Projeto Oficinas de Fotografias Comunidade em Foco Nelson CHINALIA PUC- Campinas ISSN-2175-6554 Referência: CHINALIA, Nelson., Projeto Oficinas de Fotografias Comunidade em Foco. In: Mídia Cidadã 2009 V Conferência Brasileira de Mídia Cidadã, 2009. Guarapuava. Anais. Guarapuava, 2009. p. 807-812. RESUMO Dar ao jovem da periferia de Campinas a oportunidade de imprimir, por meio da produção fotográfica, seu olhar sobre a realidade em que vive. Essa foi a proposta desenvolvida em agosto de 2008 pela ONG Comitê para Democratização da Informática (CDI), iniciativa que possibilitou integrar educação, arte e tecnologia em processo coletivo de construção e exercício de cidadania. Com câmeras simples, os jovens, além da oportunidade de entenderem as técnicas fotográficas, produziram cerca de oito mil imagens, das quais 100 foram selecionadas e divididas por temas que pudessem mostrar a realidade de cada educando, sua família, seu bairro e as questões sociais, ambientais e de moradia. Além da produção das imagens, todos os educandos tiveram acesso a informações de como se dá o processo da imagem digital, da captura da imagem ao computador, a criação de uma pasta para o arquivamento e o envio das imagens via Internet. Como resultado desse trabalho, foi editado o livro Comunidade em Foco e realizada uma exposição fotográfica no Shopping Parque D. Pedro em Campinas. O evento permitiu, entre outros resultados, possibilitar aos jovens expor suas produções, exibir seus talentos, além de uma maior integração entre eles, seus familiares e membros das comunidades onde vivem. Compartilhar os resultados desse trabalho foi momento não só de orgulho aos adolescentes, mas principalmente, de elevação da autoestima. Participaram dessa iniciativa professores de universidades, universitários e educadores sociais. Palavras-chave: Fotografia; Cidadania; Mídia; Inclusão; Informática. A capacidade de uma sociedade de desenvolver-se cultural, social e economicamente é
determinada pela qualidade e quantidade de informação e conhecimento nela disseminados. Assim, quanto maior a situação de exclusão social de uma sociedade, mais urgente se torna lidar com a exclusão informacional. Inclusão Digital é um conceito que une os esforços de fazer com que as populações excluídas possam obter os conhecimentos necessários para utilizar linguagens e capacidades dos recursos de Tecnologia de Informação e de Comunicação existentes e, dessa forma, possam se tornar produtores e detentores de informação. O processo de inclusão inevitavelmente traz um crescimento cultural, econômico e social das comunidades que passam por ele. Revitalizar a capacidade das comunidades carentes proporcionando a oportunidade de conhecer um mecanismo de comunicação e de compartilhamento de informação como a fotografia e possibilitar a construção de uma rede independente que se articule com o governo sem ser controlado por ele constituíram-se alguns dos objetivos do Projeto Comunidade em Foco. Durante o mês de agosto de 2008 tive a oportunidade de desenvolver um trabalho que vai na contramão das características das aulas que ministro na graduação no Curso de Jornalismo da Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Fui convidado pela ONG Comitê para Democratização da Informática (CDI) a trabalhar com menores carentes das periferias de Campinas e região. A proposta foi a de ensinar fotografia a um grupo de 96 alunos assistidos pela ONG que já possuíam noções de informática a entender e lidar com a imagem digital. Para isso, tivemos 12 câmeras obtidas a partir da verba garantida por projeto na lei Rouanet, que institui políticas públicas para a cultura nacional, como o PRONAC - Prograna Nacional de Apoio à Cultura. O grande destaque desta lei é a política de incentivos fiscais que possibilita à pessoas jurídicas e físicas aplicarem uma parte de seus impostos de renda devidos em ações culturais. Usar a tecnologia como ferramenta para a inclusão digital. Foi com esse objetivo que 96 jovens saíram pelas ruas das comunidades carentes de Campinas com uma câmera digital nas mãos e uma idéia na cabeça. Registraram, na forma de imagens digitais, como enxergam suas realidades sociais, a população dos bairros onde moram, seus personagens, suas dificuldades e a realidade das periferias onde os problemas sócio-
ambientais são intensos, uma característica comum em todas as periferias das grandes cidades. O projeto, que criou várias oficinas de fotografia digital oferecidas às comunidades assistidas pelo CDI, foi fruto de uma integração entre educação, arte e tecnologia para um processo coletivo de construção e exercício da cidadania. Teve como resultado um despertar tecnológico de cada participante e seus familiares, possibilitando a realização de uma reflexão crítica sobre a vida e o futuro destes jovens. Uma estimativa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) aponta que há no País em torno de 120 milhões de pessoas digitalmente excluídas. Essa população não tem acesso a computadores e outras tecnologias ou ferramentas, como a fotografia digital, tão comum nos dias de hoje, inclusive nos telefones digitais. Isso se traduz numa impossibilidade de produção da própria imagem, e conseqüentemente na dificuldade do estabelecimento de um processo identitário dentro das comunidades. A inclusão digital não se restringe ao acesso às tecnologias e ao seu uso. Ela se relaciona à motivação e a