PREVALÊNCIA DE MENINGITE EM CRIANÇAS NO HOSPITAL UNIVERSITÁRIO JOÃO DE BARROS BARRETO, PERÍODO DE 1995 A RESUMO

Documentos relacionados
COMPARAÇÃO SOBRE A INCIDÊNCIA E A LETALIDADE DE MENINGITE BACTERIANA E VIRAL NA FAIXA ETÁRIA PEDIÁTRICA NO ESTADO DE MATO GROSSO:

SALA DE SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA EM SAÚDE DOS IMIGRANTES

INCIDÊNCIA DE MENINGITE EM CRIANÇAS DE 0-5 ANOS DO MUNICÍPIO DE MARINGÁ-PR DO ANO DE 2007 Á 2009

Perfil etiológico e terapêutico da meningite bacteriana aguda: contribuindo para a vigilância dos serviços de saúde

RESUMO MENINGITE NO HOSPITAL UNIVERSITÁRIO JOÃO DE BARROS BARRETO 1

A INCIDÊNCIA DOS CASOS DE MENINGITE NOTIFICADOS NO HOSPITAL REGIONAL, NA CIDADE DE CAMPINA GRANDE PB

Epidemiology of Meningococcal Disease in Brazil

Mortalidade por meningite no Estado do Tocantins (Brasil) no período de 2000 a 2012

Isabela Loyola Borém Guimarães¹ Marcos Loyola Borém Guimarães 1 Antônio Carlos Albuquerque Moreira 1

Vacinas Meningocócicas Conjugadas no Brasil em A infecção pela bactéria Neisseria meningitidis (NM) ocorre de forma

Vigilância das meningites e doença meningocócica

Implementação da vigilância de PB y MB na Região das Américas

DOENÇA MENINGOCÓCICA

Boletim da Vigilância em Saúde ABRIL 2013

MENINGITE E DOENÇA MENINGOCÓCICA. Profa. Maria Lucia Penna Disciplina de Epidemiologia IV

Título do Trabalho: Autores: Instituição: Introdução

Epidemiology of Meningococcal Disease in Brazil Following Introduction of MenC Vaccination Program

Vigilância das meningites e doença meningocócica 2019

MORBIDADE HOSPITALAR

Análise dos casos de meningites em residentes do município do Rio de Janeiro, 2014.

PERFIL DE ACOMETIDOS POR MENINGITE EM NATAL-RN ENTRE OS ANOS DE 2010 A 2017: UM ESTUDO DOCUMENTAL

Meningite: O que você PRECISA SABER

UTILIZAÇÃO DAS DIFERENTES VACINAS PNEUMOCÓCICAS CONJUGADAS

SALA DE SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA EM SAÚDE DOS IMIGRANTES

Influenza A Novo subtipo viral H1N1, MSP

Doença meningocócica: situação epidemiológica no Município de Manaus, Amazonas, Brasil, 1998/2002

Pneumonia (Pneumonia Humana) (compilado por Luul Y. Beraki)

Vigilância das meningites e doença meningocócica

Vacinas do Calendário de Imunização do Estado de São Paulo 2011 Vaccines included in the Immunization Schedule for the State of São Paulo 2011

Pneumonia Comunitária no Adulto Atualização Terapêutica

(043A) F383s '

PROTOCOLO DE ATENDIMENTO

PERFIL EPIDEMIOLÓGICO DOS PACIENTES DIAGNOSTICADOS COM HIV NO BRASIL NA DÉCADA

INFORME TÉCNICO DOENÇA MENINGOCÓCICA

DISCIPLINA DE INFECTOLOGIA

SÍFILIS CONGÊNITA EM MUNICÍPO DA AMAZÔNIA BRASILEIRA 1 CONGENITAL SYPHILIS IN BRAZILIAN AMAZON CITY RESUMO

ÓBITOS CAUSADOS POR PNEUMONIA NA REGIÃO SUL DO BRASIL

Fmnm..D. Em atenção ao expediente em referência, seguem anexas as informações prestadas pela Secretaria de de Vigilância Epidemiológica.

