A ABERTURA COMERCIAL, A INSERÇÃO DE MATO GROSSO NO CENÁRIO INTERNACIONAL E SEUS PRINCIPAIS EIXOS VIÁRIOS



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Transcrição:

A ABERTURA COMERCIAL, A INSERÇÃO DE MATO GROSSO NO CENÁRIO INTERNACIONAL E SEUS PRINCIPAIS EIXOS VIÁRIOS Benedito Dias Pereira 1 RESUMO: A economia do Estado de Mato Grosso, mais acentuadamente nos dez últimos anos, vem experimentando significativas mutações na sua estrutura produtiva, dado que a tradicional base econômica primária está se consolidando como moderna produção agroindustrial. Como causa da abertura comercial decorrente da globalização das economias surgem e/ou se fortalecem inexploradas ligações diretas com o exterior que enfraquecem a unilateralidade das vinculações com a região Sudeste, estruturada no mercado interno. Nesta análise, dedica-se especial atenção às vias de transportes na integração da economia do Estado com a economia nacional e internacional, além das mudanças nas especificidades da interação entre alguns dos seus principais núcleos urbanos. Palavras Chave: competitividade, globalização, região. I. Introdução A economia de Mato Grosso (MT) atualmente se insere na economia nacional com pauta de exportação mais diversificada que no passado mais recente. A soja e seus derivados representam os principais bens de exportação do Estado. Em cenário de elevado endividamento externo do País, a economia de MT se insere na nacional com uma função bem definida: gerar divisas externas, visto que a grande maioria da produção interna da soja e poucos outros bens primários são destinados à exportação. Com taxa de crescimento do produto interno maior que a do País como um todo, ultimamente tem ocorrido a imigração de grande número de empresas para MT. Nesse contexto, a abertura comercial vem 1 Professor do Departamento de Economia da UFMT e Doutor em Economia Agrícola. REVISTA DE ESTUDOS SOCIAIS Ano 3 n. 5 2001 89-98

REVISTA DE ESTUDOS SOCIAIS - ANO 3, NÚMERO 5/2001 acarretando importantes mutações na sua base produtiva e nas relações mercantis da economia de MT com a do resto do País e com a economia internacional. Nessa inserção, em particular, presenciam-se alterações estratégicas nas vias de transportes usadas para o escoamento da produção e nas características das relações comerciais entre alguns dos seus núcleos urbanos mais relevantes. Tendo a economia de MT como objeto de estudo, esse Artigo se divide em três partes. Na primeira, de forma resumida, identificam-se os fatores mais relevantes para a imigração de empresas para MT. Na segunda, aborda-se como a abertura comercial, que se dá em paralelo ao surgimento e/ou restauração de eixos viários, implica em mudança nas relações mercantis entre a economia de MT e as regiões mais dinâmicas do País, além de implicar em mutações na base econômica do Estado. Verificam-se também, conforme se notará adiante, importantes alterações nas relações mercantis entre os principais núcleos urbanos internos. Na terceira parte elaboram-se os comentários finais. II. Principais Fatores da Imigração de Empresas para Mato Grosso A existência de Programas e Fundos de Desenvolvimento Industrial inegavelmente se constitui em fator atrativo à imigração de empresas para o Estado. Entrementes, em decorrência da guerra fiscal atualmente praticada pelas unidades federativas do País, esses instrumentos estão exercendo efeitos bem menos significativos que outros, como os fatores locacionais, por exemplo, visto que as decisões empresariais sobre localização estão visando, essencialmente, o alcance da minimização dos custos operacionais (custos de transportes das matérias-primas e de escoamento da produção final). De maneira geral, segundo diversas teorias de localização, a fertilidade natural do solo e a proximidade dos centros consumidores e/ou da oferta de matéria-prima explicam a localização da atividade agrícola em torno do traçado dos eixos viários mais dinâmicos. Nos dias atuais, dada a oferta elástica de terras em MT, a localização no entorno dos eixos viários do Estado, em particular, é influenciada majoritariamente pela proximidade das fontes de matérias-primas e minoritariamente pela proximidade dos centros consumidores, dado que, em anos mais recentes, 90

