O PROCESSO DE URBANIZAÇÃO E A MOBILIDADE DO CAMPO PARA A CIDADE EM BELO CAMPO/BA. PALAVRAS-CHAVE: Urbanização, Pequenas cidades, Mobilidade, Campo



Documentos relacionados
A DEMANDA POR SERVIÇOS DE SAÚDE DAS PEQUENAS CIDADES DE GLÓRIA DE DOURADOS, DEODÁPOLIS, JATEÍ E VICENTINA PARA DOURADOS MS.

O PROCESSO DE URBANIZAÇÃO E A MOBILIDADE DO CAMPO PARA A CIDADE EM BELO CAMPO/BA

URBANIZAÇÃO LUCIANO TEIXEIRA

Geografia População (Parte 2)

SOCIOLOGIA A SOCIOLOGIA EM AÇÃO

HABILIDADES. Compreender a formação da população brasileira. Perceber as influências presentes na cultura brasileira.

ATIVIDADES EXTRAS GEOGRAFIA 1OS ANOS

PESQUISA DE OPINIÃO PÚBLICA

MODERNIZAÇÃO AGRÍCOLA E ESTRUTURA FUNDIÁRIA: ANÁLISE DA MICRORREGIÃO DE ALFENAS-MG

Este caderno, com oito páginas numeradas sequencialmente, contém cinco questões de Geografia. Não abra o caderno antes de receber autorização.

PLANO DE ENSINO DE GEOGRAFIA /2012

PROPOSTA PEDAGÓGICA CURRICULAR DISCIPLINA: GEOGRAFIA ENSINO FUNDAMENTAL

INDUSTRIALIZAÇÃO URBANIZAÇÃO: AUMENTO DA POPULÇÃO DA CIDADE EM RELAÇÃO AO CAMPO.

no Estado do Rio de Janeiro

UNIVERSIDADE DO ESTADO DO PARÁ GEOGRAFIA PRISE - 2ª ETAPA. EIXO TEMÁTICO: II REGIÃO1. O ESPAÇO REGIONAL Competências Habilidades Conteúdo

A Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal (RIDE-DF) no Censo 2010

Pernambuco. Tabela 1: Indicadores selecionados: mediana, 1º e 3º quartis nos municípios do estado de Pernambuco (1991, 2000 e 2010)

NOTA TÉCNICA Nº 1. Governo do Estado da Bahia Secretaria do Planejamento (Seplan) Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI)

DIVISÃO REGIONAL DO BRASIL MÓDULO 04 PARTE I

Elaboração e Análise de Projetos

HETEROGENEIDADE REGIONAL

A MULHER NO MERCADO DE TRABALHO

OCUPAÇÃO E EMPREENDEDORISMO NAS REGIÕES DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO: uma análise a partir do Censo 2010

Maranhão. Tabela 1: Indicadores selecionados: mediana, 1º e 3º quartis nos municípios do estado do Maranhão (1991, 2000 e 2010)

PRODUTO INTERNO BRUTO DOS MUNICÍPIOS NOVA BASE Bahia:

A realidade do SAB para as crianças e adolescentes de 7 a 14 anos. O acesso à Educação

Acre. Tabela 1: Indicadores selecionados: mediana, 1 o e 3 o quartis nos municípios do estado do Acre (1991, 2000 e 2010)

GEOGRAFIA. PRINCIPAIS CONCEITOS: espaço geográfico, território, paisagem e lugar.

Trabalho 001- Estratégias oficiais de reorientação da formação profissional em saúde: contribuições ao debate. 1.Introdução

Sistema Integrado de Pesquisas Domiciliares

Indústria e Industrialização. Prof. Melk Souza

Associativismo Social

Raquel Gomes de Sousa Universidade Federal do Rio de Janeiro

UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALFENAS - MG Curso de Geografia Bacharelado

Parte III: Abordagem Histórica da Economia Brasileira

GRUPO I POPULAÇÃO E POVOAMENTO. Nome N. o Turma Avaliação. 1. Indica, para cada período histórico, o fluxo migratório que lhe corresponde.

