(1995), esse tipo de investigação permite produzir instantâneos da situação de saúde de uma população ou comunidade, baseados na avaliação individual



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DIFERENCIAIS DE GÊNERO NA CONCEPÇÃO DA VELHICE ENTRE CRIANÇAS DO PETI DA ALDEIA SOS NO MUNICÍPIO DE JOÃO PESSOA/PB: A EDUCAÇÃO INFANTIL NO PROCESSO DE (DES)CONSTRUÇÃO DA VELHICE JOSÉ MAURÍCIO FIGUEIREDO JÚNIOR Universidade Federal da Paraíba REBECA VINAGRE MARTINS Universidade Federal da Paraíba LAURA DE SOUSA GOMES VELOSO Universidade Federal da Paraíba PROBLEMATIZAÇÃO O aumento do número de idosos é um fenômeno mundial, constituindo o segmento que mais cresce na população. Nos países ricos, a idade mínima para considerar uma pessoa como idosa é de 60 anos, enquanto que nos países pobres a faixa etária cai para 65 anos. O Brasil, mesmo classificado como país em desenvolvimento, considera, em seu Estatuto do Idoso, como pessoa idosa aquela que tem idade igual ou superior a 60 anos. (BRASIL, 2004). Essa transformação demográfica e epidemiológica da população idosa adquiriu peculiaridades no Brasil, devido a essa transição ter acontecido tão abruptamente. O baixo índice de fecundidade, a queda da mortalidade por doenças infecto-contagiosas, a urbanização, os avanços tecnológicos em saúde e a inserção da mulher no mercado de trabalho durante a segunda metade do século XX são alguns fatores responsáveis por esta transição, gerando repercussões políticas e sociais voltadas às necessidades individuais e coletivas do idoso brasileiro do século XXI. Neste sentido, este grupo populacional passou a ser mais observado, mais estudado, sobretudo em relação às questões de saúde, porém, quando se volta aos aspectos de conceituação do significado de ser idoso, percebe-se ainda estereótipos que impedem a construção de uma identidade positiva do ser velho. Portanto, chegar a uma idade avançada já não é mais privilégio de poucas pessoas. Em contrapartida, muitas sociedades ocidentais não são conseqüentes com essas transformações, havendo diferenciais de gênero nessa concepção, a saber: as mesmas atribuem valores relacionados com a competitividade para seus grupos, valorizam a capacidade para o trabalho, para a independência e para autonomia funcional, sendo essa visão caracterizada como uma representação tipicamente masculina. Outra forma de representar essa fase da vida, mais doméstica e feminina, centra o problema da velhice como a perda dos laços familiares e da rede de proteção social. Só que, na realidade, muitas dessas crenças e valores, permeadas em ambos os gêneros, nem sempre podem ser acompanhadas pelos idosos, se levar em consideração algumas mudanças e perdas biopsicossociais que frequentemente se associam ao processo heterogêneo da velhice. (VELOZ; NASCIMENTO-SCHULZE; CAMARGO, 1999). Estudo da Fundação Perseu Abramo (2007) corroboram essa visão diferenciada do que é ser idoso no Brasil, a partir de diferenciais de faixa etária. De modo geral a imagem da velhice é mais negativa que positiva tanto entre idosos (88%) como entre não idosos (90%). Os aspectos negativos da velhice mais citados foram as doenças ou debilidade físicas (opinião espontânea de 62% dos não idosos e de 58% dos idosos); o desânimo ou a perda da vontade de viver (citado por 35% dos idosos e por 28% dos não idosos); e ainda a dependência física (pouco mais de 25% em ambos os seguimentos). Assim, tentar definir velhice usando apenas a visão biológica é cair em um erro de demarcação meramente cronológica, tratando-se a população idosa de forma homogênea, não levando em consideração as especificidades do envelhecer num processo que abrange

