Cogeração: Ampliação da Oferta de Energia Elétrica com a Biomassa (Bagaço da Cana-de-Açúcar)



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Transcrição:

Revista Diálogos Interdisciplinares 2013, vol. 2, n.2, ISSN 2317-3793 Cogeração: Ampliação da Oferta de Energia Elétrica com a Biomassa (Bagaço da Mariana Garbarino Zancaner 1 Fundação Armando Alvares Penteado, São Paulo, SP, Brasil Tharcisio Bierrenbach de Souza Santos 2 Fundação Armando Alvares Penteado, São Paulo, SP, Brasil O objetivo do presente trabalho é avaliar a capacidade da expansão do fornecimento de energia elétrica através do processo de cogeração com bagaço de cana-de-açúcar na matriz energética brasileira. O processo de cogeração, por definição, é eficiente e sustentável em termos ambientais, e apresenta como principal vantagem um grande potencial para complementar o parque hidroelétrico nacional, que dentro do cenário atual tem uma grande dependência na geração de energia pela queima de combustíveis fósseis que aumentam a emissão dos gases causadores do efeito estufa e das usinas hidrelétricas, que ficam a mercê dos níveis pluviométricos e da topografia correta. Por essas características, tais projetos alagariam imensas áreas, provocando grande impacto social e ambiental, ou utilizam pequenos reservatórios, o que diminui a capacidade geradora desses empreendimentos. O Brasil adotou historicamente o modelo de produção de eletricidade baseado na hidroeletricidade (71%) que utiliza, em sua maioria, grandes reservatórios para diminuir as influências da variação da energia natural afluente, porém, os reservatórios não estão crescendo no mesmo passo que a demanda por energia. A cogeração não é um método novo no Brasil, ele vem sendo usado há muito tempo, como forma de suprir as atividades das usinas produtoras de álcool e açúcar, já que seu principal insumo é o bagaço proveniente do processamento da cana. O setor sucroenergético projeta um grande crescimento da demanda de açúcar e etanol, significando também em aumento do bagaço disponível para produção de energia. Com essas tendências, o setor teria a capacidade de produzir cerca de 14% da eletricidade nacional no ano de 2020. Para que isso seja viável será necessário uma reestruturação industrial com a adoção de tecnologias mais eficientes e maiores incentivos governamentais e econômicos. Palavras-chave: Cogeração. Matriz energética. Bagaço. Diversificação; Venda de energia elétrica. The objective of this study is to evaluate the ability of the expansion of the supply of electricity by cogeneration bagasse cane sugar in the Brazilian energy base. The cogeneration process is by definition efficient and environmentally sustainable, and has the major advantage is great potential to supplement hydroelectric national park, that within the present scenario has a large dependence on power generation

48 Cogeração: Ampliação da Oferta de Energia Elétrica com a Biomassa (Bagaço da by burning fossil fuels that increase emission of greenhouse gas emissions and hydroelectric plants that are at the mercy of rainfall patterns and right topography. For these characteristics such projects would flood vast areas, causing major social and environmental impacts, or a use small reservoir that decreases the generating capacity of these enterprises. Brazil has historically adopted the model of producing electricity based on hydropower (71%) who uses mostly large reservoirs to reduce the influences of the affluent natural energy, however, the reservoirs are not growing at the same pace as demand for energy. Cogeneration is not a new method in Brazil, it has been used a long time as a way to address the activities of the plants producing sugar and alcohol, as its main raw material is bagasse from sugarcane processing. The sugarcane industry projects a large increase in demand for sugar and ethanol, meaning also increase the available bagasse for energy production. With these trends the industry has the capacity to produce about 14% of national electricity in 2020. For this to be viable it will require a restructuring industry with the adoption of more efficient technologies and greater government incentives and economic. Keywords: Cogeneration. Energetic base. Bagasse. Diversification. Sale of energy. Introdução Este trabalho tem como tema a cogeração de energia elétrica através do bagaço da cana-de-açúcar (biomassa), enfatizando sua vantagem sobre geração de energia elétrica, seus benefícios ambientais, sua crescente participação no setor elétrico e em que medida é um assunto de grande interesse, tanto para os produtores de álcool e açúcar, quanto para o setor energético brasileiro. A cana-de-açúcar é processada quando chega à usina e os principais produtos desta moagem são o açúcar e o álcool. O que resta é uma abundante quantidade de bagaço, que é levado até a caldeira para ser queimado virando vapor que irá gerar energia elétrica após passar pelas turbinas e geradores. Este processo é totalmente automatizado e inserido dentro da linha de produção das usinas, ou seja, a usina produz energia para suprir as necessidades próprias sendo que o excedente energético produzido por ela pode ser vendido para empresas responsáveis pela distribuição de energia. Esta fonte alternativa de energia elétrica 1 Administradora pela Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP). E-mail: marigzancaner@hotmail.com. 2 Doutor em História Econômica pela Universidade de São Paulo, professor da Faculdade de Administração da Fundação Armando Alvares Penteado e Diretor do FAAP-MBA, São Paulo, Brasil. E-mail: tsantos@faap.br.

