O mercado de trab ENFERMAGEM ILUSTRAÇÕES WALTER VASCONCELOS. [ 30 ] setembro/outubro 2003 diga lá nº 33



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Transcrição:

O mercado de trab ENFERMAGEM ILUSTRAÇÕES WALTER VASCONCELOS [ 30 ] setembro/outubro 2003 diga lá nº 33

alho na área de Cuidar ter cuidado, tratar. Nenhum outro verbo traduz com tanta perfeição a atividade de enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem. Zelando pela vida onde quer que bata um coração, a atuação dos profissionais de enfermagem corresponde a nada menos que 65% da força de trabalho na área de saúde um percentual expressivo. Tradicionalmente, com base no modelo ARMANDO FREITAS médico-assistencial vigente no país, a atividade de cuidar de pacientes é desenvolvida em hospitais públicos e privados. Mas, de uns tempos para cá, o panorama vem se alterando. diga lá nº 33 setembro/outubro 2003 [ 31 ]

A partir de uma reflexão mais ampla sobre o papel social da enfermagem, do surgimento de novas especializações, da necessidade de abertura do mercado e de ações concretas nas políticas governamentais de saúde, abrem-se aos poucos novas possibilidades para a atuação dos profissionais da área fora dos hospitais, tanto em trabalhos de prevenção quanto em atendimentos domiciliares que podem ser realizados de forma autônoma, por instituições, ou por meio de cooperativas. Mas, se hoje o emprego formal deixa de ser a única alternativa para o exercício da atividade, por outro lado, é importante ter plena consciência da atual estrutura do mercado de trabalho, em defesa da valorização da categoria e do trabalho de extrema importância que ela exerce. Para retratar com a maior transparência possível esse cenário, a Diga Lá ouviu profissionais de enfermagem ligados a hospitais públicos, privados e a cooperativas. Novas frentes Atualmente, há três principais frentes de trabalho para enfermeiros (curso superior), técnicos e auxiliares de enfermagem: hospitais públicos e privados, cooperativas e serviços de home care. O preferido, pelas garantias que oferece, é o emprego formal na rede hospitalar pública ou privada. No serviço público, há ainda a opção de trabalhar em postos de saúde e em programas de saúde de família, que vêm recebendo grande incentivo do Governo Federal. Muitas vezes, especialmente nos casos de plantões de 12 por 36 horas, o emprego formal permite a acumulação com um segundo emprego ou uma atividade autônoma nas horas vagas. Aqui, a maioria do pessoal de enfermagem tem outro emprego ou atividade, afirma Maria Christina Estolano da Silveira, supervisora de Enfermagem da Casa de Saúde São José, um dos hospitais mais tradicionais da Zona Sul do Rio de Janeiro. Nas horas vagas, quem não está trabalhando está fazendo faculdade de Enfermagem, no caso dos técnicos, ou cursos de especialização, concorda Márcia Cristina Quevedo, enfermeira do Serviço de Educação Continuada do Hospital Samaritano, também no Rio. A necessidade de um segundo emprego se justifica pela realidade salarial da categoria. Mesmo em hospitais de excelência como a Casa de Saúde São José e o Samaritano, os salários dos enfermeiros ficam na faixa de R$ 1.700 a R$ 2.500. Entre técnicos, verifica-se uma queda de cerca de 40% desses valores. Mesmo assim, a procura é grande e a seleção rigorosa. Não é só o salário que deve ser levado em conta. O lugar onde se trabalha também conta muito. No Samaritano, temos ótimas condições materiais e de estrutura para exercer a nossa atividade e os salários nunca atrasam. Há ainda os benefícios indiretos, como plano de saúde. Por tudo isso, tem muita gente querendo trabalhar aqui. O recrutamento inclui currículo, entrevista, prova técnica e avaliação psicológica. Os cursos devem ser reconhecidos pelo COREn (Conselho Regional de Enfermagem) e os candidatos com alguma experiência têm mais chances, mas a prova técnica e a análise comportamental têm muita importância, explica Márcia, que coordena ao lado de outra Márcia, a Ramos, e de Ana Cláudia Póvoa o Serviço de Educação Continuada, que além de responder pelo recrutamento e treinamento de pessoal, zelando pela manutenção da qualidade do atendimento, promove encontros, cursos de atualização e faz pareceres sobre novos medicamentos e materiais para o Departamento de Compras do hospital. Maria Christina Estolano, formada há 20 anos e há oito na Casa de Saúde São José, concorda com a importância da infra-estrutura para a atividade de enfermagem: Os hospitais privados costumam ter um padrão de qualidade de assistência. Investem mais em estrutura e isso nos dá maior tranqüilidade e satisfação. Talvez este seja um dos motivos da baixa rotatividade na São José. Quem entra não quer sair. E não é fácil entrar. A procura é grande e na hora da contratação, pesa muito a qualidade do curso e o desempenho durante o treinamento. A disputa por um emprego formal na rede pública, mesmo com os constantes problemas de falta de material para curativos, exames e cirurgias, superlotação, sobrecarga de trabalho e atrasos nos pagamentos, também é acirrada. E, com o emprego garantido, ninguém se arrisca a criticar publicamente a inexistência de uma estrutura adequada para o trabalho de enfermagem. Entra governo, sai governo, a falta de dinheiro e o des- [ 32 ] setembro/outubro 2003 diga lá nº 33