A ABERTURA COMERCIAL, A INSERÇÃO DE MATO GROSSO NO CENÁRIO INTERNACIONAL E SEUS PRINCIPAIS EIXOS VIÁRIOS vem ocorrendo redução dos custos de transportes de acesso aos principais mercados nacionais e mundiais, dentre outros motivos, como decorrência do uso de novos sistemas intermodais de transporte. Ademais, como as inovações físico-químicas e biológicas devem ser consideradas como imperativo da competição na corrente fase do modo de produção capitalista e como elas contribuem diretamente para alterar o grau de fertilização nata dos solos, por conseguinte, elas também exercem influencia sobre a decisão locacional, fortalecendo, como conseqüência, a localização em torno dos principais eixos viários. Destarte, como essas inovações estão contribuindo para enfraquecer os efeitos da fertilidade natural dos solos sobre a localização e, além disso, como o mercado consumidor de MT é ainda extremamente frágil e, a emergência de modais de transportes, seja para os mercados do resto do País, seja para o mercado internacional, está atuando no sentido de serem reduzidos os custos de transportes de escoamento da produção, naturalmente deduz-se que, nesse cenário, os custos são minimizados se a unidade produtiva se instala no entorno dos principais eixos viários. III. A Economia de Mato Grosso e suas Principais Vias de Transportes: Reflexos Internos e a Abertura Comercial Em paralelo aos diversos efeitos econômicos dos eixos viários emergentes ou em restauração -com as devidas alterações na logística de transportes-, a abertura comercial da economia de MT está implicando em mudanças nas relações mercantis entre os seus mais importantes núcleos urbanos, na base econômica do Estado e na forma da economia se relacionar com os centros mais dinâmicos do País. Logo, alguns eixos viários atualmente desempenham importantes funções estratégicas na economia mato-grossense. Alguns deles se destacam. Os comentários seguintes, por sua relevância, focam os seguintes eixos viários do Estado: a) A BR 364 e sua recuperação; b) A BR 163 e sua recuperação; c) A Hidrovia Rio das Mortes-Araguaia-Tocantins; d) A Ferronorte; e) A Hidrovia do Madeira; f) A ampliação da Hidrovia Tietê-Paraná; e g) A Hidrovia Paraguai-Paraná. Por oportuno, no Anexo 1, consta Mapa de Mato Grosso com devidas ilustrações viárias. 91

REVISTA DE ESTUDOS SOCIAIS - ANO 3, NÚMERO 5/2001 FIGURA 1: Mapa de Mato Grosso com Ilustrações Viárias FONTE: CANAVARROS et alii (1997: 44); A abertura comercial da economia de MT, em paralelo à restauração e/ou criação de novas vias de transportes, implica no fim da unilateralidade das relações comerciais até então mantidas com as regiões mais dinâmicas do País. Conforme se depreenderá, como resultado dessa 92

