ATUAÇÃO DE UM BANCO DE DESENVOLVIMENTO PARA A SUPERAÇÃO DA POBREZA: O EXEMPLO DO BANCO DO NORDESTE DO BRASIL



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Transcrição:

ATUAÇÃO DE UM BANCO DE DESENVOLVIMENTO PARA A SUPERAÇÃO DA POBREZA: O EXEMPLO DO BANCO DO NORDESTE DO BRASIL Nelson Antônio de Souza Discutir o tema inclusão produtiva no Brasil remete, necessariamente, ao Banco do Nordeste do Brasil (BNB) e a seus programas de microfinanças urbana e rural. Instituição financeira múltipla criada em 1952, o Banco contribui de forma decisiva para a superação da pobreza no Nordeste e norte de Minas Gerais e Espírito Santo, o chamado Polígono das Secas, mediante apoio creditício a todos os segmentos da economia regional. Com efeito, o BNB faz do segmento de microfinanças uma de suas bandeiras e, hoje, a imensa maioria de seus clientes é composta por microempreendedores. Nesse contexto, as ações do Banco do Nordeste estão perfeitamente integradas ao Plano Brasil sem Miséria. Portanto, tornar-se o banco dos pequenos constitui decisão estratégica que confere valor ainda maior à missão do Banco como agente de transformação do panorama socioeconômico do nordeste brasileiro. Detentor da maior carteira de crédito de longo prazo em sua área de atuação, o BNB notabiliza-se, ao longo de sua história, por apoiar o setor rural e a classe empresarial, bem como por financiar grandes projetos industriais e de infraestrutura, absolutamente necessários ao desenvolvimento e à geração de emprego e renda na região. 1

O BRASIL SEM MISÉRIA Há uma década e meia, o Banco decidiu atuar com outro instrumento voltado para a inclusão produtiva, o microcrédito, buscando contemplar os empreendedores individuais que formam grande parte da população nordestina e que passaram a constituir fundamental extrato na segmentação de clientes da Instituição (Figura 1). Em 1998 o Banco do Nordeste lançou o Crediamigo, programa inspirado em experiências internacionais bem sucedidas de bancos sociais, implantadas em países com características semelhantes às do nordeste brasileiro. A ação do Crediamigo foi pioneira, sendo até mesmo considerada exótica pelo mercado financeiro nacional 1. Após período de maturação e aprimoramento de sua metodologia, o programa tornouse referência internacional, sendo hoje o maior programa de microcrédito produtivo e orientado da América do Sul, com carteira ativa de 1,8 milhão de clientes e R$ 25 bilhões investidos na economia nordestina (posição de agosto de 2014). Em 2005, inspirado em sua experiência com microcrédito urbano, o Banco do Nordeste lançou o Agroamigo (microcrédito rural), voltado para operacionalização do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf). Igualmente exitoso e com atuação fundamental em uma região marcada pela estiagem, o Agroamigo conta com metodologia própria, tendo também a orientação para o crédito como um de seus pilares, bem como a diretriz máxima de contribuir para a redução da pobreza no Nordeste e para a permanência do homem no campo, por meio do incentivo ao empreendedorismo. Na posição de agosto de 2014, o Agroamigo já havia atendido mais de 1,3 milhão de pessoas e já havia destinado valor superior a R$ 5,4 bilhões a atividades desenvolvidas em áreas rurais. 1 SOUZA, 2010. 2

Figura 1 Segmentação de clientes BNB GRANDE MÉDIO INFORMAL FORMAL CREDIAMIGO EMPREENDEDOR URBANO PEQUENO MICROEMPRESA EMPREENDEDOR RURAL AGROAMIGO SERVIÇO INDÚSTRIA COMÉRCIO AGROPECUÁRIA E AGROINDÚSTRIA ATIVIDADES LEGALIZADAS Fonte: BNB. Mas qual seria o segredo dos programas de microfinanças do Banco do Nordeste do Brasil? Quais aspectos que, aliados a outras políticas sociais do governo, os tornam efetivos na superação da vulnerabilidade social no Nordeste? CREDIAMIGO E SEU CARÁTER INOVADOR Inovação no sistema brasileiro nacional, o Crediamigo tem no aval solidário uma de suas maiores forças. Ao considerar que microempreendedores informais não dispõem de garantias reais ou comprovação de renda, a proposta para viabilizar os empréstimos reside, essencialmente, na exigência de colateral nas operações de crédito. Ou seja, os integrantes dos grupos formados por três a 30 empreendedores independentes avalizam-se e responsabilizam-se por todo o crédito. 3

