Anotadas do 5º Ano 2008/09 Data: 2008.11.24 Disciplina: Medicina II Prof.: Dr. Manuel Branco Tema do Seminário: Imunologia Clínica 2 Autora: Mariana Santos Equipa Revisora: Bibliografia Anotada do ano anterior. Harrison, 17ª edição, vol. I Caso Clínico 1 IDENTIFICAÇÃO BAMC, 41 anos, natural de Évora. Residente em Lisboa. Doméstica MOTIVO DE INTERNAMENTO (4/06/04) Angioedema da face DOENÇA ACTUAL 20 dias antes do internamento doente refere quadro clínico caracterizado por vómitos alimentares e febre que regrediu com dieta e Paracetamol em SOS. 2 dias antes do internamento refere epigastralgia e náuseas auto-medicou-se com omeprazol + sucralfato No dia do internamento doente refere 2 episódios de lipotímia; prurido generalizado e edema dos lábios e face. Nega dispneia, disfagia ou disfonia, tosse ou pieira. Nega diarreia. Sem ingestão de fármacos para além dos referidos, à excepção de chá com Aloe vera e Pau d Arco. Nos últimos meses refere astenia. Página 1 de 9
Nega emagrecimento recente ou viagens. ANTECEDENTES PESSOAIS Úlcera gástrica diagnosticada em 2001 (EDA), fez 3 meses de terapêutica com omeprazol (Pariet ) e sucralfato (Ulcermim ) Sem AP conhecidos de doença alérgica. ANTECEDENTES FAMILIARES Irrelevantes EXAME OBJECTIVO TA 101/60 mmhg FC 97ppm TT 37,8ºC Edema do lábio superior Orofaringe: sem alterações AC: S1 + S2 AP: MV rude, mantido bilateral/, simétrico. Raros sibilos dispersos Abdómen: mole, depressível, indolor. Sem massas ou organomegálias MI: sem edemas Sem sinais meníngeos Sem outras alterações cutâneas Observação ORL: cavidade bucal e orofaringe sem alterações. CV móveis e simétricas, sem massas ou edema. Lúmen glótico livre. Internada no Serviço de Medicina IIB Medicada com: ácido ε-aminocapróico 1F ev 8/8h ranitidina 50mg ev 8/8h hidroxizina 25 mg 12/12h aerossol com salbutamol + brom. ipratrópio 8/8h O 2 por óculos nasais a 2L/mn Resolução do edema em 24 horas Página 2 de 9
EXAMES COMPLEMENTARES DE DIAGNÓSTICO RX tórax sem alterações ECG sem alterações Hb 11,0g/dL ; VGM 85,8; CMHG 33,1; Leuc 16 580; N 35,0%; E 41,0% - 6800; B 0,0%; L 20,0%; M 4,0% Plaq. 238 000; VS 33mm; PCR 2,3 glicemia 85; ureia 17; creat 0,6; Na 148; K 3,6; Cl 292 ALT 29; AST 16; Bil tot 0,4; γgt 79; FA 105; LDH 313; CK 45 Prot totais 62; Alb 39; α 1 5,2; α 2 6,6; β 1 3,4; β 2 2,2; γ 10.2 IgG 10,8; IgA 0,8; IgM 2,18; IgE total 2600 C1 inibidor 0,28; C1q 0,19; C3 1,10; C4 0,14 CH 50 54,7 Gasimetria normal HIPÓTESES DE DIAGNÓSTICO Causas de IgE total Micose Broncopulmonar alérgica Alérgica (fármacos, alimentos,...) Dermatite atópica Infecção HIV Síndrome de Hiper IgE Mieloma IgE Linfoma Parasitose sistémica Tuberculose Causas de eosinofilia Alérgica (fármacos, alimentos,...) Infecção (parasitas; fungos; virais...) Doença hematológica / neoplásica S. hipereosinofílico 1ário Página 3 de 9
leucemia linfoma mastocitose associada a neoplasia Síndrome de Hiper IgE; Hipoadrenalismo Causas de angioedema Associado a fármacos Associado a alimentos Ocupacional Associado a picadas de insectos Factores físicos Associada a infecções (hepatites, parasitas, fungos,...) Doenças autoimunes Neoplasias Angioedema hereditário Angioedema e Eosinofilia angioedema Associado a fármacos Associado a alimentos Ocupacional Associado a picadas de insectos Factores físicos Associada a infecções (hepatites, parasitas, fungos,...) Doenças autoimunes Neoplasias Angioedema hereditário IgE eosinofilia Micose Broncopulmonar alérgica Alérgica (fármacos, alimentos,...) Dermatite atópica Infecção HIV Síndrome de Hiper IgE Mieloma IgE Linfoma Alérgica (fármacos, alimentos,...) Infecção (parasitas; fungos; virais...) Doença hematológica / neoplásica S. hipereosinofílico 1ário leucemia linfoma mastocitose associada a neoplasia Síndrome de Hiper IgE; Sindrome Ommen Hipoadrenalismo Parasitose sistémica Tuberculose Página 4 de 9
