A PRIMEIRA TAREFA DE ESTUDO DAVYDOVIANA NA ESPECIFICIDADE DA MATEMÁTICA. Palavras-chave: Tarefa de estudo; ações de estudo; conceito de número.



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Transcrição:

25 A PRIMEIRA TAREFA DE ESTUDO DAVYDOVIANA NA ESPECIFICIDADE DA MATEMÁTICA Josélia Euzébio da Rosa UFPR Ademir Damazio UNESC Resumo No presente trabalho, de natureza teórica, apresentamos e analisamos a tarefa de estudo proposta por Davydov para introdução do conceito de número no primeiro ano escolar como meio de comparação entre grandezas. Davydov, seus colaboradores e continuadores tais como Gorbov, Mikulina e Savieliev elaboraram e desenvolveram em sala de aula, na Rússia, uma proposta para o ensino de Matemática com a finalidade de que os estudantes compreendam o mais claramente possível o conceito teórico dos números reais como singularidades e particularidades de representação das relações gerais entre grandezas. As proposições são organizadas por meio de tarefas de estudos compostas por seis ações cada. O foco, no presente trabalho, é para a primeira delas. Os dados que constituem a referência para ilustração da análise foram extraídos do livro didático elaborado por Davydov e seus colaboradores. As ilustrações traduzem a objetivação do seguinte sistema de ações: 1) transformação dos dados da tarefa a fim de revelar a relação universal, geral, do objeto estudado; 2) modelação da relação universal na unidade; 3) transformação do modelo da relação universal para estudar suas propriedades em forma pura; 4) dedução e construção de um determinado sistema de tarefas particulares que podem ser resolvidas por um procedimento geral; 5) controle da realização das ações anteriores; 6) avaliação da apropriação do procedimento geral como resultado da solução da tarefa de estudo dada. Cada nova ação é introduzida em um movimento que articula as relações gerais entre as grandezas e suas particularidades, o que possibilita a introdução do conceito de número. Palavras-chave: Tarefa de estudo; ações de estudo; conceito de número. O presente trabalho é parte de um processo maior de investigação desenvolvido pelos integrantes do GPEMAHC (Grupo de Pesquisa em Educação Matemática: uma abordagem histórico-cultural, coordenado pelo Prof. Dr Ademir Damazio) e do GEPAPe (Grupo de Estudos e Pesquisa Sobre a Atividade Pedagógica, coordenado pelo Prof. Dr. Manoel Oriosvaldo de Moura) sobre os princípios teórico-metodológicos da Teoria Histórico-Cultural para Educação Matemática (DAVÍDOV, 1987; DAVIDOV, 1988; DAVÍDOV e SLOBÓDCHIKOV, 1991; DAVYDOV, 1998 e 1982; GALPERIN, 1987; GALPERIN e TALYZINA, 1967; GALPERIN, ZAPORÓZHETS e ELKONIN, 1987; KALMYKOVA, 1991; RUTETSKY, 1991; LEONTIEV, 1978; OBÚJOVA, 1987; TALIZINA, 2001; VIGOTSKI, 2000; VYGOTSKY, 1991; ZAPORÓZHETS, 1987; ГОРБОВ, 2008; ДАВЫДОВ, 1997). Livro 3 - p.001374