dimensões biológicas, políticas, psicológicas, econômicas, culturais, e sociais. (JARDIM, 2006). Neste sentido, o problema de pesquisa que determinou a realização desse estudo foi discutir como diferenciais de gênero entre crianças compreendem o processo de envelhecimento em geral através de três fenômenos que mais o tipificam: o idoso como ator social principal, a velhice como última fase da vida e o próprio envelhecimento enquanto processo que transcende a própria barreira cronológica para abranger todo o curso da vida. O objetivo principal desse trabalho foi analisar os conteúdos e as diferenças de gênero presentes na percepção de crianças que freqüentam o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) da Aldeia Infantil SOS, em João Pessoa/PB, em relação ao significado de ser velho, como também analisar os atributos ao idoso sob a percepção dessas crianças. Existem diferentes representações de gênero sobre o envelhecimento e a velhice? Se sim, quais são suas diferenças de conteúdo? Conforme visto em outras pesquisas realizadas no Brasil, como a da Fundação Perseu Abramo (2007) e a de Debert (1996), se as representações sociais do envelhecimento e da velhice em crianças forem sustentadas principalmente com base na noção de declínio, isto terá conseqüências negativas não só para a conduta delas, diante desse processo, mas principalmente para aquelas pessoas que já são idosas. Esse problema reflete nada mais do que a falta de debates sobre o tema entre profissionais da Gerontologia e da Educação, gerando uma indefinição do que se entende efetivamente por uma educação infantil capaz de legitimar a produção de discursos sobre a construção de novos velhos nas instituições responsáveis pela educação formal desses cidadãos. Esse mesmo discurso deveria vir acompanhado de um enfoque de gênero, organizado a partir do pressuposto da velhice como fenômeno biopsicossocial, visto que a percepção da velhice possui valores e crenças diferenciados entre o masculino e o feminino. Conhecendo o quadro anterior e suas concepções gerontológicas - e tendo em vista os objetivos da educação infantil de desenvolvimento integral da criança em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade (BRASIL, 1996) compreendemos que, entre outras ações, a educação infantil sob a ótica de gênero tornar-se-á produtiva, fornecendo mais liberdade para as crianças, incentivando-as a viver a realidade e outras formas de pensar e agir criticamente com relação ao processo de (des)construção da velhice. Seguindo esse raciocínio, Scortegana (2001) afirma que se faz necessário que a criança desenvolva, por meio da educação, sua objetividade, tornando-se crítica e consciente do mundo que a cerca, buscando, entre várias outras coisas, a reflexão sobre o envelhecimento e a velhice. Portanto, as instituições para educação infantil podem oportunizar essa reflexão e o encontro intergeracional, objetivando o resgate de valores, a quebra de falsos conceitos, mitos e de idéias errôneas que existem em torno do envelhecer. Dessa forma a educação infantil, aliada à educação gerontológica, poderá transmitir uma reflexão da vida e de seu curso natural, sendo uma das formas de contribuir para uma qualidade de vida em todas as etapas da vida, principalmente durante a velhice. Enfim, denota-se a importância de compreender a percepção do que significa ser velho para pessoas de variadas gerações, inclusive as crianças, como também as diferenças de gênero existentes entre elas na concepção da velhice, contribuindo dessa forma, desde a infância, na busca de representar o ser idoso de maneira integral. DESENVOLVIMENTO O estudo se caracteriza como sendo do tipo exploratório e descritivo, com corte transversal e abordagem quantitativa dos dados. De acordo com Almeida Filho e Rouquayrol

(1995), esse tipo de investigação permite produzir instantâneos da situação de saúde de uma população ou comunidade, baseados na avaliação individual e possibilitando indicadores globais de saúde para o grupo estudado. Inicialmente, fez-se contato com a direção da organização não governamental (ONG) Aldeia Infantil SOS, situada em João Pessoa/PB, para autorização da pesquisa. Essa ONG, em convênio com o governo federal, vem desenvolvendo o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), com o objetivo de retirar crianças e adolescentes pessoenses, da faixa etária de 7 a 15 anos, do trabalho perigoso, penoso, insalubre e degradante, promovendo