APELAÇÃO nº. 0387687-17.2012.8.19.0001 APELANTE: PAULO CESAR DE REZENDE Defensoria Pública APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO 19ª Vara Criminal da Comarca da Capital DESEMBARGADOR RELATOR: JOÃO ZIRALDO MAIA EMENTA. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO E USO DE DOCUMENTO FALSO. ERRO DE TIPO. CONSUNÇÃO. ABSOLVIÇÃO. REAJUSTE DOSIMÉTRICO. DESCABIMENTO. 1. Réu denunciado pela prática dos delitos previstos no art. 304 e 297 c/c 29 do CP, este último por duas vezes, na forma do art. 69 do CP. 2. Narra a denúncia que, em diligência policial, agentes da lei se dirigiram ao endereço onde reside o réu, cuja imagem teria sido divulgada em canal de televisão e contra a qual pairava a suposta prática de crimes de estelionato. 3. Informa a exordial que, abordado pelos milicianos quando saía do prédio onde mora, o réu identificou-se apresentando documento de identidade com nome diverso daquele com o qual teria se apresentado verbalmente, pelo que foi conduzido à autoridade policial, quando se apurou que o documento de identidade apresentado era falso. 4. Foi apreendida, ainda, em poder do réu, uma CNH também falsa. 5. Prova pericial e oral fidedignas no sentido de que os documentos (RG e CNH) de fato eram falsos e o réu em sua autodefesa não nega ter concorrido para que terceiro falsificasse a CNH e retirasse as infrações de trânsito existentes em seu nome. 6. Insurgência defensiva quanto ao édito condenatório, ao argumento de que o réu não teria feito uso do documento falso, que teria incorrido em erro de tipo a justificar a absolvição do mesmo. 7. Prova oral que torna isolada a tese de não uso do documento falso, sendo certo que não se extrai do contingente probatório que o réu teria incorrido em erro quanto a quaisquer das elementares do tipo. 8. Ao contrário, as declarações autodefensivas deixam claro que o réu concorreu para a falsificação da CNH apreendida e reconhecem a ilicitude do seu agir. 9. Pretendida consunção que na espécie não opera efeitos modificativos da sentença porque o réu foi denunciado pela prática do art. 304 e do artigo 297, na forma do art. 29, este por duas vezes, em razão do uso do RG falso e participação na falsificação da CNH, ou seja, documentos diversos. 10. A sentença condenatória reconheceu a procedência da pretensão punitiva pelo reconhecimento da prática do delito 1
consubstanciado no uso do RG falsificado e pelo delito consistente na participação em crime de falsificação de CNH, aplicando-se as regras do concurso material. 11. Absolvição que não se acolhe. 12. Dosimetria penal adequada à culpabilidade do agente. RECURSO DESPROVIDO. A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos estes autos da Apelação nº 0387687-17.2012.8.19.0001, onde figuram as partes preambularmente epigrafadas, A C O R D A M os Excelentíssimos Senhores Desembargadores que compõem a Colenda do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, em Sessão realizada no dia 20/05/2014, à unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do eminente Des. Relator. V O T O Trata-se de recurso de apelação interposto pelo réu contra a sentença que o condenou à pena total de 05 (cinco) anos de reclusão e 24 (vinte e quatro) dias-multa à razão unitária mínima legal, em regime semiaberto, em razão da prática dos crimes previstos nos artigos 304 e 297, na forma do art. 69 do CP. Presentes os requisitos de admissibilidade do recurso, dele conheço. No entanto, não assiste razão ao pleito recursal aviado pela defesa. Registre-se que a materialidade do delito previsto no art. 297 do CP está devidamente consubstanciada no auto de apreensão de fls. 16 (e-doc 00027), sendo certo que o laudo de exame em documentos constante do e-doc 000185 espanca qualquer dúvida acerca da falsidade dos documentos apreendidos, no que toca especificamente à carteira de identidade e à CNH apreendidas. 2