O BRASIL SEM MISÉRIA A estratégia proporciona acesso fácil e desburocratizado aos empréstimos, contribuindo ainda para o empoderamento desses clientes, por meio de repasse de informações importantes para o gerenciamento de sua atividade ou mesmo por intermédio da inclusão dessas pessoas em novos grupos sociais. Sacoleiros (as), costureiros (as), vendedores (as) de pipoca, feirantes, cabeleireiros (as), trabalhadores (as) autônomos que sempre estiveram à margem do sistema financeiro nacional, obrigando-se, em geral, a recorrer a fontes informais, passam a ter carências de capital de giro e investimento supridas com crédito bancário. Créditos de curto prazo, mais de 80% deles com valor entre R$ 100 e R$ 2 mil, e taxas de juros substancialmente inferiores às praticadas no mercado brasileiro fizeram e fazem a diferença na vida de milhões de pessoas que conseguem progressos em seus empreendimentos. Ressalte-se que cerca de 90% das operações do Crediamigo financiam atividades ligadas ao comércio, 9% ao setor de serviços e 1% às indústrias. Outro diferencial do programa é a orientação para o crédito, promovida por meio dos assessores do Instituto Nordeste Cidadania (Inec), Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) 2 responsável pela operacionalização do programa. Nesse modelo, o assessor de crédito presta atendimento personalizado ao empreendedor, no sentido de orientá-lo em suas necessidades básicas de gestão. Esses diferenciais possibilitam ao Banco do Nordeste do Brasil realizar, em média, 15 mil operações por dia no âmbito do Crediamigo, apresentando taxa de inadimplência inferior à média do Sistema Financeiro Nacional (a taxa de inadimplência até 90 dias era de 0,78% na posição de agosto de 2014), fazendo valer a máxima de que os mais pobres são melhores pagadores, sobretudo se os recursos tomados de empréstimo direcionam-se à atividade produtiva que garante a 2 Regulamentada pela Lei n.º 9.790, de 23 de março de 1999. Enquadram-se como Oscip pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, desde que os respectivos objetivos sociais e normas estatutárias atendam aos requisitos instituídos por essa Lei. 4

subsistência da família. O programa se faz presente em 1.995 municípios, por meio de 280 agências e 244 postos de atendimento. AGROAMIGO: ACOMPANHAMENTO E ORIENTAÇÃO Na zona rural, o Banco do Nordeste também assume papel relevante no Plano Brasil sem Miséria por meio da operacionalização do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), sendo responsável pela contratação de quase 75% dos financiamentos na Região. Entre os beneficiários atendidos pelo Pronaf incluem-se agricultores familiares, cujo rendimento bruto anual não ultrapassa R$ 20 mil, estando sujeitos a situações de vulnerabilidade, sobretudo nos períodos de seca. Esses trabalhadores se enquadram no Grupo B do Pronaf, público para o qual se direciona, inicialmente, o Programa de Microcrédito Produtivo e Orientado Rural do Banco do Nordeste, o Agroamigo. O participante do Pronaf do Grupo B contrai empréstimo de até R$ 4 mil por operação, com taxa de juros de 0,5% ao ano e prazo de pagamento de até dois anos. Para ter direito a esses recursos, o produtor rural precisa estar de posse de sua Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP), documento que o enquadra como beneficiário e delimita seu porte. O crédito é concedido mediante apresentação de projeto, e é nesse aspecto que o Agroamigo faz a diferença. Operacionalizado pelo Instituto Nordeste Cidadania (Inec), o Agroamigo tem a figura do assessor de crédito como seu diferencial. Por meio dessa equipe qualificada, o Agroamigo chega às mais distantes localidades rurais, levando orientação creditícia a quem mais precisa. O acompanhamento ao empreendimento é feito antes e após o desembolso dos recursos, assegurando padrão de desenvolvimento sustentável para as atividades financiadas. Eleito em 2010 por concurso promovido pela Escola Nacional de Administração Pública (Enap) como uma das dez melhores experiências em Inovação da Gestão Pública, 5

