Palavras-chaves: inovação tecnológica, estrutura de mercado, indústria farmacêutica.



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ESTRUTURA DE MERCADO E INOVAÇÃO TECNOLÓGICA: UMA ANÁLISE DA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA BRASILEIRA RESUMO - A proposta deste artigo é caracterizar o processo inovativo na indústria farmacêutica brasileira, a partir da análise do número de patentes depositadas no Brasil, da participação no mercado e do desempenho de empresas, nacionais e estrangeiras, na década de 90. Questiona-se se um pequeno número de grandes empresas, em geral, estrangeiras, seria capaz de promover a mudança tecnológica em empresas nacionais, ou estaria contribuindo para aumentar as diferenças entre essas, comprometendo, conseqüentemente, o bem estar social no país. Palavras-chaves: inovação tecnológica, estrutura de mercado, indústria farmacêutica. 1. Introdução A análise das relações entre estrutura de mercado e inovação tecnológica é controversa. Enquanto a visão schumpteriana associa uma maior intensidade tecnológica a empresas de maior tamanho, a abordagem neoclássica evidencia o papel das médias e pequenas empresas. A relação entre concentração de mercado e inovação tecnológica, por sua vez, também, não é conclusiva. Segundo SCHUMPETER (1961), a concentração seria condição necessária para a geração de inovações tecnológicas, uma vez que são os monopólios de curta duração que viabilizam a introdução de inovações capazes de impulsionar a competitividade e a dinâmica econômica, o que leva, portanto, a própria eliminação dessa, sem necessidade de interferência do Estado. A inovação exige um alto volume de gasto, o qual, por sua vez, está, em geral, associado a grandes empresas. Essas, por sua vez, só são grandes em função de trajetórias passadas de construção de vantagens competitivas que permitiram a apropriação e a acumulação de lucros. Para STEINDL (1990), no entanto, os diferenciais de custos gerados pelas economias de escala, relacionados com as grandes empresas, favorecem o crescimento mais rápido da escala e a obtenção de novos diferenciais de custos, originando assimetrias cada vez mais difíceis de serem superadas pelo simples crescimento de firmas pequenas. Segundo POSSAS (1990), essas assimetrias de tamanho, que também se refletem em assimetrias de lucro, conduzem à concentração de mercado. Essa, por sua vez, fruto do gradativo processo de expansão das grandes empresas e do deslocamento da pequena empresa, não representa uma garantia de progresso técnico e de redução de custos. STEINDEL (1990, p. 116) também defende que uma grande empresa em vias de expansão tenderá a converter seu maior tamanho numa vantagem para si, dispondo de outros meios que não a redução dos custos. Apesar das controvérsias, sabe-se que, em geral, o esforço relativo em P&D (gastos com P&D/vendas, ou gastos com P&D/lucros) ou o número de patentes de pequenas empresas é pequeno, comparativamente ao das grandes empresas (SCHERER, 1980). No entanto, é questionável o diferencial entre médias e grandes empresas. Um menor número de grandes empresas implica em uma maior concentração de mercado (maior poder de monopólio), o que tem implicações não só do ponto de vista do consumidor (maior preço), mas também, tecnológico (sob um ambiente de baixa concorrência, as empresas teriam pouco estímulo para o desenvolvimento tecnológico). 1

