O monitoramento das atividades de pesquisa e desenvolvimento em um contexto de globalização competitiva. Lia Prado Arrivabene Cordeiro 1. INTRODUÇÃO A pesquisa que em curso tem como objetivo verificar a viabilidade do desenvolvimento de um modelo de coleta, processamento e consolidação de informações estratégicas, que permita fundamentar a definição de políticas e o direcionamento de recursos para sua implementação, em consonância com a política global do governo para a área de ciência e tecnologia, visando os benefícios para a sociedade como um todo. Este trabalho procura analisar o problema da falta de acompanhamento e avaliação das ações implantadas para realimentação do Sistema de Ciência e Tecnologia. Sugere o monitoramento de informações estratégicas, por intermédio da aplicação de técnicas modernas de gestão da informação (incluindo técnicas infométricas) e de princípios de inteligência competitiva/estratégica, para identificar um modelo conceitual de monitoramento de informações estratégicas em Ciência e Tecnologia, que oriente na identificação e escolha de indicadores do impacto da pesquisa sobre o setor produtivo brasileiro frente à concorrência estrangeira. 2. A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO E A GLOBALIZAÇÃO O processo de globalização aumenta a competitividade internacional e faz com as empresas invistam na produção de inovações tecnológicas, o que requer conhecimento especializado. Neste novo contexto, o modo da produção do conhecimento está voltado para o desenvolvimento de pesquisa aplicada, para atender às demandas econômicas e sociais, e não mais para a acumulação do conhecimento, como é propósito básico da pesquisa básica. Caracteriza-se pela transdisciplinaridade, uma vez que os problemas a serem solucionados são complexos, e exigem, muitas vezes, disciplinas complementares. Caracteriza-se também pela heterogeneidade institucional, pois este tipo de conhecimento deixou de ser produzido exclusivamente pela universidade, envolvendo agora pequenas empresas de alta tecnologia, laboratórios de pesquisa, multinacionais, ONGs, etc. O desenvolvimento das tecnologias da comunicação, computação e informação, principalmente as redes e a INTERNET, possibilitaram a interação entre os diversos locais de pesquisa, acelerando o processo de intercâmbio de informação. Este fato, aliado ao alto índice educacional e ao volume de recursos disponíveis para P&D nos países desenvolvidos, vem aumentando a distância entre esses e os não desenvolvidos.
3. A POLÍTICA DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA NO BRASIL Na literatura especializada há algumas evidências de que a definição e orientação das políticas e ações governamentais na área de Ciência e Tecnologia, nos últimos anos, não têm se apoiado em bases sólidas, abrangentes e realistas. Um dos indicadores é a nossa produção de patentes, cerca de 300 por ano. (NICOLSKY, 1999) Os principais entraves referem-se: "a falta de mecanismos de realimentação do sistema, inclusive com respeito a avaliação de desempenho das instituições; a definição nem sempre precisa sobre o papel das agências de fomento, de modo a dar conta da complexidade do processo de desenvolvimento científico e tecnológico; e a administração sem autonomia dos institutos de pesquisa e universidades, o que dificulta a modernização de suas atividades e melhor administração de seus orçamentos". (PPA, 1996) Países desenvolvidos vêm utilizando resultados de estudos prospectivos como um dos instrumentos de apoio à tomada de decisão política em Ciência e Tecnologia. Em recente seminário, Estudos Prospectivos em Ciência e Tecnologia: Experiências Internacionais, organizado pelo Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia CCT e realizado em Brasília, nos dias 27 e 28 de setembro de 2000, sob a coordenação do MCT, durante o debate da Sessão I Experiências nacionais: Japão e Alemanha, Luciano Coutinho, da UNICAMP, destacou o caráter de continuidade das ações no setor de Ciência e Tecnologia dos países desenvolvidos e o caráter espasmódico das ações no Brasil. Segundo ele, "tivemos o ciclo dos anos 70, o ciclo dos anos 80, o longo inferno dos anos 90, quando os recursos para Ciência e Tecnologia minguaram, e agora, a esperança nos Fundos Setoriais que acenam com a possibilidade da continuidade das ações no setor". Um exemplo conhecido desse caráter espasmódico, foi no início dos anos 70, quando as Metas e Bases Para Ação do Governo previam a implantação de um Sistema Nacional de Informação sobre Ciência e Tecnologia, para captação, tratamento e difusão sistemática e permanente de informações atualizadas sobre Ciência e Tecnologia, seguindo uma tendência mundial de organização, processamento, análise e difusão da informação científica e tecnológica orquestrada pela UNESCO/UNISIST. Vários países no mundo tomaram a mesma iniciativa do Brasil. Apesar de ter sido feito o planejamento do referido Sistema, ao final de quatro anos o modelo acabou não sendo implantado. O Brasil perdeu uma oportunidade histórica, pois o Japão, por exemplo, já acumula uma experiência de 30 anos em estudos prospectivos: desde 1970 dispõe de uma infra-estrutura nacional de 2