26 Na especificidade desta pesquisa, de natureza teórica, o foco é para a primeira tarefa de estudo apresentada por Vasili Vasilievich Davydov (DAVIDOV, 1988, p. 188), cuja finalidade é a obtenção e o emprego do número como meio especial de comparação das grandezas (Vale ressaltar que no decorrer do texto será utilizada a grafia Davydov. Porém, ao se tratar de referência, será mantida a escrita conforme apresentada na obra, quais sejam: Davídov, Davidov, Davydov e Давыдов). Davydov nasceu em 1930 e faleceu em 1998. Doutor em psicologia, pertenceu a terceira geração de psicólogos russos soviéticos, desde os trabalhos da equipe inicial de Vigotsky, realizados nas décadas de 1920 e 1930. As produções davydovianas surgiram no interior da teoria histórico-cultural, cuja matriz filosófica é o materialismo histórico dialético. Faz parte do Sistema de Ensino Elkonin-Davydov e é recomendado, ainda hoje, pelo Ministério da Educação e Ciência da Federação Russa para o desenvolvimento em instituições de ensino daquele país (EDITORA VITA-PRESS, 2010). Além disso, é referência no cenário mundial, em países como Ucrânia, Cazaquistão, Noruega, França, Alemanha, Holanda, Canadá e Japão (idem). Atualmente, também é investigado no Havaí e Estados Unidos (SCHMITTAU & MORRIS, 2004; SCHMITTAU, 2005 e. g). Nesses locais, também são produzidas pesquisas que acenam para a potencialidade das contribuições do sistema em questão para processo de ensino e aprendizagem. Embora Davydov tenha falecido em 1998, seu sistema continua em desenvolvimento pelo grupo de colaboradores e continuadores, ou seja, não é uma obra pronta e acabada. Nos estudos realizados no Brasil (ROSA, 2011) sobre o referido autor, são consideradas as obras de Davydov em espanhol, traduzidas diretamente do Russo por Marta Shuare (DAVÍDOV, 1987; DAVÍDOV & MARKOVA, 1987; DAVIDOV, 1988; DAVYDOV, 1982), em inglês (DAVYDOV, 1988; DAVYDOV, 1999), o livro didático para o primeiro ano do ensino fundamental, elaborado por Davidov, Gorbov, Mikulina e Savieliev (ДАВЫДОВ et al, 1997) e o manual de orientações metodológicas para o livro didático elaboradas pelo mesmo grupo de colaboradores e continuadores do sistema de Davydov, tais como Gorbov, Mikulina e Savieliev (ГОРБОВ, МИКУЛИНА e САВЕЛЬЕВА, 2008). As obras em russo são traduzidas para o português (por solicitação do GPEMAHC - Grupo de Pesquisa em Educação Matemática: uma Abordagem Histórico- Cultural) por Elvira Kim, professora de nacionalidade russa que atualmente leciona a disciplina de Russo no centro de idiomas da Universidade Federal do Paraná. Livro 3 - p.001375

27 No presente, apresentamos e analisamos a tarefa de estudo apresentada por Davydov para o primeiro ano do Ensino Fundamental em matemática cuja finalidade é a obtenção e o emprego do número como meio especial de comparação das grandezas (DAVIDOV, 1988, p. 188). Para tanto, são propostas seis ações de estudos tais como: 1. Transformação dos dados da tarefa a fim de revelar a relação universal, geral, do objeto estudado; 2. Modelação da relação universal na unidade das formas literal, gráfica e objetal; 3. Transformação do modelo da relação universal para estudar suas propriedades em forma pura; 4. Dedução e construção de um determinado sistema de tarefas particulares que podem ser resolvidas por um procedimento geral; 5. Controle da realização das ações anteriores; 6. Avaliação da apropriação do procedimento geral como resultado da solução da tarefa de estudo dada. A primeira e fundamental ação de estudo, transformação dos dados da tarefa a fim de revelar a relação universal, geral, do objeto estudado, começa com a introdução das crianças em situações que levam à necessidade dos correspondentes conceitos em caráter teórico (DAVYDOV, 1982). Consiste na transformação dos dados objetais da tarefa de estudo, não solucionável pelos procedimentos já conhecidos, com o fim/finalidade de revelar a relação universal (conteúdo da análise mental) do objeto. Tal relação constitui o aspecto real dos dados transformados e atua como base genética e fonte de todas as propriedades e peculiaridades do objeto integral. Assim, por exemplo, o objetivo/finalidade principal das proposições de Davydov e seus colaboradores é que, ao finalizar o ensino fundamental, o estudante tenha formado uma concepção autêntica e completa do número real, com base no conceito de grandeza (comprimento, área, volume, massa, etc.), na inter-relação entre aritmética, geometria e álgebra. Davydov e seus colaboradores desenvolvem a gênese do referido conceito, no primeiro ano do Ensino Fundamental. Também considera o estágio atual de desenvolvimento dos números reais, formado pelos números naturais, inteiros, racionais e irracionais, na inter-relação entre a aritmética, geometria e álgebra. Esta última, conforme mencionado, liberta o pensamento da criança da prisão das dependências Livro 3 - p.001376

