FAUNA "SILVESTRE" URBANIZADA - INTERAÇÕES NO MEIO AMBIENTE ARTIFICIAL



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Transcrição:

FAUNA "SILVESTRE" URBANIZADA - INTERAÇÕES NO MEIO AMBIENTE ARTIFICIAL Dr Vladimir Stolzenberg Torres Segundo o artigo 3º, da Lei nº 6.938/1981 meio ambiente é o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas. Nesta linha, tem sido dividido (classificado, identificado,, rotulado) em natural, artificial, cultural e do trabalho. Conforme Brito (s/d), quando se estabelece uma classificação, busca-se agrupar distintos elementos, de distintas espécies, através da identificação, nos mesmos, de uma característica marcante e comum. Por esse fato, tem-se como certo que classificar não significa, como podem entender os mais descuidados, unir em um grupo elementos iguais, mas, de modo diverso, unir em um grupo ou classe elementos substancialmente distintos que, sobre um determinado aspecto, ostentam uma característica marcante e comum, entre eles. Se a característica que permite a classificação de um determinado meio ambiente como natural é o fato de ter ele origem pelos procedimentos normais da natureza (sem a interferência substancial do homem), o meio ambiente artificial, em contrapartida, é reconhecido por ser fruto da citada interferência. Desse modo, o meio ambiente artificial têm sido identificado, primordialmente, com ambientes urbanizados, decorrentes de uma forte e marcante intervenção antrópica sobre o que, outrora foi um ambiente natural clímax talvez. Ou, conforme Fiorillo (2008): [...] o meio ambiente artificial é compreendido pelo espaço urbano construído, consistente no conjunto de edificações (chamado de espaço urbano fechado), e pelos equipamentos públicos (espaço urbano aberto). Dessa forma, todo o espaço construído, bem como todos os espaços habitáveis pela pessoa humana compõem o meio ambiente artificial. Nesse entendimento porém, é fundamental enfatizar que não é qualquer ação humana que irá determinar uma artificialização do meio ambiente natural. Se se pensasse de outra forma ter-se-ia que defender, por exemplo, que uma planta em um vaso (no qual foi inserida pela ação do homem) seria um meio ambiente artificial, o que não é coerente. Poder-se-ia até dizer que o vaso, no qual a planta se encontra, é um ente artificial, todavia o mesmo não se poderia dizer da planta, em si mesma, que não teve, substancialmente, a sua naturalidade afetada. A planta, mesmo estando em um vaso, ao invés de na mata, comporta-se, cresce e desenvolve-se do modo como as suas peculiaridades o permitam. O seu comportamento e o seu desenvolvimento limitam-se às características naturais de sua substância e, claro, às condições físicas (como o tipo de substrato e a irrigação) que lhe sejam proporcionadas. A artificialidade, nessas circunstâncias, limita-se, por sua vez, à transferência do vegetal (que não estando na mata, encontra-se no vaso). É certo que o homem trabalha em cima da matéria originariamente natural, para criar o seu mundo. Entretanto, a partir do momento em que a mesma sofre a ação substancial do ser humano, torna-se mais relevante classificá-la 1