informação para suporte às demandas que o acompanhamento e análise dos resultados dos estudos prospectivos exigem. Na Universidade de São Paulo USP, desde 1978 existe um grupo que faz prospecção. Existem também outros grupos de pesquisadores, na UNICAMP e na UFRJ, que vêm trabalhando, há alguns anos, no desenvolvimento de projetos de inovação tecnológica entre Universidade e Empresa. Todos estes grupos acumularam possuem experiência no desenvolvimento de estudos prospectivos. Apesar dessas iniciativas serem do conhecimento do Ministério da Ciência e Tecnologia, resultam como iniciativas isoladas ao não estarem integradas em um projeto nacional. A partir de julho de 1999, pelo número de eventos patrocinados pelo Governo (MCT, MDIC, MRE, UnB) com a participação de especialistas estrangeiros e abertos para a sociedade, observa-se um esforço para iniciar um debate nacional e, conseqüentemente, ampliar o conhecimento sobre questões como gestão do conhecimento, inteligência competitiva, estudos prospectivos e cadeias produtivas. 4. O MONITORAMENTO DE INFORMAÇÕES ESTRATÉGICAS PARA CIÊNCIA E TECNOLOGIA A complexidade dos Sistemas de Ciência e Tecnologia dos países desenvolvidos e do Brasil é similar, no entanto, aos países desenvolvidos, onde a tomada de decisão está vinculada a um conjunto de informações estratégicas que são resultado de um monitoramento contínuo e de trabalho integrado de coleta, armazenagem, processamento, análise e comparação dos dados levantados pelos estudos prospectivos. O resultado destes estudos, em outros países, demonstra sua utilidade para identificar tendências, utilizando técnicas modernas de gestão da informação, entre as quais se incluem as técnicas de infometria, e de princípios de inteligência competitiva. O monitoramento das informações estratégicas, dentro e fora destes países, é realizado em dois níveis: 1) acompanhamento dos dados; 2) prospecção. No Japão, há 30 anos os estudos prospectivos são utilizados para definir as prioridades do governo. A cada cinco anos é feito um novo levantamento, baseado nos resultados do anterior. A metodologia utilizada é a técnica Delphi, em duas rodadas. O questionário aplicado dá ênfase ao grau de importância da tecnologia e ao tempo previsto para sua realização. No início do processo eram pesquisados 600 tópicos (tecnologias), atualmente são 1200 tópicos. Estes estudos prospectivos são coordenados por um Comitê de Prospecção, que define quais são os tópicos de pesquisa, e que é composto por Sub-Comitês, aos quais cabe a definição do quadro de referência. A relação dos respondentes: 1/3 são do setor público, 1/3 do setor acadêmico e 1/3 de associações e demais setores da 3
sociedade. O procedimento de pesquisa leva cerca de dois anos e meio para cada caso. A avaliação dos resultados destes 30 anos de estudos prospectivos demonstrou que o acerto das previsões foi de 20% no longo prazo, já no curto prazo foi de 80%. Em termos gerais, todos os especialistas estrangeiros consideraram os estudos prospectivos muito confiáveis. Atualmente, há uma preocupação de fundir os levantamentos de necessidades com os levantamentos de tecnologias, buscando com isso um cruzamento entre necessidades sócio-econômicas e tecnologias. A Alemanha iniciou suas atividades de prospecção em 1990. O 1º Delphi, com o Japão, foi realizado em 1993, outros dois Delphi, também foram realizados com o Japão. Atualmente, a Alemanha optou por um Programa de Prospecção que se chama FUTUR e que é uma combinação de outras metodologias, como o benchmarking, além do Delphi. Segundo o especialista alemão Harriolf Grupp, dentre os métodos utilizados o Delphi é o que apresenta maior vantagem, porque os questionários são muito semelhantes, o que possibilita a comparação dos resultados com outros países, enquanto a técnica de Cenários, que permite muita liberdade, dificulta as comparações entre países. Na Austrália, a abordagem foi mais pragmática que na Alemanha, Japão, Coréia e França. O país optou pela montagem de um Programa Nacional de Prospecção, sem fazer um grande e amplo Estudo Nacional Prospectivo. O estudo foi muito seletivo dentro dos recursos disponíveis. As diversas instituições que compõem a sociedade, tais como, associações, empresas, universidades, ONGs, etc, fizeram seus estudos prospectivos a pedido do governo, muitas vezes com uma única tecnologia. O conjunto formou grande mosaico, que não era necessariamente abrangente, e que serviu de base para a definição de prioridades tanto do setor público quanto do privado. Diferentemente dos outros países, os estudos foram mais centrados na demanda de tecnologia do que na oferta de tecnologia. São utilizados cenários futuros e, posteriormente, é realizada uma consulta nacional com os setores e pessoas interessadas. As metodologias foram escolhidas caso a caso: - Extrapolação curva S, etc. - Pattern Analisys analogias, morfologia, árvore de relevância - Goal Analisys impacto, análise de conteúdo, e análise de patentes - Imprevisibilidade- análise de cenários - Complexidade Delphi No Brasil foram recentemente criados Fundos Setoriais como mecanismo complementar de financiamento da política de Ciência e Tecnologia. O Congresso Nacional aprovou cinco Fundos Setoriais, que irão financiar pesquisa nas áreas espacial, de energia elétrica, recursos minerais, transportes e petróleo. Eles são 4