Cogeração: Ampliação da Oferta de Energia Elétrica com a Biomassa (Bagaço da 49 traz vantagens para o meio ambiente, torna possível a diminuição de dependência do mercado de petróleo e agrega um sistema de energia de baixo custo. Ao mesmo tempo, melhora o retorno dos investimentos realizados na unidade produtora de açúcar e álcool, revestindo-se de grande importância para o sistema como um todo. Com a necessidade de aumentar a produção de geração de energia elétrica, devido à tendência do aumento do consumo e a crescente preocupação com os impactos causados ao meio ambiente pelas outras formas de geração de energia, é possível fazer com que a cogeração por bagaço de cana-de-açúcar tenha um maior peso no setor energético brasileiro quanto às outras fontes de energia elétrica, diminuindo dessa forma sua dependência com relação às variações internacionais do preço do petróleo. A cogeração de energia por bagaço de cana-de-açúcar é totalmente viável, com grande potencial energético a ser explorado e inserido na matriz energética do Brasil. Sua principal característica é o fato de ser uma fonte de energia renovável. Seu impacto ambiental é praticamente nulo, se comparado às hidrelétricas e aos derivados do petróleo; os investimentos iniciais são elevados, mas o prazo de retorno e os custos são reduzidos; proporcionando inovação tecnológica, com a utilização de equipamentos nacionais e contribuindo para diminuir a importação de energia e de petróleo. O que falta são maiores incentivos governamentais, garantindo segurança de investimentos ao setor sucroalcooleiro, metas para as empresas e uma inserção permanente na matriz energética do país. Pretende-se estudar a disponibilidade do bagaço, a produção de energia a partir do bagaço de cana de açúcar, as vantagens econômicas e ambientais e, finalmente, os benefícios para o setor energético brasileiro se ocorresse um aumento na participação da cogeração na matriz energética. Conhecer, por outro lado, a tecnologia, distribuição e comercialização da energia, o crescimento no consumo, os diversos aspectos de legislação do setor e as dificuldades da cogeração. Em 2001 o país passou por uma crise energética, que teve como resultado o chamado

50 Cogeração: Ampliação da Oferta de Energia Elétrica com a Biomassa (Bagaço da apagão. Este foi um indicador de que, naquela ocasião, como agora, o setor energético brasileiro apresenta elevados riscos de déficit de oferta nos curto e longo prazos, já que o consumo tem crescido de maneira acelerada (apenas em 2010 ocorreu um crescimento de 7,8%). Então é imperativo que novas fontes de geração de energia elétrica, como a cogeração por bagaço de cana-de-açúcar, ganhem foco e tenham seus processos industriais otimizados. O bagaço é o maior subproduto da cana-de-açúcar. Cerca de 200 milhões de toneladas de bagaço são gerados anualmente. Segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB [2011]), na safra 2010/2011 foram moídos 623,9 milhões de toneladas do produto e a tendência é de aumento para os próximos anos. O potencial de cogeração dessa fonte pode alcançar 14.000 Megawat (MW) médios em 2021 (UNICA, 2012). Cada vez mais as organizações internacionais do meio ambiente estão impondo metas para a diminuição de gases causadores do efeito estufa e procedimentos que agridem ou modificam o meio ambiente, como no caso das usinas hidrelétricas, que causam alagamentos e desviam o curso natural de rios. Na produção de energia através do uso do bagaço não existem resíduos que sejam nocivos ao ambiente e as cinzas geradas com a queima de bagaço de cana podem ser aproveitadas na produção de concreto pelo setor da construção civil. Este trabalho foi realizado através de pesquisas em artigos acadêmicos, livros referentes ao assunto e dados secundários. Para que haja o contínuo desenvolvimento e crescimento do setor industrial, o Brasil vai necessitar de novas fontes de energia, que sejam mais baratas e que possam suprir a crescente demanda. Ela é uma das mais caras do mundo e a soma de impostos e encargos setoriais totaliza 51% da conta de um consumidor médio brasileiro (BERTELLI, 2011). Trata-se de um grande desafio, que necessita de políticas públicas e investimentos consideráveis. Produções de Álcool e Açúcar