novas possibilidades de futuro, através da educação, para esses jovens carentes. A partir desse convênio, pode-se conduzir um melhor desenvolvimento no que se refere à formação de professores, propostas pedagógicas, condições de organização e recurso destinados aos serviços, práticas educativas e relação com as famílias. Após autorização da direção da Aldeia Infantil SOS, a pesquisa foi encaminhada à Comissão de Bioética do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) para averiguação das normas éticas. A coleta de dados teve início após a emissão do certificado de autorização do referido comitê e do consentimento livre e esclarecido assinado pelos pais e/ou responsáveis pelos participantes do estudo, já que a amostra era composta por menores de 18 anos de idade. Toda a pesquisa foi embasada segundo a Resolução 196/96, do Conselho Nacional de Saúde, que dispõe sobre pesquisa realizada com seres humanos. A coleta de dados foi realizada através da aplicação de um instrumento multidimensional já validado no Brasil, a escala diferencial semântica construída por Neri (1991, 1995, 1997), que possui 30 pares de adjetivos bipolares (com conotação positiva e negativa) correspondendo a atributos que visam caracterizar os idosos em termos cognitivos, ou relativos à capacidade de processamento da informação e de solução de problemas, com reflexos sobre a adaptação social (10 itens); de agência, isto é, autonomia e instrumentalidade para a realização (06 itens); de relacionamento interpessoal, cobrindo aspectos afetivomotivacionais, refletidos na interação social dos idosos (07 itens); e alusivos à imagem social (persona), por se acreditar que refletem os rótulos sociais comumente usados para designar e discriminar pessoas idosas. Para isso, os dados foram colhidos na própria Aldeia Infantil SOS pelos pesquisadores deste estudo através da entrega do questionário semi-estruturado a cada criança e jovem participante do PETI, observando-se os aspetos éticos e legais no que se refere ao anonimato dos entrevistados, para autorização do sujeito na pesquisa. Cada indivíduo escolhe a polaridade para cada par de adjetivos apresentados e atribui, por meio de uma escala numérica, grau de maior ou menor intensidade à escolha. A análise dos dados foi feita com base na interpretação das respostas obtidas por meio do questionário e comparação das mesmas com a literatura existente. Os dados foram tratados através de estatística descritiva (média e desvio-padrão), utilizando-se a planilha eletrônica Statiscal Package for the Social Sciences (SPSS), versão 11.5 para Windows. Foram entrevistadas 50 crianças e jovens com idade média de 10 anos, sendo 27 do gênero masculino e 23 do gênero feminino, representando um percentual de 54% e 46%, respectivamente. Destacam-se alguns dos atributos que, pela porcentagem de respostas com elevado grau de polaridade (positiva ou negativa), permitiram caracterizar a percepção que as crianças e jovens entrevistados na Aldeia SOS tiveram do significado de ser idoso. Essa porcentagem com os principais atributos pode ser apresentada na tabela 1, destacando-se apenas os atributos que obtiveram maior relevância científica.

POLARIDADE POLARIDADE CATEGORIAS POSITIVA NEGATIVA GÊNERO M(%) F(%) M(%) F(%) Sábio/tolo 46 42 2 4 Saudável/doentio 28 30 16 14 Bem-humorado/malhumorado 40 26 6 10 Aceito/rejeitado 28 26 22 14 Sociável/introvertido 36 20 14 22 Generoso/mesquinho 48 28 4 10 Independente/dependente 6 12 42 30 Produtivo/improdutivo 40 26 8 8 Rápido/lento 16 22 24 22 Flexível/rígido 12 24 28 10 Condescendente/crítico 18 18 20 16 Integrado/isolado 24 28 26 16 Valorizado/desvalorizado 38 26 10 14 M=masculino / F=feminino Tabela 1. Distribuição percentual das respostas de maior relevância, segundo gênero, em relação à polaridade atribuída na escala diferencial semântica aos atributos imputados aos idosos. Para Mazutti (2006), a concepção da criança acerca do viver e do envelhecer está diretamente relacionada ao que ocorre a sua volta, conforme o contexto que está inserido. É