Objetiva-se, portanto, nesse trabalho, parte de um projeto maior que analisa setores diferenciados por nível tecnológico (número de patentes depositadas no Brasil) 1, e por origem de capital predominante (estrangeiro, nacional e estatal), verificar as relações existentes entre estrutura de mercado e inovação na indústria farmacêutica, setor de alta intensidade tecnológica. Desde a década de 50, verifica-se nessa indústria o domínio do capital estrangeiro e a tendência à concentração de mercado. Em 1957, dezenove estabelecimentos de grande porte, apenas dois nacionais, eram responsáveis por 76,3% do abastecimento do mercado e, em 1976, de um total de 460 empresas, 391 nacionais atendiam 15,7% do mercado, e as demais, estrangeiras, 84,3%, sendo a parcela das vinte maiores de 47% (KUCINSK e LEDOGAR, 1977, citados por GIOVANNI, 1980). Não pode-se afirmar, no entanto, que o esforço inovativo 2 na indústria farmacêutica esteja positivamente ou negativamente relacionado com a concentração de mercado, o que contribuiu, ao longo dos anos, para a polêmica sobre a definição do direcionamento da questão tecnológica nessa indústria. Cabe ressaltar que apesar de o Brasil ter sido um dos primeiros países a permitir o patenteamento de produtos e o de processos farmacêuticos, passou a não reconhecê-los em 1945 e 1969, respectivamente, suspendendo-os, oficialmente, em 1971 (MELLO, 1995). Acreditava-se, a partir da visão de que a concentração de mercado teria um efeito negativo sobre o esforço inovativo nacional, que a suspensão do patenteamento pudesse fortalecer a indústria brasileira e incentivar a pesquisa. Dadas as inúmeras pressões, ameaças de sanções e retaliações comerciais ao país, em 1996, o Código de Propriedade Industrial (Lei n o. 9.279) reconheceu a permissibilidade de patentes na indústria farmacêutica, mesmo sob o receio de que essa pudesse aumentar a concentração, e, conseqüentemente, elevar os preços de medicamentos (VARELLA, 1996), dada a menor competitividade das empresas nacionais, via inovação. Uma das justificativas para o reconhecimento foi a transferência de tecnologia de empresas estrangeiras para nacionais. Não haviam, no entanto, garantias de que essa ocorreria. Além da obrigatoriedade, no Brasil, do uso efetivo da patente, pelo titular, no máximo um ano após o depósito dessa, não poder ser garantida, dadas as dificuldades de controle pelo governo, a transferência estaria atrelada ao desenvolvimento de tecnologia própria, mesmo que de caráter adaptativo (BARBIERI, 1990). Por outro lado, as empresas estrangeiras, em geral, maiores que as domésticas, poderiam utilizar seu tamanho como vantagem, negligenciando o progresso técnico ou não transferindo tecnologia para empresas nacionais, gerando, possivelmente, uma maior dependência externa do país. É questionável, portanto, a visão de que o melhor caminho para uma mudança tecnológica na indústria farmacêutica, no Brasil, seria a partir de um pequeno número de grandes empresas, ainda mais sob um novo paradigma tecnológico-organizacional, que, segundo NAKANO (1994), privilegia estruturas menores, ágeis e flexíveis, e a formação de networks (redes). Objetivando identificar alguns dos principais traços do processo inovativo na indústria farmacêutica, na década de 90, caracterizou-se, nesse estudo, o esforço inovativo (patenteamento), a concentração de mercado, e o desempenho de 129 empresas do setor de medicamentos, 87 nacionais e 42 estrangeiras, no período de 1995 a 2001, assim como as relações entre tamanho da empresa (pequena, média, intermediária e grande), origem de capital (nacional e estrangeiro), patenteamento e lucratividade 3. 1 Os demais setores analisados são o agrícola e o metalúrgico. 2 O esforço inovativo é, em geral, medido em termos de gastos com P&D (indicador de entrada) ou número de patentes concedidas ou depositadas (indicadores de saída) (HASENCLEVER e FERREIRA, 2002). Adota-se, nesse estudo, o número de patentes depositadas no Brasil pelas empresas analisadas. 3 A lucratividade adotada nesse estudo é a obtida pela empresa, como um todo, no período analisado. 2