Cogeração: Ampliação da Oferta de Energia Elétrica com a Biomassa (Bagaço da 51 Para entender como funciona a produção de energia por cogeração, assim como quais são suas vantagens e benefícios frente às outras formas de produção de energia elétrica que fazem parte da matriz brasileira, é preciso saber a origem da sua matéria prima, o bagaço da cana-de-açúcar. A quantidade de bagaço disponível está diretamente ligada à quantidade de cana-de-açúcar plantada e moída destinada para a produção de álcool e/ou açúcar, já que, o bagaço é um subproduto da cana. Segundo dados da UNICA (2012) a cana ocupa cerca de sete milhões de hectares ou cerca de 2% de toda a terra arável do País, que é o maior produtor mundial, seguido por Índia, Tailândia e Austrália. As regiões de cultivo são Sudeste, Centro-Oeste, Sul e Nordeste. A produção de cana-de-açúcar se concentra nas regiões Centro-Sul e Nordeste do Brasil. Segundo dados da UNICA, na safra 2010/2011 o Brasil produziu 559.215 (mil toneladas) de cana-de-açúcar, na região Centro-Sul 493.159 (mil toneladas) e na região Norte-Nordeste 66.056 (mil toneladas) de cana-de-açúcar. A cana é cortada, por corte mecanizado ou manual (o corte manual está no final, mais de 90% do corte já é mecanizado no Brasil), e transportada até a unidade de produção. Podem ser usados caminhões de até 45 toneladas de capacidade de carga, que percorrem distancias de até 20 km da usina produtora. O primeiro passo é a passagem pela balança para medir a quantidade de toneladas de cana-de-açúcar que será processada; na sequência ocorre uma retirada de amostra para medir o teor de sacarose, a porcentagem de sólidos solúveis e o teor de fibra; para então a cana entrar na mesa alimentadora para a lavagem a seco ou com água; O quarto passo do processo é o preparo da cana nos picadores e desfibradores (visa a abertura das células da cana); em seguida ocorre a extração do caldo da cana, que pode ser por dois processos, moagem (97% de extração) e difusor (98% de extração). O sexto passo do processo é a filtração, limpeza e decantação do caldo, para a retirada de impurezas; enquanto que o sétimo passo é a separação do caldo para fabricação de álcool nas destilarias e para a fabricação de açúcar.

52 Cogeração: Ampliação da Oferta de Energia Elétrica com a Biomassa (Bagaço da Segundo Ometto (2005), além da importância econômica do seu uso, o álcool também interfere no fator social, pois sua vantagem se estende por todas as etapas do processo produtivo e do consumo: gera empregos, possibilita o uso de subprodutos, convive harmoniosamente com o solo e com os recursos hídricos, substitui a utilização de energia fóssil causadora do efeito estufa. O centro de tecnologia da Coopersucar afirma que a emissão de carbono evitada pelo uso de álcool corresponde a aproximadamente 18% do total da relacionada ao uso de gasolina e outros combustíveis fosseis. O funcionamento de uma unidade de produção sucroalcooleira requer três tipos de energia: térmica, utilizada no cozimento do açúcar e/ou na destilação do álcool etílico; mecânica, utilizada, na maior parte das unidades para mover as moendas que, por um processo de desfibramento e compressão, retiram o caldo da cana, a sacarose nele presente; e a energia elétrica para a iluminação, funcionamento dos motores e bombas d água que movimentam todo o sistema fabril (CONAB, 2011). A consecução dos três tipos de energia utilizados na unidade produtora sucroalcooleira é feita através da queima do bagaço em fornalhas que aquecem as caldeiras para a produção de vapor. A quantidade e a temperatura máxima do vapor obtido dependem da capacidade e resistência das caldeiras. A tradição brasileira definiu um padrão de caldeira com resistência de 21 bar (medida que representa a intensidade da pressão interna em centímetros quadrados). Essas caldeiras, em número compatível com a dimensão da unidade, produzem a quantidade de vapor necessária para fazer funcionar todo o complexo industrial e incinera todo o bagaço produzido nas moendas a cada safra, sem deixar excedentes para a safra subsequente que tenderiam a se transformar em problemas ambientais. Esse processo tradicional sempre garantiu a funcionalidade do sistema, a autossuficiência energética da unidade e a ausência de resíduos sem destino (CONAB, 2011, p. 22). O Bagaço da Cana-de-Açúcar Todos os organismos biológicos que podem ser utilizados como fonte de energia, tais como: lenha e carvão vegetal, alguns óleos vegetais, cana-de-açúcar, beterraba, biogás, podem ser chamados de Biomassa (CARIOCA, 2000 apud BASQUEROTTO, 2010, p. 27). Para este