EXAMES COMPLEMENTARES DE DIAGNÓSTICO Serologia para helmintas - IHMT Serologia quisto hidático (HSM) Pesquisa de OQP nas fezes Serologia para CMV, EBV, Herpes vírus, HIV, Vírus hepatites Imunoelectroforese Urina 24 horas - proteína de Bence Jones Mielograma Rx Tórax Ecografia abdominal TAC toraco-abdomino-pélvica Endoscopia digestiva alta RESULTADOS Pesquisa de OQP nas fezes - negativa Serologia para o CMV IgG 69; IgM - o VEB IgG anti VCA +; IgM anti VCA -; IgG anti EBNA + o HIV anti HIV1 e Ag HIV 1 - ; anti HIV2 - Imunoelectroforese - IgM e IgE sem picos monoclonais Urina 24 horas - proteína de Bence Jones - negativa Mielograma 11/06/2004 - MO normocelular - Relação mieloide - eritróide conservada (4,6 / 1) - Na série mielóide, é evidente o aumento de Eo (36% da celularidade total) em todos os estadios maturativos, sem outras alterações significativas - Não se observam células atípicas Endoscopia digestiva alta (9/07/04) - Esófago: sem lesões - Estômago: fundo e corpo sem lesões. Antro hiperemiado - Bulbo e D2: sem lesões Página 5 de 9
- Gastrite do antro Ecografia abdominal - Fígado com dimensões normais, contornos regulares e estutura homogénia, identificando-se no LD formação de tipo quístico com áreas de septação no seu interior com diâmetro máximo de 11cm... TAC toraco-abdomino-pélvica - Hidatidose hepática envolvendo o lobo direito com 2 quistos hidáticos com vesículas filhas em que a lesão quística de maiores dimensões mede 10x8cm. Serologia para helmintas IHMT - Possível hidatidose Possível Larva Migrans Visceral Possível Anisaquiose Inconclusivo Filariose Serologia quisto hidático POSITIVA; TITULAÇÃO 1/2560 DIAGNÓSTICO DEFINITIVO Quisto hidático hepático Echinococcus granulosus TERAPÊUTICA Albendazol : 200mg de 12/12h, po Prednisolona em desmame Página 6 de 9
Dispositivo para auto-administração de adrenalina sub-cutânea Excisão cirurgica do quisto hepático Vigilância clínica, laboratorial e imagiológica da doente Mantém terapêutica com albendazol Exame funcional respiratório Tac toraco-abdomino-pélvica e CE Caso Clínico 2 JIT, sexo feminino, 36 anos, enfermeira, natural de Faro, residente em Lx. Desde há 5 anos, apresenta queixas de eritema e prurido das mãos, com fissuração, agravada nos períodos de trabalho e melhorando nas férias mas tendendo ultimamente a tornar-se mais permanente e que a doente atribui à desinfecção frequente das mãos. Desde há 2 anos aparecimento de queixas de dificuldade respiratória, e inicia corticoterapia inalatória diária, inicialmente com 200 mcg de fluticasona dia e actualmente com 500 mcg/dia. Refere em média consumo de beta-2 miméticos 2-3 x/semana, com boa eficácia, considerando-se estabilizada. Despertares nocturnos por causa de dificuldade respiratória aproximadamente 1-2x/semana, sempre com uso de beta-2. Recorre à consulta na sequência de episódio de dificuldade respiratória aguda, edema da face, mal-estar geral e lipotimia, que motivou recurso ao SU, de início cerca de 30 minutos após jantar com amigos em que ingeriu: sopa de legumes, camarão com pêra abacate, lombo de porco recheado com castanhas, arroz, salada de alface e tomate, pudim de chocolate e vinho tinto. Analisando sequencialmente as queixas da doente: Queixas dermatológicas O facto de agravarem nos períodos de trabalho poderia estar associado a contacto com algum alergeneo no trabalho, ou ao aumento de stress devido a este. As queixas de eritema e prurido poderiam dever-se a uma urticária (hiperssensibilidade tipo I), se a reacção fosse imediata, ou a um eczema (hiperssensibilidade tipo IV), se a reacção Página 7 de 9
