MÃE, POSSO IR SOZINHO PARA A ESCOLA? SAIBA AS VANTAGENS DE DEIXAR O SEU FILHO ANDAR A PÉ // PAGS. 22-23



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Meu nome é Rosângela Gera. Sou médica e mãe de uma garotinha de sete anos que é cega.

Transcrição:

MÃE, POSSO IR SOZINHO PARA A ESCOLA? SAIBA AS VANTAGENS DE DEIXAR O SEU FILHO ANDAR A PÉ // PAGS. 22-23

Mãe, posso ir sozinho para a escola? Há mais gente a torcer oelo sim Só 26% dos pais do l. e 2. ciclos deixam os filhos irem sozinhos para a escola. Melhor qualidade de vida e menos stress são os novos argumentos MARTA F. REIS mana. reis@ionline.pt Mónica chega à porta da escola sozinha. Assim parece, porque o portão abre e nem olha para trás. Há quanto tempo não são os pais que a trazem? Só a pergunta acusa uma mãe atenta do outro lado da rua, junto à passadeira. Vivem a cinco minutos da Escola Eugênio dos Santos, em Lisboa, mas Sílvia não ficaria descansada ao vê-la sair sozinha. Mesmo que na sua infância fizesse os sete quilómetros entre casa e escola sem o olhar dos pais, de autocarro com os irmãos. "Ela tem dez anos, ainda é muito nova", diz. De vez em quando, já faz uns recados e brinca com amigos na rua, mas as manhãs são complicadas. "Há muito trânsito e nem sempre os carros param". Numa manhã de aulas, não é difícil encontrar pais com a mesma preocupação e outros que simplesmente acenam no carro à porta da escola, quase sempre parados em segunda fila. Quando não são os pais, são as carrinhas de ATL ou explicadores. Depois há os filhos que, conquistado o direito à autonomia na hora de ir para a escola, lembram todo um processo de habituação e, em alguns casos, súplica por liberdade e convivência com amigos. Rosarinho também vive a cinco minutos da Eugênio dos Santos. Tem 14 anos e desde os 12 vai sozinha para a escola. Das primeiras vezes fazia o trajecto a falar com a mãe ao telemóvel. Agora só tem de enviar mensagem quando chega. Na escola D. Pedro IV, em Queluz, Guilherme, também de 14 anos, teve ordem de soltura no 6. s ano. Ainda é um quilómetro de caminho e o que sossegou os pais foi ter paragem pelo meio em casa dos avós. Daniela, de 15 anos, faz o percurso com amigas desde o 1 ano, depois de insistir contra os receios dos pais de que fosse assaltada. Na altura tinha 15 minutos contados para chegar. "A partir daí vinham à minha procura." Teresa deixa a filha Margarida ir a pé desde os 10 anos, mas ainda não deu luz verde ao filho rapaz, agora da mesma idade. "É mais desvairado, mete-se no meio da estrada", justifica. A instrução para, caso se sinta ameaçada, correr para o primeiro café ou loja aberta, é uma das regras de segurança da filha, hoje de 12 anos. Mas o que mais deixa Margarida nervosa não são adultos desconhecidos mas alunos mais velhos e relatos de assaltos e agressões num viaduto por onde passa. Se caminhos esconsos ou falta de acessos são alguns dos motivos para menos idas sozinhos para a escola, os pais terem de ir trabalhar e não os poderem levar foi, para a maioria a razão principal para a passarem a fazê-10. Mas os argumentos parecem estar a mudar. Depois de apelos intermitentes nos últimos cinco anos, a pressão académica e comunitária por uma maior independência das crianças nunca esteve tão viva e há cada vez mais iniciativas amigas do ambiente e saúde a promover os percursos a pé ou de bicicleta. Depois de uma primeira análise sobre o fenómeno da queda de autonomia há 20 anos, o think tank britânico Policy Studies Institute prepara-se para publicar a primeira comparação internacional do grau de autonomia em termos de mobilidade de crianças e um inquérito divulgado este mês em Inglaterra a propósito da "Semana de Ir a pé para a Escola", efeméride que ainda não se celebra em Portugal, concluiu que além dos argumentos de sustentabilidade e melhor qualidade de vida nas cidades, reduzindo o congestionamento automóvel, promover a autonomia das crianças logo a partir do primeiro ciclo pode ajudar a reduzir stress nas famílias e combater sedentarismo e absentismo. Neste inquérito, um terço dos pais considerou que deixar os filhos na escola é o momento mais stressante do dia, tantos como os que apontaram o trabalho. PORTUGAL MAL NA FOTOGRAFIA O inquérito nacional no âmbito do estudo do Policy Studies Institute foi realizado pela Faculdade de Motricidade Humana da Universidade de Lisboa. Os resultados, publicados este mês no "Journal of Science and Medicine in Sporr", revelam o que os investigadores consideram ser uma redução drástica da autonomia e mobilidade das crianças no espaço de uma geração. Hoje, apenas 35% das crianças de oito e nove anos vai a pé para a escola quando 86% dos pais fazia esse trajecto. Mais de metade (56%) vai de carro, algo que só 9% dos pais fazia No primeiro e segundo ciclo, apenas 26,6% das crianças tem permissão para ir sozinha para escola. Na comparação internacional, Portugal surge no 10 a lugar entre 16 países e a par de Inglaterra, França e Itália, como o país onde as crianças da primária têm menos autonomia. O medo dos pais parece sobrepor-se aos benefícios reconhecidos para uma evolução da autonomia em idades mais jovens, o que os investigadores portugueses atribuem também a desconheci-