O BRASIL SEM MISÉRIA o programa, em permanente expansão, é responsável por projetos maiores, com valores de até R$ 15 mil, sempre no âmbito do Pronaf, envolvendo outras linhas de crédito. Sua carteira ativa, na posição de setembro de 2014, chegava a R$ 2,3 bilhões. Evidenciando sua contribuição ao Plano Brasil sem Miséria, o Agroamigo contabiliza 936,5 mil operações de crédito ativas (contratadas no período de 2011 a setembro de 2014), das quais 591,0 mil destinam-se a beneficiários do Bolsa Família. Mais da metade das operações é contratada por mulheres (51%). Do total de financiamentos, 79% beneficiam afrodescendentes, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) e do Ambiente de Microfinança Rural e Agricultura Familiar do Banco do Nordeste. Gráfico 1 Públicos beneficiários da microfinança rural do Banco do Nordeste Total de operações Operações com beneficiários do Bolsa Família Operações com pessoas do Cadastro Único (*) Operações ativas contratadas no período de 2011 a setembro de 2014. Fonte: BNB, MDS e MDA. 6

MULHERES E MICROFINANÇAS A exemplo da experiência de microcrédito produtivo em Bangladesh 3, o Crediamigo tem grande participação feminina. Com os dados de agosto de 2014, 67% de seus clientes são mulheres. Ou seja, sobressai-se a figura da mulher como provedora do sustento da família ou exercendo atividade para complementar a renda familiar, visando a assegurar comida na mesa, melhoria das condições de moradia e educação de melhor qualidade para os filhos. Na opinião de especialistas em microcrédito, como Dundord e Watson 4, as mulheres representam menor risco de crédito do que os homens, pois aproveitam-se mais da estrutura dos grupos solidários para empoderar-se, valorizando a coletividade. Logo, pode-se considerar a participação feminina decisiva para o sucesso do Crediamigo. INTEGRAÇÃO AO BOLSA FAMÍLIA Ao integrar seus programas de microcrédito ao Plano Brasil sem Miséria, o Banco do Nordeste contribui para o objetivo principal de elevar a renda e as condições de bem-estar da população, o que acontece por meio da concessão direta de crédito aos beneficiários do Programa Bolsa Família. O público-alvo do Bolsa Família tem renda familiar mensal de até R$ 154 por pessoa. A essas famílias é pago o benefício que visa a promover o alívio imediato da pobreza e, em consonância com a ação complementar dos programas de microfinanças, os beneficiários ganham melhor inserção no mercado produtivo. 3 Iniciativa implementada na década de 1970 pelo professor de Economia Muhammad Yunus, que inspirou a concepção da metodologia do Crediamigo. 4 BRAGA, LEANDRO E LYRA JÚNIOR, 2012. 7

O BRASIL SEM MISÉRIA Levantamento realizado em 2013 aponta que cerca de 45% dos clientes do Crediamigo são beneficiários do Programa Bolsa Família, percentual que ilustra bem o foco do Crediamigo em empreendedores de mais baixa renda. Na zona rural, esse percentual se eleva para 59% dos clientes do Agroamigo. A fim de potencializar essa parceria, os assessores de microcrédito reúnem os beneficiários do Bolsa Família para falar do microcrédito e orientá-los quanto ao uso dos recursos. Em 2013, foram distribuídas 500 mil cartilhas de Orientação Empresarial e Ambiental entre todos os clientes do Crediamigo, cujo tema era Quem manda no meu dinheiro?. O conteúdo dessas cartilhas é discutido com os clientes em palestras informativas realizadas nas comunidades. Portanto, Crediamigo e Agroamigo têm como base o crédito responsável a fim de não gerar o endividamento do cliente e poder contribuir no crescimento de seu empreendimento e, consequentemente, na melhoria dos indicadores sociais da região. É inegável que a integração ao Bolsa Família intensifica o combate à pobreza, contribuindo para a redução das desigualdades sociais e para a geração de renda. BRASIL SEM MISÉRIA TAMBÉM NO CAMPO No âmbito do Brasil sem Miséria, definiu-se como uma das prioridades para o meio rural o Programa de Fomento às Atividades Produtivas Rurais, promovido em conjunto pelos ministérios do Desenvolvimento Social e do Desenvolvimento Agrário. O Programa objetiva estimular a geração de trabalho e renda e promover a segurança alimentar e nutricional de seus beneficiários, público constituído de agricultores familiares, silvicultores, aquicultores, extrativistas e pescadores, que se enquadrem nas disposições da Lei nº 1.326, de 24 de julho de 2006, e que se encontrem em situação de extrema pobreza. 8