fosse tardia. Após interrogação mais pormenorizada, a doente referiu que a reacção era principalmente tardia, ou seja, um eczema. Queixas respiratórias Devemos começar por caracterizar melhor esta dificuldade respiratória: Quando ocorre? Em esforço ou em repouso? Reverte espontaneamente ou com medicação? Acontece em algum período específico do ano? Quantas vezes por dia/semana/mês? Tem sintomas acompanhantes? Tosse? Pieira? Sint. Nasais? Sint. Oculares? A dificuldade respiratória desta doente ocorre subitamente, e acompanha de pieira, e reverte com a medicação, tendo agravado ao longo do tempo. Será asma? Investigações: 1) Provas de função respiratória 2) Provas de função respiratória com broncodilatador verificar se e pelo menos 12% reversível após broncodilatador (ex: salbutamol) É ASMA! Caracterizando melhor a asma, temos uma doente que faz terapêutica antiasmática e que mantém sintomas (o uso do β2-mimetico 2/3 vezes por semana dá-nos uma ideia do numero de crises). Assim, para calcular o grau de severidade desta asma, temos de somar ao grau que atribuiríamos pela terapêutica (500mcg de corticóide inalatório + β2-mimetico em SOS e terapêutica apropriada para asma persistente moderada), a severidade dos sintomas remanescentes (sintomas mais frequentes do que 1 vez por semana mas menos frequentes do que 1 vez por dia pertencem a categoria asma persistente ligeira), logo a nossa doente tem asma persistente grave. Quadro actual A doente apresenta uma reacção sistémica, grave e rápida, com o envolvimento de 2 órgãos ou sistemas, após a ingestão de possíveis alergeneos, logo e uma ANAFILAXIA. Qual será o produto que consumiu que provocou esta reacção? - marisco - chocolate - castanha - vinho - pera abacate - tomate Página 8 de 9
Foram feitos testes de alergia a doente, e verificou-se que ela tinha hiperssensibilidade ao látex. Esta hiperssensibilidade e comum em profissionais de saúde, e é importante pensar nela porque origina reacções graves, e porque se podem evitar os problemas respiratórios (o pó das luvas e um alergeneo) usando luvas especiais sem pó ou luvas de nitrito. No entanto, ela não consumiu látex à refeição, o que acontece e que 1/3 dos doentes com hiperssensibilidade ao látex tem o Síndrome Látex-Frutos. Este síndrome caracterizase por uma hiperssensibilidade a certos frutos, como a castanha, a pêra-abacate, a manga e a banana, dado que as proteínas do látex são muito semelhantes às destes frutos. Assim, o produto que provocou esta reacção poderia ter sido a pêra-abacate ou a castanha. Neste caso foi a castanha. É importante pensar no chocolate (ou noutros alimentos como morangos), porque estes desencadeiam a libertação de histamina em doentes susceptíveis. O vinho (sobretudo o vinho branco e o vinho verde) desencadeia a libertação de gás que pode conter sulfitos, desencadeando crises de asma. Anexo: HIDADATIDOSE A hidatidose é uma infecção dos seres humanos provocada pelo estágio de larva do complexo Echinococcus granulosus, E. multicularis ou E. volgeli. Os parasitas do complexo E. granulosus, que produzem lesões quísticas ulioculares, são prevalentes em ares onde o gado é criado na companhia de cães. Os quistos hidáticos de crescimento lento costumam permanecer assintomáticos até que o seu tamanho crescente e o seu efeito de massa no órgão envolvido provoquem sintomas. O fígado e os pulmões são os locais mais comummente afectados por esses quistos. Os doentes com hidatidose hepática que se mostram sintomáticos apresentam-se, com maior frequência, com dor abdominal ou massa palpável no quadrante superior direito. A compressão do ducto biliar pode resultar em icterícia. A ruptura ou o extravasamento episódico de um quisto hidático podem causar febre, prurido, urticária, eosinofilia ou anafilaxia. Página 9 de 9