MODELOS DE URBANISMO:CONCEITOS, DESENHOS E TIPOS

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Transcrição:

MODELOS DE URBANISMO:CONCEITOS, DESENHOS E TIPOS CONFORME O Prof. Dra. MARIA ALZIRA MARZAGÃO MONFRÉ RESUMO Apresentação das correntes de pensamento sobre a cidade da era industrial tendo como base referencial a obra O Urbanismo de Françoise Choay. Conceitos básicos e terminologia referentes ao Urbanismo. Os desenhos de modelos de cidades e a investigação da expressão das idéias que os definem. A ordenação das correntes de pensamento de Urbanismo e desenhos da cidade com base na antologia de Choay fundamenta a investigação poscedente das correntes pósmodernas e contemporâneas que está em elaboração. Palavras-chave: Urbanismo. Modelos. Desenho de cidade. ABSTRACT Presentation of schools of thought on the city of the industrial age as reference base the work "The Urbanism" Françoise Choay. Basic concepts and terminology. The drawings of models and the investigation of the expression of ideas that define them. The order of city thought of Urbanism and drawings currents based on the anthology of Choay based research poscedente of postmodern and contemporary currents that are in preparation. Keywords: Urbanism. Models. City design. 1 INTRODUÇÃO A antologia sobre o Urbanismo de Choay (2005) publicada em 1965, baseia-se em textos dos diversos autores de propostas de modelos de cidade. Neste trabalho propomos a leitura dos desenhos de cidade dos modelos referenciados e classificados por Choay. Algumas questões metodológicas para este trabalho devem ser consideradas: Há autores que referem-se a modelos ideais sem terem desenhado ou projetado uma cidade, tendo sido outrem quem projetou e/ou construiu uma cidade com base nos ideais que definiam um modelo de cidade. Exemplo de Ebenezer Howard que idealizou as Cidade-Jardim, tendo realizado diagramas de localização dos elementos urbanos 1/15

porém foi Robert Unwin quem desenhou e projetou a cidade de Letchworth a primeira cidade-jardim - com base na idealização de Howard. Nos casos em que os autores não desenharam um modelo, adotamos ilustrações utilizadas em publicações dos textos publicados. Há autores que descrevem uma sociedade, com formas de regulação das relações sem descrições precisas de um espaço organizado com base nestas regulações e não foram encontradas ilustrações nas publicações dos textos. Nestes casos, adotamos um modelo que tenha sido implantado com base nas regulações imaginadas pelo autor e que refira-se claramente à intenção de ser um modelos. Exemplo de John Ruskin que propunha modelos de sociedades com trabalho artesanal e produção auto-suficiente que foram as bases para a implantação de colônias nos Estados Unidos da América (no Tenesse especialmente) denominadas Ruskin Colonies. Estas questões metodológicas reforçam a discussão das questões de conceitos e terminologia que serão objeto de análise neste trabalho, tratando de MODELOS, URBANISMO e URBANIZAÇÃO. 2 ETIMOLOGIA E DESENHO Etimologia [Do gr. etymología, pelo lat. etymologia.] S. f. E. Ling. 1. O estudo das palavras, de sua história, e das possíveis mudanças de seu significado. 2. Origem e evolução histórica de um vocábulo: A etimologia do vocábulo português malha pode ser reconstruída até chegar-se ao lat. macula. (FERREIRA, 1999) O sufixo ismo da palavra URBANISMO define o estudo ou teoria da cidade. Ildefonso Cerdá responsável pelo projeto de ampliação de Barcelona na década de 1850, apesar de jamais ter usado o termo urbanismo, utilizou o termo urbe para designar de modo geral os diferentes tipos de assentamentos humanos e o termo urbanização designando a ação sobre a urbe em seu texto A Teoria Geral da Urbanização. (CERDÁ, 1867)