XXI Seminário Nacional de Parques Tecnológicos e Incubadoras de Empresas e XIX Workshop ANPROTEC. Conhecimento em ação

Tipologias da divisão espacial do trabalho e suas articulações com indicadores sócio-econômicos: regiões de Ribeirão Preto e Presidente Prudente

COLÉGIO SANTA TERESINHA

Foto: Harald Schistek

PESQUISA DE OPINIÃO PÚBLICA

Pesquisa Mensal de Emprego

Matriz de Referência de GEOGRAFIA - SAERJINHO 5 ANO ENSINO FUNDAMENTAL

Planejamento Bimestral

Indústria como produtora do Espaço Urbano. Professor Thiago Espindula - Geografia

Cursos Educar [PRODUÇÃO DE ARTIGO CIENTÍFICO] Prof. M.Sc. Fábio Figueirôa

Caracterização do território

Urbanização Brasileira. Professora: Jordana Costa

O PLANEJAMENTO DOS TEMAS DE GEOGRAFIA NA ORGANIZAÇÃO DA PRÁTICA PEDAGÓGICA

Censo Demográfico Aglomerados subnormais Primeiros resultados

HIV/AIDS NO ENTARDECER DA VIDA RESUMO

SEJA RESPONDIDA NA RESPECTIVA FOLHA DE RESPOSTAS; ESTEJA ASSINADA FORA DO LOCAL APROPRIADO; POSSIBILITE A IDENTIFICAÇÃO DO CANDIDATO.

Aumento do emprego contrasta com desindustrialização em SP e RJ

O LIVRO DIDÁTICO DE GEOGRAFIA NO ENSINO FUNDAMENTAL: PROPOSTA DE CRITÉRIOS PARA ANÁLISE DO CONTEÚDO GEOGRAFIA FÍSICA DO SEMIÁRIDO BRASILEIRO

50 anos a trabalhar pela saúde das pessoas

PESQUISA DE OPINIÃO PÚBLICA SOBRE O GOVERNO FEDERAL

Instruções para elaboração de TCC ANÁLISE DE MERCADO

SOLUÇÃO DA PROVA DE MATEMÁTICA E RACIOCÍNIO LÓGICO DO INSS TÉCNICO DO SEGURO SOCIAL PROVA BRANCA.

Gabarito extraoficial comentado IBGE. Prof. Sérgio Henrique.

Dinâmica Demográfica: Região Metropolitana de Salvador

Emprego formal na indústria têxtil catarinense: localização, caracterização, diferenças e semelhanças entre as mesorregiões

Geografia População (Parte 1)

Palavras-chave: Paulo Freire. Formação Permanente de Professores. Educação Infantil.

OFICINA 3 IGM Indicadores de Governança Municipal Projeto SEP: PLANEJAMENTO E FORMAS ORGANIZACIONAIS DAS POLÍTICAS PÚBLICAS MUNICIPAIS / REGIONAIS

GOVERNANÇA METROPOLITANA DA REGIÃO METROPOLITANA DO RIO DE JANEIRO

PERSISTÊNCIA DO PODER POLÍTICO E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO: O CASO DA TRANSIÇÃO DE REGIME NO BRASIL

Rincão da Cebola - Porto Velho Cidade do Rio Grande (RS): dinâmica urbana (espaço-tempo) numa reflexão sobre o pensamento urbanístico contemporâneo.

BOLETIM CAGED Cadastro Geral de Empregados e Desempregados. FEVEREIRO Comportamento do Emprego - Limeira/SP.

As Diversas Vertentes das Desigualdades Socioespaciais no Município de Dourados-MS

3 Metodologia. 3.1 Tipo de pesquisa

Os processos históricos que encadearam a emergência da Sociologia

Minha casa, nossa luta

UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO CONSELHO DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO SECRETARIA DOS ÓRGÃOS COLEGIADOS

Perguntas Frequentes Edital de Seleção Pública nº 2014/005 - Redes ECOFORTE

Educação para o consumo de alimentos transgênicos. A. informação como mediadora da relação de consumo no âmbito

GEOGRAFIA 7º ano 1º Trimestre / 2016 BATERIA DE EXERCÍCIOS COMPLEMENTARES

As teorias demográficas

Linha do Tempo. Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica

Resumo Expandido Título da Pesquisa Palavras-chave Campus Tipo de Bolsa Financiador Bolsista Professor Orientador Área de Conhecimento Resumo

