, 3,5mm (Figura 2C) e avaliação da profundidade de sondagem em torno da recessão, 0.5 mm. Figura 2: Exame clínico da recessão: em A, medida da altura do tecido queratinizado; Em B, medida da altura da recessão e medida da altura da coroa clínica do dente e em C, medida da largura da recessão em sua parte mais larga. Segundo Guida et al. (2010), pacientes que apresentam menos de 2 mm da faixa de tecido queratinizado têm maior chance de acumulo de placa bacteriana e recessões de tecidos moles. Para estes pesquisadores, 2 mm gengiva ceratinizada pode ser utilizado como referência para indicar as cirurgias de aumento da faixa de tecido queratinizado. Para Serra e Silva Filho (2010), as cirurgias de aumento da faixa de tecido queratinizado podem ser indicadas, principalmente, nos casos em que o paciente apresente uma reduzida ou ausente faixa de tecido queratinizado.

4 Técnica cirúrgica Ao concluir o exame da recessão, foi planejado o tratamento cirúrgico com o objetivo de recobrir a recessão e aumentar a faixa de tecido gengival queratinizado. A técnica cirúrgica para o caso foi a do enxerto gengival livre. Para Silva; Casati; Salum (2006), a técnica do enxerto gengival livre pode ser escolhida para aumentar as dimensões gengivais, prevenir o desenvolvimento das recessões gengivais, facilitando a higiene oral. Contudo o enxerto gengival livre ainda pode ser utilizado para o recobrimento radicular, usando técnica direta ou indireta. A técnica direta é realizada em um único passo cirúrgico, na qual o leito é preparado para receber o enxerto retirado do palato. A técnica indireta, consiste na criação de gengiva inserida pela técnica direta do enxerto gengival livre e, posteriormente, reposicionamento coronal do tecido enxertado. No nosso caso clínico, a técnica utilizada para recobrir a recessão foi a direta. Para Feitosa et al. (2008), o enxerto gengival livre deve ser escolhido por ser um procedimento simples e rápido, onde se mostra resultados superiores ou similares no aumento gengival quando comparado com outras técnicas mucogengivais, como enxerto de tecido conjuntivo e utilização de matriz dérmica acelular. Já para Silva, Casati e Sallum (2006), o enxerto gengival livre deve ser escolhido, em áreas onde a estética não é um fator primordial, para o aumento das dimensões dos tecidos gengivais para prevenir ou parar recessões e para facilitar o controle do biofilme, aumentando a profundidade do vestíbulo. Preparação do sítio receptor Após a anestesia da região dos incisivos inferiores, com uma lâmina de bisturi 15C, foi realizada o preparo do sítio receptor o mais largo possível para facilitar a vascularização, englobando áreas adjacentes interproximais e apicais à recessão gengival. A largura do sítio correspondeu ao dobro da largura da recessão, 7 mm. Foram realizadas incisões horizontais estendendo-se de um lado ao outro da junção amelo-cementária nas papilas, margeando a recessão. A preparação das bordas do leito foi realizada com incisões perpendiculares à primeira incisão horizontal, divergindo apicalmente na mucosa alveolar. A totalidade do retalho foi dissecado e reposicionado no sentido apical, expondo o tecido conjuntivo periostal (Figura 3).

5 Figura 3: O sítio receptor preparado para receber o enxerto Retirada do enxerto O enxerto foi removido do palato e sua dimensão correspondeu à do leito receptor. Para a aferição desta dimensão, foi utilizado um molde com papel estéril de envelope de fio de sutura, que foi colocado no leito e recortado no tamanho correto e, em seguida, levado ao palato para demarcar o tamanho do enxerto. Já a espessura do enxerto variou de 1,5 a 2 mm, como preconizado por Borghetti et al. (2011).Após a demarcação das dimensões do enxerto, o mesmo foi removido com auxílio de lâmina de bisturi 15C (Figura 4). Segundo Monnet- Corti; Borghetti (2011), a espessura ideal do enxerto é entre 1,0 e 2,0 mm levando-se em conta a espessura da camada epitelial palatina. Sendo importante ressaltar que o enxerto deve ser testado e adaptado ao sitio receptor. Contudo a rapidez da execução das etapas evita a desidratação do enxerto, a contaminação e a formação de coagulo no sitio receptor. Figura 4: Em A, Molde nas dimensões do sítio receptor para demarcar o tamanho do enxerto e Em B, o enxerto removido com auxílio do molde.