Urbanismo como uma escola, teoria ou princípio artístico forjou-se na metade do século XIX, sob a transformação gerada pelas indústrias que tranformam a ocupação do território e do trabalho, dissociando da exploração da terra diretamente para a produção. Choay refere-se ao surgimento da palavra urbanismo em 1910 baseando-se em G. Bardet e cita a definição do dicionário Larousse que define urbanismo como ciência e teoria da localização humana (CHOAY, 2005; pág.2). Esta definição do dicionário Larousse remete ao conhecimento da Geografia e menos a Cidade propriamente, desprezando a palavra urbe; a geografia humana e urbana vem tratando do urbanismo e contribuindo para o que Choay define como disciplina que se diferencia das artes urbanas anteriores por seu caráter reflexivo e crítico, e por sua pretensão científica. (CHOAY,2005, pág. 2) Com esta acepção de Choay, o Urbanismo tem caráter teórico e não prático, ou seja, trata-se da crítica e da reflexão teóricas sob quaisquer ângulos do conhecimento nas áreas de pretensão científica da geografia, economia, política, social em recortes específicos de análise da Cidade. O espaço e sua ordenação, o desenho da Cidade como expressão de idéias e intenções não estão em análise na obra de Choay. Há que se distinguir Urbanismo e Urbanização, a teoria e prática para trazer ao âmbito do desenho e compreender as intenções dos desenhos de Cidade, pois Choay mesma afirma: A sociedade industrial é urbana. A cidade é seu horizonte....no entanto, fracassa na ordenação desses locais. A socideade industrial tem especialistas em planejamento urbano. No entanto, as criações do urbanismo são, em toda parte, assim que aparecem, contestadas, questionadas. (CHOAY, 2005, pag. 1) As criações do urbanismo trataremos neste trabalho como criações da urbanização. As definições das palavras conforme o Dicionário Aurélio (FERREIRA, 1999): URBE [Do lat. urbe.] S. f. Cidade (1): "Nada se respeitou até agora [na cidade do Rio]. Nenhuma preservação de elementos tradicionais, nenhuma defesa dos valores históricos da urbe." (Brito Broca, Horas de Leitura, pp. 150-151.) (FERREIRA, 1999) _ISMO [Do gr. ismós, ou.] Suf. nom. = 'doutrina, escola, teoria ou princípio artístico, filosófico, político ou religioso'; 'ato, prática ou resultado de'; 'peculiaridade de'; 'ação, conduta, hábito, ou qualidade característica de'; 'afecção', 'quadro mórbido', 'condição patológica (causada por)';

'conjunto das características comuns a certo povo, ou civilização'; 'expressão, ou palavra própria de determinada língua, ou região, ou povo'; 'proteção, patronato'; 'modalidade ou prática esportiva' (FERREIRA, 1999) URBANISMO [De urbano + -ismo.] S. m. O estudo sistematizado e interdisciplinar da cidade e da questão urbana, e que inclui o conjunto de medidas técnicas, administrativas, econômicas e sociais necessárias ao desenvolvimento racional e humano delas. (FERREIRA, 1999)

URBANIZAÇÃO [De urbanizar + -cão.] S. f. Urb. Processo de criação ou de desenvolvimento de organismos urbanos segundo os princípios do urbanismo. Conjunto dos trabalhos necessários para dotar uma área de infra-estrutura (p. ex., água, esgoto, gás, eletricidade) e/ou de serviços urbanos (p. ex., de transporte, de educação, de saúde). Fenômeno caracterizado pela concentração cada vez mais densa de população em aglomerações de caráter urbano. (FERREIRA, 1999) Apenas a palavra urbanização refere-se à criação, explicitamente a ação de urbanizar, tornar ubano um território, o que pode se dar através de um projeto que ordene previamente a ocupação ou sem um projeto ou desenho ordenadores, como é o caso de inúmeros assentamentos urbanos no Brasil. A criação da urbanização que ordena e estabelece critérios é um projeto e um desenho. A urbanização propõe e define modelos, define formas e conceitualmente um objeto destinado a ser reproduzido por imitação segundo (ARGAN, 2004). Entendendo Urbanismo como a crítica e reflexão sobre a cidade, não há definição de modelos, mas a crítica e reflexão sobre os modelos já criados. O urbanismo, ou a reflexão crítica pode gerar modelos e criações de urbanização, mas para tanto utiliza-se da mão do arquiteto que expressa uma intenção. Choay adota o termo pré-urbanismo para correntes do início do século XIX até início do século XX. Considerando o termo urbanismo tendo sido forjado no início do século XX, Choay estabelece referência com o crescimento da urbanização a partir da socidade industrial que se consolida no período, havendo ordenação cronológica nas correntes classificadas. A corrente pré-urbanismo sem modelo coloca a questão do modelo a ser rebatida na discussão anterior deste trabalho, quanto a criações do urbanismo versus criações da urbanização. Pressupõem-se diante da classificação sem modelo que as outras correntes classificadas propuseram modelos, ou seja, há criações do urbanismo de cada corrente, modelos desenhados que expressam as reflexões e críticas das diversas correntes, excessão desta conforme classificação de Choay. Identificar os desenhos expressivos de cada corrente é o que este trabalho apresentará a seguir.

