Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro TRIBUNAL DE JUSTIÇA 9ª CÂMARA CÍVEL ============================================== APELAÇÃO CÍVEL nº 0368872-74.2009.19.0001 APELANTE: MARCUS LUIZ DOS SANTOS GODINHO APELADO 1: NOBRE SEGURADORA DO BRASIL LTDA. APELADO 2: LUCIANA VIANA RIBEIRO MONTENEGRO APELADO 3: HUMBERTO SILVA MONTENEGRO JUNIOR RELATOR: DESEMBARGADOR ROGERIO DE OLIVEIRA SOUZA A C Ó R D Ã O RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. SEGURO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. DENUNCIAÇÃO DA LIDE. POSSIBILIDADE DE A SEGURADORA SUPORTAR A CONDENAÇÃO DE FORMA SOLIDÁRIA. DANO MORAL. PESSOA NÃO TRANSPORTADA. COBERTURA NÃO CONTRATADA. PELO CAUSADOR DO DANO. O contrato de seguro de responsabilidade civil é considerado como uma garantia prestada pela seguradora de realizar o pagamento de perdas e danos devidos pelo segurado a terceiro. Obrigações assumidas no contrato que não se encerram entre as partes contratantes, mas que tem o condão de atingir eventual terceiro beneficiário. Obrigação solidária. Possibilidade de a seguradora denunciada suportar diretamente a condenação. Como o seguro contratado não tem cobertura para indenização por danos morais em relação a terceiro não transportado, não é possível a condenação da seguradora ao pagamento de tal verba. Inteligência do art. 757 do CC. Manutenção da verba arbitrada a título de danos morais a ser suportada pelo causador do dano. Valor que atende aos princípios reitores do instituto. Conhecimento e parcial provimento do recurso. VISTOS, relatados e discutidos estes autos da Apelação nº 0368872-74.2009.8.19.0001 em que é apelante MARCUS LUIZ DOS SANTOS GODINHO e apelado 1 NOBRE SEGURADORA DO BRASIL LTDA., apelado 2 LUCIANA VIANA RIBEIRO MONTENEGRO e apelado 3 HUMBERTO SILVA MONTENEGRO JUNIOR. ACORDAM os Desembargadores da 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade, em CONHECER O RECURSO e DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO, na forma do voto do Desembargador Relator. Página 1 de 6
Trata-se de ação, pelo rito sumário, proposta por LUCIANA VIANA RIBEIRO MONTENEGRO e HUMBERTO SILVA MONTENEGRO JÚNIOR em face de MARCOS LUIZ DOS SANTOS GODINHO, com o fim de obter a condenação deste ao pagamento de indenização por danos morais e materiais em virtude de acidente de trânsito. Alegam que, no dia 16.02.09, a primeira Autora dirigia o veículo de sua propriedade, marca VW, tipo Gol, pela Rua dos Araújos, quando, na esquina desta rua com a Rua Conde de Bonfim, com o sinal verde para a suplicante, seu veículo foi abalroado pelo auto de marca Fiat Palio de propriedade do Réu e conduzido pelo mesmo. Afirmam que foram socorridos no Hospital Souza Aguiar, pois sofreram lesões em decorrência do acidente. Aduzem, ainda, que o veículo de propriedade da 1ª Autora sofreu uma série de avarias, sendo que, o Réu se recusou a indenizá-los. Como o suplicado faltou com o dever de cuidado no seu atuar, deve ressarcir os prejuízos. Pedem a condenação do Réu ao pagamento de indenização a título de danos materiais causados no veículo, no valor de R$ 9.026,00, e ainda, a indenizar danos morais. O Réu apresentou contestação e denunciou da lide a Nobre Seguradora do Brasil. O pedido foi julgado procedente, constando o seguinte dispositivo: JULGO PROCEDENTES os pedidos, e condeno o réu a consertar as avarias do veículo de propriedade da autora, efetuando os serviços e as trocas das peças discriminadas às fls. 73, em uma oficina autorizada Volkswagen, em quinze dias, sob pena de multa diária de R$100,00, e ainda, condeno-o a indenizar os autores com a quantia de R$10.000,00, para cada um, corrigida monetariamente a partir da data da sentença, e acrescida de juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação. Condeno, ainda, o réu, em custas e honorários advocatícios que fixo em 10% sobre os valores