Cogeração: Ampliação da Oferta de Energia Elétrica com a Biomassa (Bagaço da 53 trabalho o foco será no bagaço de cana-de-açúcar. O bagaço aparece depois que a cana foi moída e o caldo extraído para a produção do álcool e do açúcar e é tradicionalmente utilizado como combustível nas usinas e destilarias do setor. O bagaço é transportado das moendas ou difusores em esteiras até as caldeiras, para ser queimado. Os seus componentes são: 32-50% celulose, 19-25% hemicelulose, 23-32% lignina, 2% de cinzas, 46% fibra, 50% umidade (CTC, 2012). O mais importante, dentro da composição do bagaço, para a cogeração é a umidade, que não deve estar acima de 52%, já que a geração de energia começa com a queima do bagaço (produção de vapor). Segundo a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), uma tonelada de cana de açúcar produz em média 250 kg de bagaço e 200 kg de palha, um kg de bagaço produz 2,2 kg de vapor a 65kgf/cm 2 (caldeira que trabalha com pressão de 65 kg) superaquecido a 510ºC, então, uma tonelada de cana produz 550 kg de vapor. A grande diferença no aproveitamento do poder energético do bagaço pode ser percebida na observação de um indicador simples: a quantidade de energia elétrica gerada (medida em kilowatts) por tonelada de bagaço queimado. Esse indicador está ligado ao tipo de equipamento usado nas usinas, como a pressão em que a caldeira trabalha (quanto maior a pressão utilizada, maior o aproveitamento). Com as novas caldeiras, a quantidade média de energia produzida por tonelada de bagaço queimado está em 188,2 kilowatts, enquanto que nas unidades que continuam gerando com seus equipamentos tradicionais de baixa capacidade, este mesmo número está em 85,8 kilowatts (CONAB, 2011). A quantidade de bagaço disponível para a produção de energia está ligada ao tamanho da safra nacional de cana-de-açúcar. A safra brasileira confirma uma tendência de crescimento nos últimos 40 anos. Caso as estimativas para a safra 2013/2014 se confirmem, as 589,60 milhões de toneladas de cana-de-açúcar que devem ser colhidas representarão um volume 0,66% maior que as 585,74 milhões de toneladas de 2012/2013 (UDOP, 2012). A UNICA (2012) afirma que esse crescimento é resultado decorrente de quatro fatores

54 Cogeração: Ampliação da Oferta de Energia Elétrica com a Biomassa (Bagaço da distintos: o aumento de 6,5% na área de cana disponível para colheita, um aumento na produtividade agrícola, a redução da idade da lavoura e as melhoria das condições climáticas. A Cogeração por Bagaço de Cana-de-Açúcar A geração de energia elétrica através da queima do bagaço não é uma novidade no setor sucroalcooleiro. De fato, a cogeração com bagaço é o principal responsável pelo suprimento de energia nas usinas de álcool e açúcar, como forma de não depender da possível variação na entrega de energia por outras fontes. Essa tradição não é uma exclusividade brasileira e faz parte do processo industrial em todos os países que desenvolvem a produção de açúcar e álcool. A novidade é a venda da energia elétrica excedente para o sistema elétrico nacional, ou seja, é poder usar a energia elétrica produzida por bagaço não apenas para suprir as necessidades da usina, mas para fazer parte da matriz energética nacional. Existem varias definições para o termo cogeração. Segundo Moran e Shapiro (2002) apud Dantas (2010) é o método que sequencialmente produz potência (energia elétrica e/ou mecânica) e transferência de calor (energia térmica ou vapor de processo). Para Lozano (1998) é a produção conjunta, em processo sequencial, de energia elétrica ou mecânica e de energia térmica, partindo de uma mesma fonte de energia primária. Segundo o Instituto Nacional de Eficiência Elétrica (INEE) (2012) através da cogeração é possível tornar útil até 85% da energia do combustível, enquanto que, em um gerador termelétrico, no máximo 40% do combustível usado para funcionar o gerador pode ser transformado em energia elétrica. Um gerador termelétrico se baseia na queima do combustível para a produção de vapor, esse vapor sob alta pressão aciona as turbinas que gera energia elétrica. Por maior que seja a eficiência do gerador termelétrico, a maior parte da energia contida no combustível é transformada em calor e perdida no meio ambiente. A venda do excedente de energia das usinas de álcool e açúcar somente passou a ser

Cogeração: Ampliação da Oferta de Energia Elétrica com a Biomassa (Bagaço da 55 seriamente discutida como fonte alternativa a partir de 2001, quando o país passou por sérias dificuldades de oferta de energia e foi necessária a implementação de um severo programa de racionamento no consumo da energia elétrica. As novas políticas públicas editadas a partir dessa época passaram a valorizar as fontes que requerem prazos curtos para instalação e funcionamento dos projetos e fontes alternativas de baixa emissão de carbono. Para Sanches (2003) o processo de cogeração no setor sucroalcooleiro consiste em aproveitar o vapor produzido pela queima de bagaço em caldeiras, para movimentar os equipamentos da própria usina e, simultaneamente, acionar conjuntos geradores de energia elétrica. Muitas vantagens podem ser identificadas para os distintos atores envolvidos na política energética (COELHO, 1999 apud OLIVEIRA, 2007, p. 43): para o setor elétrico, por colaborar na garantia de geração elétrica, em particular nos períodos de seca; para o setor sucroalcooleiro, por permitir a diversidade da produção; para a sociedade, pelas vantagens sociais e ambientais, incluindo a geração de empregos na área rural, aumento da arrecadação de impostos e pela dinamização do setor. Hoje no Brasil existem mais de 450 usinas sucroalcooleiras operando. Em termos energéticos, a safra de 2009 foi equivalente a mais da metade de todo o óleo e gás consumidos no país. Uma usina que processa dois milhões de toneladas de cana por ano gera 24G Wh/ano para atender suas necessidades próprias e poderá vender ao sistema até 300 GWh/ano com tecnologia dominada no país. Embora os parâmetros econômicos, a quantidade cana moída e a estrutura dos equipamentos variem muito de usina para usina, a energia elétrica por elas produzida é competitiva com a gerada em centrais a gás. As usinas têm, como um fator importante, a localização próxima às cargas, propiciando redução de custos de transmissão (SOUZA, 2003). A safra de cana de açúcar se dá no período seco do ano, justamente a época que os reservatórios das usinas hidrelétricas, principal matriz energética do país, encontram-se no seu nível mais baixo.