A autoria por sua vez decorre da própria prova oral coligida em audiência de instrução e julgamento, eis que os depoimentos prestados pelos agentes policiais responsáveis pela abordagem do réu são uníssonos no sentido de que o acusado, uma vez indagada sua identidade, apresentou aos milicianos uma carteira de identidade pela qual atribuiu a si identificação diversa da verdadeira. Noutras palavras, enquanto no documento de identidade apresentado por ocasião da identificação à autoridade policial apresentava o nome NATAL MÔNACO FILHO, o resultado da identificação papiloscópica do acusado revelou que sua verdadeira identidade é PAULO CESAR DE REZENDE (e-doc 00028). A defesa insurge-se quanto à imputação constante do artigo 304 do CP, arguindo que o acusado não fez uso do documento e que, não obstante mantê-los em seu apartamento, a apreensão decorreu de revista ilegal. No entanto, a prova dos autos direciona-se em sentido oposto, isto é, evidencia que o réu foi abordado quando saía do prédio onde mora, tendo sido apontado pelo porteiro como a pessoa cuja imagem fora divulgada em canal de televisão como suposto autor de crimes de estelionato. A defesa, neste tocante, mostra-se isolada, porque os agentes militares foram uníssonos ao afirmarem que em decorrência da abordagem o réu identificou-se utilizando documento falso, e espontaneamente conduziu-se à delegacia em companhia dos agentes da lei. Frise-se que o réu não nega em juízo ter incorrido na participação em crime de falsificação de documento público. E, não obstante reconhecer o ilícito de sua conduta, revela que teria pago a quantia de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) e fornecido fotografia para quem um terceiro, a quem chama de Érico, providenciasse a confecção de nova CNH sem qualquer registro de infrações de trânsito, tendo 3
conhecimento de que tal documento, assim como a identidade que apresentou durante a abordagem policial, foram feitos em nome de outra pessoa. E mesmo assim, não esboçando qualquer estranhamento, manteve-se na posse dos mesmos, vindo a fazer uso do documento de identidade aos agentes da lei. Não se sustenta a tese defensiva segundo a qual o apelante teria incorrido em erro de tipo, tornando atípica a sua conduta. E tal se dá porque as provas dos autos não permitem concluir que o réu teria incorrido em erro sobre quaisquer das elementares dos tipos imputados. Ao contrário, suas declarações em autodefesa deixam claro que concorreu para que terceiro fabricasse falso documento público, fornecendo foto e dinheiro, sendo evidenciada a intenção do agente: a retirada das pontuações deméritas de sua CNH. Aliás, se verídicas as intenções manifestadas, restariam inexplicáveis as razões pelas quais o acusado mantinha consigo, além de uma CNH falsificada, um RG igualmente falsificado também em nome de NATAL MÔNACO FILHO. razão à defesa. No tocante à pretensa consunção, tampouco assiste É de se considerar que foi imputada ao réu a prática do delito constante no artigo 304 do CP e no artigo 297 c/c art. 29, este por duas vezes. Se por um lado, quando da exibição do documento de identidade ao agente da lei, de fato a consunção se operaria, de forma a falsificação da mesma fosse considerada um delito consunto em relação ao uso; por outro, a participação na falsificação da CNH (documento diverso), que não foi apresentada ao policial quando da abordagem, se deu de forma autônoma, o que restou admitido pelo acusado. 4
Daí que a condenação pelo artigo 304 do CP, tal como lançada na sentença, justificou-se pela apresentação espontânea do documento de identidade falsificado ao agente policial. Já a condenação em relação ao artigo 297 do CP c.c. art. 29 do CP, por uma só vez, se deu em razão da participação do acusado na falsificação da CNH, documento diverso do apresentado. Por fim, no que concerne à dosimetria penal, em especial quanto ao recrudescimento da pena-base, não vislumbro qualquer inidoneidade, eis que o magistrado de piso obrou bem ao justificar o afastamento da pena provisória do patamar mínimo legal em razão do grau de reprovabilidade da conduta e do juízo de censura que recaiu sobre o atuar do agente, tanto no que toca ao crime de uso de documento falso em relação à carteira de identidade apresentada, quanto no que concerne ao crime de falsificação da CNH para o qual concorreu o réu. Pela mesma razão, atendendo-se ao exame das circunstâncias judiciais do artigo 59, a teor do que determina o art. 33, 3º do CP, mantenho o regime semiaberto. Ante o exposto, voto no sentido de desprover o apelo defensivo, mantendo-se a pena e o regime penal fixados na sentença hostilizada. Rio de Janeiro, 20 de maio de 2014. Desembargador JOÃO ZIRALDO MAIA Relator 5