3 DESENHO E MODELO O conceito de modelo foi tratado por (ARGAN, 2004) em dois textos, um artigo denominado Tipologia na Enciclopedia Universal da Arte e outro denominado Sobre o conceito de tipologia arquitetônica, texto este de 1962 publicado na compilação de textos do autor, Projeto e Destino. O conceito de modelo, conforme Quatremère de Quincy em Dicionário Histórico (apud ARGAN, 2005): O modelo, entendido segundo a execução prática da arte, é um objeto que se deve repetir tal qual é; o tipo é, pelo contrário, um objeto segundo o qual qualquer pessoa pode conceber obras que não se assemelharão em nada entre si. Tudo é preciso e dado no modelo; tudo é mais ou menos vago no tipo. Assim vemos que a imitação dos tipos nada tem que o sentimento e o espírito não possam reconhecer [...]. urbanismo, Neste trabalho, trataremos dos modelos de urbanização criados pelas correntes do analisando na linguagem do desenho os elementos de composição que caracterizam cada um. Com esta análise, estaremos tratando de tipos e não de modelos, novamente conforme (ARGAN, 2005, pag. 66): O conceito de vagueza ou genericidade do tipo, que portanto não pode influir diretamente sobre a invenção e a qualidade estética das formas, explica também a gênese, o modo de formação do tipo. Este, obviamente, não é jamais formulado a priori, é sempre deduzido de uma série de exemplares. A condição de formulação a priori do tipo, colocada por (ARGAN, 2004), remete a conceituação de tipologia, entendida como grupo de elementos de composição que formam o tipo: Que o processo formativo de uma tipologia não é um mero processo classificatório e estatístico, mas um processo conduzido com vistas a uma fialidade estética precisa, é algo demonstrado por dois fatos fundamentais. Primeiro: as séries tipológicas não se formam, na história da arquitetura, apenas em relação às funções práticas dos edifícios, mas especialmente em relação a configuração deles.... Segundo: ainda que possam designar quantas classes e subclasses tipológicas se queira, normalmente as tipologias arquitetônicas são diferenciadas segundo três grandes categorias, a primeira das quais compreende configurações inteiras de edifícios, a segunda, os grandes elementos construtivos, a terceira, os elementos decorativos (ARGAN,2004, pág 67)

Neste trabalho trazemos o desenho da urbanização e procura-se identificar a correspondente tipologia e ainda os elementos que foram adotados na composição posterior de novas tipologias, observando a cronologia das correntes de urbanismo. Os critérios propostos por (ARGAN, 2004) serão utilizados e rebatidos do edifício (arquitetura) para a cidade (urbe), Nas correntes de urbanismo classificadas por (CHOAY, 2005) buscamos identificar suas características tipológicas, considerando especialmente, conforme (ARGAN, 2004), a configuração na implantação, o que se pode observar através do desenho (da forma) e menos das funções práticas atribuídas aos diversos elementos que compõem e configuram os exemplares apontados por (CHOAY, 2005). A implantação na urbanização se considera como a definida pelo arranjo e composição dos elementos construídos embuídos de suas funções práticas e os resultantes nas relações de localização (proximidades) e densidades populacionais, Na diferenciação de tipologias, o rebatimento das três grandes categorias apontadas por (ARGAN, 2004), são considerados: A primeira, como as configurações inteiras das edificações propostas na implantação, especialmente a tipologia arquitetônica adotada para moradia, considerando horizontalidade ou verticalidade; A segunda, os grandes elementos de uso comum e coletivos que caracterizam a implantação urbana tais como ruas, áreas sem edificação e livres conforme sua localização no conjunto; A terceira, os componentes arquitetônicos que configuram a implantação conforme sua localização que definam subdivisões maiores ou menores do conjunto, tais como muramentos ou cercamentos.