caso com as populações de baixa renda continuam comprometendo o atendimento na maioria dos hospitais da rede pública. Mas há exceções: casos em que instituições públicas, além de cumprirem com eficiência seu objetivo social, são ilhas de excelência. Um exemplo é o Inca - Instituto do Câncer, que supera um momento de crise para se afirmar novamente como um hospital de referência na sua especialidade. Com 243 enfermeiros, 231 técnicos de enfermagem e 456 auxiliares de enfermagem, o hospital tem tecnologia de ponta, corpo clínico de alto nível e uma preocupação constante com a atualização. Os salários seguem a média do mercado. Como não poderia deixar de ser, a procura de vagas também é grande: Nós aqui levamos em conta o conhecimento na área oncológica, que tem suas especificidades. Os tratamentos de quimioterapia e radioterapia são duas delas. Mas tumores de pescoço e cabeça também exigem cuidados especiais do pessoal da enfermagem. Por isso nos preocupamos com a formação de mão-de-obra, com cursos de especialização, afirma José Luiz Lopes de Oliveira, coordenador de Recursos Humanos do Inca. Cooperativas As cooperativas existem desde no século XIX, mas no Brasil, a partir da década de 1990, as cooperativas da área de saúde tiveram um grande crescimento nas regiões urbanas como Rio de Janeiro e São Paulo, sobretudo em função das crises financeiras e da retração no mercado de trabalho formal. Para Jacqueline Coelho de Oliveira Calçado, presidente da Nursing Care Cooperativa de Enfermagem, é importante reforçar a tradição das cooperativas e a crença nos valores éticos de honestidade, transparência, responsabilidade social e preocupação com os demais. Jacqueline Calçado explica que a busca de autonomia é facilitada pelo caráter de sociedade cooperativista uniprofissional, já que profissionais de uma determinada categoria têm em comum objetivos que podem ser facilmente alcançados através dessa união de forças. O cooperativismo vem gradativamente ocupando espaço e contribui de forma significativa para o desenvolvimento econômico da nação. Na avaliação da presidente da Nursing Care Cooperativa de Enfermagem, as cooperativas de trabalho possibilitaram ao trabalhador e ao tomador de serviços vantagens como atendimento personalizado, seleção de cooperados de acordo com o perfil requerido, substituição de cooperados sem ônus em curto espaço de tempo, flexibilidade de quadro segundo a taxa de ocupação, redução dos custos operacionais com pessoal administrativo e melhor qualidade do serviço executado. Para os cooperados, ela enumera vantagens como rendimentos acima do mercado, gestão da própria renda, oportunidades atrativas de trabalho segundo a sua disponibilidade, além de todos os benefícios diretos e indiretos de participar de uma sociedade cooperativista. Jacqueline Calçado defende ainda um novo modelo de ensino voltado para a preparação, o desenvolvimento e a consolidação de uma cultura empreendedora para os profissionais de enfermagem, pois a transição do modelo antigo para um modelo de enfermagem empreendedor, competitivo, focado na sobrevivência e no sucesso profissional requer a formação de uma nova mentalidade. diga lá nº 33 setembro/outubro 2003 [ 33 ]