2. O patenteamento na indústria farmacêutica Para a amostra analisada, de um total de 5.244 patentes depositadas no Brasil, 5.165 (98,49%) foram do tipo PI (patente de invenção), 43, DI (desenho industrial), 22, MU (modelo de utilidade) e 14, MI (modelo industrial). A maioria das patentes, 97,54%, foi do tipo PI e depositada por empresas de capital estrangeiro, indicando, dada a relação entre controle do capital (nacional e estrangeiro) e titular da patente (residentes e não-residentes), a predominância de patentes do tipo PI, concedidas a não-residentes. As participações das empresas de capital estrangeiro nos depósitos de patentes MU, MI e DI também foram superiores às de empresas de capital nacional (FIGURA1). DI - E 0,72% DI - N 0,10% MU - N 0,17% MI - N 0,04% MI - E 0,23% MU - E 0,25% PI - N 0,95% PI - E 97,54% Fonte: Elaborada pela autora, com base nos dados do INPI - INSTITUTO NACIONAL DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL (2003). Figura 1 Participação de PI, DI, MU e MI de empresas de capital nacional (N) e de capital estrangeiro (E) no total de patentes depositadas no setor de medicamentos do Brasil. A princípio, a predominância de PI poderia indicar um alto dinamismo tecnológico no país, uma vez que essas são patentes de maior conteúdo tecnológico, ou seja, que o setor de medicamentos no Brasil inova muito mais do que adapta as tecnologias existentes. No entanto, como colocado anteriormente, o depósito de patentes não é uma garantia da exploração dessas, principalmente quando esse é realizado por não-residentes. Como pode ser observado na TABELA 1, no Brasil, de 1993 a 1999, um maior número de patentes de invenção concedidas a não-residentes esteve, em geral, relacionado a um menor número de licenças de exploração. Pode-se dizer, portanto, que o aumento de patentes de invenção concedidas a não-residentes verificado no período não esteve acompanhado, necessariamente, de uma elevação no número de licenciamentos, o que sugere a não exploração de algumas patentes depositadas no Brasil por empresas estrangeiras, questão, no entanto, que merece maiores estudos. 3

Tabela 1 Correlações entre os números de licenças de exploração de patentes (remessas) e de patentes concedidas no Brasil (PI, MU, DI de não-residentes, Nres, e totais), no período de 1993 a 1999. PI Nres PI Total UM Nres MU Total DI Nres DI Total Total Nres Total Licenças -0,80-0,75 0,05 0,10-0,53-0,52-0,73-0,64 Fonte: Elaborada pela autora, com base nos dados do MCT MINISTËRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA (2002). A partir da análise da distribuição dos depósitos de patentes entre empresas nacionais e estrangeiras, verificou-se, também, que em extratos com mais de 200 patentes (TABELA 2), oito empresas estrangeiras foram responsáveis por 60,47% dos depósitos no Brasil, e apenas uma empresa nacional foi identificada em extratos com mais de 20 patentes. Confirmou-se, portanto, o domínio da tecnologia por empresas de capital estrangeiro, dada a baixa participação das nacionais nos depósitos de patentes. Tabela 2 Distribuição das empresas nacionais e estrangeiras por faixas (número de patentes depositadas no Brasil). Faixa N o. de empresas nacionais N o. de empresas estrangeiras Sem patentes 67 7 1 a 5 patentes 16 10 6 a 20 patentes 3 6 21 a 50 patentes 0 3 51 a 200 patentes 0 8 201 a 500 patentes 1 5 Acima de 500 0 3 Total de empresas 87 42 Fonte: Elaborada pela autora, com base nos dados do INPI (2003). 3. A estrutura de mercado e a lucratividade na indústria farmacêutica Tomou-se como base para a definição da estrutura de mercado da indústria farmacêutica, a Receita Bruta de Vendas (RBV). Como pode ser visto na TABELA 3, apesar dessa, em 1998 e 2000, ter apresentado um ligeiro crescimento, a tendência, em termos de volume vendido, para o setor como um todo, foi decrescente. Em 2002, as vendas de medicamentos no Brasil, em unidades, foram as menores dos últimos seis anos, cerca de 1,61 bilhões de unidades, o que levou o país a sair do 7º para o 12º lugar no ranking mundial (FEBRAFARMA FEDERAÇÃO BRASILEIRA DA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA, 2003). 4