4 AS CORRENTES DE URBANISMO: CLASSIFICAÇÃO E CRONOLOGIA As correntes de pensamento sistematizadas e classificadas por Françoise Choay em sua obra O Urbanismo com primeira edição em 1965, estabelece grupos de autores que propuseram e questionaram a Cidade, classificando os grupos como: Pré-Urbanismo Progressista Pré-Urbanismo Culturalista Pré-Urbanismo Sem Modelo Urbanismo Progressista Urbanismo Culturalista Urbanismo Naturalista Tecnotopia Antrópolis Filosofia da Cidade Na Tabela 1 a seguir à classificação em correntes definida por (CHOAY, 2005) acrescentamos para cada autor de texto analisado pela autora a identificação do ano e do modelo vinculado. Como instrumento de leitura das tipologias, acrescentamos a cada autor citado por (CHOAY,2005), ano e exemplar. Mantivemos a identificação de um texto no caso em que um modelo não foi identificado como sob autoria ou sob a condução da mão de um arquiteto diretamente pelo autor do texto. Observa-se que em ordem decrescente à cronológica, não há desenho a ser considerado modelo, inversamente proporcional às dimensões que as cidades passam a assumir e consequente complexidade em função da quantidade de variáveis envolvidas na definição de um modelo de cidade diante das dimensões que passam a assumir a partir da segunda metade do século XX. Observamos que as duas primeiras correntes classificadas por (CHOAY, 2005), pré-urbanismo progressista e pré-urbanismo culturalista remetem a quarta e quinta correntes, urbanismo progressista e urbanismo culturalista, os dois últimos cronologicamente do início do século XX coincidindo com a constituição do temo urbanismo como o estudo sistematizado e interdisciplinar da cidade e da questão urbana (FERREIRA, 1999).

PRÉ-URBANISMO PROGRESSISTA Robert Owen New Harmony 1820 Charles Fourier Falanstério 1832 Victor Prosper Consideránt La Reunion 1852 Etiénne Cabet Icaria 1840 Pierre-Joseph Proudhon 1865 Benjamin Ward Richardson Hygeia 1876 Jean-Baptiste Godin Familistério 1874 Julio Verne Franceville 1979 Herbert-George Wells 1907 PRÉ-URBANISMO CULTURALISTA Augustus W. N. Pugin 1839 John Ruskin Ruskin Colonies 1850 William Morris 1884 PRÉ-URBANISMO SEM MODELO Friederich Engels 1872 Karl Marx 1844 P. Kropotkin 1913 Bukharin e Probrajensky 1919 URBANISMO PROGRESSISTA Tony Garnier Cidade Industrial 1904 Georges Benoit-Lévy 1904 Walter Gropius 1925 Le Corbusier Ville Radieuse 1935 Stanislav G. Strumilin 1960 URBANISMO CULTURALISTA Camillo Sitte Pincípios artísticos 1889 Ebenezer Haward Cidade-Jardim 1903 Raymond Unwin Letchworth 1903 URBANISMO NATURALISTA Frank Loyd Wright Broadacre 1934 TECNOTOPIA Eugène Hénard Teoria Circulação 1909 Relatório Buchnan Circulação Viária 1963 Iannis Xenakis Cidade Cósmica 1964 ANTRÓPOLIS Patrick Geddes 1915 Marcel Poete Int. ao Urbanismo 1929 Lewis Mumford Townscape 1960 Jane Jacobs Death and Life 1961 Leonard Duhl Urban Condition 1963 Kevin Lynch A Imagem 1964 FILOSOFIA DA CIDADE Georg Simmel 1903 Oswald Spengler 1918 Martin Heidegger 1954 TABELA 1: Correntes, autores e cronologia do Urbanismo conforme (CHOAY, 2005)