A ABERTURA COMERCIAL, A INSERÇÃO DE MATO GROSSO NO CENÁRIO INTERNACIONAL E SEUS PRINCIPAIS EIXOS VIÁRIOS abertura, a realização (comercialização) da produção da economia do Estado deixa de se processar exclusivamente no mercado interno. A abertura comercial, dessa maneira, impõe novas formas e novos caminhos à realização da produção interna. A BR 364, o principal eixo viário da região Centro-Oeste, se constitui na principal via de integração entre o Sudeste, Centro-Oeste e Norte do País. Essa BR contribuiu decisivamente para a consolidação dos dois principais núcleos urbanos de MT: Cuiabá (Várzea Grande) e Rondonópolis. A partir do itinerário dessa via esses núcleos se conectaram com Rondônia e Acre e com o Triângulo Mineiro, respectivamente, a Noroeste e a Sudeste do Estado. No futuro imediato essa BR continuará se constituindo em importante eixo viário: ela fará parte de conjunto de modais que ensejará alterações na logística interna de transportes e nas características da influência da economia paulista sobre a economia de MT. Com o término das obras da Tietê-Paraná, essa Hidrovia se conectará com a BR 364 a partir de São Simão (GO), resultando em mais de mil quilômetros navegáveis entre São Paulo, Mato Grosso do Sul e Goiás (Guimarães & Lemes, 1997:59). A partir dessa vinculação intermodal a economia de MT se ligará com a economia do Sudeste e do Sul do País -Portos de Santos (SP) e de Paranaguá (PR), dentre outros-, sem a mediação do Triângulo Mineiro e, portanto, acarretando significativa alteração no grau de influência dessa região sobre a economia de MT, em particular, sobre o núcleo de Rondonópolis. A BR 163 -via longitudinal do Estado que liga o Sul de Mato Grosso ao Município de Santarém (PA)- desempenhou importante função no surgimento do núcleo madeireiro em Sinop (MT) e na interligação entre Rondonópolis e Campo Grande (MS). Com extensão de 1,6 mil Km, apenas a metade da BR 163 está asfaltada. No Programa Brasil em Ação do Governo Federal prevê-se a recuperação de mais de 700 Km das Rodovias: 163 e 364, no Acre, Rondônia, MT e Mato Grosso do Sul. Em particular, o cruzamento entre a BR 364 e a BR 163, que ocorre em Rondonópolis, se constitui em causa propulsora do crescimento da economia desse Município. 93

REVISTA DE ESTUDOS SOCIAIS - ANO 3, NÚMERO 5/2001 A melhoria das condições de tráfego da BR 163 implicará em redução dos custos de transportes para o acesso ao mercado mundial. O uso da Hidrovia Teles-Pires-Tapajós, por outro lado, acentuaria essa contração. Essa Hidrovia, porém, está com sua navegabilidade prejudicada em função de vários problemas operacionais existentes ao longo do seu leito. Por outro lado, a Hidrovia do Madeira poderá se constituir, em futuro imediato, na principal via de escoamento dos produtos de exportação de grande parte da economia de MT, sobretudo das plantas situadas no Norte e no Noroeste do Estado, pois ela se interliga com o sistema rodoviário do Estado. O sistema intermodal da qual a Hidrovia do Madeira faz parte, poderá ser complementado pela navegação da Hidrovia do Teles-Pires-Tapajós, desde que, logicamente, sejam resolvidos os problemas operacionais ainda existentes nessa Hidrovia. A Hidrovia do Madeira, vale a pena se registrar, engendra estratégica inversão no tradicional sentido do escoamento da produção da economia interna para os mercados internacionais, visto que, antes do uso dessa via, a maioria do fluxo da exportação se processava através de malha rodoviária (BR 163/364), percorrendo mais de 2.000 Km, com destino aos mercados do Sudeste e do Sul do País e/ou aos Portos de Santos e de Paranaguá. O uso desse sistema multimodal reduz em 50% os custos de transportes (Piaia,1999:6). Outrossim, no sentido inverso do fluxo de exportação estão sendo transportados fertilizantes, que, como resultado da diminuição das distâncias e dos custos de transportes, tiveram seus preços reduzidos em até US$ 40,00 por tonelada. Essa inversão de fluxo contribuirá para que no Noroeste de MT sejam consolidadas as condições para a formação de região com nexos mercantis cada vez mais frágeis com os demais pólos econômicos do Estado. Uma vez concretizado esse fato, as condições para futuro desmembramento sócio-político de MT estariam naturalmente presentes e como conseqüência poderá ser criada mais uma unidade federativa no País. A Ferronorte, por sua vez, foi concebida como sistema de transporte ferroviário de carga que interliga as cidades de Porto Velho (RO), Santarém (PA) e Cuiabá à Aparecida do Taboado (MS), 94