das condenações. JULGO, ainda, PROCEDENTE em parte a litisdenunciação, condenando a litisdenunciada a ressarcir ao litisdenunciante os valores a serem dispendidos por ele com o conserto do veículo da autora, nos termos da condenação acima, nos estritos limites do contrato, e IMPROCEDENTE o pedido de condenação ao ressarcimento por indenização por danos morais, já que excluída da apólice. (fls. 217/221). Inconformado, o Réu (Marcos Luiz) interpôs recurso de apelação, com as razões de fls. 232/241, pleiteando a reforma da sentença. Sustenta que a responsabilidade da seguradora é solidária e que a sentença não assegura o resultado prático do processo, que é ressarcir os Autores de seus prejuízos; que não tem condições de adiantar o valor para o conserto do veículo. Defende que a seguradora deve responder pela totalidade dos danos pleiteados na inicial, porquanto o limite do seguro contratado equivale a R$25.000,00 (vinte cinco mil) para cada cobertura (danos materiais e danos corporais). Página 2 de 6
Acrescenta que os danos morais estão incluídos na categoria de danos corporais. Reputa excessivo o valor arbitrado a titulo de indenização por danos morais, sob o fundamento de que o acidente não causou qualquer incapacidade nos Apelados, mas tão somente lesões leves. Nas contrarrazões de fls. 245/249, a litisdenunciada reitera os argumentos da contestação no sentido de a cobertura de danos morais em relação a 3º não transportado não ter sido contratada, razão pela qual não pode ser exigido seu pagamento pela seguradora. Por fim, aduz que sua responsabilidade é de reembolso em favor do segurado de valores que o mesmo venha a despender em decorrência de condenação ao pagamento de indenização por danos causados a passageiros e a terceiros não transportados. sentença. Contrarrazões dos Autores às fls.252/254, prestigiando a O recurso deve ser conhecido, pois presentes os pressupostos legais. Trata-se de ação, na qual os Autores postulam o pagamento de indenização por danos materiais e morais sofridos em virtude do acidente de trânsito envolvendo veículo objeto do contrato de seguro celebrado com o 2º Réu. O pedido foi julgado procedente, tendo sido o réu condenado a consertar as avarias do veículo de propriedade da autora, e ao pagamento de a indenização a título de danos morais na quantia de R$10.000,00, para cada Autor. O denunciado foi condenado a ressarcir ao litisdenunciante os valores despendidos. Contra tal comando se insurgiu o Apelante para que seja reconhecida a responsabilidade solidária da seguradora pelo pagamento dos danos sofridos pelos 2º e 3º Apelados, inclusive danos morais. seguro. Código Civil de 2002 deu nova definição de contrato de O referido diploma, no seu art. 757, ao definir o contrato de seguro atribui-lhe a função de garantir legítimo interesse do segurado: Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados. Página 3 de 6
Nessa mesma linha, tem-se que o contrato de seguro de responsabilidade civil é considerado como uma garantia prestada pela seguradora de realizar o pagamento de perdas e danos devidos pelo segurado a terceiro (CC, art. 787). Art. 787. No seguro de responsabilidade civil, o segurador garante o pagamento de perdas e danos devidos pelo segurado a terceiro. 1 o Tão logo saiba o segurado das consequências de ato seu, suscetível de lhe acarretar a responsabilidade incluída na garantia, comunicará o fato ao segurador. 2 o É defeso ao segurado reconhecer sua responsabilidade ou confessar a ação, bem como transigir com o terceiro prejudicado, ou indenizá-lo diretamente, sem anuência expressa do segurador. 3 o Intentada a ação contra o segurado, dará este ciência da lide ao segurador. 