pela sua artificialidade (enquanto produto do manuseio) do que pela sua naturalidade originária (já, de certa forma, descaracterizada). Diz-se isso pela certeza de que após ser manuseado, em sua substância, pela ação humana, o meio ambiente, certamente, comportar-se-á de modo diverso. Suas características, suas propriedades, suas peculiaridades e particularidades apresentar-se-ão de modo distinto daquele que ele apresentaria se não tivesse sido passível do toque do homem. O meio ambiente urbano, apesar de pouco estudado em comparação com ecossistemas naturais preservados, fornece uma oportunidade particularmente significativa para o estudo da fauna, especialmente a comunidades de aves. Sob influência do ser humano, este ambiente se caracteriza por possuir fragmentos de diferentes tipos de vegetação alterada, com tamanhos e formas distintas, composta geralmente por espécies vegetais oportunistas ou exóticas (os parques, praças e jardins de uma cidade) Matarazo-Neuberger (1995). Muitos destes locais servem de refúgio para certas espécies de aves, possibilitando inclusive a colonização por novas espécies Emlen (1974). Mas, e a fauna... O ambiente urbano é a resultante das interações dos fatores ambientais, biológicos e sócio-econômicos, onde o meio edificado pelo homem predomina sobre o meio físico, causando profundas alterações sobre este e na qualidade de vida dos seres (LOMBARDO, 1990). O adensamento urbano leva à formação de inúmeros microecossistemas, os quais refletem diretamente na fauna urbana, o que a torna resultante de fatores tanto ecológicos como históricos e, portanto, não originada, somente, pela depauperação da composição faunística, original pelo processo de urbanização, mas, também, pela constante introdução de espécies (JAPYASSÚ e BRESCOVIT, s/d). Torres (2003), registrou a presença a presença de Amphisbaena prunicolor Cope, 1885 e A. darwinii trachura Cope, 1885 em algumas áreas de Porto Alegre. De acordo com este estudo, A. prunicolor apresentou preferência por troncos em decomposição, local onde foi mais facilmente encontrada, chegando algumas vezes a serem observados 3 indivíduos em um tronco com 2 metros de comprimento e 0,35 metros de diâmetro. A. darwinii trachura apresentou preferência por solo, especialmente junto à pedras e áreas com rico teor húmico. Posteriormente Farias et al. (2014) alteraram esta lista (e mesmo as denominações taxonômicas), referindo a presença de A. trachura Cope, 1885, A. prunicolor (Cope, 1885), e A. darwinii Burmeister, 1861. Neste mesmo estudo (FARIAS et al., 2014), apontam a presença (em ambiente urbano, na área de um Parque inserido dentro de um ambiente totalmente antropomorfisado), de Hypsiboas pulchellus (Duméril & Bibron, 1841) e Rhinella fernandezae (Gallardo,1957) para Amphibia; e Philodryas olfersii (Lichtenstein,1823), Oxyrhopus rhombifer Duméril, (Bibron & Duméril, 1854), Teius oculatus (D Orbigny & Bibron,1837), Acanthochelys spixii (Duméril & Bibron, 1835), e Trachemys dorbigni (Duméril & Bibron, 1835) para Reptilia. Para Mammalia, o estudo identificou a presença de Didelphis albiventris Lund, 1840, Artibeus lituratus (Olfers, 1818), Tadarida brasiliensis (L. Geoffroy, 1824), e Cavia aperea Exerleben, 1777. 2