28 numéricas concretas e o eleva a um nível mais abstrato e generalizado (VIGOTSKI, 2000). Desse modo, a fim de abstrair a relação essencial, genética do conceito de número, Davydov e seus colaboradores iniciam, na primeira ação de estudo, com a introdução do conceito de grandeza, pelas relações de igualdade e desigualdade: igual, maior ou menor (Ilustrações 1, 2 e 3). A orientação para estas relações gerais permite comparações entre grandezas apresentadas graficamente (Ilustração 4). Logo, os estudantes registram tais relações por meio de fórmulas expressas por letras (Ilustração 5), o que comporta a passagem para o estudo das propriedades das relações de igualdade e desigualdade em sua forma pura (Ilustrações 6 e 7). Sendo assim, mesmo antes de se apropriar do conceito de número, a criança consegue determinar os resultados desta comparação, com a ajuda de fórmulas literais tais como: a = b, a > b, a < b (DAVYDOV, 1982). Porém, em algumas situações é difícil ou quase impossível efetuar a comparação direta entre duas grandezas e revelar a igualdade ou desigualdade. Para tanto, será necessário uma terceira grandeza, uma unidade de medida (Ilustração 8). A busca de quantas vezes a unidade de medida cabe na grandeza a ser medida permite à criança determinar a relação múltipla universal a ser modelada na próxima ação de estudo. O processo é realizado por meio da discussão e reflexão, em que se evita tarefas idênticas para não conduzir a uma generalização empírica da relação universal. A segunda ação de estudo consiste na modelação da relação universal, já identificada, na unidade das formas literal, gráfica e objetal. Nem toda representação pode ser considerada "modelo de estudo", apenas aquela que estabelece a relação universal, essencial de um objeto integral e possibilita sua análise ulterior. O conteúdo do modelo de estudo estabelece as propriedades internas do objeto, não observáveis de maneira direta. O modelo de estudo, como produto da análise mental, pode ser um meio especial da atividade mental humana. Davídov (1988, p. 213) considera o modelo como uma expressão objetal-semiótica do ideal. No exemplo da matemática escolar, referente ao processo de apropriação do conceito de número, essa segunda etapa resulta da relação entre grandezas que pode ser representadas por meio de tiras de papel, depois por segmentos e, finalmente, por letras. Ao partir da análise das múltiplas relações entre grandezas, a criança identifica a conexão essencial e a reproduz nas formas objetais, gráficas e literais. A reflexão sobre Livro 3 - p.001377

29 quantas vezes uma unidade de medida está contida na grandeza, direcionada pelo professor, leva a criança a reproduzir o modelo: A/c = N ou A = cn (Ilustração 9). A terceira ação de estudo consiste na transformação do modelo da relação universal para estudar suas propriedades em forma pura. Esta relação, nos dados reais da tarefa, parece estar "oculta pelas propriedades particulares que, em conjunto, dificultam a sua revelação, porém, se faz visível no modelo "em forma pura". A adoção do trabalho pedagógico com o modelo é um processo pelo qual se estudam as propriedades da abstração teórica da relação universal. Consiste em transformar o modelo da relação encontrada de modo a permitir o estudo de suas propriedades gerais. Assim, a modificação da unidade de medida com a mesma grandeza inicial A leva à mudança do número concreto que representa sua relação. Por exemplo, se A/c = n e b > c, então A/b > n (Ilustração 10). Em síntese, Davídov e Slobódchikov (1991) dizem que a terceira ação de estudo consiste na experimentação com o modelo a fim de estudar minuciosamente as propriedades da relação geral antes identificada. A quarta ação de estudo se refere à dedução e construção de um determinado sistema de tarefas particulares que podem ser resolvidas por um procedimento geral (Ilustração 10). Os estudantes concretizam a tarefa de estudo inicial e a convertem na diversidade de tarefas particulares que podem ser resolvidas por um procedimento único (geral), apropriado durante a realização das ações de estudo anteriores. O caráter eficaz deste procedimento se verifica, justamente, na solução de tarefas particulares, que são focadas pelos estudantes como variantes da tarefa de estudo inicial. Os escolares separam em cada uma a relação geral e orientam-se naquela que aplica o procedimento geral de solução apropriado (DAVYDOV, 1988; DAVIDOV, 1988). As ações de controle e avaliação são desenvolvidas durante todo o processo até o momento apresentado. Na quinta ação de estudo, controle da realização das ações anteriores, a função principal é assegurar que o procedimento geral da ação tenha todas as operações indispensáveis para que o estudante resolva exitosamente a diversidade de tarefas concretas particulares. O controle assegura a requerida plenitude na composição operacional das ações e a forma correta de sua execução. Quando a criança domina o procedimento geral de medição das grandezas e mede um determinado volume, o professor propõe a repetição, segundo Davydov (1988), de forma que ocorra alguma operação executada de forma incorreta. Assim, por exemplo, cada vez que o estudante ou professor encher a unidade de medida, deve Livro 3 - p.001378