capacidade para a utilização das Tecnologias da Informação de forma crítica e empreendedora Afirma Cristina de Luca no livro, publicado pelo Instituto Ethos O Que as Empresas Podem Fazer Para a Inclusão Digital. Luciano Pereira Mendes, 16 anos é morador do DIC-5, bairro da periferia de Campinas na região do Aeroporto de Viracopos, e um dos jovens atendidos pelas oficinas de Fotografia. Luciano comenta que, apesar de um amigo possuir uma câmera e permitir que ele a utilize, ele não sabia ao certo como usá-la, nem conhecia as funções do equipamento para obter uma imagem diferenciada. Depois da Oficina, aprendeu a utilizar os comandos da câmera digital. Com o ensino médio concluído e atualmente desempregado, Luciano agora tem uma idéia da carreira que vai seguir: o da informática, além de não deixar de levar a câmera para onde for. A fotografia produzida por Luciano durante a Oficina retrata uma característica peculiar de seu bairro: um antigo supermercado que pegou fogo há cerca de cinco anos e foi proibido de voltar a funcionar pela imposição da justiça. Apesar dos riscos, algumas famílias moram atualmente no interior do prédio abandonado, em meio a escombros e
ruínas do local. Cada oficina teve a duração de cinco dias, e em cada local as equipes do CDI montavam, juntamente com educandos das EICs (Escola de Informática para a Cidadania) que funcionam nos Centros Comunitários dos bairros os computadores, um telão e o projetor multimídia, e doze câmeras. Nos encontros, tivemos a chance de conceituar a fotografia como representação da realidade, detalhar os equipamentos, enquadramento e as propriedades da luz, exemplificar com imagens feitas por profissionais e por amadores a cena fotografada. A cada momento percebíamos a expectativa que crescia em cada aluno para utilizar a câmera e mostrar o que aprendeu nas aulas expositivas. Os alunos saíram às ruas com as câmeras junto com os educadores no momento em que perceberam que o registro fotográfico se encontra além das técnicas necessárias para se obter uma imagem bonita. É entender que a fotografia pode ser um documento de época, registra o olhar de quem aperta o botão. E este olhar tem que ser direcionado de modo a entender e conhecer melhor a comunidade e, além de tudo, é uma possibilidade de expressão artística de cada autor, que passa a ser um agente produtor da própria imagem e história. Os 96 participantes com as câmeras compradas para o projeto puderam, durante dois dias, registrar tudo que pudesse render uma boa imagem. O resultado foi uma soma de oito mil imagens que formaram um mapa imagético da periferia de Campinas. Essas imagens passaram, então, por um processo de seleção que destacou cem fotografias sintetizando a idéia do projeto e a realização através do olhar dos jovens. Nos dias 24 a 19 de março de 2008, a Cidade de Campinas assistiu às comemorações promovidas pelo CDI dedicadas ao Dia Municipal da Inclusão Digital do Município, entre elas a Mostra de Fotografia Comunidade em Foco, nome que foi dado pelos participantes do projeto, resultado do trabalho promovido pelo CDI, realizado com a ajuda da lei Rouanet e de profissionais da área de fotografia. Este evento de abertura
aconteceu no Shopping Parque Dom Pedro e foi aberto a visitantes no dia 25 de março, com entrada gratuita. Tive a oportunidade de ser o curador do projeto, que teve como meta integrar a educação, a arte e a tecnologia em um processo coletivo de construção e exercício da cidadania. Além da Mostra, também foi produzido o livro Comunidade em Foco, que teve seu lançamento no dia 29 de março, também no Shopping Parque Dom Pedro em Campinas. Com a mostra e o livro, os jovens e demais realizadores puderam perceber os resultados de seus esforços e compartilhá-los, finalizando o exercício de aprendizado com uma confraternização e com a possibilidade de usar a fotografia como uma função articuladora que proporcionou a estes jovens um aprofundamento em seus próprios contextos e cotidianos, transformando-se em uma competência crítica e social que é extremamente necessária na sociedade em que nos encontramos. A construção do significado da imagem, tão necessário para a sua compreensão, também culminou em uma ferramenta de expressão que possibilita a inserção social, a formação de uma leitura crítica da realidade e deu aos educandos a chance de serem agentes ativos e produtores de história. REFERÊNCIAS TELES, Anamaria; SAMAGAIA, Jacqueline. O Uso da Fotografia como Instrumento de Inclusão Social uma Experiência com Adolescentes de uma Comunidade de Baixa Renda na Cidade de Blumenau/SC. Intercom Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação. VIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação da Região Sul Passo Fundo RS, 2007. Disponível em <http://www.intercom.org.br/papers/regionais/sul2007/resumos/r0412-1.pdf> Acesso em 3 Ago. 2009. MAGRO, Viviane Melo de Mendonça. Adolescentes Como Autores de Si Próprios: Cotidiano, Educação e o Hip Hop. Cad. CEDES vol.22 no.57 Campinas Ago. 2002. Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=s0101-
32622002000200005&lng=en&nrm=iso&tlng=pt> Acesso em 3 Ago. 2009. ASSUMPÇÃO, Rodrigo Ortiz D Avila. Além da Inclusão Digital: O Projeto sampa.org. Universidade de São Paulo. Escola De Comunicações e Artes. Tese de Mestrado. São Paulo, 2001. Disponível em <http://referencias.onid.org.br/media/arquivos/dissertacao_rodrigo.pdf> Acesso em 5 Ago. 2009.