2 MATERIAIS E MÉTODOS

UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA FACULDADE DE CIÊNCIAS INTEGRADAS DO PONTAL CURSO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS

Avaliação do agente etiológico bacteriano mais prevalente no líquor de um complexo hospitalar de Porto Alegre nos últimos dez anos

Meningites em idade pediátrica realidade de um hospital português

SIREVA no Brasil: funcionamento apresentação de dados

Doutorado em epidemiologia (UFRGS). Professora do Núcleo de Epidemiologia da Faculdade de Medicina (UNISUL). 3

Avaliação de dois anticorpos monoclonais em estudos histopatológicos e imunohistoquímicosde

O Problema da Doença Pneumocócica na América Latina

ANÁLISE DOS DADOS DE MORTALIDADE DE 2001

Revista Paulista de Pediatria ISSN: Sociedade de Pediatria de São Paulo Brasil

Boletim semanal de Vigilância da Influenza/RS Semana epidemiológica 37/2016

UNIFESP - HOSPITAL SÃO PAULO - HOSPITAL UNIVERSITÁRIO DA

J. Health Biol Sci. 2017; 5(1):31-36 doi: / jhbs.v5i1.902.p

UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS INSTITUTO DE PATOLOGIA TROPICAL E SAÚDE PÚBLICA DEPARTAMENTO DE MEDICINA TROPICAL E DERMATOLOGIA

PUERICULTURA E PEDIATRIA. FAMED 2011 Dra. Denise Marques Mota

LEVANTAMENTO DAS CAUSAS DE MORTE NEONATAL EM UM HOSPITAL DA REGIÃO DO VALE DO IVAÍ PR.

Medidas de freqüência

doi: / v58n3p

Prefeitura do Município de Bauru Secretaria Municipal de Saúde

Machado de Almeida BM, Targa CR, Batista CG, Farias FC, Oliveira JM, Gonçalves LA, Fernandes MK, Souza RH, de Medeiros AR

Vigilância e prevenção das Doenças de transmissão vertical

Artigo Original TUMORES DO PALATO DURO: ANÁLISE DE 130 CASOS HARD PALATE TUMORS: ANALISYS OF 130 CASES ANTONIO AZOUBEL ANTUNES 2

ANÁLISE DE SOBREVIDA DE MENINGITE PIOGÊNICA EM CRIANÇAS

MORBIDADE HOSPITALAR E MORTALIDADE POR DIABETES MELLITUS: RECIFE, 2016 e 2017

Coqueluche em lactentes jovens um antigo problema de saúde pública, ainda presente

EMENTAS DO CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM FARMÁCIA CLÍNICA EM INFECTOLOGIA EAD

MENINGOENCEFALITES. Dra. Joelma Gonçalves Martin Departamento de pediatria Faculdade de Medicina de Botucatu- UNESP

Palavras-chave: Hepatite viral humana; Vigilância epidemiológica; Sistemas de informação; Saúde pública.

Indicadores de ocorrência de doenças em populações

Dengue em Dois Municípios de Pequeno Porte da Região Norte do Estado de São Paulo

CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS E LABORATORIAIS DE MENINGITES BACTERIANAS EM CRIANÇAS

HEPATITES VIRAIS SEXUALMENTE TRANSMISSÍVEIS EM IDOSOS: BRASIL, NORDESTE E PARAÍBA

Brasil : Um retrato da Pneumonia Comunitária

Infecções por Gram Positivos multirresistentes em Pediatria

2 MATERIAL E MÉTODOS 1.1 OBJETIVOS DO TRABALHO

Situação epidemiológica da Influenza Pandêmica (H1N1), no Pará, semanas epidemiológicas 1 a 43 de 2009.

CUSTOS E INTERNAÇÕES HOSPITALARES POR PNEUMONIA EM CRIANÇAS VACINADAS PELA PCV10 EM REGIÃO METROPOLITANA DO TOCANTINS

Marcos Carvalho de Vasconcellos Departamento de Pediatria da FM UFMG

Infecções do Sistema Nervoso Central. Osvaldo M. Takayanagui. Professor Titular de Neurologia. Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto

INFORMATIVO CEDIPI. Dose de reforço das vacinas conjugadas contra o meningococo C

INDICADORES EPIDEMIOLÓGICOS

Carla A. S Domingues. Coordenadora Geral do Programa Nacional de Imunizações

Vigilância epidemiológica e avaliação da assistência às meningites Epidemiologic surveillance and evaluation of meningitis hospital care

TUBERCULOSE NA TERCEIRA IDADE NO BRASIL

Informe Epidemiológico Influenza

TENDÊNCIAS DA INCIDÊNCIA DA AIDS NO BRASIL E SUAS REGIÕES

PERFIL EPIDEMIOLÓGICO DO PACIENTE IDOSO INTERNADO EM UMA UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA DE UM HOSPITAL UNIVERSITÁRIO DE JOÃO PESSOA