Nesse foco, enquadram-se famílias com renda per capita de até R$ 77 por mês. No Programa de Fomento, o responsável pela família recebe R$ 2,4 mil ao longo de dois anos, divididos em até três parcelas, para implantar atividades produtivas rurais visando à manutenção e segurança alimentar da família. AVANÇOS NO MICROCRÉDITO Com efeito, as experiências com microfinanças acabaram gerando outros avanços fundamentais no sentido de aprimorar esse tipo de política. Assim é que, integrando as ações de desenvolvimento econômico, foi instituído pela Lei n.º 11.110, de 25 de abril de 2005, o Programa Nacional de Microcrédito Produtivo Orientado (PNMPO), que sistematiza um marco legal para a atuação em microcrédito no Brasil. No âmbito do PNMPO, define-se microcrédito como o crédito concedido para o atendimento das necessidades financeiras de microempreendedores, mediante utilização de metodologia baseada no relacionamento direto no local em que é executada a atividade econômica 5. O PNMPO, dessa forma, objetiva incentivar a geração de trabalho e renda entre os microempreendedores populares; disponibilizar recursos para o microcrédito produtivo orientado; e oferecer apoio técnico às instituições de microcrédito produtivo orientado, com vistas ao seu fortalecimento para a prestação de serviços aos empreendedores populares. Assim, as atividades de microcrédito desenvolvidas por diversas instituições no Brasil, a exemplo do Banco do Nordeste, se referenciam no Programa Nacional, o que permite alinhar as atuações, padronizar a linguagem em uso, estimular 5 O Decreto n.º 6.607, de 21 de outubro de 2008, delimita que microempreendedores populares são as pessoas físicas e jurídicas empreendedoras de atividades produtivas de pequeno porte, com renda bruta anual de até R$ 120 mil. 9

O BRASIL SEM MISÉRIA novas práticas em microcrédito, desenhar diretrizes para comparabilidade e para transparência no setor, conhecer as melhores práticas e as linhas de financiamento de crédito praticadas no país. O PNMPO ainda determina que o atendimento ao empreendedor deve ser feito por pessoas treinadas para efetuar o levantamento socioeconômico e prestar orientação educativa sobre o planejamento do negócio, para definição das necessidades de crédito e de gestão voltadas para o desenvolvimento do empreendimento. Alem disso, o contato com o empreendedor deve ser mantido durante o período do contrato de financiamento, visando ao seu melhor aproveitamento e a sua melhor aplicação, bem como ao crescimento e à sustentabilidade da atividade econômica; e o valor e as condições do crédito devem ser definidos após a avaliação da atividade e da capacidade de endividamento do tomador final dos recursos, em estreita interlocução com este. Outro avanço ocorre em 2011, quando o governo federal lança o Programa Crescer, com base nas diretrizes do PNPMO e tendo como referência o Crediamigo. O Crescer integra o conjunto de ações relativas ao eixo de inclusão produtiva do Plano Brasil sem Miséria, que conta ainda com os eixos garantia de renda e acesso a serviços. Os bancos públicos autorizados a operacionalizar o Crescer beneficiam milhões de empreendedores, que passam a contrair empréstimos com juros reduzidos. Dos R$ 13,8 bilhões desembolsados no âmbito do Crescer, 73% (mais de R$ 10 bilhões) são contratados pelo Crediamigo. O Banco do Nordeste assegura no âmbito do Crescer juros de 5% ao ano aos empreendedores nordestinos, colaborando de modo decisivo para o aumento do lucro de suas atividades e, consequentemente, para melhoria da qualidade de vida de suas famílias. 10