56 Cogeração: Ampliação da Oferta de Energia Elétrica com a Biomassa (Bagaço da Potencial da Geração De acordo com dados da ANEEL (2012), em novembro de 2008 existiam 302 termelétricas movidas à biomassa no país, que correspondia a um total de 5,7 MW (megawatts) instalados. Dessas, 252 são usinas de cogeração movidas por bagaço de cana. O numero de usinas que vendem o seu excedente de energia ainda é baixo no Brasil, mas ainda assim essas unidades conseguiram ficar na segunda posição, com uma participação de 6,5%, apenas perdendo para a hidráulica. A participação das usinas termoelétricas movidas exclusivamente a bagaço de cana chega a aproximadamente a 4%. Tornando-se por base estudo da UNICA de 2012, o potencial energético da biomassa de cana de açúcar é enorme. As usinas sucroalcooleiras poderiam ampliar os atuais 2.000 MW de capacidade instalada de geração de energia para valores entre 4.000 e 7.000 MW até 2011 e atingir 9.600 MW em 2015, ou 70% da capacidade de Itaipu. Energia limpa e renovável, com baixo investimento em equipamentos e linhas de transmissão e com tecnologia nacional. A grande questão é saber quanta energia elétrica está guardada nos canaviais brasileiros. Uma pesquisa feita pela CONAB, em 2011, mostra os dados oficiais da potência instalada de todos os empreendimentos em funcionamento no Brasil no ano de 2009. Barreiras ao Incremento do uso da Cogeração No presente trabalho foram identificado quatro possíveis barreiras que podem tornar a cogeração menos atrativa e viável para os usineiros: a tecnologia, o uso do bagaço para produzir álcool de segunda geração, a questão do preços de compra da energia gerada e as taxas impostas para se conectar com as redes de transmissão. Mesmo com o potencial de gerar, em 2012, o volume de energia equivalente ao gerado na hidrelétrica de Itaipu, o uso do bagaço para gerar energia pode se tornar ainda mais subvalorizado se esses quatro aspectos apresentados não forem melhorados.

Cogeração: Ampliação da Oferta de Energia Elétrica com a Biomassa (Bagaço da Álcool de Segunda Geração 57 O etanol celulósico, também conhecido como etanol de segunda geração (EG2), é uma nova tecnologia que vem sendo desenvolvida para a produção de álcool a partir do bagaço. Está previsto para 2014 o início da primeira planta industrial utilizando essa nova tecnologia, quando será possível se ter uma real ideia da sua viabilidade, como concorrente da cogeração de energia a partir do bagaço. Segundo Bastos (2013), essa nova tecnologia tem o potencial de aumentar a produção do álcool em 50% sem expandir a área de plantação da cana-de-açúcar. Para a expansão da cogeração por biomassa, a tecnologia capaz de gerar álcool a partir do bagaço se apresenta como uma barreira, pois desvia a matéria prima utilizada para outro fim. A grande questão é: para qual destino o bagaço será utilizado e como fazer essa escolha? As principais questões a serem analisadas para o direcionamento da utilidade do bagaço são custo, demanda e necessidade. Em relação à necessidade e à demanda, o Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE) se sustenta nas seguintes realidades do mercado: (1) aumento da demanda do álcool hidratado, consequência do aumento da demanda por carro flex; (2) oscilação do preço do barril de petróleo; (3) expansão da exportação do etano brasileiro, que é misturado a gasolina para diminuir a emissão de gases que causam o aumento do efeito estufa (MILENA, 2011). Tecnologia Na menor pressão, de 22 bar, a operação se restringe ao período de safra e gera até 10 kwh por tonelada de cana moída pela usina. Na segunda linha tem-se a já considerada alta pressão com 80 bar mas, usando o ciclo CTC, com até 60 kwh/t cana excedente de energia. Já com a mesma pressão de vapor, associada ao ciclo CEST, chega-se a até 250 kwh/t cana, com um consumo de vapor consideravelmente mais baixo por tonelada moída. A última