MORBIMORTALIDADE DA POPULAÇÃO IDOSA DE JOÃO PESSOA- PB

MENINGITE: PERFIL EPIDEMIOLÓGICO DA DOENÇA NO BRASIL NOS ANOS DE 2007 A 2013

Epidemiologia Analítica

EPIDEMIOLOGIA. Profª Ms. Karla Prado de Souza Cruvinel

ÓBITOS DE IDOSOS POR DEMÊNCIAS NA REGIÃO NORDESTE DO BRASIL: PANORAMA DE UMA DÉCADA

RESULTADO TRABALHOS CIENTÍFICOS

Perfil etiológico das meningites bacterianas, notificadas entre 1999 e 2010 no Rio Grande do Sul

Vigilância e vacinas 2018

Índice. Índice... ii Sumário... iii Abstract... v

SUS SP PROVAS DE RESIDÊNCIA MÉDICA PREPARATÓRIO PARA. Residência em Medicina SUS - USP.indd 1 17/08/ :05:03

DOENÇA MENINGOCÓCICA EM PORTUGAL:

BOLETIM EPIDEMIOLÓGICO ARBOVIROSES Nº 001/2019

Vigilância das meningites e doença meningocócica

PROGRAMA DE RESIDÊNCIA MÉDICA EM INFECTOLOGIA PEDIÁTRICA PERÍODO DE 2 ANOS DEPARTAMENTO DE INFECTOLOGIA DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE PEDIATRIA

Transcrição:

ARTIGO ORIGINAL PREVALÊNCIA DE MENINGITE EM CRIANÇAS NO HOSPITAL UNIVERSITÁRIO JOÃO DE BARROS BARRETO, PERÍODO DE 1995 A 2004 1 PREVALENCE OF MENINGITIS IN CHILDREN HOSPITALIZED AT HOSPITAL UNIVERSITÁRIO JOÃO DE BARROS BARRETO FROM 1995 TO 2004 Mariane Cordeiro Alves FRANCO 2, Martha Rodrigues SANJAD 3 e Patrícia Helena Oliveira PINTO 3 RESUMO Objetivo: analisar a prevalência de meningite em crianças de 0 a 12 anos internadas no Hospital Universitário João de Barros Barreto (HUJBB), Belém Pa, período de janeiro de 1995 a dezembro de 2004. Método: estudo transversal de prevalência a partir de dados eletrônicos do Departamento de Arquivos Médicos e Estatístico do referido hospital. Informações obtidas: número do prontuário, idade, sexo, agente etiológico, procedência, tempo de permanência hospitalar e tipo de alta. Resultados: a prevalência de meningite no período estudado foi de 20,6%, correspondendo a 2077 crianças, com tendência à redução no decorrer dos anos, principalmente, após 1999. Predominaram o sexo masculino e a faixa etária de 3 meses a 5 anos, constituindo 60,2% e 59,7%, respectivamente; mais freqüente a etiologia bacteriana não especificada (46,4%), seguida por vírus (20,2%), N. meningitidis (15,2%), H. influenzae (9,3%), S. pneumoniae (3,2%), M. tuberculosis (3,1%), fungos (1,8%) e outros (0,9%); tempo médio de permanência de 26 dias e coeficiente de letalidade de 9,29%. Conclusão: observada uma elevada prevalência de meningite em crianças internadas no HUJBB, com etiologia predominantemente bacteriana, seguida por vírus e fungos. DESCRITORES: meningite, criança, prevalência. INTRODUÇÃO A meningite representa importante problema de saúde pública, pela possibilidade de resultar em graves seqüelas neurológicas e óbito, principalmente, na faixa etária pediátrica. 1 No Brasil, entre 1990 e 2000, notificados ao Ministério da Saúde (MS) 297.000 casos de meningite, com taxas médias gerais em torno de 20 por 100.000 habitantes, sendo 52% de etiologia bacteriana. 1 Notificados no Pará, em 2003, 670 casos de meningite, em Belém, 214. 2 Uma grande variedade de agentes infecciosos é implicada como causadora de meningite. Pela ordem de freqüência, são: bactérias, vírus, fungos, espiroquetas, helmintos e protozoários. 3 Embora muitas espécies de bactérias possam induzir à meningite, três delas são responsáveis por cerca de 9 dos casos: Neisseria meningitidis (meningococo), Haemophilus influenzae e Streptococcus pneumoniae (pneumococo). 4 As meningites virais são também freqüentes, atingindo principalmente crianças com mais de um ano, adolescentes e adultos jovens. 5 A meningite, apesar dos enormes avanços tecnológicos quanto ao diagnóstico, compreensão da patogênese e tratamento, ainda permanece como importante causa de morbidade e mortalidade, principalmente na faixa etária pediátrica. 6 Devido à considerável prevalência de meningite no estado do Pará e a elevada letalidade desta patologia na faixa etária pediátrica, é fundamental analisar a meningite em crianças internadas no Hospital Universitário João de Barros Barreto, pois este é referência no diagnóstico e tratamento de doenças infecciosas e parasitárias. Recebido em 23.01.2006 - Aprovado em 08.03.2006 1 Trabalho realizado no Hospital Universitário João de Barros Barreto 2 Professora Mestra da disciplina de Pediatria da Universidade do Estado Pará 3 Graduandas do Curso de Medicina da Universidade do Estado Pará Revista Paraense de Medicina V.20 (1) janeiro - março 2006 33

