IDENTIFICAÇÃO DE EXEMPLARES DE LAMBARIS NATIVOS COM POTENCIAL REPRODUTOR, COLETADOS EM BACIAS HIDROGRÁFICAS DA REGIÃO NORDESTE DO ESTADO DE SANTA CATARINA Gisele Luana STAROSKY¹, Joice Regina GOMES, Daniel Meneguello LIMEIRA, Artur de Lima PRETO². ¹ Bolsista PIBITI/CNPq; ² Orientador IFC-Campus Araquari. Introdução A produção em cativeiro de peixes de água doce no Brasil é uma atividade em constante crescimento. Levando-se em conta somente a produção de peixes nativos, a produção nacional cresceu 322,35% no período de 2004 a 2013 (FAO, 2015). Neste contexto, o Estado de Santa Catarina se destaca por ser o estado com o maior número de empreendimentos aquícolas para este fim (MPA, 2013). A produção em cativeiro de peixes nativos pode contribuir com a diminuição da captura destes no ambiente natural, e consequentemente com a redução do risco de extinção de espécies ameaçadas. Outras vantagens desta prática são a fácil manutenção de reprodutores e a eliminação do risco de introdução de espécies exóticas ao ambiente. Estudos com foco na manutenção da diversidade genética destas espécies, com o uso de marcadores moleculares, são importantes pois podem contribuir para a realização de programas de melhoramento genético e para a conservação de seu patrimônio genético natural. Espécies do gênero Astyanax, comumente chamados de lambaris, caracterizam-se por serem espécies de pequeno porte e com ampla distribuição, sendo facilmente encontradas em rios de todo o território nacional. Por possuírem características como ciclo de vida rápido, boa aceitação de alimentação artificial, rápida adaptação a variações térmicas, crescimento precoce e elevada produtividade, podendo atingir uma produção de 100 t/ha/ano. (Hayashi et al., 1999; Soares et al., 1999; Vilela e Hayashi, 2001; Garutti, 2003; Porto-Foresti, 2005), sua produção apresenta potencial para criações em pequenas propriedades e também para criações mais intensivas. O presente estudo teve como objetivo identificar exemplares de lambaris nativos com potencial reprodutor, selecionando as matrizes com potencial zootécnico e alto polimorfismo genético, servindo como base para futuros programas de melhoramento genético e de conservação de seu patrimônio genético. Material e Métodos
Exemplares de lambari foram coletados em pequenos tributários dos rios Itapocu (Massaranduba, SC) e Cubatão (Joinville, SC) com o uso de peneirões, puçás e redes de arrasto. Os peixes foram acondicionados em tambores de 50 L com água do local e aeração constante, sendo levados ao Laboratório de Aquicultura - Campus Araquari. Posteriormente, foi feita a identificação da espécie e a classificação quanto ao sexo segundo Garutti (2003). Os peixes foram acondicionados em caixas de PVC, com aeração constante e alimentação à vontade. Foi realizada a biometria destes lambaris, sendo mensurados o peso (g), a altura (cm) e o comprimento total (cm). Em seguida, o peso dos peixes foi utilizado como ferramenta para a seleção dos animais a serem analisados geneticamente, sendo selecionados os animais 25% maiores (4 o quartil) e os 25% menores (1 o quartil), em ambos os sexos. Dos animais selecionados, foi retirado um pequeno pedaço da nadadeira caudal para a posterior extração de DNA. As extrações de DNA foram realizadas no Laboratório de Ensino e Diagnóstico veterinário- LEDVET, Campus Araquari, e para tanto foi utilizado o método CTAB de extração de DNA, sugerido por Boyce e Zwick (1989). Para realização de PCR e posterior avaliação da diversidade genética dos indivíduos selecionados, foram testados nove marcadores microssatélites desenvolvidos para o lambari Astyanax altiparanae, descritos por Zaganini et al. (2012). Para as amplificações dos locos de microssatélites foi utilizada a reação de PCR sugerida por Zaganini et al. (2012). Resultados e discussão Os exemplares coletados neste estudo foram identificados como pertencentes à espécie Astyanax laticeps. O comprimento total, peso e altura dos exemplares selecionados para este estudo encontram-se na tabela 1, discriminados quanto ao local de origem, sexo e quartil. Em média, as fêmeas coletadas na Bacia do Rio Itapocu foram maiores e mais pesadas quando comparadas às fêmeas coletadas na Bacia do Rio Cubatão. No caso dos exemplares machos coletados, não é possível realizar esta comparação devido ao pequeno número de machos coletados na Bacia do Rio Cubatão.