58 Cogeração: Ampliação da Oferta de Energia Elétrica com a Biomassa (Bagaço da linha mostra a eficiência hipotética da gaseificação BIG/GT. Não se conta com nenhuma unidade deste tipo de sistema instalado em usinas no Brasil devido ao seu alto custo de implantação, estimado em mais de US$ 1.500 por kw instalado. O sistema atualmente em instalação nas usinas, com turbinas de condensação, custa menos de US$ 700 por kw instalado, e mesmo assim poucas usinas já trabalham com a venda de energia elétrica. Portanto, o preço de venda da energia precisará ser atrativo para justificar grandes investimentos e riscos. Outro investimento que deve ser feito pelos usineiros para poderem vender energia são as linhas de transmissão. A construção e manutenção de linhas fogem do ramo de atividade sucroalcooleiro, e essas usinas não têm nem experiência nem escala para construir tais ramais a custos competitivos. O ideal é que a concessionária de eletricidade construísse e operasse tais linhas, através de financiamento governamental. Fixação do Preço Médio de Energia Vendida O preço é um dos maiores atrativos para os usineiros entrarem na atividade de produção e venda de energia elétrica. Como investimentos iniciais para compra da caldeira adequada, o gerador e a construção das linhas de transmissão são altos é preciso, então, que o ganho com a energia vendida quite o capital investido e aumente o caixa da empresa. O preço médio da energia vendida nos leilões realizados em 2008 foi de R$ 154 por megawatt médio e em 2010 recuou para R$ 144 e R$ 102 em 2011. Nesse contexto, no último ano o segmento vendeu apenas 4% do ofertado no mercado regulado, ante participação média de 16% nos leilões realizados entre 2008 e 2010 (SANTOS, 2013, p. 37). Os preços atrativos nos leilões exclusivos para biomassa de 2008 começaram a declinar principalmente porque o governo alterou as regras a partir de 2009 e passou a permitir a concorrência de outras fontes de energia, como a eólica. As usinas eólicas iniciaram sua participação na matriz energética nacional após a implantação do novo modelo do setor, em

Cogeração: Ampliação da Oferta de Energia Elétrica com a Biomassa (Bagaço da 59 2004 e foram impulsionadas pelo PROINFA, programa de governo para incentivo de fontes alternativas. Um dos motivos dos preços não estarem atrativos para os usineiros e ocorrer a entrada de um forte concorrente, energia eólica, nos leiloes é o não cumprimento da entrega de energia contratada em leilões anteriores. Estudo divulgado pela EPE (2012) analisou que a quantidade de energia contratada foi maior que a quantidade de energia gerada verificada nas usinas, desmoralizando a credibilidade de entrega das usinas. Conexão a Rede Segundo Szklo (2001) apud Bastos (2011, p. 22), o custo de conexão do cogerador à rede de distribuição é criado como uma das maiores barreiras a viabilização da venda de energia excedente no Brasil. A tarifa cobrada é proporcional à potência demandada ou injetada no ponto de conexão, em MW, para a remuneração do custo de transporte de energia gerada ou consumida pela central. E, também, conforme o ponto de conexão da central de cogeração ao sistema. A partir de 2002, a legislação determinou que os encargos setoriais de responsabilidade do segmento consumo passassem a ser incorporados nas tarifas de uso do sistema, juntamente com as perdas elétricas (ANEEL, 2005 apud BASTOS, 2011, p. 60). Produção Excedente de Energia para Venda Pelo fato da venda de energia não ser uma especialidade dos produtores de açúcar e álcool, o que os atrai a investir nessa produção é a questão lucrativa e a viabilidade financeira. A viabilidade econômica da venda de energia depende de fatores, tais como a pressão da caldeira, o consumo de vapor do processo de produção do açúcar e álcool, os investimentos em subestação e linha de transmissão, a implementação de equipamentos para separação e aproveitamento da palha e a opção por geração na safra e entressafra, o que exige emprego de mais de uma caldeira. A combinação dos fatores enunciados pode resultar em uma

60 Cogeração: Ampliação da Oferta de Energia Elétrica com a Biomassa (Bagaço da variação muito significativa na quantidade de energia gerada, no faturamento da termoelétrica nos custos de implantação da usina de açúcar e álcool e da termoelétrica anexa a ela. Uma das barreiras do uso do bagaço de cana para geração de energia elétrica é a falta de consenso com relação ao preço de venda dos excedentes, em virtude das várias reduções na referência tarifária estabelecida pela Eletrobras (COELHO, 1999 apud FERREIRA, 2012, p. 53). Isso se deve ao fato de os planejadores do setor elétrico avaliarem o setor de cana como sendo sazonal, não observando o novo papel das termoelétricas em um sistema de base hidroelétrica (CLEMENTE, 2003 apud FERREIRA, 2012, p. 53). O processo começa com as turbinas, que são máquinas que transformam a energia contida no fluído que por elas atravessa em energia mecânica, através do movimento. Segundo Molina (2001) apud Salles (2009, p. 50), Pode-se definir a turbina a vapor (TV) como sendo uma máquina térmica de fluxo motora, que utiliza a energia do vapor sob forma de energia cinética, ou seja, o papel da turbina a vapor consiste em transformar em energia mecânica a energia contida no vapor sob as formas de energia térmica e de pressão, através de movimento. Toda turbina se compõe de duas partes principais: a roda fixa ou estator e a roda móvel ou rotor. Na roda fixa estão os distribuidores destinados a transformar a energia do vapor, total ou parcialmente, em energia cinética; na roda móvel está os receptores fixos, destinados a transformar a energia cinética em trabalho mecânico sobre o eixo motor e em certos casos transformar parte da energia do vapor em energia cinética. No caso de vapor de média e alta pressão, acima de 42 bar, são necessárias turbinas de alta eficiência. Como o fluído passa com grande velocidade e pressão por suas pás, é necessária a desmineralização da água de alimentação da caldeira, que dará origem ao vapor motor da turbina. Do contrário, as minúsculas partículas minerais existentes na água vaporizada se chocariam violentamente com as pás da turbina, danificando o equipamento. Os geradores, por sua vez, são ligados à turbina e transformam a energia mecânica por ela gerada em energia elétrica. Turbinas e geradores estão localizados no setor da usina