Garantias Apesar das vantagens apontadas por Jacqueline, o sistema de trabalho cooperativo não agrada a todos. Enfrenta alguma oposição do Ministério do Trabalho, que defende por princípio os direitos constitucionais conquistados pelos trabalhadores. José Luiz Lopes de Oliveira, do Inca, é um dos que criticam o cooperativismo na área de saúde: O profissional cooperado perde seus direitos trabalhistas, benefícios que levaram décadas para serem conquistados. Na área de enfermagem do Inca, por tratar-se de atividade fim, não praticamos essa forma de contratação. Uma instituição que tenha um compromisso social, uma responsabilidade social, não pode adotar esse tipo de sistema. Aqui no Inca, não trabalhamos atualmente com cooperativa, afirma ele. Na teoria, perfeito. Mas, na prática, será que o mercado tem mesmo capacidade de absorver tantos profissionais de enfermagem com carteira assinada? Esta é uma questão que bota lenha numa polêmica de grande alcance. O mercado informal é uma necessidade de sobrevivência dos que não conseguem um emprego formal ou é uma imposição de empresas mais preocupadas com o lucro do que com o bem-estar do funcionário ou do paciente? A resposta vai depender do ponto de vista do entrevistado. Na área de saúde, as cooperativas só têm espaço em instituições que só visam ao lucro, afirma José Luiz Lopes de Oliveira. O vínculo cooperativo é um bom vínculo, pois os interesses são comuns. Só não funciona para quem é individualista, rebate Jacqueline Calçado. A presidente da Nursing Care naturalmente admite que o trabalho assalariado oferece mais garantias para o empregado, mas ressalta a crescente preocupação das empresas cooperativas em relação a esse problema. E garante que começam a surgir algumas ações concretas para combatê-lo. Aqui na Nursing Care, por exemplo, negociamos com grandes empresas e oferecemos ótimos planos de saúde e odontológico para os cooperados. Quanto maior o número de associados, mais vantajoso é o acordo que fazemos. Oferecemos ainda um plano de vida e de acidentes pessoais com grande desconto. Os cooperados pagam diretamente às empresas contratadas. Temos também o FAC, que é um fundo de assistência ao cooperado. A adesão é voluntária e o cooperado escolhe o valor a ser descontado. Esse fundo pode garantir o descanso remunerado, o abono natalino ou um seguro para calamidades como enchentes etc. Se o cooperado não precisar desse dinheiro, pode sacar o saldo no fim do ano, explica Jacqueline. Mercado promissor Divergências à parte, todos os entrevistados concordam que é promissor o futuro da enfermagem. Muita gente já percebeu que o mercado está em expansão. E uma prova disso é o fato de o curso de Técnico de Enfermagem, que tem 1.800 horas (sendo 600 horas de estágio), ser o mais concorrido do Senac. O primeiro módulo, de abrangência geral, é pré-requisito para o segundo, que forma auxiliares de enfermagem. Para conseguir o diploma de técnico, é preciso fazer os dois primeiros módulos e finalizar o terceiro. Para Mercilda Bartmann, enfermeira com larga experiência formada pela UFRS - Universidade Federal do Rio Grande do Sul e atualmente trabalhando como assessora técnica da área de saúde do Senac, vale a pena o esforço: Apesar de o nível salarial ainda estar abaixo do desejável, existe mercado. Especialmente para os que optam por fugir dos grande centros. No Norte, por exemplo, o mercado é superaquecido, pois os programas federais e estaduais absorvem um grande número de profissionais. Outro fator positivo é o aumento da expectativa de vida do brasileiro, que saltou de 52,7 anos em 1970 para 68,55 em 2000, segundo dados do Censo. Nos países mais desenvolvidos, já se observa uma tendência para a especialização no atendimento domiciliar a idosos. O acompanhante de idosos deve ter uma formação específica, multidisciplinar. Além de dominar os procedimentos básicos da enfermagem como cuidados de higiene, pequenos curativos, administração de remédios e alimentação especial, é preciso desenvolver a parte lúdica do idoso e saber conviver com seus parentes. O ideal é que esse profissional seja um [ 34 ] setembro/outubro 2003 diga lá nº 33