VARIAÇÃO ESTACIONAL DE PREÇOS E QUANTIDADE OFERTADA DE MAMÃO NOS PRINCIPAIS MERCADOS ATACADISTAS DA REGIÃO SUDESTE

ARRANJO PRODUTIVO DE JÓIAS FOLHEDAS DE JUAZEIRO DO NORTE 1

A RELEVÂNCIA DAS FONTES DOCUMENTAIS DOS SÉCULOS XVII E XVIII NA PRESERVAÇÃO DA MEMÓRIA REGIONAL DO SUL E EXTREMO SUL DA BAHIA. ¹

A População e o Espaço Urbano

MERCADO DE TRABALHO NA CIDADE DE PORTO ALEGRE

Pluriatividade, Pobreza Rural e Políticas Públicas: Uma análise comparada entre Brasil e União Européia. Resenha do Livro. Marcelino de Souz a1

TESTE DE AVALIAÇÃO DE HISTÓRIA E GEOGRAFIA DE PORTUGAL

DETERMINANTES DO CRESCIMENTO DA RENDA

Progresso tecnológico e

ANÁLISE DA ALTERAÇÃO DO USO E COBERTURA DA TERRA EM DOIS PERÍODOS NA BACIA DO RIO JAPARATUBA, SE

ANALISE DAS ANOMALIAS DAS TEMPERATURAS NO ANO DE 2015

VULNERABILIDADE AMBIENTAL E AGRICULTURA NA CIDADE DE MANAUS/AM

MUDANÇAS NA PAISAGEM URBANA: A PRODUÇÃO DE MORADIAS NO MUNICÍPIO DE SANTA VITÓRIA DO PALMAR-RS

Taxa de desemprego diminui

O Espaço do Geógrafo. Hildebert Isnard. O Espaço do Geógrafo. Boletim Geográfico, Rio de Janeiro, 36( ): 5-16, jul./dez.

ENSINO DE GEOMORFOLOGIA E PEDOLOGIA NOS ANOS INICIAIS DA EDUCAÇÃO BÁSICA: DIRETRIZES CURRICULARES E O LIVRO DIDÁTICO

SISTEMÁTICA DE ACOMPANHAMENTO E AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO

3º Trabalho de GI Análise DFD

A INFLUÊNCIA DO LIVRO DIDÁTICO DE GEOGRAFIA NA PRÁTICA DOCENTE

COLÉGIO XIX DE MARÇO excelência em educação

Transcrição:

O PROCESSO DE URBANIZAÇÃO E A MOBILIDADE DO CAMPO PARA A CIDADE EM BELO CAMPO/BA Silmara Oliveira Moreira Graduanda em Geografia/UESB, Bolsista da UESB E-mail: silmara.geo@gmail.com RESUMO: O objetivo deste artigo é discutir como se desenvolveu o processo de urbanização, pensando em suas influências na cidade de Belo Campo/BA, especificamente, diante das relações campo-cidade que nela se estabelecem. Como as transformações no espaço da cidade são cada vez mais intensas, sobretudo, em uma pequena cidade, entender como se deu seu processo de urbanização ajuda a compreender melhor como, ao longo da história, vários atores e sujeitos contribuíram para a sua configuração espacial. Atualmente, o processo de urbanização, dentro de uma lógica capitalista, não se orienta apenas e exclusivamente pelo modelo de industrialização, mesmo que esse tenha fortemente influenciado as relações socioespaciais ao longo da história. Assim, nota-se que a configuração do pequeno espaço urbano de Belo Campo, nas últimas décadas, é um produto direto, dentre outros aspectos, da mobilidade do camponês no sentido campo-cidade, como resultado, sobretudo, da ausência de políticas que mantenham o trabalhador rural no campo. PALAVRAS-CHAVE: Urbanização, Pequenas cidades, Mobilidade, Campo INTRODUÇÃO O processo de urbanização, que se intensificou a partir da Primeira Revolução Industrial, trouxe grandes transformações para as cidades de todo o mundo. No Brasil, essas modificações, que começam a ser mais visíveis, especificamente, em meados do século XX, acarretaram na alteração de algumas cidades, no surgimento de outras novas e em modificações profundas no campo. Na Bahia, passaram a existir muitas cidades nesse momento, face à emancipação política de vários municípios. Outro fato importante nesse período foi a migração de um grande contingente de pessoas tanto das pequenas cidades, quanto do campo para a Região Sudeste do Brasil, à procura de emprego, principalmente para o Estado de São Paulo, onde se concentrava a maior parte das indústrias nacionais. No município de Belo campo, é possível observar que o campo possui intensa relação com a cidade, principalmente, no que diz respeito às relações de trabalho. Diante disso, fez se necessário entender quais foram as condições históricas que conduziram a mobilidade do trabalho, no sentido da saída do homem do campo em relação à cidade de Belo Campo, 1