As demarcações em vermelho e azul evidenciam as correntes com semelhanças na identidade, conforme (CHOAY, 2005), teóricas. Buscar-se-á a semelhança e identidade nas tipologias e tipos. Observa-se nas correntes denominadas por (CHOAY, 2005) de pré-urbanismo obras de generalistas e as de urbanismo de especialistas, sendo estas com exemplares de urbanização projetados por arquitetos. As correntes de pré-urbanismo têm aspectos higienistas marcantes, motivado pela insalubriidade decorrente da falta de redes de infraestrutura de esgotos e águas pluviais especialmente, nos primeiros anos da cidade industrial. Percebe-se que um outro importante aspecto é a lógica funcional, marcadamente no período moderno de classificação e instalação das funções humanas (conceitos marcados por Le Corbusier, especialmente na Carta de Atenas). Neste cenário são grandes exemplos de pré-urbanistas: OWEN, Robert (1771-1858), FOURIER, Charles (1772-1837), CONSIDÉRANT, Victor (1808-1893), CABET, Etiene (1788-1856), PRODHON, Pierre-Joseph (1809-1863), RICHARDSON, Benjamin Ward (1828-1896), GODIN, Jean-Baptiste (1819-1888), VERNE, Julio (1828-1905) e WELLS, Herbert-George (1866-1946). Observa-se a conformação similar à cidade medieval em uma organização da edificação como muros que definem intra-muros como cidade e extra-muros como campo. (CHOAY, 2005) classifica também o pré-urbanismo como sendo culturalista, e assim inspirado em Ruskin e por Morris. A corrente de pensamento de Ruskin e Morris reclamava o desaparecimento da organicidade perante forças desintegradoras advindas da industrialização. Destacamos que os modelos culturalistas definem ocupações extensivas em oposição ao modelo progressista através de configuração de edificações de um ou dois pavimentos entremeadas com áreas de agriculturáveis ou com vegetação natural. As cidades-jardim de Howard no final do século XIX estabelecem a ordenação de um modelo de cidade que define elementos que pretendem conciliar cidade-campo que serão consagrados nos desenhos de cidades posteriores. Neste cenário, podemos citar como exemplos de pré-urbanistas culturalistas PUGIN, Augustus Welby Nosrthmore (1812-1852), RUSKIN, John (1818-1900) e MORRIS, William (1834-1896). (CHOAY, 2005) mostra um outro aspecto do pré-urbanismo, a crítica sem modelo, esta inspirada em Engels e Marx, que se achava justificada a partir da formação de uma grande classe proletária cuja geração foi permitida e autorizada pela cidade industrial.

Estes vêem na cidade uma expressão de um problema geral e ainda apontam para a dificuldade ou para a impossibilidade do planejamento. São representantes deste movimento: ENGELS, Friedrich (1820-1895), MARX, Karl (1818-1883), KROPOTKIN P. (1842-1921), BUKHARIN N. (1888-1938) e PREOBRAJENSKY G. (1886-193?). Em diante, (CHOAY, 2005) cita ainda o antiurbanismo americano, sendo este inspirado na nostalgia à natureza que foi defendido por pensadores diversos norte americanos, sendo um dos maiores representantes da Escola de Chicago seu maior representante, SULLIVAN, Louis, que pregava um retorno à sociedade rural que acreditavam ser compatível com um modelo econômico nascente: capitalista. Segue-se então a uma análise de cada modelo em particular com as devidas ilustrações através de fotos e desenhos.capturados na Internet e escaneados de publicações (fontes nas legendas) de fevereiro a agosto de 2006. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao analisarmos a cronologia (TABELA 2) podemos observar a coincidência de períodos das três primeiras correntes de urbanismo, no período das décadas de 1840 a 1880, ou seja o mesmo período em que se construiam as novas idéias sobre a organização econômica, social e política diante das transformações no modo de produção através da industrialização. Da cidade é exigido conciliar a nova ordem econômica, social e política definindo um território e conseqüente paisagem. Na TABELA 3 abaixo identificamos o período de mais exemplares representativos das 3 correntes de idéias. 1800 1810 1820 1830 1840 1850 1860 1870 1880 1890 1900 1910 1920 1930 1940 1950 1960 1970 PROGRESSISTA CULTURALISTA SEM MODELO TABELA 3: Período de 1830 a 1880 e os modelos de urbanização A denominação das correntes pressupõe, como já nos referimos, uma seqüência crescente na elaboração da tipologia (modelos, conforme Choay). Assim sendo, estabelecemos na TABELA 4 a ordenação das correntes de idéias sobre a cidade.