Tabela 3 Evolução da receita (vendas sem impostos) e do volume vendido (unidades) na indústria farmacêutica, no período de 1997 a 2001. 1997 1998 1999 2000 2001 Receita (US$ bilhões) 8,537 8,660 6,538 6,706 5,758 Taxa de crescimento (%) - 1,4% -24,5% 2,6% -14,1% Unidades vendidas (bilhões) 1,854 1,814 1,779 1,698 1,641 Taxa de crescimento (%) - -2,1% -2,0% -4,6% -3,3% Fonte: FEBRAFARMA (2003). Por outro lado, a partir da análise dos Índices Geral de Preços (IGP) e de Preços por Atacado (IPA), pôde-se constatar elevadas variações acumuladas nos preços até 1994, tanto para o setor farmacêutico como para a indústria de transformação, possivelmente em função do processo inflacionário (TABELA 4). Pós 1994, as variações decresceram continuamente até 1998, mas em menor intensidade na indústria farmacêutica, onde as menores foram observadas em 2000 e 2001. Essas se deram, possivelmente, em função da política de tabelamento de preços, que o governo brasileiro vem adotando desde de dezembro de 2000. Tabela 4 Variações de preços, acumuladas no ano, com base nos Índices Geral de Preços (IGP) e de Preços por Atacado (IPA), para as indústrias de transformação e farmacêutica, de 1993 a 2001. 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 Indústria de Transformação 2.555,0 925,6 13,8 3,8 3,0 0,0 27,7 11,5 10,5 Indústria Farmacêutica 3.122,5 910,8 21,1 16,4 12,3 10,6 17,2 2,0 7,7 Fonte: IBGE (2001), citado pelo MDIC MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO, DA INDÚSTRIA E COMÉRCIO EXTERIOR (2002). Pode-se dizer, portanto, que, de 1997 a 2001, os aumentos que ocorreram na receita gerada na indústria farmacêutica deram-se sob a combinação de pequenas variações positivas nos índices de preços, comparativamente aos demais anos, e de quedas nas quantidades de unidades vendidas nesses anos (TABELAS 3 e 4). Do ponto de vista das empresas analisadas, observou-se, a partir da receita bruta de vendas (RBV) média gerada por essas, de 1995 a 2001, que 20 empresas, de um total de 114, cinco nacionais e quinze estrangeiras, atenderam, em média, a 75,52% do mercado (TABELA 5). Verificou-se, portanto, o aumento da concentração de mercado, comparativamente à observada em 1975, onde a parcela de mercado das vinte maiores era de 47%. Segundo GIOVANNI (1980), a estrutura concentrada 4 da indústria farmacêutica, que foi se consolidando ao longo dos anos, talvez possa ser explicada, pela ausência de políticas de crédito que estimulassem as empresas nacionais, num momento em que a produção mundial 4 Essa concentração se torna ainda maior quando a análise é por classe terapêutica (GIOVANNI, 1980). 5

passava por intensas transformações tecnológicas, e, também, por políticas que facilitaram a entrada de empresas estrangeiras no Brasil. Tabela 5 Concentração de mercado (RBV), no período de 1995 a 2001. Empresas Estrangeiras Empresas Nacionais Total Faixa N o. Parcela (%) N o. Parcela (%) N o. Parcela (%) 5,75 a 10,57% 4 29,81 1 6,75 5 36,56 2,12 a 4,53% 7 20,73 4 12,13 11 32,86 1,00 a 1,92% 4 6,10 3 3,70 7 9,80 Menos 1% 18 8,84 73 11,94 91 20,78 Total 33 65,48 81 34,52 114 100 Fonte: Elaborada pela autora, com base nos dados da GAZETA MERCANTIL (2002). Quanto ao desempenho, verificou-se que das 42 empresas que apresentaram prejuízo, 78,57% eram de controle nacional. Dentre as que apresentaram lucro (72), apesar da maioria ser nacional (49), a concentração ocorreu em faixas inferiores a 1% dos lucros do mercado. De forma geral, observou-se que 74,97% do lucro e 82,69% do prejuízo do setor foram gerados, respectivamente, por dez e quatorze empresas. À medida que a participação no lucro, por faixa, aumentou, reduziu-se o número de empresas, mas elevou-se a participação conjunta dessas, caracterizando-se, portanto, a concentração de mercado, em termos de lucratividade, no setor de medicamentos (TABELA 6). Tabela 6 Participação no Lucro/Prejuízo Líquido (L/PL), de 1995 a 2001. Participação no Lucro Líquido (LL) Participação no Prejuízo Líquido (PL) Faixa N o. de empresas Parcela de mercado (%) Faixa N o. de empresas Parcela de mercado (%) 9,45 a 17,85% 3 38,43 11,20 a 19,78% 3 43,36 3,45 a 6,80% 7 36,55 2,44 a 6,33% 11 39,34 1,18 a 2,02% 10 14,70 1,04 a 1,78% 4 5,87 Menos de 1% 52 10,32 Menos de 1% 24 11,43 Total 72 100 Total 42 100 Fonte: Elaborada pela autora, com base nos dados da GAZETA MERCANTIL (2002). 6