OBJETIVO Analisar a prevalência de meningite em crianças de 0 a 12 anos internadas no Hospital Universitário João de Barros Barreto, período de janeiro de 1995 a dezembro de 2004. MÉTODO Trata-se de um estudo transversal de prevalência, realizado no Departamento de Arquivos Médicos e Estatística (DAME) do HUJBB, a partir de dados eletrônicos. Casuística constituída por todas as crianças de 0 a 12 anos de idade com diagnóstico de meningite, internadas no período de janeiro de 1995 a dezembro de 2004, sendo identificados 2077 registros. Obtidas as seguintes informações: número do prontuário, idade, sexo, agente etiológico, procedência, tempo de permanência e tipo de alta. Agentes etiológicos classificados em: N. meningitidis, H. influenzae tipo b, S. pneumoniae, M. tuberculosis, bactéria não especificada, vírus, fungos e outros, que incluem estafilococos, estreptococos e meningite em doença bacteriana (febre tifóide, gonorréia, listeriose, sífilis e salmonelose). Submetidos os dados à análise estatística, sendo aplicado o teste de contingência nas figuras 1, 3, 6 e tabela III, e o teste Z na figura 4. Tabelas e gráficos foram confeccionados utilizando-se planilhas de dados do Microsoft Excel. RESULTADOS 10 9 8 7 6 5 3 1 88, 85, 83,3% 79,3% 79,9% 79,4% 76,6% 75,4% 78,5% 77,6% 73,1% 24,6% 26,9% 20,7% 23,4% 20,1% 21,5% 22,4% 20,6% 15, 16,7% 12, 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 Total Meningite O utras D oenças FIGURA 1 Prevalência, por ano, de meningite em crianças internadas no HUJBB de 1995 a 2004. Pd 0,05 (Teste de contingência) TABELA I Distribuição, por sexo, da prevalência de meningite em crianças internadas no HUJBB de 1995 a 2004. ANO SEXO MASCULINO % FEMININO % TOTAL 1995 135 59,5% 92 40,5% 227 1996 145 56,4% 112 43,6% 257 1997 125 59,2% 86 40,8% 211 1998 153 56,9% 116 43,1% 269 1999 177 59,4% 121 40,6% 298 2000 139 65,6% 73 34,4% 212 2001 123 65,1% 66 34,9% 189 2002 96 63,6% 55 36,4% 151 2003 91 58,7% 64 41,3% 155 2004 66 61,1% 42 38,9% 108 TOTAL 1250 60,2% 827 39,8% 2077 34 Revista Paraense de Medicina V.20 (1) janeiro - março 2006