Torres et al. (2015), em estudo realizado em um parque urbano de Porto Alegre cita a presença de quarenta e nove espécies de aves, tradicionalmente consideradas como silvestres, sendo que destas, o estudo considerou vinte e cinco (51%) como residentes e as demais como migratórias. Para Amphibia e Reptilia conjuntamente, o estudo revelou a presença de nove espécies consideradas silvestres, e para Mammalia, quatro espécies. Em ambientes urbanos, mamíferos se adaptam de maneiras distintas às alterações antrópicas, sendo que no geral apenas poucas espécies estabelecem populações em hábitats urbanizados (HARRIS e YALDEN 2003). Segundo Baker et al. (2003), Kristan III et al. (2003) e Tigas et al. (2002), um dos piores efeitos da urbanização de áreas naturais para a fauna é a fragmentação de hábitats e consequentemente o aumento de bordas. A fragmentação altera a riqueza de espécies e densidades populacionais de diferentes maneiras, elevando-as ou diminuindo-as. No caso de mamíferos de grande porte, em especial os carnívoros, a fragmentação deixa áreas que podem ser pequenas demais para manter uma população viável ou insuficientes para o território de um indivíduo (CROOKS 2002; TIGAS et al. 2002). De forma similar ao estudo de Torres et al. (2015), o estudo de Pacheco et al. (2010), relata a ocorrência de Chiroptera, já registrada, em área urbana e/ou periurbana das cidades de Brasília/DF, São Paulo/SP, Curitiba/PR e Porto Alegre/RS, de não menos de quarenta e sete espécies de morcegos, sendo, 36% da família Phyllostomidae, 34% Molossidae, 23% Vespertilionidae, 4% Emballonuridae e 2% Noctilionidae. Relata ainda, o estudo de Pacheco et al. (op. cit.), marcada dominância das espécies insetívoras (64%) sobre as fitófagas (28%, onde estão incluídos frutos, folhas, néctar, pólen e partes florais), onívoras (4%), piscívoras (2%) e hematófagas (2%). Silva et al. (2014), registraram 149 espécies de aves pertencentes a 44 famílias, sendo Tyrannidae, com 17 espécies registradas, a mais representativa, no âmbito da comunidade de aves em área urbana no sul do Brasil. A riqueza foi estimada em 166,5 ± 4,73 espécies. Do total, 12 são endêmicas da Mata Atlântica. Houve predominância de insetívoros, onívoros e espécies com baixa sensibilidade a alterações de hábitat. A comunidade representa uma parcela significativa (66%) da avifauna registrada para áreas verdes inseridas em matrizes urbanas de Porto Alegre e região metropolitana. Scherer et al. (2005), avaliando a estrutura trófica de oito parques urbanos de Porto Alegre, registraram 170 espécies de aves, pertencentes a 43 famílias. Evidencia-se que espécies que possuem disponibilidade de alimento durante o ano inteiro, como insetívoros, ou os que utilizam táticas alimentares mais variadas, como onívoros, que podem utilizar o alimento de acordo com as condições oferecidas, tendem a um predomínio, como os 31,2%, encontrado para os insetívoros, e 35,3% para os onívoros, verificados neste estudo. Finalmente Em contraste com a riqueza de espécies da fauna brasileira, ainda há insuficiência de estudos nas áreas urbanas. Assim, é imprescindível o direcionamento de pesquisas sobre a fauna silvestre urbanizada nas diferentes regiões. 3

A urbanização modifica a estrutura física e biótica do hábitat, podendo afetar diversos processos ecológicos que envolvem a fauna e a flora nestas áreas. Como resultado da intervenção antrópica, a paisagem urbana geralmente se apresenta fragmentada em um mosaico de diferentes ambientes e, tanto a estrutura da vegetação, quanto a sua composição florística, costumam diferir daquela originalmente presente, disponibilizando, portanto, condições e recursos distintos a serem explorados pela fauna (MENDONÇA e ANJOS, 2005). Fica evidente, ainda, que os estudos a respeito da fauna em ambientes urbanos é significativamente associada a avefauna, o que é perfeitamente compreensível, haja vista que há maior facilidade de observação, bem como, maior volume de espécies e de ocorrência, gerando resultados mais atrativos e expressivos, do que os observáveis a partir de répteis, anfíbios ou mamíferos. É necessário sensibilizar a população para a importância de conservar e cultivar as plantas nativas e úteis à fauna, pois é uma importante forma para a preservação de muitas espécies. A esse respeito vale lembrar as palavras de Péricles da Silva Pereira, citado em Sanchotene (1985): todas as espécies animais e vegetais devem ser protegidas contra a sua possível extinção, porque, quando esta sobrevém, fatal e definitiva, o homem com toda a sua ciência jamais poderá fazê-las reviver. Conforme se observa, as principais funções desenvolvidas pela arborização na manutenção da fauna nos centros urbanos brasileiros seriam no sentido de garantir a função de abrigo e principalmente, de diversificação de fontes de alimentação. Nesta óptica, espécies de hábitos generalistas são extremamente beneficiadas no ambiente urbano, em detrimento das espécies de hábitos específicos, como as espécies típicas de habitats florestais. Assim, o componente arbóreo urbano também desempenha a importante função de complemento de fontes alimentares a espécies típicas de matas nativas, por exemplo, espécies que habitam matas nativas circundantes aos centros urbanos. Por conseguinte, coloca-se como de primeira importância o aumento de áreas verdes, parques e de arborização de vias públicas, para uma maior diversificação das fontes alimentares, e de condições para a manutenção da biodiversidade da fauna urbana; deve-se primar por uma maior diversificação de espécies vegetais, nos planos de arborização, através da priorização do emprego de espécies típicas da flora nativa, além da necessidade do emprego de plantas de caráter perene, para diminuir a rotatividade de práticas de jardinagem, como a substituição de espécies, que pode ocasionar perda de fontes alimentares para a entomofauna, gerando a migração e redução de espécies. Guimarães (2006) afirma que é preciso encontrar estratégias, dentro dos centros urbanos, que permitam compatibilizar as exigências da vida humana e a necessidades ecológicas de outras espécies, sendo que, para isto, é necessário que haja um movimento generalizado na direção de se instituir mais parques, arborizar as cidades de forma a possibilitar a sobrevivência de uma maior diversidade de organismos. O aumento das áreas verdes viria a causar o aumento na população de aves, além de que, a existência de árvores floridas atrairia insetos essenciais para certas espécies de aves; além disso, um bairro bem arborizado proporciona mais abrigo e alimentação do que áreas de pasto. 4