4. O tamanho da empresa, a atividade inovativa e o desempenho econômico Tomando-se a RBV como prox para o tamanho da empresa, dividiu-se as 114 empresas analisadas em quatro grupos: grandes (4,34 a 10,57%), médias (2,12 a 3,45%), intermediárias (1,00 a 1,92%) e pequenas (menos de 1%) (TABELA 7). A partir da correlação entre número de empregados e participação de mercado, verificou-se que empresas com mais de 1.000 empregados apresentaram, em geral, participação no mercado superior a 4,00%. A princípio, verificou-se que, em média, as maiores empresas (grupo das grandes) apresentaram um maior número de depósitos de patentes e uma maior lucratividade (TABELA 7). À medida que reduziu-se o tamanho, tanto os depósitos quanto a lucratividade diminuíram. Dada a correlação entre número de patentes depositadas no país e participação na receita bruta de vendas (RBV) total do mercado (TABELA 8), pôde-se inferir, também, que, em geral, empresas detentoras de tecnologia de patentes apresentaram maiores receitas e, conseqüentemente, maiores participações de mercado. Como o maior número de depósitos de patentes foi feito por grandes empresas estrangeiras, as mudanças institucionais (permissibilidade de patentes) que ocorreram na década de 90 podem ter contribuído ainda mais para elevar o poder de monopólio dessas empresas (onze estrangeiras foram responsáveis por 50,44% do mercado), o qual, no entanto, não implicou, necessariamente, em um maior dinamismo tecnológico para o país. TABELA 7 - Relações entre tamanho da empresa, patentes e lucratividade. Empresas por tamanho e origem de capital Parcela de mercado (% RBV) por faixa 1. GRANDES 4,34 a 10,57% Estrangeiro Patentes Lucratividade (% LL) Novartis Biociências 10,57 562 6,42 Produtos Roche Químicos Farms S/A 6,88 441 5,79 Aventis Pharma Ltda 6,61 264 17,85 Bristol-Myers Squibb Brasil S/A 5,75 118 9,45 Boehringer Ingelheim Brasil Q F Ltda 4,53 174 3,56 Total (estrangeiro) 34,34 1559 43,07 Nacional Aché Laboratórios Farmacêuticos 6,75 15 11,14 Ind Quím Farm Schering-Plough S/A 4,34 18 5,06 Total (nacional) 11,09 33 16,20 Total (7) 45,43 1592 59,27 2. MÉDIAS 2,12 a 3,45% Estrangeiro Sandoz S/A 3,32 105 1,75 Laboratórios Wyeth Whitehall Ltda 2,86 1 nd Laboratórios Pfizer Ltda 2,80 741 0,00 Sanofi-Synthélabo Ltda 2,50 167 0,91 Glaxo Wellcome S/A 2,47 40 0,00 Merck S/A Inds Químicas 2,23 437 0,24 7

Total (estrangeiro) 16,18 1491 2,90 Nacional Schering do Brasil Quím Farm Ltda 3,45 293 2,02 Laboratórios Biossintética Ltda 2,23 5 1,22 Cristalia Prods Químicos Farms Ltda 2,12 0 3,45 Total (nacional) 7,80 298 6,69 Total (9) 23,98 1789 9,59 3. MÉDIAS (intermediárias) 1,00 a 1,92% Estrangeiro Rhodia Farma Ltda 1,67 2 nd Allergan Lok Prods Farmacs Ltda 1,92 52 0,00 Lab Americano Farmacoterapia S/A 1,30 1 0,41 Laboratórios B Braun S/A 1,20 17 2,44 Total (estrangeiro) 6,09 70 2,85 Nacional Prodome Química e Farmacêutica Ltda 1,66 0 5,47 Medley S/A Ind Farmacêutica 1,04 0 0,37 União Química Farm Ltda 1,00 1 1,41 Total (nacional) 3,70 1 7,25 Total (7) 9,79 73 10,00 4. PEQUENAS Menos de 1% Estrangeiro Alcon Laboratórios do Brasil Ltda 0,78 91 1,18 Biolab Mérieux S/A 0,40 0 0,06 Carlo Erba S/A 0,76 0 0,54 Darrow Laboratórios S/A 0,36 0 0,63 Fort Dodge Saúde Animal Ltda 0,61 5 0,05 Galderma do Brasil Ltda 0,45 50 0,00 Hoechst Roussel Vet S/A 0,90 10 0,52 ICN Farmacêutica Ltda 0,20 14 0,08 Kley Hertz S/A Ind Com 0,15 1 0,10 Knoll Prods Químicos Farms Ltda 0,34 69 nd Lab Climax S/A 0,12 1 0,00 Laboratórios Baldacci S/A 0,54 2 1,48 Laboratórios