TABELA II Distribuição, por faixa etária, da prevalência de meningite em crianças internadas no HUJBB de 1995 a 2004 FAIXA ETÁRIA ANO 0-2 3 MESES % MESES - 5 ANOS % 6-12 ANOS % TOTAL 1995 9 4, 136 59,9% 82 36,1% 227 1996 5 1,9% 150 58,4% 102 39,7% 257 1997 2 0,9% 151 71,6% 58 27,5% 211 1998 7 2,6% 180 66,9% 82 30,5% 269 1999 4 1,3% 176 59,1% 118 39,6% 298 2000 13 6,1% 124 58,5% 75 35,4% 212 2001 10 5,3% 112 59,3% 67 35,4% 189 2002 3 2, 74 49, 74 49, 151 2003 9 5,8% 85 54,8% 61 39,4% 155 2004 7 6,5% 51 47,2% 50 46,3% 108 TOTAL 69 3,3% 1239 59,7% 769 37, 2077 5 45% 35% 3 25% 15% 1 5% B ac téria N E 46,4% 20,2% V irus N.m e ning itidis 15,2% H. influe n za e 9,3% S.pn e um o niae 3,2% 3,1% 1,8% 0,9% M.tub er c ulosis F u ng os O u tros FIGURA 2 Distribuição, por agente etiológico, da prevalência de meningite em crianças internadas no HUJBB de 1995 a 2004. 18, 16, 14, 12, 10, 8, 6, 4, 2, 0, 17,1% 15,2% 15,6% 10,6% 10,4% 4,2% 4,2% 1,9% 1,3% 0, 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 FIGURA 3 Prevalência de meningite por H. influenzae em crianças internadas no HUJBB de 1995 a 2004. FONTE: DAME/ HUJBB P d 0,05 (Teste de contingência) Revista Paraense de Medicina V.20 (1) janeiro - março 2006 35

TABELA III Distribuição dos agentes etiológicos, por faixa etária, em crianças com meningite internadas no HUJBB de 1995 a 2004. FAIXA ETÁRIA AGENTES 0-2 % 3 MESES - 6-12 % ETIOLÓGICOS MESES 5 ANOS ANOS % TOTAL % Bactéria NE 46 66,7% 554 44,7% 364 47,3% 964 46,4% Vírus 7 10,1% 199 16,1% 214 27,8% 420 20,2% N.meningitidis 2 2,9% 183 14,8% 130 16,9% 315 15,2% H.influenzae 6 8,7% 183 14,8% 4 0,5% 193 9,3% S.pneumoniae 4 5,8% 49 4, 13 1,7% 66 3,2% M.tuberculosis 2 2,9% 53 4,3% 9 1,2% 64 3,1% Fungo 0 0, 6 0,5% 31 4, 37 1,8% Outros 2 2,9% 12 1, 4 0,5% 18 0,9% Total 69 100, 1239 100, 769 100, 2077 100, P d 0,05 (Teste de contingência 10 8 93,77% 89,87% 89,59% 90,94% 90,57% 94,18% 93,38% 92,26% 84,83% 87,04% 90,71% 6 10,13% 15,17% 6,23% 10,41% 9,06% 9,43% 5,82% 6,62% 7,74% 12,96% 9,29% 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 Total Cura Óbito FIGURA 4 Distribuição, por tipo de alta, da prevalência de meningite em crianças internadas no HUJBB de 1995 a 2004. 1 10 8 6 Bactéria NE 92,1% 100, 88,9% 85,5% 78,8% 7,9% 0, 11,1% 14,5% 21,2% Virus N. meningitidis H. influenzae S. pneumoniae 59,4% M. tuberculosis 40,6% 70,3% 83,3% Fungos 29,7% 16,7% Outros 36 Cura Óbito FIGURA 5 - Tipo de alta, por agente etiológico, das crianças com meningite internadas no HUJBB de 1995 a 2004. P d 0,05 (Teste de contingência) DISCUSSÃO A meningite está relacionada a uma série de complicações que podem culminar com danos irreversíveis no sistema nervoso central (SNC), ou levar à morte. A literatura refere que as crianças, além de serem as mais atingidas pela doença, são as que mais evoluem para óbito. 7 No período estudado, 20,6% das crianças internadas apresentaram o diagnóstico de meningite (FIGURA 1), em contraste com a pesquisa de Nascimento (2000) 8, que mostrou uma incidência de 2,6% na faixa etária de 0 a 14 anos. A elevada prevalência encontrada na presente pesquisa pode ser explicada por esta ter sido desenvolvida em um hospital de referência em doenças infecciosas e parasitárias, fato Revista Paraense de Medicina V.20 (1) janeiro - março 2006