PROGRAMA CISTERNAS No esforço de contribuir para superar a pobreza na região, o Banco do Nordeste também é parceiro do Programa de Universalização do Acesso à Água (conhecido como Programa Água para Todos), incluso no Territórios da Cidadania 6. Os principais objetivos de sua ação, firmados com o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), em junho de 2010, voltam-se para o fortalecimento da agricultura familiar. O Programa Água para Todos também prioriza famílias inseridas no Cadastro Único para Programas Sociais e se inclui no Plano Brasil sem Miséria. Segundo dados do MDS, até setembro de 2014, 725 mil cisternas com capacidade unitária de armazenagem de 16 mil litros haviam sido construídas. A meta de 2014 prevê contemplar 750 mil famílias 7. Em ações integradas com o MDS, o Banco tem atuação importante como um dos parceiros do Programa Cisternas, que faz parte do Água para Todos e visa garantir acesso pleno à água potável em áreas rurais para consumo humano e produção agrícola. As cisternas permitem a captação e o armazenamento da água da chuva, fazendo grande diferença na vida de milhões de nordestinos que sofrem com as frequentes estiagens. Outros aspectos relevantes do Programa Água para Todos residem no fato de que 73% dos responsáveis pelas cisternas são mulheres, 80% dos beneficiados são negras ou negros, 4.956 famílias indígenas e 9.967 famílias quilombolas foram contempladas. 6 O Programa Territórios da Cidadania, lançado em 2008 pelo governo federal, tem como objetivos promover o desenvolvimento econômico e universalizar programas básicos de cidadania por meio de uma estratégia de desenvolvimento territorial sustentável. 7 Para mais informações sobre o Programa Água para Todos, ver artigo A inclusão produtiva rural no Plano Brasil sem Miséria: síntese da experiência recente de políticas públicas para o atendimento dos mais pobres no rural brasileiro. 11

O BRASIL SEM MISÉRIA Por suas características, o Programa assume caráter complementar aos programas de financiamento voltados para a agricultura familiar, como o Agroamigo, considerando que traz melhoria na capacidade hídrica de empreendimentos rurais, o que beneficia grande parte das atividades financiadas no âmbito do Pronaf. Além disso, o Programa Água para Todos envolve formação e capacitação para convivência com o semiárido, em consonância com o propósito do Banco do Nordeste de fixar o homem no campo, dotando-o de condições para que ele desenvolva com êxito suas atividades produtivas. ANÁLISE DE IMPACTO DO AGROAMIGO Voltando ao Agroamigo e ao Crediamigo, convém ressaltar alguns resultados relevantes que impactam diretamente a vida dos clientes desses programas. Comecemos pelo Agroamigo. Estudo organizado pelo pesquisador Ricardo Abramovay 8, da Universidade de São Paulo, avalia o impacto da atuação do Agroamigo nas zonas rurais nordestinas. A pesquisa leva em conta indicadores como posses de bens duráveis e meios de transporte, infraestrutura domiciliar e acesso a serviços, como água filtrada e saneamento, em comunidades rurais dentro e fora do semiárido. Comparando clientes mais antigos e recém-ingressos no Agroamigo, o pesquisador constata melhorias de produtividade nos empreendimentos dos primeiros. De acordo com a pesquisa, maior tempo de exposição ao programa significa maior valor do rebanho, enquanto os mais antigos não só alcançam crescimento médio de 19% no valor de seus rebanhos como tendem a ter vendas cerca de 40% mais elevadas, na comparação com os que acabam de ingressar no Agroamigo. 8 ABRAMOVAY, 2012. 12

Em 2011, pesquisa realizada pela área de marketing do Banco do Nordeste aponta que 98,5% dos clientes do Agroamigo consideram entre bom e ótimo o atendimento do assessor de crédito. Na mesma enquete, percentual elevado atesta melhorias após tornar-se cliente: 40,8% afirmam que aumentaram a produção, 32,7% que ampliaram a renda e 19,6% que puderam investir mais em pecuária. Do total de entrevistados, 96,1% manifestam o desejo de realizar novo financiamento. PESQUISAS COMPROVAM RESULTADOS Já em relação ao Crediamigo, a melhoria de qualidade de vida dos clientes do Programa é confirmada pela Fundação Getúlio Vargas 9. Estudo publicado em 2008, constata que 60% dos empreendedores expostos ao Crediamigo há mais de cinco anos transpuseram a linha de pobreza. A pesquisa descreve e analisa quantitativamente o impacto de programas sociais de microcrédito na economia nordestina, considerando clientes ativos do Crediamigo em 2006, com especial atenção para os clientes com renda familiar inferior a meio salário mínimo. De acordo com o estudo, a probabilidade de um cliente do Crediamigo ultrapassar a renda mensal de meio salário mínimo por pessoa aumenta consideravelmente a cada seis meses, quando o cliente se mantém ativo, e mais ainda quando permanece por mais de cinco anos no Crediamigo. Para clientes recém-ingressos, a probabilidade varia entre 36% e 41%. Na mesma linha, estudo realizado pelo Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste (Etene), órgão ligado ao Banco do Nordeste, aponta o microcrédito como fator importante para a sustentabilidade da atividade econômica 9 NERI, 2008. 13