Griffith do Brasil S/A 0,12 0 0,00 Laboratórios Stiefel Ltda 0,95 1 1,94 Pasteur Mérieux Connaught Ltda 0,22 5 0,00 Solvay Farma Ltda 0,73 18 0,00 The Sydney Ross CO 0,62 0 0,15 Zambon Laboratórios Farms Ltda 0,59 10 0,27 Total (estrangeiro) 8,84 277 7,00 Nacional Agripec Química Farmacêutica S/A 0,35 0 0,29 Amicil S/A Ind Com e Importação 0,05 0 0,00 Auad Química Ltda 0,03 0 0,12 Biobrás S/A 0,60 1 0,84 Biolab Sanus Farm Ltda 0,87 0 1,22 Biotest S/A Ind Com 0,06 2 0,02 Brasmédica S/A Inds Farmacêutica 0,14 0 0,00 Casa Gramado Labs Farms Drogs S/A 0,36 0 0,00 Centeon Farmacêutica Ltda 0,23 0 nd Cia Brasileira Antibióticos Cibran 0,00 0 0,00 Cirumédica S/A 0,13 1 0,00 8

Coprofar S/A 0,18 0 0,00 Diniz & Brandão S/A Ind e Com 0,01 0 0,00* Ecadil Ind Química S/A 0,03 0 0,02 Elmu Panquímica Farmacêutica S/A 0,00 1 0,04 Embrabio Emp Bras Biotecnologia S/A 0,06 0 0,00 Farmagrícola S/A Imp Exp 0,09 0 0,04 Farmalab Inds Químicas Farms Ltda 0,66 1 0,00 Farmoquímica S/A 0,14 1 0,11 Fatec S/A 0,56 0 0,65 Fitol S/A Ind Com 0,06 0 0,00 Geratec S/A Biotecnologia Aplicada 0,01 1 0,01 Geyer Medicamentos S/A 0,03 0 0,00* HB Farma Laboratórios Ltda 0,03 0 0,01 Hebron S/A Inds Químs Farms 0,16 6 0,00 Herbarium Laboratório Botânico Ltda 0,47 0 1,22 Igefarma Laboratórios S/A 0,12 0 0,04 Importadora Bagé S/A Ibasa 0,06 0 0,00 Ind Biológica Farm Amazônia S/A 0,13 1 0,00 Ind Com Medicamentos Labogen S/A 0,09 0 0,03 Ind Soros Prods Farm PI S/A Insopisa 0,02 0 0,00 Inst Hypodermia Farm S/A Hipofarma 0,08 3 0,23 Inst Vital Brazil S/A IVB 0,16 0 0,00 Ind Química Est Goiás S/A Iquego 0,33 0 0,00 Jofadel Ind Farmacêutica S/A 0,03 0 nd JP Ind Farmacêutica S/A 0,20 0 0,00 Lab Ducto Ind Farm Ltda 0,10 0 0,20 Lab Enila Ind Com Prods Q Farm S/A 0,26 0 0,00 Lab Itafarma Ltda 0,11 0 0,22 Lab Kinder S/A 0,00 0 0,00 Lab Madrevita Ltda 0,07 1 0,24 Lab Prado S/A 0,03 0 0,02 Lab Sanobiol Ltda 0,07 0 0,02 Lab Teuto Brasileiro Ltda 0,99 0 6,80 Labogen S/A Quím Fina Biotecnologia 0,16 1 0,38 Labonobel S/A Ind Farmacêutica 0,00 0 0,01 Laboratório Catarinense S/A 0,27 2 0,10 Laboratório Gross S/A 0,15 0 0,00 Laboratório Hepacholan S/A 0,03 0 0,04 Laboratório Veafarm Ltda 0,02 0 0,00 Laboratórios Goulart S/A 0,01 0 0,00* Laborlab S/A Prods Laboratórios 0,01 0 0,01 Labtest Diagnóstica S/A 0,15 0 0,23 Lab Farmacêutico Est PE S/A Lafepe 0,50 1 0,19 Laob Bioquímicos Ltda 0,16 0 0,17 Lab Vitamínicos Zootécnicos Ltda Lavizôo 0,01 0 0,00 Lip Lab Produtos Plasmáticos S/A 0,02 0 0,00 Pharmus Química Farmacêutica S/A 0,00 0 0,00 Polyfarma S/A Com Ind Prod Quim Far 0,07 0 0,00 Probion Ind Medics Veters Ltda 0,00 0 0,01 Prods Veterinários Ouro Fino Ltda 0,11 5 0,02 Química da Bahia Ind Com S/A 0,20 0 0,00 Química Farmac Gaspar Viana S/A 0,05 0 0,01 Quimicanorte S/A Inds Químs Norte 0,03 0 0,00 Quiral Química do Brasil S/A 0,03 0 0,02 Sintequim S/A Ind Farmoquímica 0,00 0 0,00 Sivam Cia Prod Fomento Agro Pec 0,02 0 0,00 Steviafarma Indl S/A 0,01 0 0,00 Uci Farma Ind Farm Ltda 0,22 0 0,12 Unidrogas Ind Com Medicamentos Ltda 0,76 0 0,50 Univet S/A Ind Veterinária 0,07 0 0,00 9

Virtus Ind Com Ltda 0,55 0 0,49 Zodiac Prods Farm S/A 0,16 0 0,00 11,94 28 14,69 Total (91) 20,78 305 21,69 * Essas empresas apresentaram pequenas participações no lucro do período (1995 a 2001). As demais, com 0,00%, tiveram participação nos prejuízos da indústria farmacêutica. nd: dado não disponível. Fonte: Elaborada pela autora, com base nos dados da pesquisa. TABELA 8 Correlações entre número de patentes, %RBV e %LL. %RBV %LL N o. de patentes 0,68 0,35 %LL 0,78 - N o. de empresas 109 109 Fonte: Elaborada pela autora, com base nos dados da GAZETA MARCANTIL (2002). Por outro lado, verifica-se que, em cada grupo, definido pelo tamanho da empresa, os desvios em termos de patentes e de participação no lucro líquido do setor foram relativamente altos. Como pode ser observado na TABELA 7, das grandes empresas, caracterizadas pelas