auxiliar de enfermagem, e essa tendência deve chegar ao Brasil, prevê Mercilda, que também atesta um grande crescimento na área de home care. A expansão do mercado nessa direção é irreversível, já que os hospitais descobriram quão elevado é o custo de manter internados pacientes crônicos. Além disso, é preciso levar em consideração que os pacientes sentem-se muito melhor em suas próprias residências. Os profissionais de enfermagem podem atuar como assalariados ou como autônomos, a serviço de cooperativas ou trabalhando de forma independente, contratados diretamente pela família do paciente. Os parentes quase sempre precisam trabalhar fora e não têm tempo nem os conhecimentos necessários para cuidar de uma pessoa doente. Mercilda Bartmann defende a tese de que, para obter reconhecimento como categoria, é fundamental que os profissionais de enfermagem se organizem e mantenham sempre uma postura de reflexão em relação ao papel social do trabalho que desenvolvem e ao tipo de vínculo estabelecido com o empregador ou a sociedade cooperativista. Assim como Mercilda, José Luiz Lopes de Oliveira, coordenador de Recursos Humanos do Inca, é outro que aposta no crescimento do mercado para a área de enfermagem: Doença vai existir sempre. E como os enfermeiros têm a visão do paciente como um todo, o mercado será sempre favorável. Além disso, cada vez mais os enfermeiros assumem funções administrativas e gerenciais dentro do hospital. E há ainda o constante surgimento de novas especializações, avalia José Luiz. Simultaneamente ao crescimento do mercado, vai mudando também a imagem dos profissionais de enfermagem. O mercado exige profissionais cada vez mais qualificados, o que estimula a busca de atualização ou cursos de especialização, e aos poucos esses profissionais vão conquistando o respeito da população em geral. Espaço, a gente conquista com competência. Quando o médico percebe que o enfermeiro é atualizado, é eficaz, ele respeita e até se mostra aberto a receber uma sugestão em relação a determinado paciente. Curiosamente, isso acontece mais entre médicos com grande experiência. Os mais novos muitas vezes subestimam a importância do trabalho de enfermagem, analisa Márcia Quevedo, do Hospital Samaritano, onde trabalham 75 enfermeiros, 225 técnicos e 58 auxiliares de enfermagem. Há 17 anos no hospital, Márcia só lamenta a queda de qualidade na formação de profissionais de enfermagem, o que é constatado freqüentemente nos testes de recrutamento que ela coordena. Segundo a enfermeira, muitas faculdades e cursos despejam anualmente centenas de profissionais sem qualificação no mercado. No caso dos enfermeiros, os formados teoricamente estão aptos a comandar equipes de técnicos e auxiliares. Mas, com pouco conhecimento técnico e nenhuma prática, isso se transforma num grande risco para os pacientes, adverte Márcia, que aponta UFRJ, UERJ, UNIRIO, Gama Filho e Luiza de Marilac como as melhores faculdades de Enfermagem do Rio. Nos testes para a função de técnico de enfermagem, destacam-se os que fizeram os cursos do Senac, Hilton Gama e Cruz Vermelha, finaliza a enfermeira. diga lá nº 33 setembro/outubro 2003 [ 35 ]