também observado por Asturias et al. (2003) 9 em três grandes hospitais de referência na Guatemala. Na FIGURA 1 é observada uma tendência à redução da prevalência de meningite ao longo dos anos estudados, principalmente a partir de 1999 (p<0,0001), semelhante ao descrito por Kmetzsch e col. (2003) 10, no Rio Grande do Sul. Predominou a faixa etária de 3 meses a 5 anos (TABELA II), em concordância com o estudo de Weiss et al. (2001) 11. A etiologia mais freqüente foi bacteriana, seguida pela viral e fúngica, como demonstra a FIGURA 2. O resultado descrito está de acordo com Kojouharova et al. (2003) 12. Encontrados poucos trabalhos sobre prevalência de meningite fúngica na infância, talvez pelo fato dessa patologia ser de baixa ocorrência nesse grupo etário, estando relacionada principalmente aos imunodeprimidos, como relatado por Pancharoen et al. (2001) 13. A FIGURA 2 revela os agentes bacterianos identificados: N. meningitidis, H. influenzae tipo b, S. pneumoniae e M. tuberculosis. Grande parte dos trabalhos pesquisados mostrou uma maior prevalência, em ordem decrescente, de N. meningitidis, H. influenzae tipo b e S. pneumoniae, como relatado por Kojouharova et al. (2003) 12, em concordância com a presente pesquisa. É importante ressaltar a diminuição da prevalência de meningite por H. influenzae após 1999 (p<0,0001), ano em que a vacina conjugada contra este agente passou a ser incluída no calendário nacional de vacinação (FIGURA 3). Dados da Secretaria Executiva de Saúde Pública (SESPA) do Estado do Pará confirmam os resultados encontrados, mostrando uma queda do coeficiente de prevalência de 1,5 por 100.000 habitantes em 1999 para 0,4 em 2000 14, com nenhum caso notificado em 2003. 2 Vários fatores podem explicar a elevada eficácia da vacina conjugada anti-haemophilus, estimada em 95 a 10, como a capacidade de induzir imunidade eficiente na mucosa nasofarígea, impedindo a colonização pela bactéria, e, assim, reduzindo o número de portadores. 10 Houve uma elevada proporção de meningite bacteriana de etiologia indeterminada (FIGURA 2), fato observado também por Nascimento (2000) 8 e Weiss et al. (2001) 11. A identificação do agente não é possível em grande número de casos, em decorrência, entre outros fatores, do uso indiscriminado de antibióticos, de técnicas de coleta e armazenamento inadequadas de amostras de líquor e dificuldades técnico-operacionais dos próprios laboratórios. 8 A meningite bacteriana de etiologia não identificada prevaleceu em todas as faixas etárias, seguida pela meningite viral, com p<0,0001 (TABELA III). Na faixa etária de 0 a 2 meses, a literatura descreve um predomínio de bactérias gram-negativas entéricas. 15 No entanto, no período estudado, não se isolou esse agente. Ressalta-se, porém, na TABELA III, um grande percentual de bactéria não especificada (66,7%) nessa faixa etária, havendo possibilidade desse agente estar incluído neste grupo etiológico. Entre 3 meses e 5 anos de idade, destacaram-se, entre os agentes bacterianos, o H. influenzae e N. meningitidis (p<0,0001), como demonstra a TABELA III. Segundo Castro e col. (2003) 15, os três agentes mais comuns nessa idade, em ordem de freqüência, são: H. influenzae, N. meningitidis e S. pneumoniae. Nas crianças de 6 a 12 anos, N. meningitidis predominou entre as bactérias identificadas, com p<0,0001 (TABELA III). Nesse grupo, de acordo com Castro e col. (2003) 15, há uma diminuição da importância do H. influenzae, com aumento da incidência de S. pneumoniae e N. meningitidis. Entretanto, no presente trabalho, a etiologia pneumocócica representou apenas 1,7% do total de casos de meningite nessa idade. No período estudado, o coeficiente de letalidade correspondeu a 9,29% (FIGURA 4), semelhante ao detectado por Weiss et al. (2001) 11. Todos os pacientes com meningite viral obtiveram evolução favorável, com nenhum óbito registrado (FIGURA 5), em concordância com o estudo de Tee et al. (2002) 16, confirmando a evolução benigna da doença. A meningite tuberculosa apresentou maior taxa de letalidade, com p<0,0001 (FIGURA 5), em concordância com o trabalho de Degefie (2003) 17. Segundo este autor, o estágio avançado da doença no momento do diagnóstico e a ausência de vacinação são os principais determinantes de pior prognóstico. Em virtude da gravidade da meningite tuberculosa, é importante uma investigação da cobertura da vacina BCG no Estado, já que a mesma reduz o risco de tuberculose e promove uma proteção de mais de 8 contra a forma meníngea. 18 É importante destacar, ainda, a N. meningitidis como agente de principal ocorrência dentre as bactérias de etiologia identificada. No Reino Unido, a introdução da vacina meningocócica conjugada na imunização de rotina em crianças levou a uma significante redução da doença. 19 Nesse sentido, seria interessante o Programa Nacional de Imunização avaliar a possibilidade de Revista Paraense de Medicina V.20 (1) janeiro - março 2006 37