Um plano de conservação de espécies urbanas torna-se altamente relevante, não apenas para manter o equilíbrio da teia alimentar, mas igualmente para auxiliar no manejo de espécies nas cidades e solucionar problemas de saúde pública que possam envolver, dentre outros, os quirópteros. Compreendendo a dieta, o comportamento social, a dispersão ou deslocamento sazonal, as possibilidades de coabitação entre espécies, relação predador-presa, torna-se mais fácil à convivência entre a fauna urbana e o homem. Referências bibliográficas BAKER, P. J.; ANSELL, R. J.; DODDS, P. A. A.; WEBER, C. E.; HARRIS, S. Factors affecting the distribution of small mammals in an urban area. Mammal review, v.33, p.95-100, 2003. BRASIL. Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/quadro/1981-1987.htm>. Acesso em: 13 jun 2015. BRITO, Fernando de A. A. A hodierna classificação do meio ambiente, o seu remodelamento e a problemática sobre a existência ou a inexistência das classes do meio ambiente do trabalho e do meio ambiente misto. Âmbito Jurídico.com.br Ambiental, s/d. Disponível em <http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos _leitura&artigo_id=1606>. Acesso em 17 jun. 2015. CROOKS, K. Relative sensitivities of mammalian carnivores to habitat fragmentation. Conservation Biology, v.16, p.488-502, 2002. EMLEN, J. T. An urban bird community in Tucson, Arizona: derivation, struture, regulation. The condor, n.76, p.184-197, 1974. FARIAS, Mariana F.; TORRES, Vladimir S.; TODESCHINI, Felipe. Parque Municipal Chico Mendes, Porto Alegre RS: Peculiaridades Ambientais. XVIII Congresso Brasileiro de Arborização Urbana. Anais do... Disponível em: <http://www.cbau2014.com.br/trabalhos/ 21251.pdf>. Acesso em 20 mai 2015. FIORILLO, Celso A. P. Curso de direito ambiental brasileiro. 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008. 300p. GUIMARÃES, M. Há mais aves nos grandes centros urbanos hoje? Ciência & Cultura. v.58, n.2, p.14-14, 2006. HARRIS, S.; YALDEN, D. W. An integrated programme for monitoring terrestrial mammals in Britain. Mammal review, v.34, p.1-11, 2003. JAPYASSÚ, H. F.; BRESCOVIT, A. Biodiversidade araneológica na cidade de São Paulo: a urbanização afeta a riqueza de espécies? S/d. Paginae incertae. Disponível em: <http://ambientes.ambientebrasil.com.br/urbano/artigos_urbano/biodiversidade_araneologica_na_cidade_de_sao_p aulo%3a_a_urbanizacao_afeta_a_riqueza_de_especies%3f.html> Acesso em 12 abr 2015. KRISTAN III, W. B.; LYNAM, A. J.; PRICE, M. V.; ROTENBERRY, J. T. Alternative causes of edge-abundance relationship in birds and small mammals of California coastal sage scrub. Ecography, v.26, p.29-44, 2003. LOMBARDO, M. A. Vegetação e clima. In: III ENCONTRO NACIONAL SOBRE ARBORIZAÇÃO URBANA. Anais... Curitiba, PR. p. 01 13. 1990. 5

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