Tabela 01: Média (± DP) das variáveis biométricas avaliadas nos exemplares selecionados para a análise molecular. Bacia Rio Itapocu Rio Cubatão Sexo (, ) Quartil N Comprimento Total (cm) Altura (cm) Peso (g) 4 o 3 9,80 ± 0,10 2,60 ± 0,17 12,37 ± 1,06 1 o 4 5,95 ± 0,48 1,80 ± 0,12 3,37 ± 0,45 4 o 8 10,54 ± 2,27 15,19 ± 34,67 15,90 ± 10,00 1 o 8 6,18 ± 0,52 1,77 ± 0,26 2,92 ± 0,68 4 o 1 12,22 ± 0,00 3,62 ± 0,00 27,52 ± 0,00 1 o 1 6,07 ± 0,00 1,77 ± 0,00 2,84 ± 0,00 4 o 8 7,84 ± 0,17 2,40 ± 0,14 6,79 ± 0,41 1 o 8 6,15 ± 0,51 1,71 ± 0,28 3,07 ± 0,73 A figura 01 mostra o resultado das PCRs dos marcadores microssatélites utilizados neste estudo. Dos nove marcadores microssatélites testados, cinco não foram capazes de amplificar o DNA dos exemplares selecionados (Asty 11, Asty 15, Asty 16, Asty 23 e Asty 24). Dos marcadores que amplificaram o DNA dos peixes testados, três deles (Asty 13, Asty 26 e Asty 27) apresentaram bandas espúrias, que são amplificações não específicas de fragmentos do genoma do animal estudado. O único marcador que apresentou uma amplificação bem específica foi o marcador Asty 12. Este tipo de resultado é comum quando são utilizados marcadores microssatélites desenvolvidos para outras espécies, também chamados de marcadores heterólogos. Na ocorrência deste tipo de problema, a solução é padronizar novamente a reação de PCR, variando as temperaturas e as proporções dos reagentes utilizados na reação, para que estes marcadores passem a funcionar com a nova espécie estudada. Desta forma, todos os marcadores que apresentaram problemas na amplificação do DNA dos lambaris deste estudo estão nesta fase de padronização. Figura 01: Resultado dos testes de PCR realizados com os marcadores microssatélites utilizados neste estudo.
Em um futuro programa de melhoramento genético para a produção de lambaris, os resultados obtidos até o momento aparentemente indicam que as fêmeas da Bacia do Rio Itapocu são as mais indicadas para a formação de um plantel de matrizes. Com relação aos machos coletados, é necessário um n amostral maior para ser possível este tipo de inferência. Porém tal decisão seria muito precipitada uma vez que as análises moleculares ainda não estão completas. Para que se possa finalmente decidir quais exemplares são realmente adequados para esta análise, é importante observar a variabilidade genética dos peixes a serem adquiridos e, neste caso, o uso de marcadores microssatélites pode ajudar na resolução desta demanda. Embora os marcadores microssatélites sejam, segundo Ferreira e Graltapaglia (1996), marcadores neutros e que não sofrem pressão de seleção, alguns dos locos testados podem estar ligados a sítios do genoma que expressam características (genes) aos animais estudados, tais como ganho de peso ou tamanho. Sendo assim, ao se comparar as genotipagens obtidas com os animais do 1 o e do 4 o quartil (os animais menores com os animais maiores, respectivamente), é possível que ocorra alguma relação entre a presença de um alelo específico dentro de um determinado loco e características como maior ganho de peso ou maior taxa de crescimento. Caso seja observado este tipo de ocorrência, a seleção de reprodutores e matrizes pode ser antecipada uma vez que estes alelos sejam observados. Estas questões serão respondidas somente