A ABERTURA COMERCIAL, A INSERÇÃO DE MATO GROSSO NO CENÁRIO INTERNACIONAL E SEUS PRINCIPAIS EIXOS VIÁRIOS conectando-as posteriormente à malha ferroviária paulista através da ponte rodo-ferroviária, recentemente inaugurada, construída sobre o Rio Paraná, na divisa entre São Paulo e Mato Grosso do Sul. Essa ferrovia, já parcialmente executada, estimulará a produção de algodão e de grãos nas plantas situadas ao longo do seu traçado. Por outro lado, como a Ferronorte intensificará os vínculos mercantis entre a economia de MT e a paulista, depreende-se que o maior mercado interno do País poderá ser acessado pelos produtores do Estado a menores custos de transporte. Essa evidência, obviamente, contribui para aumentar a competitividade dos produtos exportáveis de MT. A Ferronorte, todavia, não deve ser visualizada de maneira una e estática, mas sim como parte de conjunto de modais, dado que em futuro próximo ela fará parte de um sistema multimodal de transportes, de acordo com previsão de investimentos constantes no Programa Brasil em Ação do Governo Federal. Se as projeções desse Programa se concretizarem e se se imagina essa ferrovia conectada à Hidrovia Tietê- Paraná, estarão sendo ofertadas alternativas para o escoamento da produção interna, que naturalmente poderão ser exploradas pelos produtores de MT, seja para o mercado interno (Sudeste do País e outras regiões), seja para o mercado externo. A BR 070 consolidou Goiânia (GO) como área de influência sócioeconômica na região Centro-Leste de MT, em particular sobre o Município de Barra do Garças. A economia dessa região, observa-se, atualmente não experimenta o mesmo grau de dinamismo que outras do Estado. O nível de atividade econômica dessa região, entretanto, será positivamente modificado a partir do uso pleno da Hidrovia Rio das Mortes-Araguaia-Tocantins. Sinteticamente: A Hidrovia Rio das Mortes-Araguaia-Tocantins e a recuperação da BR 153, juntamente com a ferrovia Norte-Sul, devem compor um corredor intermodal com vistas a favorecer a produção de grãos em parte do Centro-Oeste e no estado do Maranhão, com saída para Atlântico (Guimarães & Lemes, 1997:59). De acordo com dados do GEIPOT (Empresa Brasileira de Planejamento de Transportes do Ministério dos Transportes), os custos de transportes correspondentes a esse sistema intermodal podem atingir até 95

REVISTA DE ESTUDOS SOCIAIS - ANO 3, NÚMERO 5/2001 US$ 34,00 por tonelada, bastante inferiores, assim, aos praticados no modal rodoviário, que se situa na faixa de US$ 48,00 a US$ 60,00 por tonelada, no transporte de soja até o Porto de Santos (SP). A Hidrovia Rio das Mortes-Araguaia-Tocantins, porém, atualmente encontra-se embargada por organizações não-governamentais, cujas ações estão pautadas na proteção das áreas indígenas e ao meio ambiente físico. Como alternativa ou como complemento a essa Hidrovia se poderia imaginar a intensificação do tráfego da BR 158. Com extensão de 803 Km, grande parte dessa BR (411 Km), todavia, ainda não está asfaltada. De outra maneira, poder-se-ia supor que o uso da BR 080, que conecta a BR 158 à BR 163, também atuaria no sentido de fortalecer a economia de Barra do Garças e Municípios circunvizinhos; porém, aliados aos problemas operacionais da BR 158, com extensão de 624 Km, a BR 080 ainda está totalmente sem asfalto. A Hidrovia do Paraguai-Paraná, que já era usada comercialmente em 1.847 quando o vapor Etruria (com capacidade de 20 mil toneladas) trazia açúcar, calcário e aguardente do Centro Sul e no retorno transportava gado, fumo e algodão, é navegável numa extensão de cerca de 3.442 Km. Após serem solucionados os problemas operacionais dessa Hidrovia, restritos ao trecho compreendido entre Cáceres e Corumbá - onde a mesma atravessa a região do Pantanal-, o pólo de Cáceres, de maneira lógica, se constituirá em saída estratégica dos bens produzidos no Sudoeste de MT em direção ao Mercosul e, com a participação do modal rodoviário, os efeitos positivos dessa Hidrovia alcançarão o pólo de Cuiabá, como decorrência natural dos efeitos multiplicadores existentes em fatos econômicos afins. Além dos eixos viários já abordados, ainda que resumidamente, é importante se tecer breves comentários sobre outra opção para escoamento da produção de MT: a ligação Sudoeste-Pacífico. Essa ligação começa entre Cáceres e San Matias na Bolívia, atinge a seguir Santa Cruz de La Siera e daí, os Portos de Arica no Chile e Iquique e Ilo no Peru, de onde serão alcançados os mercados asiáticos. Para os transportes de mais alto calado existem diversos problemas operacionais nessa ligação, decorrentes -à exceção dos Portos de Tocopilla e Valparaíso no Chile- do baixo calado dos Portos que operam na Costa do Pacífico. Essa alternativa, contudo, viabiliza o alcance de extenso 96