incluir a vacina anti-meningocócica no calendário básico de vacinação. Em relação ao elevado percentual de meningite bacteriana não especificada, é importante a coleta precoce do líquor antes de iniciar o tratamento empírico para diminuir o número de culturas sem crescimento de germes, além de um aprimoramento das técnicas laboratoriais de diagnóstico, pois a não identificação do agente pode comprometer a boa evolução da doença. O diagnóstico precoce da meningite e a instituição rápida da terapia específica são fundamentais para um prognóstico mais favorável da doença, já que esta ainda representa um importante problema de saúde pública devido a sua elevada morbidade, letalidade e alto índice de seqüelas. CONCLUSÃO A prevalência de meningite em crianças de 0 a 12 anos internadas no HUJBB, no período de janeiro de 1995 a dezembro de 2004 é de 20,6%, correspondendo a 2077 pacientes, com uma tendência à diminuição a partir de 1999. A maioria dos pacientes é do sexo masculino e possui idade entre três meses e cinco anos. A etiologia predominante é bacteriana, seguida por vírus e fungos. 38 SUMMARY PREVALENCE OF MENINGITIS IN CHILDREN HOSPITALIZED AT HOSPITAL UNIVERSITÁRIO JOÃO DE BARROS BARRETO FROM 1995 TO 2004 Mariane Cordeiro Alves FRANCO, Martha Rodrigues SANJAD e Patrícia Helena Oliveira PINTO Objective: to analyze the prevalence of meningitis in children ranging from 0 and 12 years of age, hospitalized at the Hospital Universitário João de Barros Barreto (Belém Pa) wthin January, 1995 and December, 2004. Methods: This is a transversal study of prevalence based on electronic data collected by the Department of Statistics and Medical Archives belonging to the hospital. The following information has been obtained: number of patient s medical records, age, sex, etiological agent, origin, duration of hospitalization and type of discharge. Results: The prevalence of meningitis during the period under study was 20,6%, corresponding to 2077 children, with a tendency of reduction throughout the years, mainly after 1999. The predominant group consisted of male children, wthin 3 months and 5 years old, forming 60,2% and 59,7%, respectively. The non- specified bacterial etiology was the most prevalent (46,4%), followed by virus (20,2%), N. meningitidis (15,2%), H. influenzae (9,3%), S. pneumoniae (3,2%), M. tuberculosis (3,1%), fungus (1,8%) and others (0,9%). In the 0 to 2 months age bracket, the prevalent bacteria identified was H. influenzae (8,7%). Within 3 months and 5 years, N. meningitidis (14,8%) and H. influenzae (14,8%) predominated. Within 6 and 12 years, N. meningitidis was the most frequent bacteria (16,4%). The average time of hospitalization was 26 days and the lethal coefficient was 9,29%. Conclusion: There was a high prevalence of meningitis in children hospitalized at the HUJBB, with a predominant bacterial etiology, followed for virus and fungus. KEY-WORDS: meningitis, child, prevalence REFERÊNCIAS 1 - OLIVEIRA, A; SIMÃO, ACM; NASCIMENTO, LFC. Perfil dos casos de meningite em serviço de pediatria. Rev Paul Pediatria. 2004; 22(2): 89-94. 2 - Governo do Estado do Pará, Secretaria Executiva de Saúde Pública, Núcleo Estadual de Epidemiologia. Incidência de doenças preveníveis por tratamento e acompanhamento por município; 2003. (dados não publicados). 3 - MIRANDA, ECBM; SILVA, BM; OLIVEIRA, PR. Meningites. In: LEÃO, R. Doenças infecciosas e parasitárias: enfoque amazônico. Pará (Pa): CEJUP, p.171-89, 1997. 4 - FOCACCIA, R. Meninigites bacterianas. In: VERONESI, R; FOCACCIA, R. Tratado de infectologia volume 1. 9ª ed. São Paulo (SP): Atheneu, p.805-31, 1996. 5 - NOGUEIRA, AS; FORTES, CQ. Infecções do sistema nervoso central. In: SCHECTER, M; MARANGONI, DV. Doenças infecciosas: conduta diagnóstica e terapêutica. 2ª ed. Rio de Janeiro (RJ): Guanabara Koogan, p.252-62, 1998. 6 - LUCENA, R; GOMES, I; CARDOSO, E; GÓES, J; NUNES, L; CARDOSO, A; e col. Aspectos clínicos e laboratoriais de meningite piogênica em lactentes. 2002. Arq Neuro-Psiquiatr. 2002; 60(2a): 281-4. 7 - VIEIRA, JFS. Incidência de meningite em pacientes de 0 a 12 anos no Instituto de Medicina Tropical de Manaus. Arq Neuro- Psiquiatr. 2001; 59(2a): 227-9. 8 - NASCIMENTO, LFC. Meningites bacterianas no Hospital Universitário de Taubaté, 1995-1998: epidemiologia, etiologia e evolução de 82 casos. Pediatr Mod. 2000; 36(12): 828-34. 9 - ASTÚRIAS, EJ; SOTO, M; MENENDEZ, R; RAMIREZ, P; RECINOS, F; GORDILLO, R; et al. Meningitis and pneumonia in Guatemalan children: the importance of Haemophilus influenzae type b and Streptococcus pneumoniae. Rev Panam Salud Publica. 2003; 14(6): 377-84. Revista Paraense de Medicina V.20 (1) janeiro - março 2006