formados por percentuais do faturamento de empresas privadas ou por contribuições pela exploração de recursos naturais. O Fundo dos Fundos, cujo objetivo é a recuperação da infra-estrutura de pesquisa das Universidades e Institutos, será formado por 20% do total arrecadado pelos Fundos Setoriais. Encontra-se também em tramitação o chamado Fundo Verde- Amarelo, que será constituído por parcela do Imposto de Renda pago pela contratação de serviços e assistência técnica no exterior e por um percentual dos pagamentos de royalties estrangeiros feitos por empresas instaladas no Brasil. Este será destinado a estimular parcerias universidade-empresa para desenvolver inovações tecnológicas. É o maior dos Fundos, com estimativa de arrecadação em torno de R$ 250 milhões ao ano. A razão apontada pelo Governo para a criação deste Fundo é o baixo investimento em Pesquisa e Desenvolvimento pelas empresas brasileiras. O indicador que evidencia essa distorção é a distribuição de cientistas e engenheiros dedicados a Pesquisa e Desenvolvimento. Nos países do Primeiro Mundo, entre 50% e 70% desses profissionais concentram-se nas empresas, no Brasil 90% dos referidos profissionais estão nas Universidades e Laboratórios Públicos e apenas 10% nas empresas. Todos os recursos serão canalizados para o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT). Cada Fundo terá um Comitê Gestor presidido pelo MCT e com representantes da FINEP, do CNPq, do Ministério específico da área e em alguns casos, do setor empresarial envolvido e quando houver, da agência reguladora do setor. O Ministro da Ciência e Tecnologia, Ronaldo Sardenberg, em entrevista recente ao Jornal do Brasil, explicou que cada Fundo começa com um trabalho prospectivo, um estudo de problemas e potenciais vantagens comparativas em cada área e que os projetos a serem financiados deverão estar voltados para a solução desses problemas e desenvolvimento dessas potencialidades. Serão geridos por Comitês que contam com a participação de representantes dos ministérios da área, agências reguladoras do setor, além do setor empresarial e científico. A produção científica brasileira vem crescendo e atualmente esse crescimento é somente superado pela Coréia. O número de doutores aumentou, no entanto, a Ciência é mal distribuída nas diversas regiões do país. Na opinião de Luciano Coutinho, o setor privado é o elo fraco do Sistema tecnologia inovação. Ele acredita que os focos, no Brasil, que devem ser anteriores a um estudo prospectivo nacional,são os seguintes: 1) promoção da competitividade em matéria de exportação; 2) reforço do capital nacional (Programa Regional de clusters ); 3) - equidade social e qualidade de vida (eficiência nos gastos públicos e combate a pobreza). 5
Alguns indicadores internos e externos, que podem orientar o processo de tomada de decisão em Ciência e Tecnologia são: - Novidade da pesquisa - Urgência de resultados( impacto) - Competitividade dos produtos (qualidade/preço) - Medida do impacto (novos mercados) - Proteção da inovação (quantidade de patentes) 5. CONCLUSÃO Os países desenvolvidos estão utilizando o monitoramento de informações estratégicas por intermédio da aplicação de técnicas modernas de gestão da informação, incluindo-se técnicas infométricas, e de princípios de inteligência competitiva/estratégica para obter indicadores que apoiem a tomada de decisão política em Ciência e Tecnologia. Conclui-se que no Brasil existe infra-estrutura institucional complexa, de comunicação, de informática, de informação, além de pessoal especializado para iniciar um Programa Nacional de Prospecção, utilizando as mesmas ferramentas infométricas complexas e mecanismos dos países desenvolvidos, de maneira integrada, visando otimizar os recursos disponíveis no país. O discurso do atual governo, indica que há vontade política para criar condições ao desenvolvimento de mecanismos duradouros. Com a criação dos Fundos Setoriais espera-se haver continuidade no fluxo de recursos financeiros, uma das razões apontadas para a descontinuidade das ações no setor, para que sejam criadas as instâncias de realimentação do Sistema de Ciência e Tecnologia no Brasil. Nome: Lia Prado Arrivabene Cordeiro Titulação: Mestre em Biblioteconomia e Documentação Onde obteve a titulação: Universidade de Brasília - UnB Principais atividades: Aluna do Doutorado em Ciência da Informação da UnB, Chefe da Divisão de Acordos Bilaterais, da Assessoria de Cooperação Internacional do Ministério da Ciência e Tecnologia Vinculação institucional: IBICT/ CNPq - Tecnologista Senior 6