6 Depois da remoção, o enxerto foi submerso em solução fisiológica durante o tempo em que estava sendo realizada a sutura do sítio doador, que realizada em forma de malha para reter o coágulo a fim de estancar o sangramento e facilitar a cicatrização (Figura 4). Figura 5: Sutura em malha do sítio doador Em seguida, o enxerto foi estabilizado no sítio receptor com suturas horizontais nas laterais do enxerto e com suturas suspensórias em torno do colo do dente e fixadas no tecido conjuntivo no fundo do vestíbulo, assegurando o assentamento vertical do enxerto em seu leito periostal e radicular (Figura 4). Após a fixação do enxerto, foi colocado um curativo com cimento cirúrgico para evitar o deslocamento do enxerto e das suturas (Figura 5). Figura 6: Sutura e estabilização do enxerto no sítio receptor A estabilização é realizada através de suturas horizontais descontinuas interproximais, laterais e suturas suspensórias: sendo que as suturas horizontais do enxerto é fixado a gengiva inserida adjacente e as suturas suspensórias são fixadas ao tecido conectivo do fundo do vestíbulo até a mucosa alveolar. Tendo por objetivo impedir que os movimentos orofaciais altere a posição do enxerto, dificultando revascularização do enxerto (MONNET-CORTI, M.; BORGHETTI, 2001).

7 Figura 7: Proteção do enxerto com cimento cirúrgico Medicação pós-operatória Foi prescrito à paciente o uso oral de ibuprofeno (300 mg) três vezes ao dia por 5 dias. Para uso local, foi indicado o antisséptico, clorexidina a 0,12%, e recomendado que fizesse bochechos três vezes ao dia por 8 dias. Avaliação pós-operatória: 8 dias Após 8 dias do procedimento, o cimento cirúrgico foi removido e observou-se a presença de tecido esbranquiçado recobrindo o enxerto formado por tecido epitelial necrótico e biofilme (Figura 8A), que foi removido com auxílio de gaze e com peróxido de hidrogênio (H 2 O 2 ) a 10 volumes (Figura 8B), deixando visível tecido conjuntivo em início de reepitelização. A paciente foi reorientada com relação higiene bucal. Figura 8: A: aspecto do enxerto após a remoção do cimento cirúrgico. B: Aspecto do enxerto após a limpeza com peróxido de hidrogênio (H 2 O 2 ) e início da reepitelização do enxerto. Também foi removido o curativo cirúrgico do sítio doador, onde se observou um bom padrão de cicatrização por segunda intensão e início da reepitelização do palato.

8 Figura 9: Cicatrização do sítio doador em oito dias. Avaliação pós-operatória: 15 dias Aos 15 dias da realização do enxerto, pôde-se observar presença de inflamação localizada na margem gengival dos elementos 31 e 41 e a queratinização do epitélio do enxerto e a completa epitelização, por segunda intensão, do sítio doador (Figura 9). Figura 10: A: Ceratinização do epitélio do enxerto após 15 dias. B: Cicatrização do sítio doador, mostrando a completa epitelização por segunda intensão. Avaliação pós-operatória: 21, 30 e 60 dias. Aos 21, 30 e 60 dias, observa-se a completa cicatrização do sítio receptor e do enxerto (Figura 11).

9 Figura 11: Cicatrização do enxerto em 21 dias (A), em 30 dias (B) e em 60 dias (C). A epitelização começa na periferia do corte, que em 10 a 15 dias está completamente recoberto por um novo epitélio, necessitando, ainda, de 7 a 15 dias para chegar a maturação, assim obtendo uma cicatrização total em cerca de 4 semanas (MONNET-CORTI; BORGHETTI, 2011). Durante a cicatrização ocorre um importante fenômeno que é a contração do EGL, podendo interferir no resultado e na característica clinica final. A taxa de contração do enxerto na literatura varia de 23, 24% a 55% em períodos de até seis meses após a cirurgia. Se, de fato, a contração do EGL pode interferir tanto no resultado, como na característica clinica final e sabendo que gengiva inserida pode ser criada ou aumentada, haverá critérios para decidir se a gengiva inserida necessita ou não ser aumentada (SILVA, CASATI, SALLUM, 2006). Comparando os resultados aos 21, 30 e 60 dias, pode-se observar que a contração do enxerto foi clinicamente insignificante. Após 60 dias do procedimento cirúrgico, foi avaliado o ganho de tecido gengival queratinizado e o recobrimento da radicular. O Quadro 3 mostra os resultados iniciais e após a realização do enxerto gengival livre. Quadro 3: Ganho de tecido gengival queratinizado e recobrimento da recessão com o enxerto gengival Livre. Medidas iniciais da recessão e após realização do enxerto Dente: 31 Critérios avaliados Inicial Após o enxerto Recessão: 2 mm 0 mm Altura da coroa clínica 11 mm 9 mm Profundidade de sondagem 0,5 mm 0,5 mm Gengiva queratinizada 0 mm 5 mm