mento e falta de educação parental para a diferença entre risco e segurança. Mas a solução parece exigir mais do que sensibilização. Elisabete Gomes, mãe de uma aluna de sete anos da Escola Teixeira de Pascoais em Alvalade, tentou este ano lançar uma versão do que nos EUA dá pelo nome de "Walking to School Bus" e já leva mais de mil crianças a pé para a escola no lowa. Inspirada pelos "pedibus" que têm surgido pontualmente em Lisboa desde 2008 - carreiras pedestres organizadas por pais ou voluntários - quis lançar uma iniciativa idêntica na escola para que a sua filha pudesse desde já começar a fazer o percurso com maior autonomia. "Éramos poucos pais e acabou por nao arrancar. Ainda existe o culto de que as ruas e os estranhos são perigosos", lamenta Elisabete, para quem o perigo real no bairro é o trânsito à porta da escola dos pais que vão deixar os filhos a caminho do trabalho. É por isso que não deixa a filha ir sozinha, algo que espera fazer no próximo ano mas que acredita que exigirá medidas como impedir os estacionamentos nos passeios, por exemplo com pinos à porta da escola. Do lado do presidente da junta, André Caldas, existe vontade de travar o "trânsito selvagem" e além dos "pedibus" - em Alvalade um tem ajudado a combater o absentismo no bairro das Murtas - outra criação recente são as Zonas 30, onde esta passou a ser a velocidade máxima de circulação. Já para combater a falta de disponibilidade dos pais, uma das ideias é envolver os reformados nos autocarros humanos como já acontece na vigilância de passadeiras. Para Elisabete, as razões para insistir que conforto e qualidade de vida não é passar horas enfiada no carro, sobretudo em criança, são muitas, mesmo que por agora se sinta uma excepção. Querer que a filha seja confiante, desfrute da cidade e consiga entrar num café e pedir um copo de água ou indicação sem ter vergonha ou receio são algumas delas. 86% dos pais da actual geração de alunos ia a pé para a escola com oito ou nove anos. Hoje, só 35% das crianças vão a pé e 56% de carro, algo que apenas 9% dos pais fazia