maiores participações no mercado, em RBV, (4,34 a 10,57%), cinco, as estrangeiras, estiveram entre as treze maiores depositantes de patentes (2 ª, 5 ª, 9 ª, 10 ª e 13 ª ). Essas depositaram, em média, 311 patentes, enquanto as duas empresas nacionais, com 11,09% de participação no mercado, depositaram apenas 16 patentes. Ou seja, dentre as grandes empresas, um alto número de depósitos de patentes não foi, necessariamente, um pré-requisito para as nacionais obterem altas participações no mercado e vice-versa. Isso sugere que, atualmente, a competição na indústria farmacêutica não ocorra somente via inovação. Nos anos 50, verificou-se, na indústria, o deslocamento de empresas nacionais de setores mais sofisticados tecnologicamente, os quais passaram a ser dominados por empresas estrangeiras que entravam no país (GIOVANNI, 1980). O mercado dividiu-se entre produtos populares (OTC, over-the-counter) e éticos (produtos com patentes vigentes ou vencidas, comercializados, em geral, sob prescrição de receita médica), e a indústria nacional passou a competir no mercado de produtos populares. Segundo JARDIM (1993, p. 27), no Brasil, legislações menos restritivas à propaganda, sistemas de saúde desorganizados, preços elevados de medicamentos éticos, pequena participação do setor público na questão dos medicamentos e o baixo poder aquisitivo da população vêm sustentando e elevando a participação desses produtos no mercado farmacêutico. Quanto à lucratividade, observou-se, que, em geral, empresas com maior participação no mercado e maior número de patentes não foram, necessariamente, as mais lucrativas. Entre as grandes empresas nacionais, verificou-se que a alta participação nos lucros não esteve relacionada com um alto número de patentes depositadas. A empresa nacional Aché, apesar do menor número de patentes, apresentou a segunda maior participação do grupo e do setor como um todo, em termos de lucratividade (TABELA 9). 10

TABELA 9 Empresas mais lucrativas do período. Empresa Posição no LL % RBV Patentes Aventis 1 ª 6,61 estrangeira grande 264 Aché 2 ª 6,75 nacional grande 15 Bristol-Myers 3 ª 5,75 estrangeira grande 118 Lab Teuto Brasileiro Ltda 4 ª 0,99 nacional pequena 0 Novartis 5 ª 10,57 estrangeira grande 562 Produtos Roche 6 ª 6,88 estrangeira grande 441 Prodome 7 ª 1,66 nacional intermediária 0 Ind Quím Farm Schering Plough 8 ª 4,34 nacional média 18 Boehringer 9 º 4,53 estrangeira média 174 Cristalia 10 º 2,12 nacional média 0 Schering do Brasil 11 º 3,45 nacional média 293 Laboratórios Stiefel 12 ª 0,95 estrangeira pequena 1 Sandoz 13 º 3,32 estrangeira média 105 Fonte: Elaborada pela autora, com base nos dados da pesquisa. Já, dentre as estrangeiras, apenas nos grupos das grandes empresas e intermediárias, observou-se alta correlação entre a participação nos lucros e o número de patentes (TABELA 10). Mas como algumas das empresas médias, e, em menor proporção, as pequenas, estiveram entre as mais lucrativas, não apresentando, necessariamente, um alto número de depósitos de patentes (TABELA 9), pode-se dizer, de forma geral, que para as empresas analisadas uma maior lucratividade não esteve, necessariamente, associada a um maior esforço inovativo. Tabela 10 Correlação entre participação nos lucros e patentes, por tamanho da empresa. Tamanho das empresas Grande Médio Intermediário Pequeno Total Estrangeiras 0,88-0,19 0,90 0,15 0,34 Estrangeiras e Nacionais 0,72 0,18 0,58 0,29 0,35 Fonte: Elaborado pela autora, com base nos dados da pesquisa. Por outro lado, verificou-se, também, que nem sempre a estrutura produtiva instalada no país esteve, no período analisado, relacionada com uma maior lucratividade. Isso pôde ser constatado a partir dos índices de correlação entre imobilizado (IM) 5 e lucratividade (L/PL) para uma amostra de 103 empresas, 80 nacionais e 23 estrangeiras. Essa foi mais forte (0,88) entre empresas nacionais do que entre estrangeiras (0,47), o que pode ser um indicativo de que a lucratividade nas estrangeiras não esteve, no período analisado, atrelada somente à capacidade produtiva. Cabe ressaltar que a indústria farmacêutica, no Brasil, é caracterizada pelo alto volume de importação de matéria-prima. Medicamentos são industrializados no país por manipulações simples de princípios ativos importados, sendo os lançamentos decorrentes, em geral, de pesquisas realizadas pelas matrizes das empresas estrangeiras no exterior. 