30 também usar um volume de líquido diferente. Pode ocorrer que não se faça referência a um numeral durante a contagem das unidades de medida. Às crianças, compete o esclarecimento das causas da variação do resultado da medição. Tal atribuição permitelhes que se apropriem de uma série de operações concretas indispensáveis para a medição correta. Esse procedimento, o controle, garante ao estudante a correção no cumprimento das ações. A ação de controle está estreitamente ligada à sexta ação de estudo que é a avaliação da apropriação do procedimento geral como resultado da solução da tarefa de estudo dada. Em todos os estágios da resolução da tarefa de estudo, a avaliação orienta as demais ações para seu resultado final: A obtenção e o emprego do número como meio especial de comparação das grandezas (DAVÍDOV, 1988, p. 186). De acordo com Davydov (1988), essa ação possibilita a determinação da ocorrência ou não de apropriação, a identificação se o resultado das ações de estudo corresponde, ou não, ao objetivo final. Também traz evidência das reais condições da criança para resolver outra tarefa de estudo, que exige um novo procedimento de solução. Enfim, a tarefa de estudo davydoviana é resolvida por meio de um sistema de ações de estudo. Cada nova ação é introduzida em um movimento que articula as relações gerais entre as grandezas e suas particularidades, o que possibilita a introdução do conceito de número. Referências Bibliográficas: DAVÍDOV, V. V. Análisis de los principios didácticos de la escuela tradicional y posibles principios de enseñanza en el futuro próximo. In: SHUARE, Marta. La psicología Evolutiva y pedagógica en la URSS. Moscú: Progreso, p. 143-155, 1987. DAVIDOV, V. V. La enseñanza escolar y el desarrollo psíquico: investigación teórica y experimental. Moscú: Editorial Progreso, 1988. DAVÍDOV, V. V.; SLOBÓDCHIKOV, V. I. La enseñanza que desarrolla en la escuela del desarrollo; en La educación y la enseñanza: una mirada al futuro. Ed. Progreso, Moscú, p. 118-144, 1991. DAVYDOV, V.V. La renovación de la educación y el desarrollo mental de los alumnos. Revista de Pedagogía. Santiago: N. 403, p. 197-199, jun. 1998. Livro 3 - p.001379

31. Tipos de generalización en la enseñanza. 3. ed. Habana: Editorial Pueblo y Educación, 1982. EDITORA VITA-PRESS. Система развивающего обучения Д.Б.Эльконина - В.В. Давыдова. Rússia, 2010. Disponível em: <http://www.vita-press.ru>. Acesso em: Ago. 2010. GALPERIN, P. Sobre la investigación del desarrollo intelectual Del niño. In. La psicología evolutiva y pedagógica en la URSS. Editorial Progreso, Moscú, p. 125-143, 1987. GALPERIN, P.; TALYZINA, N. F. La formación de conceptos geométricos elementales y su dependencia sobre la participación dirigida de los alumnos. In: Psicología Soviética Contemporánea. Instituto Del Libro, p. 273-302, 1967. GALPERIN, P.; ZAPORÓZHETS A.; ELKONIN, D. Los problemas de la formación de conocimientos y capacidades en los escolares y los nuevos métodos de enseñanza en la escuela. In: La psicología Evolutiva y pedagógica en la URSS. Moscú, Progreso, p. 300-316, 1987. KALMYKOVA, Z. I. Pressupostos psicológicos para uma melhor aprendizagem da resolução de problemas aritméticos. In: LÚRIA; LEONTIEV, VYGOTSKI, et al. Pedagogia e Psicologia II. Lisboa: Estampa, p. 9-26,1991. KRUTETSKY, V. A. Algumas características do desenvolvimento do pensamento nos estudantes das escolas superiores. In: LÚRIA; LEONTIEV, VYGOTSKI, et al. Pedagogia e Psicologia II. Lisboa: Estampa, 1991. LEONTIEV, A. N. O desenvolvimento do psiquismo. Lisboa: Livros Horizonte, 1978. OBÚJOVA, L. Dos vias para formar un sistema simples de conceptos científicos. In: DAVIDOV, V.; SHUARE, M. La psicología evolutiva y pedagogía en la URSS: antología. Moscú: Editorial Progreso, p. 194-205. 1987. ROSA, J. E. Proposições de Davydov para o ensino de matemática no primeiro ano escolar: inter-relações dos sistemas de significações numéricas. Tese (Doutorado em Educação: linha de pesquisa Educação Matemática). Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2012. SCHMITTAU, J.; MORRIS, A. The development of algebra in Davydov s elementary curriculum, the mathematics educator. 2004. Disponível em <math.nie.edu.sg/ame/matheduc/tme/tmev8_1/schmittau.pdf>. Acesso em: 18 out. 2010. SCHMITTAU, J. The development of algebraic thinking: a Vygotskian perspective. Zentralblatt Fuer Didaktik Der Mathematik International Review of Mathematics Education, v. 37 (1), p. 16-22. 2005. Disponível em <http://www.emis.de/journals/zdm/zdm051i.html>. Acesso em: 15 nov. 2010. Livro 3 - p.001380