partindo do pressuposto de que grande parte da população urbana veio da zona rural do próprio município. A migração do camponês para a cidade trouxe uma nova dinâmica para o espaço urbano, acima de tudo, decorreu em uma grande mudança na vida dessas pessoas. Acredita-se que muitas delas, mesmo morando na cidade, ainda estabelecem relações de trabalho com o campo, e que esse não foi completamente tirado delas. Por outro lado, pretende-se compreender, também, como que esse camponês, ao chegar à cidade, se territorializou, pois é importante saber as condições de vida desse sujeito no espaço da cidade. Finalmente, pretende-se considerar qual a relação estabelecida entre a reprodução da vida do camponês em uma pequena cidade, pensando no processo de produção do espaço urbano, por considerar relevante identificar as relações de trabalho que o camponês estabelece, enquanto morador da cidade, com o campo a fim de compreender em que medida suas relações com o campo influenciam no urbano, enquanto modo vida. Cabe salientar, que o presente trabalho, é produto de uma pesquisa que se encontra no seu estágio inicial, portanto os resultados apresentados são preliminares. Para o desenvolvimento da pesquisa, num primeiro momento, estão sendo feitas pesquisas na base de dados do IBGE, sobre as Taxa de Urbanização e Ruralização do município de Belo Campo, bem como do crescimento populacional do distrito sede e da zona rural do município, para entender a mobilidade do trabalho no sentido campo-cidade. A fim de verificar o número de pessoas que veio do campo para a cidade e identificar as relações de trabalho que se estabelecem, serão aplicados questionários e feitas entrevistas com moradores dos bairros mais recentes da cidade. Serão realizadas também entrevistas com os gestores do município para compreender a relação entre Estado, representado pelo poder público municipal, e os trabalhadores do campo. Ao término da coleta de dados e informações, a pesquisa caminhará no sentido de sintetizá-la. Diante dos dados coletados, serão feita analise do crescimento populacional da cidade ao longo dos anos. Será feito também um mapeamento a fim de identificar a origem das pessoas entrevistadas, ou seja, se vieram do campo e quais são as relações de trabalho que estabelecem com o local de origem. URBANIZAÇÃO E A MOBILIDADE DO CAMPO PARA A CIDADE A urbanização é um processo e a forma como esse acontece está intimamente ligada 2

com o modo de produção vigente, às diversas escalas geográficas de análise e aos interesses dos diferentes sujeitos. O processo de urbanização, aliado a industrialização, fez com que a população das cidades viesse a crescer progressivamente. Ao analisar esse processo, Sposito afirma que: [...] a urbanização é um processo de longa duração, que se inicia com o aparecimento das primeiras cidades e que se revela a partir de diferentes modos de produção, sob diversas formas; expressa e ampara a existência de uma divisão social do trabalho. (SPOSITO, 2004) A urbanização influencia diretamente na divisão social do trabalho, nesse contexto, enquanto forma mais ampla, insere uma nova lógica nas relações da sociedade. Esse processo que, por hora, é complexo deve ser analisado diante da conexão do tempo com o espaço, entre diferentes ritmos temporais de análise e diferentes escalas (SPOSITO, 2004). No Brasil, esse processo se iniciou durante as décadas de 1940 e 1960, e foi modificado pelo crescimento da industrialização que atraiu grande contingente de pessoas para a cidade. Por outro lado, segue uma lógica hegemônica em diversas escalas, vinculada à lógica do modo de produção capitalista. Todavia, isso também esteve relacionado ao fato de que boa parte dessas pessoas foi expulsa do campo, seja em função da modernização da agricultura, seja pela ausência de políticas voltadas para manter o pequeno produtor rural, aspecto apontado por Santos (2009). Esse contexto estabeleceu uma nova lógica nas relações que ocorrem nos espaços urbanos. Assim, por exemplo, as cidades baianas, nessa perspectiva, também passaram por modificações em sua dinâmica, enquanto locais onde se estabeleceram novas demandas do capital, o que provocou transformações no cotidiano e na própria organização do espaço intra-urbano. Por outro lado, a divisão territorial, técnica e social do trabalho marca a relação entre o campo e a cidade, sendo que ao longo da história ao campo coube produzir para a manutenção da cidade. (SPOSITO, 2006) A partir do final do século XVIII, todavia, o campo, que antes era responsável pelo setor de produção somente agrícola, passou a fazer parte também de outros setores da economia, como o setor terciário que, cada vez, mais é notado nesse espaço. Ademais, nessa 3