quando as análises moleculares estiverem concluídas. Além da possibilidade de identificação precoce de características zootécnicas desejadas, é importante atentar para a variabilidade genética e ocorrência de alelos raros dentro dos exemplares estudados, uma vez que uma maior variabilidade genética é, do ponto de vista evolutivo, desejável. Não se pode esquecer que toda produção de peixes em cativeiro está sujeita a escapes para o ambiente, e a introdução de alelos até então inexistentes em uma determinada localidade pode representar um impacto ambiental de difícil quantificação. Conclusão As fêmeas de lambari coletadas na Bacia do Rio Itapocu, por serem maiores, são aparentemente mais atrativas para a seleção de matrizes para produção de lambaris em cativeiro. Todavia, para a tomada de qualquer decisão sobre a seleção de exemplares para reprodução, é necessário se concluir as análises moleculares, uma vez que é extremamente
importante se observar a variabilidade genética, a ocorrência de alelos raros e a possível ligação de locos microssatélites a genes que expressam características favoráveis aos exemplares selecionados, sob o ponto de vista zootécnico. Referências BOYCE, T.M.; ZWICK, M.E. Mitochondrial DNA in bark weevils: size, structure, and heteroplasmy. Genetics, Austin, v.12, n.3, p.825 836, 1989. FAO, 2015. Fisheries and Aquaculture Information and Statistics Service. (disponível em: http://www.fao.org/figis/servlet/sqservlet?file=/work/figis/prod/webapps/figis/temp/hqp_7 000816343999618792.xml&outtype=html). Acesso: 24/09/2015. FERREIRA, M. E., GRATTAPAGLIA, D. 1998. Introdução ao uso de marcadores moleculares em análise genética. EMBRAPA-CENARGEN, Brasília. 220p. GARUTTI, V. 2003. Piscicultura Ecológica. Editora UNESP, São Paulo. 330p. HAYASHI, C.; GALDIOLI, E.M.; NAGAE, M.Y. Exigência de proteína para alevinos de lambari (Astyanax bimaculatus) (PISCES: CHARACIDAE). In: REUNIÃO ANUAL DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE ZOOTECNIA, 36., 1999, Porto Alegre. Anais Porto Alegre: Sociedade Brasileira de Zootecnia, 1999. MPA - MINISTÉRIO DA PESCA E AQUICULTURA, 2013. Censo Aquícola Nacional: Ano 2008. Brasília. 336p. PORTO-FORESTI, F.; CASTILHO-ALMEIDA, R. B.; FORESTI, F. Biologia e criação do lambari-do-rabo-amarelo (Astyanax bimaculatus). In: Espécies nativas para piscicultura no Brasil. Editora UFSM, cap. 5, p. 105 120, 2005. SOARES, C. M.; HAYASHI, C.; GONÇALVES, G. S.; GALDIOLI, E. M.; BOSCOLO, W. R.; NAGAE, M. Y. Substituição parcial da proteína da farinha de peixe pela de fontes proteicas alternativas em dietas para alevinos de lambari (Astyanax bimaculatus). In: Reunião Anual da Sociedade Brasileira de Zootecnia, 36., 1999, Porto Alegre. Anais Porto Alegre: Sociedade Brasileira de Zootecnia, 1999. VILELA, C; HAYASHI, C. Desenvolvimento de juvenis de lambari Astyanax bimaculatus (Linnaeus, 1758), sob diferentes densidades de estocagem em tanques-rede. Acta Scientiarum, v.23, n.2, p.491-496, 2001. ZAGANINI, R.L.; HASHIMOTO, D.T.; PEREIRA, L.H.G., OLIVEIRA, C.; MENDONÇA, F.F.; FORESTI, F.; PORTO-FORESTI, F. Isolation and characterization of microsatellite loci in the Neotropical fish Astyanax altiparanae (Teleostei: Characiformes) and cross-species amplification. Journal of Genetics - Online Resources (91): 24-26, 2012.