10 - KMETZSCH, CI; SCHERMANN, MT; SANTANA, JCB; ESTIMA, CL; FARACO, FJ; SILVA, CM; e col. Meningites por Haemophilus influenzae b após a implantação da vacina específica. J Pediatr. 2003; 79(6): 530-6. 11 - WEISS, DPL; COPLAN, P; GUESS, H. Epidemiology of bacterial meningitis among children in Brazil. Rev Saude Publica. 2001; 35(3): 249-55. 12 - KOJOUHAROVA, M; GATCHEVA, N; SETCHANOVA, L; MECHANDJIEVA, V. Childhood bacterial meningitis in Bulgaria: a population- based retrospective study in six regions during 1992-96. Int J Infect Dis. 2003; 7(2): 109-12. 13 - PANCHAROEN, C; CHINDAMPORN, A; THISYAKORN, U. Childhood cryptococcosis: an increasing problem in the era of AIDS. J Med Assoc Thai. 2001; 84(1): 86-90. 14 - Ministério da Saúde, Fundação Nacional de Saúde, Guia Brasileiro de Vigilância Epidemiológica. Meningite. 2001. Disponível em http://www.sespa.pa.gov.br. Acessado em 10 de dezembro de 2004. 15 - CASTRO, IO; SOARES, CAS. Meningites. In: CIMERMAN, S; CIMERMAN, B. Medicina Tropical. São Paulo (SP): Atheneu, p.321-9, 2003. 16 - TEE, WS; CHOONG, CT; LIN, RV; LING, AE. Aseptic meningitis in children: the Singapore experience. Ann Acad Méd Singapore. 2002; 31(6): 756-60. 17 - DEGEFIE. Tuberculous meningitis in a district hospital from Southern Ethiopia. Ethiop Med J. 2003; 41(4): 311-8. 18 - PUVACIC, S; DIZDAREVIC, J; SANTIC, Z; MULAOMEROVIC, M. Protective effect of neonatal BCG vaccines against tuberculous meningitis. Bosn J Basic Med Sci. 2004; 4(1): 46-9. 19 - RAMSAY, NE; ANDREWS, N; KACZMARSKI, EB; MILLER, E. Efficacy of meningococcal serogroup C conjugate vaccine in teenagers and toddlers in England. Lancet. 2001; 357(9251): 195-6. Endereço para correspondência: Profa. Mestra Mariane Cordeiro Alves Franco Tv. Mariz e Barros, nº:943, aptº:704 Bairro: Pedreira CEP: 66.080-660 Belém - PA Telefone: (091) 3233-3984/ 9983-1043 e-mail: lpfranco@uol.com.br/ medicina@uepa.br Martha Rodrigues Sanjad Tv. Benjamin Constant, nº 1425, aptº 501 Bairro: Nazaré CEP: 66035-060 Belém PA Telefone: (091) 3223-5789/ 8801-2114 e-mail: marthasanjad@gmail.com Revista Paraense de Medicina V.20 (1) janeiro - março 2006 39