PROGRESSISTA 1800 1810 1820 1830 1840 1850 1860 1870 1880 1890 1900 1910 1920 1930 1940 1950 1960 Pré-progressista Progressista Tecnotopia 1970 CULTURALISTA NATURALISTA Pré-culturalista Sem modelo Culturalista Naturalista Antrópolis TABELA 4: Caracterização dos modelos e correntes A partir dessa ordenação, discutimos a definição de três correntes de idéias (progressista, culturalista e naturalista seguindo a categorização de (CHOAY, 2005)) que contribuíram para a criação de urbanização das cidades industriais. Os modelos oriundos das três correntes definiram elementos de composição que permaneceram isolados dos modelos, passando a ser adotados como tipos, recortados do contexto do modelo que os originou. A análise dos modelos ou tipos de urbanização conforme a tipologia da edificação habitacional permite caracterizar as intenções de organização sociais expressos nos componentes da urbanização. As correntes de urbanismo pelo que observamos, apontadas por (CHOAY, 2005) se sucedem sob duas ordens: Dinâmica de alterações nos modos de produção e trabalho determinando necessidade de transformações da ordenação do espaço da cidade que os abriga. Pendular entre tecnicistas e humanistas, qualificados como progressistas identificando as conquistas tecnológicas aplicadas à arquitetura e as cidades de um lado ou qualificados como culturalistas ou naturalistas identificando a busca de integração cidade-campo e homem-natureza, esta última com caráter de utopia nostálgica.

REFERÊNCIAS ARGAN, Giulio Carlo. Projeto e Destino. Editora Ática, São Paulo, 2004 ASCHER, François. Metapolis: Acerca do futuro das cidades. Celta Editora. Oeiras, 1998 BENEVOLO, Leonardo. As Origens da Urbanística Moderna. Editorial Presença. Lisboa, 1981 BERNAL, J. D.. Ciência na História. Trad. Américo Neves Pedro. 7 volumes.livros Horizonte. Lisboa, 1975 CERDÁ, Ildefonso & LOPEZ de Aberasturi, Antonio (org). La Teoría General de la Urbanización; (1867). Trad. italiana Ada Ceruti: Teoria Generale Dell'Urbanizzazione, Jaca Book, Milão 1985. CHOAY, Françoise. O Urbanismo. Editora Perspectiva, São Paulo, 2005. A Alegoria do Patrimônio. Trad. Luciano Vieira Machado. Editora UNESP. São Paulo, 2001 CONSIGLIERI, Victor. As Significações da Arquitetura 1920 1990. Editorial Estampa. Lisboa, 2000 FEMTRESS, James e WICKHAM, Chris. Memória Social: novas perspectivas sobre o passado. Trad. Telma Costa. Editorial Teorema. Lisboa, 1996 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Aurélio Século XXI. Editora Nova Fronteira, 1999 FRIDMAN, F.. Donos do Rio em nome do rei; uma história fundiária da cidade do Rio de Janeiro. Zahar Editor, Rio de Janeiro,1999 GIDDENS, Anthony. As Conseqüências da Modernidade. Editora UNESP, São Paulo, 1991 GOURHAN-LEROI, André. Evolução e Técnicas. 2 volumes. Edições 70. Lisboa, 1984 KUMAR, Krishan. Da Sociedade Pós-Industrial à Pós-Moderna: novas teorias sobre o mundo contemporâneo. Jorge Zahar Ed., Rio de Janeiro, 1997 LATOUR, Bruno. Jamais fomos modernos. Editora 34. São Paulo, 1994

Índice de Tabelas TABELA 1: Correntes, autores e cronologia do Urbanismo conforme (CHOAY, 2005)... 9 TABELA 3: Período de 1830 a 1880 e os modelos de urbanização... 11 TABELA 4: Caracterização dos modelos e correntes... 12

Sumário 1 INTRODUÇÃO... 1 2 ETIMOLOGIA E DESENHO... 2 3 DESENHO E MODELO... 6 4 AS CORRENTES DE URBANISMO: CLASSIFICAÇÃO E CRONOLOGIA... 8 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS... 11