O BRASIL SEM MISÉRIA desempenhada por microempresários sem muitos recursos, constatando aumento da lucratividade para a maior parte dos clientes. Em relação aos indicadores que se referem à renda e à capacidade de pagamento, esses são diretamente proporcionais ao tempo de exposição ao Crediamigo. As mudanças tornam-se mais evidentes a partir de onze contratações. Quanto ao nível de estruturação do negócio, diz o estudo, a permanência no programa promove uma mudança no nível de Subsistência e Acumulação Simples, cujos faturamentos brutos não ultrapassam R$ 60 mil por ano, para Acumulação Ampliada (faturamento entre R$ 60 e R$ 120 mil anuais). A mudança representa maior estabilidade na atividade desempenhada, gerando resultados positivos. Em relação aos indicadores de qualidade de vida, a pesquisa observa melhoria significativa no tipo de residência própria. Grande parte dos clientes deixa de morar com parentes ou em casa emprestada e adquire casa própria, de acordo com o Etene. CONSIDERAÇÕES FINAIS Os resultados e impactos da atuação do Banco do Nordeste nos diferentes programas voltados para a superação da pobreza no Brasil, analisados neste artigo de forma resumida, evidenciam a importância de políticas e programas estrategicamente concebidos com a visão de melhorar a vida das pessoas, inserindo-as no campo produtivo e permitindo-lhes viver com dignidade. Dessa forma, apoiar microempreendedores urbanos, criando soluções inovadoras para levar crédito produtivo e orientado a pessoas nas cidades até então excluídas do sistema financeiro; prover orientação e acompanhamento para os agricultores familiares; e criar condições para a universalização da água nas zonas rurais são ações que fazem do Banco do Nordeste do Brasil um grande parceiro do Plano Brasil sem Miséria. Os resultados vivenciados por nós do Banco do Nordeste e apontados em pesquisas (envolvendo aumento de produtividade, de renda e de acesso a bens de 14

consumo), falam por si e validam a importância do crédito para o desenvolvimento de pequenos empreendedores. Nesse sentido, o processo de inclusão produtiva apresentado na região Nordeste nos impulsiona, como banco de desenvolvimento regional, a buscar cada vez mais aprimorar nosso atendimento e apoio às empreendedoras e aos empreendedores nordestinos, razão de nossa existência como instituição. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABRAMOVAY, Ricardo; et al. Cinco anos do Agroamigo: retrato do público e efeitos do Programa. 1.ª ed. Fortaleza: Banco do Nordeste do Brasil, 2012. BARBOSA, Cristiane Garcia; TEIXEIRA, Marcelo Azevedo; DAMASCENO, Wellington Santos (Orgs.). A experiência dos Programas de Microfinanças do Banco do Nordeste. 1.ª ed. Fortaleza: Banco do Nordeste do Brasil, 2012. BRAGA, Maria Goretti Serpa; LEANDRO, Charles Diniz; LYRA JÚNIOR, Stélio Gama. Microcrédito como ação complementar ao Programa Bolsa-Família: a experiência do Crediamigo do BNB. In: BARBOSA, Cristiane Garcia; TEIXEIRA, Marcelo Azevedo; DAMASCENO, Wellington Santos (Orgs.). A experiência dos Programas de Microfinanças do Banco do Nordeste. 1.ª ed. Fortaleza: Banco do Nordeste do Brasil, 2012. ETENE. Avaliação do Programa Crediamigo: Melhoria das Condições de Vida. Fortaleza: Banco do Nordeste do Brasil, 2014. NERI, Marcelo; et al. Microcrédito, o mistério nordestino e o Grameen brasileiro: perfil e performance dos clientes do Crediamigo. 1.ª ed. Rio de Janeiro: FGV, 2008. SOUZA, Célia Garcia. O desenho do programa Crediamigo do Banco do Nordeste: inclusão social e mercado. 1.ª ed. Fortaleza: Banco do Nordeste do Brasil, 2010. 15