A ABERTURA COMERCIAL, A INSERÇÃO DE MATO GROSSO NO CENÁRIO INTERNACIONAL E SEUS PRINCIPAIS EIXOS VIÁRIOS mercado da economia mundial (asiático). Antes, todavia, de se pensar em se atingir esse amplo mercado, em paralelo à ligação para o Pacífico, é relevante se imaginar que a parte inicial do itinerário dessa ligação pode ser usada para se alcançar mercados consumidores da própria América do Sul (Pacto Andino). IV. Comentários Finais Com base nos traços gerais de um modelo de localização de unidades produtivas, aliadas às características correntes da economia mato-grossense, deduziu-se que o empresário decide racionalmente pela localização de sua planta em torno dos principais eixos viários e próxima às fontes de matérias-primas. Desse modo, a localização desempenha função estratégica para o escoamento da sua produção em direção aos principais mercados nacionais e externos ao País. Se aos fatores sobreditos, como natural imperativo da fase extremamente competitiva ora vivenciada pelo modo de produção capitalista se adicionam as vantagens competitivas dinâmicas geradas pelas contínuas inovações tecnológicas que estão em curso na economia mundial, deduz-se que os impactos diretos e indiretos de todos os eixos de transportes abordados sobre a corrente espacialidade de Mato Grosso, doravante, vão implicar em maior seletividade dos investimentos e portanto, em maior seletividade na localização das unidades produtivas nos diversos pólos econômicos. A despeito desses eixos viários já exercerem nítidos efeitos atrativos à localização dos novos investimentos e na reestruturação das unidades produtivas já instaladas, a concepção de eixos estruturantes que acompanha o Programa Brasil em Ação do Governo Federal -cujos fundamentos repousam na racionalidade da decisão empresarial sobre o investimento- reforça os efeitos clássicos de localização e das vantagens competitivas dinâmicas já obtidas por dada região. Assim, ao sabor das forças de mercado ocorrerá a ampliação das diferenças sócio-econômicas entre os diversos pólos atualmente existentes em MT. Apropriadas políticas públicas, obviamente, devem atuar na contramão dessa tendência, de modo a serem atenuados os efeitos tendentes à expansão dessas disparidades. 97

REVISTA DE ESTUDOS SOCIAIS - ANO 3, NÚMERO 5/2001 V. Referências Bibliográficas CANAVARROS, Otacílio et al. A Questão Energética em Mato Grosso -Elementos Essenciais ao Planejamento. Cuiabá: 1997. Mimeo. ESTEVAM, Luis Antônio. O Tempo da Transformação: estrutura e dinâmica na formação econômica de Goiás. 1996. 205 f. Tese de Doutoramento, UNICAMP, Campinas. GUIMARÃES, E. N; LEME, H. J. de Campos. Caracterização Histórica e Configuração Espacial da Estrutura Produtiva do Centro Oeste, Campinas: UNICAMP, Textos NEPO, p. 21-73, dez. 1997. MUELLER, Charles C. Políticas Governamentais e Expansão Recente da Agropecuária no Centro-Oeste. In Planejamento e Políticas Públicas, n. 3, p. 45-74, jun. 1990. PEREIRA, Benedito Dias. A Industrialização da Agricultura Matogrossense. Cuiabá: EdUFMT, 1995. PIAIA, Ivane Inêz. Geografia de Mato Grosso. Cuiabá: EdUNIC, 1.999. 98