Cogeração: Ampliação da Oferta de Energia Elétrica com a Biomassa (Bagaço da 61 conhecido com Central Termo Elétrica (CTE), abrigando também os quadros elétricos, sistemas de refrigeração dos circuitos, subestação, e o centro de controle da CTE, com softwares que controlam o processo de geração, entrega de energia na rede e monitoramento do vapor advindo da caldeira. Conforme Ramos et al. (2003) apud Salles (2009, p. 51), A situação atual da maioria das usinas de açúcar e álcool do Brasil, especialmente no Estado de São Paulo, é de autossuficiência do consumo de energia dentro da indústria e de equilíbrio no consumo de vapor de processo. Ou seja, todos os acionamentos mecânicos dos equipamentos, iluminação e bombeamentos nos processos de produção são supridos pelas turbinas da própria usina e toda a demanda do processo no aquecimento do caldo, evaporação, cozimento e destilação é suprida pelo vapor de escape das turbinas. Ao lado da CTE, deve ser construída uma subestação elevadora, onde a tensão elétrica é elevada por transformadores, a fim de atingir um nível de tensão a possibilitar a eletricidade percorrer grandes distâncias pelas linhas de transmissão com menores perdas. As próprias usinas sucroalcoleiras devem arcar com a subestação elevadora e a linha de transmissão até uma subestação da concessionária de energia elétrica ou até uma intersecção com a rede da concessionária. A complexidade da ligação com o sistema varia de acordo com a distância percorrida. Uma das tensões mais utilizadas, a linha de transmissão de 138 kv pode custar de R$ 150 mil a R$ 300 mil por km percorrido. Portanto a CTE tem com input o vapor de média ou alta pressão e como output a eletricidade gerada. Seus resíduos são o condensado e vapor de escape de baixa pressão, necessário ao processo do açúcar e álcool. Incentivos Governamentais De interesse dos usineiros tanto quanto do governo, o desenvolvimento dessa fonte tem incentivos de implantação através do Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica. Criado no âmbito do Ministério de Minas e Energia pela Lei nº 10.438, de 26 de abril de 2002, e revisado pela Lei nº 10.762, de 11 de novembro de 2003. Tem como principais objetivos: alavancar os ganhos de escala, promover a aprendizagem tecnológica,

62 Cogeração: Ampliação da Oferta de Energia Elétrica com a Biomassa (Bagaço da promover competitividade industrial nos mercados interno e externo, identificação e a apropriação dos benefícios técnicos, e garantir a competitividade econômico-energética de projetos de geração que utilizem fontes limpas e sustentáveis. A meta desse programa prevê a instalação de 3.300 MW de capacidade, que serão incorporados ao SIN. Desse montante, 1.100 MW serão de fontes eólicas, 1.100 MW de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) e 1.100 MW de projetos de biomassa. A energia produzida pelas unidades geradoras selecionadas será adquirida pela Centrais Elétricas Brasileiras S.A.. Os contratos dos geradores com a Eletrobrás terão duração de 20 anos, contados a partir da entrada em operação. Seus benefícios são (PROINFA, 2004): Social: Geração de 150 mil postos de trabalho diretos e indiretos durante a construção e a operação, sem considerar os de efeito-renda; Tecnológico: Investimentos de R$ 4 bilhões na indústria nacional de equipamentos e materiais; Estratégico: Complementaridade energética sazonal entre os regimes hidrológico/eólico (NE) e hidrológico/biomassa (SE e S). A cada 100 MW médios produzidos por parques eólicos, economizam-se 40 m³/s de água na cascata do rio São Francisco; Meio Ambiente: A emissão evitada de 2,5 milhões de tco2/ano criará um ambiente potencial de negócios de Certificação de Redução de Emissão de Carbono, nos termos do Protocolo de Kyoto; e Econômico: Investimento privado da ordem de R$ 8,6 bilhões. O apoio financeiro é feito pelo BNDES com participação de até 70% dos itens financiáveis. Considerações finais O presente trabalho enfocou a possibilidade da ampliação da oferta de energia elétrica por