10 Na avaliação do recobrimento radicular, comparando o exame inicial e o realizado 60 dias após a realização do enxerto gengival livre, pode-se observar o recobrimento total da recessão, o qual pode ser comprovado pela redução da altura da coroa clínica, que era de 11 mm e passou para 9 mm após o enxerto, reduzindo 2 mm equivalente à altura da recessão (Figura 12). Figura 12: Recobrimento da superfície radicular. Em A, recessão de 2 mm e altura da coroa clínica de 11 mm. Em B, ausência de recessão e altura da coroa clínica de 9 mm. Conforme Carranza et al. (2007), a técnica de enxerto gengival livre (EGL) também tem sido relata com sucesso no recobrimento radicular. Além disso, o EGL é utilizado para criar uma zona mais larga de gengiva inserida, essencial para manutenção da saúde periodontal e prevenção das recessões. Na avaliação do ganho do tecido gengival queratinizado, observou-se um aumento considerável na quantidade de tecido queratinizado e de gengiva inserida, que passou de 0 mm para 5 mm após a realização do enxerto gengival livre (Figura 13).

11 Figura 13: Ganho de tecido gengival queratinizado. Em A, ausência de tecido queratinizado. Em B, presença de 5 mm de tecido gengival queratinizado após o realização do enxerto gengival livre. O enxerto gengival livre aumenta de maneira estável a quantidade de tecido queratinizado e gengiva inserida em um intervalo médio de 0,5 a 4 mm. Com esse aumento de tecido queratinizado torna-o um resultado constante e confiável podendo ser aumentada em grandes proporções, sendo a principal importância dessa técnica (MONNET-CORTI; BORGHETTI, 2011). CONSIDERAÇÕES FINAIS Portanto, é possível concluir por meio do caso clinico apresentado que o enxerto gengival livre pode ser um recurso aplicável para o recobrimento radicular e aumento do tecido queratinizado, permitindo alcançar uma adequada morfologia do periodonto. REFERÊNCIAS AMERICAN ACEDEMY OF PERIODONTOLOGY, Glossary of periodontal terms. The American academy of periodontology,4 th ed. Chicago, 2001. BOUCHARD, P.; MALET, J.; BORGHETTI, A. Decision making in aesthetics root coverage revisited. Periodontology. v.27, n.1, p.97-120, 2001. CARRANZA, F.A.; TAKEI, H.H.; NEWMAN, M.G. Periodontia clinica. 10ª ed. Rio de Janeiro: LTDA, 2007. Cap. 69. p. 1005-19. CEZAR NETO, J.B. Importância da faixa de tecido queratinizado para a saúde Peri-implatar. Revista PerioNews. v.4, n.3, p.210-14, 2010. FARIAS, B.C. et al. Cirurgias periodontais estéticas. Int J Dent. v.8, n.3, p.160-166, jul/set. 2009. FEITOSA, D.S. et al. Indicações atuais dos enxertos livres. RGO. Porto Alegre. v.56, n. 2, p. 1-6, abr./jun. 2008. GUIDA, B. et al. Recobrimentos radicular de recessões gengivais associadas a lesões cervicais não cariosa. R. Periodontia. v. 20, n.2, p.14-21, jul. 2010.

12 MONNET- CORTI, M.; BORGHETTI, A. Enxerto gingivalepitelioconjuntivo. In.BORGHETTI, A. et al. Cirurgia plástica periodontal. 2 ed.. Porto Alegre: Artmed, 2011. Cap. 7, p.137-155. PAREDES, S.O. Estudos das recessões gengivais em pacientes adultos atendidos na faculdade de odontologia da UFMA: etiologia, prevalência e severidade. R. Periodontia, v. 18, n.1, p.85-91, Mar. 2008. SERRA, W.L.; SILVA FILHO; Importância da faixa de tecido queratinizado para a saúde Peri-implatar. Revista PerioNews, v.4, n.3, p.210-14, 2010. SILVA, C.O.; CASATI, M.Z.; SALLUM, A.W. Avaliação critica do uso do enxerto gengival livre para o recobrimento radicular e para o aumento da faixa de tecido queratinizado. R. Periodontia. v.13, n.3, p.55-60, set. 2006.