Terminalidade da vida & bioética. Jussara Loch - PUCRS

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Transcrição:

Terminalidade da vida & bioética Jussara Loch - PUCRS

Paciente terminal paciente cujas condições clínicas são irreversíveis, independentemente de serem tratadas ou não, e que apresenta alta probabilidade de morrer em um período relativamente curto de tempo (3 a 6 meses). American College of Physicians Ethics Manual. The physician and society; research; life-sustainig treatment and other issues. Ann Intern Med 1989; 111(4): 327-35.

Cuidado paliativo É uma abordagem que melhora a qualidade de vida de pacientes e suas famílias no enfrentamento dos problemas associados com as enfermidades em período terminal, através da prevenção e alívio do sofrimento mediante a identificação, o assessoramento e tratamento impecáveis da dor e de outros problemas, físicos, psicossociais e espirituais. OMS, 2002

A dor pode ser definida como um fenômeno biopsicossocial resultante de uma combinação de fatores biológicos, psicológicos, comportamentais, sociais e culturais.

SOFRIMENTO Reflete a alteração global da qualidade de vida ou o stress severo induzido por uma ou por múltiplas perdas = dor total É uma ameaça ao estado do paciente enquanto pessoa! Portenoy RK. Cancer pain. Epidemiology and syndromes. Cancer 1989;63:2298-307. Astudillo W; Mendinueta C; Astudillo E. Cuidados del enfermo en fase terminal y atención a su familia. Quito, Ecuador: Editorial Universitaria, 1995.

FATORES QUE MODIFICAM A PERCEPÇÃO DA DOR PELO PACIENTE Outros sintomas Efeitos adversos do tratamento Perdas: prestígio posição social papel familiar financeiras Sentimentos: impotência desfiguração fadiga etc... depressão físicos DOR TOTAL ansiedade raiva Problemas burocráticos Atraso no diagnóstico Acesso difícil à equipe Equipe pouco comunicativa Fracasso terapêutico Amigos e familiares ausentes Temor do hospital - Medo da dor - Medo da morte Preocupação com a família e/ou situação financeira Intranqüilidade espiritual - incerteza quanto ao futuro

Dignidade humana fundamenta-se na premissa moral de que cada vida humana tem significado e valor intrínseco. é puramente qualitativa, não admite níveis e é a mesma para todos. todo ser humano, por definição, tem dignidade. nada e nenhuma circunstância pode tirar a dignidade de um ser humano. ao reconhecer-se a dignidade do ser humano, torna-se obrigatório o respeito a sua autonomia.

Respeito à autonomia: (à capacidade de decisão e liberdade) Reconhecer que o paciente tem um Reconhecer que o paciente tem um projeto de vida, que tem valores que podem ser diferentes dos valores do profissional, e respeitá-los na medida adequada.

Os direitos do paciente Expressar seus sentimentos e valores Ser adequadamente informado Poder participar das decisões. Ser cuidado em todos os sentidos Não experimentar dor. Ser visto como pessoa. Ter sua dignidade respeitada.

TIPOS DE MORTE E SUA CONOTAÇÃO MORAL ESCOLHA DA AÇÃO A sacralidade da vida A dignidade da A qualidade pessoa humana de vida RESULTADO DA AÇÃO DISTANÁSIA ORTOTANÁSIA EUTANÁSIA Manter a vida A morte no momento Abreviar a vida com sofrimento certo, com conforto sem dor - tratamento fútil ou e alívio do sofrimento ou sofrimento desproporcionado -

Futilidade terapêutica Proporcionalidade terapêutica

Futilidade terapêutica Refere-se a intervenções que não produzem qualquer benefício significativo para o paciente. Quantitativa: a probabilidade de uma intervenção beneficiar o paciente é extremamente baixa. Qualitativa: a qualidade do benefício que uma intervenção produzirá é extremamente pequena. Ambas remetem à perspectiva de beneficiar o paciente. Um tratamento que produz apenas um efeito fisiológico sobre o corpo do paciente não lhe confere, necessariamente, um benefício. Jecker NS. Futility. Ethics in Medicine. University of Washington School of Medicine

Ao analisar a futilidade de uma intervenção, os médicos devem distinguir entre um efeito, que é limitado a alguma parte do corpo do paciente, e um benefício, que provocará uma apreciável melhora na pessoa do doente como um todo. Um tratamento que falha em prover o último, independentemente de alcançar o primeiro, deve ser considerado fútil. Schneiderman LJ, Jecker NS, Jonsen AR. Medical futility: its meaning and ethical mplications. Ann Intern Med. 1990 Jun 15;112(12):949-54.

Embora exceções e precauções devam ser levadas em consideração, nós defendemos que os médicos têm capacidade para definir um tratamento como fútil e estão autorizados a suspender um procedimento nestas bases. Nestes casos, os médicos devem agir em consonância com outros profissionais da saúde, mas não necessitam obter o consentimento dos pacientes ou familiares. Schneiderman LJ, Jecker NS, Jonsen AR. Medical futility: its meaning and ethical mplications. Ann Intern Med. 1990 Jun 15;112(12):949-54.

Proporcionalidade terapêutica DEFINIÇÃO DE OBJETIVOS MÉDICO propõe tratamento eficácia/benefício segurança/risco necessidades paciente TERAPÊUTICA disponibilidade facilidade técnico-operativa benefício/utilidade/riscos/gastos PACIENTE dor e sofrimento valores ideais impacto emotivo benefício esperado SELEÇÃO DO TRATAMENTO PROCESSO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ACEITAÇÃO DO TRATAMENTO ELEIÇÃO TERAPÊUTICA Modificado de Fracapani M, 1996

Relação clínica nos cuidados paliativos: modelo beneficente-autonomista MÉDICO não-maleficência informação beneficência indicação PACIENTE autonomia moral capacidade direitos eleição Não-Maleficência e Respeito à Autonomia (processo de consentimento informado) Adaptado de Gracia DG. Bioética Clínica, Santafé de Bogotá: El Búho,1998