relação campo-cidade, a presença do camponês é também cada vez mais notada na cidade: ou seja, a luta do campo é vencida na cidade. As relações cidade-campo nos pequenos municípios são marcadas, também, pela mobilidade do trabalho, que segundo Gaudemar, consiste num processo cujo fim é disponibilizar [...] os homens, os seus corpos e seus espaços de vida [para contínua] valorização do capital (GAUDEMAR, 1977, apud SILVA, 2008, p. 29). Essa mobilidade se dá, devido à expropriação dos meios de produção no contexto da urbanização, ou mesmo por não conseguir sobreviver do trabalho desempenhado no campo. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DAS PEQUENAS CIDADES Pensar a urbanização em uma pequena cidade consiste em pensar numa maneira diferenciada de entender as suas implicações enquanto processo num campo pouco explorado e até mesmo conhecido pela maioria dos pesquisadores. No Brasil, segundo o IBGE, todo distrito sede de município é considerado cidade. Nesse sentido, é importante salientar que cada país tem a sua classificação. Apesar da idéia de cidade estar quase sempre vinculada com os grandes centros, locais caracterizados por grande concentração demográfica, é pertinente observar que somente pelos dados demográficos não é possível entender o urbano, uma vez que é necessária a análise de outros fatores socioespaciais para se chegar a uma noção do que constitui o urbano em determinado local. A definição de cidade como grande aglomeração não contempla a dinâmica das pequenas cidades. Segundo Barcelar: [...] alguns estudiosos do urbano estabelecem critérios rigorosos para caracterizar um determinado assentamento humano como cidade e assim relegam cidades menores a um limbo conceitual e até mesmo modificam suas características de conceituação ao afirmarem serem as pequenas cidades, não-cidades. (BARCELAR, 2003, p.03) Há uma grande divergência na conceituação e na denominação de pequena cidade, uma vez que órgãos se diferem quanto à classificação. Todavia, é importante salientar que mesmo as pequenas cidades carregam em si um conteúdo urbano, nas relações que se tecem, 4

sejam elas de ordem econômica, ou nas relações sociais. Ainda segundo Barcelar: De modo abrangente, podemos admitir que a cidade é a materialização do urbano. A cidade se materializa enquanto espaço urbanizado. Enquanto que o urbano é a relação, os processos político-sociais inerentes ao desenvolvimento da urbanização do território, da região ou do país. Portanto, de forma singular a cidade seria a materialização das ações humanas, enquanto o urbano seria inerente ao processo de transformação de uma sociedade, lugar ou espaço em formas urbanas, que não se atém apenas à cidade, mas a forma de vida de um grupo social. O urbano é a representação de um modelo de vida, a cidade a materialização deste modelo. (BACELAR, 2003, p. 2) É importante compreender, no entanto, que o ritmo com que esse urbano se verifica na cidade pequena é diferenciado das médias e grandes cidades, e esse é um caminho de discussão ainda pouco explorado empiricamente, sobretudo, no caso das cidades baianas. Essas, no entanto, desempenham papel muito importante na rede urbana. Sua economia, normalmente, está ligada aos empregos gerados pelo setor público ou às atividades desempenhadas no campo, ou seja, atividades do setor primário, não deixando de apresentar uma parcela crescente no setor de comércio e serviço, ainda que em pequena quantidade. A RELAÇÃO CAMPO-CIDADE EM BELO CAMPO A cidade de Belo Campo está localizada no nordeste brasileiro, no sudeste da Bahia, mais precisamente, no Território de Identidade de Vitória da Conquista. O município limita-se com os municípios de Tremedal, Candido Sales, Caraíbas e Vitória da Conquista (Figura 01). 5

