ACÓRDÃO. O julgamento teve a participação dos Desembargadores PAULO PASTORE FILHO (Presidente), JOÃO BATISTA VILHENA E SOUZA LOPES.

Transcrição

1 Registro: ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº , da Comarca de São Paulo, em que é apelante TURKISH AIRLINES INC, é apelada MAPFRE VERA CRUZ SEGURADORA S/A. ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 17ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento ao recurso, V.U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Desembargadores PAULO PASTORE FILHO (Presidente), JOÃO BATISTA VILHENA E SOUZA LOPES. São Paulo, 29 de junho de Paulo Pastore Filho relator Assinatura Eletrônica

2 VOTO Nº: APEL.Nº: COMARCA: SÃO PAULO APTE. : TURKISH AIRLINES INC APDO. : MAPFRE VERA CRUZ SEGURADORA S/A RESPONSABILIDADE CIVIL Transporte aéreo Extravio de carga Aplicação do previsto no art. 14 do Código de Defesa do Consumidor -Inaplicabilidade da Convenção de Montreal Indenização integral - Ação regressiva julgada procedente Recurso não provido. Acresça-se ao relatório da r. sentença proferida a fls. 190/196 que foi julgado procedente o pedido de regresso de quantia desembolsada por cumprimento de contrato de seguro, ante a verificação de sinistro. A apelante afirma que a r. decisão não pode subsistir, sustentando, em síntese, que tem aplicação, na hipótese, a Convenção de Montreal (Decreto nº 5.910, de 27 de setembro de 2006) em detrimento do Código de Defesa do Consumidor, uma vez que o objeto da presente demanda versa sobre relação comercial de transporte de carga. Entende, desta forma, que eventual condenação não pode ultrapassar a quantia de 19 Direitos Especiais de Saque por quilograma. Enfatiza que a apelada não logrou êxito em comprovar os danos suportados pela empresa segurada, tampouco que o suposto extravio tenha sido ocasionado pela Turkish Airlines. Entente que o contrato formulado entre a empresa segurada EMA S/A e a seguradora Mapfre, ora apelada, não é de consumo, mas tão-somente de relação comercial, e, portanto, aplica-se o Código Civil. Ressalta que a empresa Turkish Airlines não participou do contrato de seguro celebrado entre a apelada e a empresa segurada, razão pela qual não pode ser Apelação nº São Paulo 2

3 responsabilizada pelos supostos prejuízos sofridos por aquela empresa e cobertos pela apelada. O recurso foi recebido no duplo efeito e o preparo está anotado. A apelada ofereceu contrarrazões, sustentando o acerto do decisum (fls. 223/236). É o relatório. O recurso não merece provimento. Em primeiro lugar, deve ser dito que, no caso em tela, aplica-se o Código de Defesa do Consumidor, em vez da legislação específica, porquanto se trata de relação de consumo. Nesse sentido vem decidindo o E. Superior Tribunal de Justiça: RESPONSABILIDADE CIVIL. TRANSPORTE AÉREO. EXTRAVIO DE BAGAGEM. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. Tratando-se de relação de consumo, prevalecem as disposições do Código de Defesa do Consumidor em relação à Convenção de Varsóvia e ao Código Brasileiro de Aeronáutica. Precedentes da Segunda Seção do STJ. Recurso especial não conhecido (REsp. nº /RO, 4ª Turma, Rel. Min. BARROS MONTEIRO, j , DJ , p. 269). RESPONSABILIDADE CIVIL. TRANSPORTE AÉREO INTERNACIONAL. EXTRAVIO DE CARGA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. Para a apuração da responsabilidade civil do transportador aéreo internacional pelo extravio da carga, aplica-se o disposto no Código de Defesa do Consumidor, se o evento se deu em sua vigência, afastando-se a chamada indenização tarifada. Recurso conhecido e provido. (REsp /SP, Rel. Ministro CESAR ASFOR ROCHA, QUARTA TURMA, julgado em 08/05/2001, DJ 15/10/2001, p. 267) Apelação nº São Paulo 3

4 Estabelece o art. 14 do Código de Defesa do Consumidor que: O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. Mencionado dispositivo não permite outra interpretação que não a de se responsabilizar o prestador de serviço pelos danos causados pelo defeito da prestação, independentemente de culpa. No caso, é incontroverso que houve o extravio da mercadoria adquirida pela segurada. Conforme relatório de sinistro e documento expedido pelo depositário da zona primária de fiscalização INFRAERO, em Guarulhos/SP, a carga fora recepcionada com peso menor do que o embarcado, ou seja, menos quilos, o que demonstra claramente que o extravio de parte da carga segurada ocorreu durante o transporte aéreo realizado pela empresa apelante (fls. 95). Conforme bem dispôs a MMª. Juíza da causa, Quanto ao montante devido, de início, já constato que não tem razão a requerida em pretender limitar o valor indenizatório à quantia de 19 Direitos Especiais de Saque, prevista na Convenção de Montreal, e já afasto a condenação ao ressarcimento da quantia gasta com a regulação do sinistro. Não se aplicam à hipótese as limitações previstas na convenção de Montreal, pois o extravio de parte da mercadoria ocorreu em razão da má prestação do serviço de transporte aéreo, que acarretou inadimplemento contratual, devendo ser prestigiada a reparação integral do dano experimentado pela autora, limitada apenas ao valor da carga perdida, em atenção ao disposto no art. 732 c.c. art. 750, CC. O conhecimento de transporte aéreo emitido pela ré especifica, como de rigor, a origem, o destino, as dimensões e o peso da mercadoria Apelação nº São Paulo 4

5 transportada (fls.93). Portanto, a indenização pretendida nesta demanda não pode ser limitada aos parâmetros pré-estabelecidos na legislação especial e nas convenções internacionais conforme pretende a requerida, pois era do conhecimento dela a quantidade, a qualidade, o peso e o valor da carga transportada, tendo diante das informações prestadas pelo remetente assumido a responsabilidade pelo transporte e entrega no local de destino, de modo que a indenização deve ser medida pelo valor da mercadoria extraviada, corrigida monetariamente desde a data de pagamento do montante da indenização securitária e acrescida de juros de 1% ao mês desde a data da citação. Nos termos do artigo 786, caput, do Código Civil, paga a indenização, nos limites do valor respectivo, fica o segurador autorizado a exercer direito regressivo contra o causador do sinistro, assumindo a posição jurídica do segurado. Dessa forma, levando-se em conta que a responsabilidade da transportadora é objetiva e que a seguradora se sub-rogou em todos os privilégios conferidos ao consumidor, o acolhimento da pretensão deduzida pela autora era mesmo de rigor. Nestas circunstâncias, agiu com acerto a MMª. Juíza da causa ao julgar procedente a ação, de sorte que a r. sentença fica integralmente mantida. Ante o exposto, nega-se provimento ao recurso. PAULO PASTORE FILHO Relator Apelação nº São Paulo 5