5 Variações no imobilizado, que reúne os investimentos em caráter permanente, de difícil conversibilidade, podem sinalizar mudanças estratégicas da empresa. Dentre os componentes do patrimônio caracterizados como imobilizado tem-se: imóveis, máquinas, instalações fabris, ferramentas, aparelhos, veículos, dispêndios com marcas, patentes e concessões, ou seja, itens de caráter produtivo (FRANCO, 1989). 11

Pode-se dizer, portanto, que como não há pressão competitiva, em geral, entre nacionais e estrangeiras, dadas as diferenças tecnológicas, e entre estrangeiras, em função dos inúmeros mercados definidos pela classe terapêutica que exploram; como a intervenção regulatória do Estado é pequena, e como as condições de financiamento entre empresas estrangeiras e nacionais são desiguais, a probabilidade de manutenção do quadro formado é alta. A cada ambiente seletivo se associa uma trajetória particular de inovações institucionais (PONDÉ, 2000). E é isso o que vem sendo observado na indústria farmacêutica desde a década de 70, quando ocorreu a desnacionalização, ou seja, a partir de mecanismos autoreforçantes, uma estrutura institucional prevalece mesmo que não seja a mais eficiente em termos de desenvolvimento econômico - lock-in (NORTH, 1990). 5. Conclusões No setor de medicamentos, de 1995 a 2001, verificou-se que as grandes empresas estrangeiras foram, em geral, as que apresentaram maior propensão a inovar (número de patentes depositadas), e maior lucratividade. No entanto, nem sempre uma elevada participação de mercado esteve relacionada com um maior número de patentes, principalmente, dentre as nacionais. Isso possivelmente em função dessas empresas concentrarem seus esforços no mercado de produtos populares, em geral, de menor nível tecnológico. Apesar da limitação em se utilizar apenas o número de patentes como indicador do processo inovativo, uma vez que existem outras formas de apropriação de tecnologia, levanta-se, também, nesse estudo a possibilidade de que o aumento do patenteamento no Brasil, principalmente de PI por não-residentes, não esteja gerando transferência de tecnologia de empresas estrangeiras para nacionais. Ressalta-se que mais investigações necessitam ser feitas para a comprovação dessa. Verifica-se, portanto, que caso essa tendência seja confirmada, a situação na indústria farmacêutica pode-se agravar à medida que o patenteamento contribua ainda mais para a segmentar o mercado de medicamentos em produtos populares, produzidos por empresas nacionais, e de alta tecnologia, por estrangeiras. Considerando, também, a segmentação por classe terapêutica, a baixa concorrência poderia levar à exploração apenas dos produtos já existentes, não havendo incentivos para investimento em pesquisas de novos medicamentos, o que acabaria por comprometer não só o desenvolvimento tecnológico, mas o bem estar social no país. Referências Bibliográficas BARBIERI, J. C. Produção e transferência de tecnologia. São Paulo: Editora Ática S. A., 1990. 181 p. FEBRAFARMA FEDERAÇÃO BRASILEIRA DA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA. Vendas de remédios despencam. (http//www.febrafarna.com.br/, capturado em 24 de janeiro de 2003). FRANCO, H. Estrutura, análise e interpretação de balanços: de acordo com a nova lei das S. A., Lei n o. 6404, de 15-12-1976. São Paulo: Atlas, 1989. 342p. 12

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