4 o Subsistirá a responsabilidade do segurado perante o terceiro, se o segurador for insolvente. Desse modo, como as obrigações assumidas no contrato não se encerram entre as partes contratantes, posto que atingem terceiro beneficiário, nada obsta que a seguradora seja condenada solidariamente com o segurado ao pagamento da indenização. Diante deste quadro, a seguradora não pode se esquivar de reparar diretamente os danos provocados pelo segurado. A condenação solidária da seguradora contratada pelo proprietário do veículo causador do dano é perfeitamente aceita pela Jurisprudência, consoante orientação do Superior Tribunal de Justiça: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. SEGURADORA LITISDENUNCIADA EM AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MOVIDA EM FACE DO SEGURADO. CONDENAÇÃO DIRETA E SOLIDÁRIA. POSSIBILIDADE. 1. Para fins do art. 543-C do CPC: Em ação de reparação de danos movida em face do segurado, a Seguradora denunciada pode ser condenada direta e solidariamente junto com este a pagar a indenização devida à vítima, nos limites contratados na apólice. 2. Recurso especial não provido. (REsp 925.130/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 08/02/2012, DJe 20/04/2012) Inicialmente, deve ser analisada a preliminar de ilegitimidade passiva suscitada pelo Apelante (Sul America). Quanto as demais matérias versadas no recurso. Página 4 de 6
Conforme se verifica, pela apólice de seguro, não houve a contratação de indenização por dano moral a terceiro não transportado. O art. 757, caput do Novo Código Civil prevê que o segurador só responde por riscos predeterminados: Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados. Desse modo, não é possível aplicar-se uma interpretação extensiva ou mesmo analógica da cláusula, de modo a ampliar a cobertura de outros riscos, mormente quando o pagamento do prêmio é calculado com base nos riscos previamente contratados. Por outro lado, a cláusula de exclusão não se revela ilegal e, como foi lançada no contrato de forma clara, também não pode ser reputada abusiva, considerando que da mesma constou a expressa definição dos eventos cobertos, assim como, daqueles excluídos. Como consequência, no caso, a seguradora não tem a obrigação em indenizar os Apelados por riscos que não estão previstos no contrato firmado com o Apelante. Quanto a verba arbitrada a título de danos morais. A indenização por danos morais é assegurada pela Constituição Federal, quando atingidos direitos personalíssimos, como a vida e saúde humana. Tal indenização possui duplo caráter, punitivo do agente causador e compensatório em relação a vítima. Também é certo que, de um lado não pode ser fixada em valor vil, diante da evidente compensação pelo abalo psicológico sofrido, nem ser fixada em valor estratosférico, de modo a não constituir fonte de enriquecimento. Além de pautar-se pelo princípio da razoabilidade, tendo em conta o fato concreto e suas repercussões. No caso, as provas produzidas nos autos, notadamente os depoimentos colhidos em audiência comprovam que o Apelado deliberadamente avançou o sinal vermelho, vindo a abalroar o auto de propriedade da 2ª Apelada (Luciana). Por conta de tal conduta culposa, a 2ª Apelada (Luciana) sofreu traumatismo crânio encefálico leve e cefaleia intensa, conforme documento de fl. 62 e o 3ª Apelado (Humberto), sofreu ferida corto Página 5 de 6
contusa no joelho direito (fl. 66). Desta situação, advém verdadeiro transtorno e aborrecimento que fogem à esfera da normalidade. Diante desse quadro, o valor da indenização arbitrada a título de danos morais, na quantia de R$10.000,00 (dez mil reais) para cada vítima deve ser mantido. Diante do exposto, o voto é no sentido de conhecer o recurso e dar lhe parcial provimento para condenar a seguradora solidariamente ao conserto das avarias do veículo de propriedade da 2ª Apelada (Luciana), nos limites do contrato, mantendo a sentença nos demais termos. Rio de Janeiro, 11 de dezembro de 2012. Rogerio de Oliveira Souza Desembargador Relator Página 6 de 6