de acordo com as reações no grupo familiar que a criança inicia a construção da imagem da velhice, podendo ser positiva ou negativa de acordo com a integração intergeracional estabelecida. O convívio de crianças com seus avós têm sido cada vez mais freqüente em decorrência do aumento da expectativa de vida dos idosos, muitas delas chegando a conhecer seus quatro avós (maternos e paternos). Verificou-se durante a pesquisa que as crianças tinham como referencial para as respostas algum idoso, geralmente os mais presentes em seu dia-a-dia sendo na maioria dos casos seus próprios avós. Esses são idosos, provavelmente, com baixa renda, já que seus netos estão matriculados em um programa dirigido a crianças carentes expostas a situações de risco e ao trabalho infantil. Esses idosos, no qual as crianças da Aldeia SOS se espelham, podem ser aqueles com maiores incapacidades e problemas de saúde decorrentes das condições socioeconômicas desfavoráveis, como baixa renda familiar, por exemplo, e também por ter um acesso difícil aos serviços assistenciais e de saúde. No entanto, a maioria das crianças entrevistadas, de ambos os gêneros, classificaram o idoso de forma positiva, destacando os principais atributos que obtiveram maior polaridade positiva, como: sábio (88%), generoso (76%), bem-humorado (66%), produtivo (66%), valorizado (64%). Essas informações corroboram, assim, com outros dados encontrados na pesquisa realizada por Cachioni (2002) com professores e alunos do ensino fundamental, no qual a maioria apresentou atitudes positivas em relação à velhice; e como também na pesquisa de Néri (2001) com estudantes de graduação da área de educação e saúde, que indicou uma tendência global positiva acerca do significado de ser velho. Tal fato pode ser explicado com experiências afetivas favoráveis ou com a expectativa dos participantes do estudo quanto a quais seriam as respostas mais adequadas, pois uma vez respondida negativamente poderiam desencadear atitude preconceituosa em relação à velhice. Segundo Mazutti (2006), as trocas intergeracionais podem beneficiar o idoso ao

permitir que este utilize sua experiência de vida acumulada, transmitindo o passado e sua lição de vida. Assim, as crianças podem construir uma concepção positiva da velhice, fortalecendo seu relacionamento com os idosos e transmitindo-lhes sua vitalidade e alegria em troca de resgatar e aprender a sua própria cultura e seus valores, além de desenvolver o respeito, o afeto, solidariedade e um cuidado mútuo. Os itens em que as crianças pontuaram como polaridade negativa, em relação ao significado de ser velho, foram respectivamente entre gêneros masculino e feminino: dependente (42% e 30%), lento (24% e 22%), isolado (26% e 16%), rígido (28% e 10%) e crítico (20% e 16%); todos com maior percepção negativa entre os pesquisadores do gênero masculino, corroborando os achados de Cachioni (2002) com docentes de Universidades da Terceira Idade; de Polizzi e Steitz (1998) com educadores; e os de Neri (2001) com estudantes de graduação em educação e em saúde, onde geralmente a percepção mais negativa é identificada entre indivíduos do gênero masculino, evidenciando que esta concepção já ocorre desde a infância. Uma possível explicação para o fato é que pode existir uma associação entre a possibilidade dos indivíduos do gênero masculino serem incentivados a encarar a velhice sob seu aspecto mais real, enfatizando prioritariamente o fator físico, como pôde ser demonstrado nas polaridades negativas de maior destaque: dependente e lento. Outra explicação apóia-se na noção de atividade laboral e de sustento familiar, tipicamente masculina, caracterizando o envelhecimento como perda do ritmo de trabalho (VELOZ; NASCIMENTO-SCHULZE; CAMARGO, 1999). CONCLUSÕES De modo geral a imagem da velhice continua sendo mais negativa que positiva mas está longe de ser apenas negativa, sobretudo na perspectiva da população infantil da Aldeia SOS situada em João Pessoa/PB, que já percebe tanto aspectos negativos quanto positivos na condição de ser