Figura 01: Município de Belo campo, Localização na Bahia, 2010 No município de Belo Campo, observa-se que houve um aumento significativo, nas 6

últimas décadas, da população da cidade, e que essa passou, em 1940, ainda enquanto uma vila, de 367 habitantes, para 8.082, em 2000 tendo sido emancipado durante a década de 1960. Belo Campo não possui como diretriz econômica a industrialização, portanto, não segue uma lógica urbana mais intensa, mesmo tendo sido influenciada por essa mesma dinâmica. Se, em seus primeiros anos de emancipação, contava com a maior parte de sua população morando na zona rural, com o decorrer dos anos, aumentou significativamente sua população urbana, sendo que a população rural manteve-se. Grande parte dos habitantes da cidade veio da zona rural do município. Segundo dados do IBGE, em 2000, a população era de 9.573 habitantes vivendo no campo e 8.082, na cidade. Mesmo com maior parte da população vivendo no campo, a Taxa de Urbanização no município vem crescendo progressivamente, enquanto que a Taxa de Ruralização diminui. (Figura 02). FIGURA 02: Taxa de Urbanização e Ruralização, Belo Campo, 1940 2000 Fonte: IBGE, Censo demográfico Nota: *Os dados de 1940 a 1960 são referentes ao período em que Belo Campo era O município de Belo Campo está localizado na região do semi-árido baiano e as pessoas que nele residem, principalmente na zona rural, enfrentam grandes problemas com a escassez de água durante o período da seca, já que a economia do município está voltada 7

basicamente para a agricultura. Entende-se, porém, que o fator climático não é determinante para o movimento migratório, pois pessoas com recursos financeiros disponíveis conseguem sobre medida continuar vivendo no campo. O poder público governamental, nas escalas municipal, estadual e federal, nos anos em que o município apresenta maior representatividade nesse processo de migração, carregam grande encargo, pois são quase inexistentes as políticas públicas voltadas para manter esse camponês no campo, durante as décadas de 1980 e 1990, principalmente, no que diz respeito ao oferecimento de suporte à produção agrícola, atividade que garante a sua sobrevivência. Por outro lado, essa saída do camponês em direção à cidade também está ligada à ideologia que se propaga: a de que a cidade é melhor para se viver, a idéia da cidade como sinônimo de desenvolvimento social e econômico, algo construído ideologicamente, sobretudo, no Brasil que objetivava industrializar-se, enquanto o campo foi concebido como o lugar do atraso. Em Belo Campo, o camponês, ao chegar à cidade, se deparou com novas formas de vida, e se instalou, normalmente, nos bairros periféricos, mais afastados do Centro, onde consegue comprar sua casa a um preço mais acessível, porque as áreas centrais das pequenas cidades são as mais valorizadas. Assim, já é possível observar a formação de bairros como Alvorada, Nova Cidade e Morro com grande parte dos habitantes que vieram do campo. Esse camponês, no entanto, não muda sua condição de trabalhador camponês. Devido às suas próprias condições materiais de existência, ocupam-se de trabalhos precarizados e, geralmente, mal remunerados. Mormente, as mulheres se encarregam de trabalhar como empregadas domésticas, ganhando baixíssimos salários, e os homens como ajudante na construção civil, prestadores de pequenos serviços, dentre outros, isso quando encontra algum trabalho, num contexto de sérios problemas, face à reestruturação produtiva do capital. Nessas condições, mesmo morando na cidade de Belo Campo, percebe-se que essas pessoas ainda possuem fortes relações de trabalho com o campo, devido ao fato de que muitos camponeses se vêem obrigados a sair todos os dias de sua residência para trabalhar na zona rural do município, a fim de garantir a sobrevivência sua e de sua família. Por outro 8