Porca Mais bicicleta Duzentos alunos de Lisboa participaram este ano na iniciativa Bike do School, da Associação pela Mobilidade Urbana em Bicicleta (MUBi). Para o ano o projecto chegará a mais concelhos. A ideia é ensinar regras de segurança e incentivar a bicicleta, em lazer ou ida para a escola para quem viva a 30 minutos. "E levar a sustentabilidade e autonomia para a mesa do jantar", diz o responsável Mário Alves. Jogo da serpente "Serpenta Papa Léguas- o jogo da mobilidade" é uma iniciativa europeia e chega a Portugal no próximo ano lectivo pela mão da Associação de Cidadãos Auto-Mobilizados (ACA-M). Alunos de Lisboa, Oeiras ou Castelo Branco vão participar num jogo em que ganha quem for para a escola a pé ou de bicicleta mais vezes. A ACA-M tem outro projecto para identificar perigos na escola, como falta de passadeiras. Cidade das crianças O "Projecto PÁ", finalista do concurso Ideias de Origem Portuguesa da Gulbenkian, é uma ideia de duas arquitectas para tornar as cidades mais amigas das crianças, reforçando o seu papel na busca de soluções. Replicar um projecto norueguês em que identificam zonas "feias" no percurso para escola e executam intervenções a seu gosto é uma das acções a implementar em 201 5. "Se não fizermos nada vamos criar iliteracia e analfabetismo motor e promover o sedentarismo" O trânsito na rua parece ser a maior preocupação dos pais na hora de deixar crianças irem sozinhas para a escola Rita Cordovil, Frederico Lopes e Carlos Neto, da Faculdade de Motricidade Humana (FMH) da Universidade de Lisboa, reali2aram o primeiro estudo sobre mobilidade das crianças portuguesas. Concluem que o medo dos riscos serviu para tirar autonomia em vez de promover cidades mais seguras. E que há países que já pensam diferente. Que receios impedem maior independência? O trânsito parece ser a principal preocupação, assim como o medo do comportamento de adultos desconhecidos (assaltos ou raptos). Com estes receios, os pais optam por diminuir a autonomia em vez de exigir medidas e esforços que promovam um ambiente seguro e confiante para as crianças viverem de forma autónoma. A confiança dada à criança para ser mais autónoma baixou drasticamente nas últimas décadas. É preciso com urgência virar este ciclo a bem da sua saúde física e mental. As famílias valorizam mais a segurança do que a saúde? O problema é que os benefícios que advêm de maior independência são mais difíceis de quantificar que os riscos. É fácil saber quantos atropelamentos há no caminho para a escola mas é difícil quantificar os benefícios a nível de desenvolvimento. mobilidade activa das crianças aumenta as suas possibilidades de consciência e representação mental do espaço em que vivem. É vital para um corpo culto, empreendedor e com sentido crítico. Um das vossas ideias é que é preciso retirar o perigo da rua e não as crianças. Como? A A criação de caminhos seguros para a escola, com espaço para as crianças que não seja ocupado por carros, é muito importante. É fundamental repensar a cidade: da política de habitação ao trânsito rodoviário, planeamento urbano, espaços verdes, rede de equipamentos lúdicos, ruas fechadas ao trânsito e zonas pedonais adequadas. E as crianças têm direito a participar nesse processo. Defendem que a independência de mobilidade devia ser um indicador de qualidade de vida das cidades. Porquê? Cidades onde a autonomia das crianças é promovida terão no futuro jovens mais activos, empreendedores e resilientes. Todos os animais necessitam na infância de brincar. No ser humano a infância é mais prolongada e a confrontação em jogos de movimento e exploração do ambiente é vital. A falta de independência está a deixar marcas nos jovens? Estudos demonstram que a falta de confrontação com o risco e de brincar nos espaços exteriores apresentam efeitos nefastos nas capacidades motoras e aptidão física, na relação social, na construção da personalidade e até no sucesso escolar. Uma infância muito protegida cria adolescentes inseguros e vulneráveis. Debater este assunto é urgente sob pena de estarmos a criar situações graves de iliteracia ou analfabetismo motor e a promover um sedentarismo com enormes custos para a saúde pública. Há também implicações na qualidade da relação entre pais e crianças. Os pais hoje passam muito mais tempo que os das gerações anteriores a vigiar e transportar os filhos em vez de a viver a cidade.

O que explica a conclusão internacional de que as crianças nórdicas têm mais autonomia? O valor lúdico, o nível de risco e a confrontação com a natureza são valorizados como oportunidades para os filhos crescerem com capacidade para resolver problemas. Além disso, há uma cultura de solidariedade na supervisão das crianças no espaço público. Os autores referem que o facto de ambos os pais trabalharem os forçou a criar uma cultura de autonomia das crianças. Em Portugal também é frequente os dois trabalharem, mas os pais parecem preferir superprotegê-las. A partir de que idade é que uma criança deve ir sozinha para escola? Depende da criança e do contexto. Se a criança for educada para a autonomia e se as condições envolventes assim o permitirem, será expectável que durante o primeiro ciclo adquira as condições motoras, perceptivas, psicológicas, emocionais e sociais para se deslocar de forma autónoma. É normal os pais acompanharem os primeiros trajectos mas, na maior parte dos casos, rapidamente podem começar a ir sozinhas ou com amigos.