32 TALIZINA, N. F. La formación de las habilidades del pensamiento matemático. Facultad de Psicología de la Universidad Autónoma de San Luis Potosí. S.L.P., México, 2001. VIGOTSKI, L. S. A construção do pensamento e da linguagem. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes, 2000. VYGOTSKY, L. S. Aprendizagem e desenvolvimento intelectual na idade escolar. In: LURIA, A. R; et al. Psicologia e Pedagogia: bases psicológicas da aprendizagem e do desenvolvimento. São Paulo: Editora Moraes ltda, 1991. ZAPORÓZHETS, A. Importancia de los periodos iniciales de la vida en la formación de la personalidad infantil. In: La psicología Evolutiva y pedagógica en la URSS. Moscú, Progreso, p. 228-249, 1987. ГОРБОВ С.Ф., МИКУЛИНА Г.Г., САВЕЛЬЕВА О.В. Обучение математике. 1 класс: Пособие для учителей начальной школы (Система Д.Б. Эльконина В.В. Давыдова). 2-е ида, перераб. - М.:ВИТА-ПРЕССб 2008. 128p. [GORBOV, S.F.; MIKULINA, G.G.; SAVIELIEV, O.V. Ensino de Matemática. 1 ano: livro do professor do ensino fundamental (Sistema do D.B. Elkonin V.V. Davidov). 2ª edição redigida, - Moscou, Vita-Press, 2008.] ДАВЫДОВ, В. В. О. et al. Математика, 1-Kjiacc. Mockba: Mnpoc - Аргус, 1997. [Davidov, V.V. Matemática, 1ª série. Livro didático e de exercícios para os estudantes da primeira série. Moscou: MIROS, Argus, 1997. Livro 3 - p.001381

33 Ilustrações Ilustração1 Comparação pelo comprimento da altura (ДАВЫДОВ, 1997, p. 9) Ilustração 2 Comparação da grandeza capacidade (ДАВЫДОВ, 1997, p. 13) Ilustração 3 Comparação pela massa (ДАВЫДОВ, 1997, p. 16) Ilustração 4 Representação gráfica da relação entre os comprimentos das alturas Representação gráfica da relação entre os comprimentos das larguras Representação gráfica das relações entre comprimentos (ДАВЫДОВ, 1997, p. 14) Livro 3 - p.001382

34 Ilustração 5 Transição da representação gráfica para a literal (ДАВЫДОВ, 1997, p. 24) Ilustração 6 Comparação pelo comprimento da altura (ДАВЫДОВ, 1997, p. 55) Ilustração 7 Comparação pelo volume (ДАВЫДОВ, 1997, p. 49) Ilustração 8 Introdução da unidade de medida (ДАВЫДОВ, 1997, p. 72) Livro 3 - p.001383

35 Ilustração 9 Modelo (ДАВЫДОВ, 1997, p. 96) Ilustração 10 Transformação do modelo (ДАВЫДОВ, 1997, p. 98) Ilustração 11 Quantas bicicletas podemos montar utilizando estas rodas? Tarefa particular (ДАВЫДОВ, 1997, p. 104) Livro 3 - p.001384