idoso. Entretanto, há consciência de que há um forte preconceito no que se refere ao domínio de agência, isto é, autonomia e instrumentalidade para a realização de atividades de vida diária ao mesmo tempo em que os idosos são percebidos por eles de forma positiva no domínio alusivo à imagem social (persona). O processo de envelhecimento - caracterizado por provocar naturalmente no indivíduo alterações morfológicas, funcionais e psicossociais - há muito foi conceituado como um período em que ocorrem perdas de diversas naturezas, atribuindo-as previamente à dependência física, depressão e outras doenças. Contudo, o aumento da expectativa de vida associado ao fortalecimento do vínculo existente nas relações intergeracionais tem criado a possibilidade de reconstruir o conceito de ser velho, derrubando alguns mitos e preconceitos sobre esta etapa da vida, tanto no contexto escolar como fora dele. Pode-se também observar neste estudo que as condições socioeconômicas não são fatores preponderantes para a atribuição negativa ao ser idoso, pelo contrário, constatou-se que estes jovens atualmente, mesmo em situação de risco social, classificaram o idoso de forma positiva, destacando-se os seguintes adjetivos: sábio, bem-humorado, generoso, produtivo e valorizado. Por outro lado, conotações negativas também foram evidenciadas, principalmente para o gênero masculino, considerando o idoso dependente, lento, isolado, rígido e crítico. Afinal, diante dessa realidade educacional brasileira, faz-se necessário a implementação de práticas educacionais para (des)construir o antigo paradigma do envelhecer. A produção de discursos legitimados sobre a construção de novos velhos nas

instituições de educação infantil deve vir sempre acompanhada sob um enfoque de gênero, organizada a partir do pressuposto da velhice como fenômeno biopsicossocial. REFERÊNCIAS ALMEIDA FILHO, N; ROUQUAYROL, M. Elementos de metodologia Epidemiológica. In:. Epidemiologia e Saúde. Rio de Janeiro: Medsi, 2003, p. 149-77. BALTES, P.B. Theoretical propositions of life-span developmental psychology: on the dynamics betwen growth and decline. Developmental Psychology, v.5, p. 611-626, 1987. BRASIL. Lei Nº. 10.741 de 01 de outubro de 2003, que aprova o Estatuto do Idoso e da outras providências. Brasília: 2004.. Ministério da Educação e do Desporto. LDB: aspectos relevantes para a educação infantil. (Lei 9.394 de 20 de dezembro de 1996.) Diário Oficial, 23 dez. 1996. Distrito Federal.. Portaria n o 20 de 13 de setembro de 2001 que regulamenta as o programa de erradicação de trabalho infantil. Acesso em: 28-06-07. Disponível em: http://www.mds.gov.br/ascom/peti/peti.htm CACHIONI, M. Formação profissional, motivos e crenças relativas à velhice e ao desenvolvimento pessoal entre professores de universidades da terceira idade. Campinas: UNICAMP, 2002, tese de doutorado. COSTA, M. F. L.; BARRETO, S. M. Tipos de estudos epidemiológicos: conceitos básicos e aplicações na área do envelhecimento. Epidemiol. e Serv. De Saúde: Belo Horizonte, 2003, 12(4):189-201. DEBERT, G.G. As representações sociais (estereótipos) do papel do idoso na sociedade atual. Em Ministério da Previdência e Assistência Social (Org.), Anais do I Seminário Internacional. Envelhecimento populacional: uma agenda para final de século. Brasília: 1996. FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO. Idosos no Brasil - vivências, desafios e expectativas na 3ª idade. Disponível em: <http://www2.fpa.org.br/portal/modules/news/index.php?storytopic= 1642>. Acesso em: 30 Jul 2007. GUIMARÃES, N.A. A escola cidadã e os desafios da sociedade pós-moderna. Mundo Jovem um jornal de idéias, Porto Alegre, mar, 2002 JARDIM, V. C. F. S.; MEDEIROS, B. F.; BRITO, A. M. Um olhar sobre o processo do envelhecimento: a percepção de idosos sobre a velhice. Rev. Bras. Geriat. E Gerontol.: Rio de Janeiro, 2006, 9(2) LEBRÃO, M. L. Saúde, bem-estar e envelhecimento: o estudo do SABE no município de São Paulo. Rev. Bras. Epidemiol. 2005; 8(2):127-41

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