lado, essa é a sua própria história, já que, mesmo vivendo na cidade, a sua condição como camponês é mantida. CONSIDERAÇÕES FINAIS Atualmente, o processo de urbanização, dentro de uma lógica capitalista, não se orienta apenas e exclusivamente pelo modelo de industrialização, mesmo que esse tenha fortemente influenciado as relações socioespaciais ao longo da história. Assim, nota-se que a configuração dos pequenos espaços urbanos é produto direto, dentre outros aspectos, da mobilidade do camponês no sentido campo-cidade. Nessa ótica, discutir essa questão contribui para um melhor embasamento teórico sobre as pequenas cidades, que se relaciona diretamente com o fortalecimento de novas abordagens empíricas. São poucas as pesquisas realizadas sobre as pequenas cidades baianas, e a maioria dos pesquisadores que abordam essa temática tende a aplicar modelos de investigação das grandes ou médias cidades. O Grupo de Pesquisa Urbanização e Produção das Pequenas e Médias Cidades da Bahia, ao qual esta pesquisa está associada, vem desenvolvendo seu trabalho a fim de reunir mais informações e buscar cada vez aprofundar no entendimento a respeito da dinâmica dessas pequenas cidades. Percebe-se que a cidade carece de estudos que ajudem a melhor compreender a dinâmica de sua urbanização, particularizada na intenção de trazer um maior aprofundamento sobre as relações existentes entre o campo e a cidade em Belo Campo. As profundas mudanças pelas quais passaram a cidade de Belo Campo seguem uma lógica inerente ao processo de urbanização, que provocou e ainda provoca grandes transformações nos espaços urbanos. Enquanto cidade pequena, Belo Campo possui uma dinâmica diferente quanto as suas relações, econômicas e sociais que são marcadas por uma intensa mobilidade do trabalho do campo, em direção à cidade. Esse fato é constatado pelo grande número de pessoas que saíram do campo para morar na cidade. É importante destacar que as ações do poder público governamental, nas suas várias 9

escalas (municipal, estadual e federal), quanto ao não oferecimento de políticas públicas voltados para o homem do campo, tem contribuído de maneira significante na configuração socioespacial da cidade de Belo Campo e na própria mobilidade do trabalhador do campo, sobretudo, num momento em que a crise do capital se instala, ou seja, do processo de reestruturação produtiva. Convém entender, portanto que as condições de vida do trabalhador camponês na cidade são de grande dificuldade econômica. Sua relação com o campo é marcada pelo trabalho e muitos desses trabalhadores camponeses que vivem na cidade afirmam que se no campo existissem boas condições para a sua sobrevivência não haveriam saído do mesmo. REFERÊNCIAS BACELAR, Winston Kleiber de Almeida. As dualidades das pequenas cidades: as cidades com menos de 10.000 habitantes do cerrado triangulino. In: Anais do II Simpósio Regional de Geografia: perspectivas para o cerrado no século XXI, Uberlândia, 2003. IBGE, Censo Demográfico. Rio de Janeiro: IBGE, 1940, 1950 e 1960. IBGE, Censo Demográfico, 1970, 1980, 1991 e 2000. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br>, acesso em agosto e setembro de 2009. LOPES, D. M. F. Cidades pequenas são urbanas? O urbano possível. In: Bahia Análise e Dados. Salvador, SEI, v. 19, n. 2, p. 369-634, jul/set. 2009 MOURA, R. A cidade em transformação: processos, conceitos e novos conteúdos.in: Bahia Análise e Dados. Salvador, SEI, v. 19, n. 2, p. 369-634, jul/set. 2009. SANTOS, Janio. Urbanização e produção de cidades na Bahia: reflexões sobre os processos de estruturação e reestruturação urbana. In: Bahia Análise e Dados: Salvador: v.19, n.2, p.499-509, jul./set. 2009. SILVA, Izildo C. A. da. A mobilidade do trabalho sobre o impacto da reestruturação produtiva: estudo das tendências migratórias em Santo André. 2008. 170p. Dissertação (Mestrado). Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, 2008. Disponível em:<http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis>, acesso em março de 2010. 10

SPOSITO, M. E. B. O chão em pedaços: urbanização, economia e cidades no Estado de São Paulo. 2004. 508 f. Tese (Livre Docência)-Unesp, Presidente Prudente, 2004. SPOSITO, M. E. B. A questão cidade-campo: perspectivas a partir da cidade. In: SPOSITO, M. E. B.; WHITACKER, A. M (org.). Cidade e Campo: relações e contradições entre urbano e rural. São Paulo: Expressão Popular, 2006. p.111-130. 11