Cogeração: Ampliação da Oferta de Energia Elétrica com a Biomassa (Bagaço da 63 cogeração com bagaço de cana-de-açúcar na matriz energética nacional. A cogeração já era usada pelas usinas produtoras de álcool e açúcar como uma forma de ser autossuficientes no seu processo produtivo. Porém, com o surgimento de novas tecnologias e caldeiras de maior pressão viu se uma nova oportunidade de otimizar esse subproduto, vender a energia excedente gerada. A geração de energia no Brasil ainda depende das hidrelétricas e dos derivados do petróleo, que dependem de altos investimentos e da média pluviométrica, e emitem gases causadores do efeito estufa altamente agressivos ao meio ambiente, respectivamente. Com a necessidade suprir a possibilidade de uma crise energética, causada pelo baixo nível dos reservatórios das usinas hidrelétricas no período de seca, e a necessidade de diminuir a emissão de CO2, imposta por protocolos mundiais, uma boa alternativa é investir em fontes renováveis e limpas como a cogeração com o bagaço. A principal vantagem neste método de gerar energia elétrica é a abundância disponível desse subproduto da cana-de-açúcar, causada pelo mercado aquecido da produção de álcool e açúcar. Com visto, uma tonelada de cana gera em média 250 kg de bagaço, e na safra 2010/2011 foram mais de 140 mil toneladas de bagaço. A principal dependência da potência da geração gerada é a tecnologia implantada nas usinas referente ao desempenho das caldeiras. As novas caldeiras de mais de 90 bar, ainda são raras nas usinas brasileiras devido seu alto valor financeiro, mais de 170 milhões de reais. No trabalho, essa questão foi analisada como uma possível barreia devido aos altos investimentos que os usineiros devem fazer. Mas, o governo brasileiro tem mostrado interesse na expansão do uso de fontes renováveis e tem ajudado financeiramente novos empreendimentos por meio do PROINFA e do BNDES. Outros dois problemas identificados são: o problema dos usineiros terem que arcar com a construção e com o custo de manutenção de uma parte das linhas de transmissão da energia, um processo caro e fora do conhecimento de operação das usinas; e a baixa seguida

64 Cogeração: Ampliação da Oferta de Energia Elétrica com a Biomassa (Bagaço da dos preços de compra da energia vendida pelas usinas de cogeração. Portanto, este trabalho contribuiu para entender que existe uma grande potência de geração de energia elétrica no subproduto da cana e que é uma fonte de energia renovável e limpa. Mas, o governo precisa subsidiar esta geração de uma maneira que torne esse processo mais atrativo para os usineiros, ajudando na questão implantação das caldeiras mais potentes, mudando a legislação do setor energético quanto às tarifas cobradas pelo uso das redes. Referências Bibliográficas AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA. Atlas de energia elétrica do Brasil. Brasília: ANEEL, 2002. Disponível em: <http://www.aneel.gov.br/arquivos/pdf/atlas_par2_cap3.pdf>. Acesso em: 25 out. 2012. BASQUEROTTO, Cláudio Henrique Cerqueira Costa. Cogeração de energia elétrica com bagaço de cana-de-açúcar compressado (Briquete). Faculdade de Tecnologia de Araçatuba - Curso de Tecnologia em Biocombustíveis, 2010. CENTRO DE TECNOLOGIA CANAVIERA (CTC). 2012. Disponível em:<www.ctcanavieira.com.br/>. Acesso em: 13 set. 2012. COMPANHIA NACIONAL DE ABASTECIMENTO (CONAB). A Geração termoelétrica com a queima do bagaço de cana-de-açúcar no Brasil. Análise do desempenho da safra 2009-2010. Mar. 2011. Disponível em: <http://www.conab.gov. br/olalacms/uploads/arquivos/11_05_05_15_45_40_geracao_termo_baixa_res..pdf>. Acesso em 22 set. 2012. DANTAS, Djolse Nascimento. Uso da biomassa da cana-de-açúcar para geração de energia elétrica: análise energética, exergética e ambiental de sistemas de cogeração em sucroalcooleiras do interior paulista. 2010. Dissertação (Mestrado em Ciências da Engenharia Ambiental)- Universidade de São Paulo Escola de Engenharia de São Carlos, São Paulo, 2010. EMPRESA DE PESQUISA ENERGÉTICA. Balanço energético nacional 2012: Ano base 2011. Rio de Janeiro: EPE, 2012. Disponível em: <https://ben.epe.gov.br /downloads/relatorio_final_ben_2012.pdf>. Acesso em: 22 jan. 2013. FERREIRA, Luiz Claudio Costa. Caracterização do potencial energético entre a produção de etanol celulósico e a cogeração a partir do Bagaço de cana. 2012. Monografia (Graduação em Engenharia Mecânica) - Universidade de Brasília, Brasília, 2012. LOZANO, M., Cogeneración, area de máquinas y motores térmicos. Departamento de Ingeniería Mecánica, Universidad de Zaragoza, 1998. 175p. MAGALHÃES, João Paulo de Almeida; KUPERMAN, Nelson; MACHADO, Roberto Crivano. Proálcool: uma avaliação global. Rio de Janeiro: Xenon Editora e Produtora Cultural, 1991. OLIVEIRA, Janaina Garcia de. Perspectiva para cogeração com bagaço de cana-de-açúcar: potencial do

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