II Encontros Coloniais Natal, de 29 a 30 de maio de 2014



Documentos relacionados
Revista HISTEDBR On-line

A Administração Pública pode ser entendida como um conjunto de órgãos e de servidores que, mantidos com recursos públicos, são encarregados de

AHU, Alagoas Avulsos, Documento 34(Versão Adaptada) 1

[fl. 1] Senhor, Despacho à esquerda: Como parece. Lisboa, 16 de novembro de 1689 [?] [rubrica]

Zumbi dos Palmares Vida do líder negro Zumbi dos Palmares, os quilombos, resistência negra no Brasil Colonial, escravidão, cultura africana

Memórias de um Brasil holandês. 1. Responda: a) Qual é o período da história do Brasil retratado nesta canção?

100 anos do Arquivo Histórico Municipal: Painel 11 / 15 um olhar sobre um precioso acervo

Catecismos tupi e dispensas: a construção missionária da idéia de casamento para os. gentios

SIGNIFICADOS ATRIBUÍDOS ÀS AÇÕES DE FORMAÇÃO CONTINUADA DA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DO RECIFE/PE

Proposta para a apresentação ao aluno. Apresentação Comunidade 1

FACULDADE DE ENSINO SUPERIOR DE LINHARES - FACELI SELEÇÃO E COMENTÁRIO DE CENAS DO FILME GLADIADOR LINHARES

agora a algumas questões Quem pode receber o

AGUARDANDO HOMOLOGAÇÃO

O ENSINO DE MATEMÁTICA NA EDUCAÇÃO PROFISSIONALIZANTE- INDUSTRIAL NA VOZ DO JORNAL O ETV : ECOS DA REFORMA CAPANEMA

( ). Desafios e possibilidades Daniela Fagundes Portela 1 Faculdade de Educação da USP. danifportela@uol.com.br

IGUALDADE DE GÊNERO: UM BREVE HISTÓRICO DA LUTA PELO VOTO FEMININO NO BRASIL

Ensino Religioso no Brasil

IMPLANTANDO O ENSINO FUNDAMENTAL DE NOVE ANOS NA REDE ESTADUAL DE ENSINO

AHU, Alagoas Avulsos, Documento 170(Versão Adaptada) 1

O mundo lá fora oficinas de sensibilização para línguas estrangeiras

ESTADO DO TOCANTINS PODER LEGISLATIVO

Sobre o sentido das deliberações adoptadas cabe informar:

A Bíblia realmente afirma que Jesus

ACTA DA REUNIÃO DA ASSEMBLEIA GERAL

Batismo e solidariedade na Vila de Sabará,

PARECER N.º 18/CITE/2012. Assunto: Licença na situação de risco clínico e licença por maternidade Direito a férias Processo n.

18/11/2005. Discurso do Presidente da República

PED ABC Novembro 2015

INSTRUÇÕES AO CANDIDATO

Disciplina: HISTÓRIA Professor (a):rodrigo CUNHA Ano: 7º Turmas: 7.1 e 7.2

GUIA DE FONTES PARA HISTÓRIA DE ALAGOAS: OS ARQUIVOS DE PENEDO. 1

Universidade Metodista de São Paulo

OBRIGAÇÃO DE SOLVÊNCIA, EMPRÉSTIMOS.

Copos e trava-línguas: materiais sonoros para a composição na aula de música

BOLSA FAMÍLIA Relatório-SÍNTESE. 53

ESTRADA DE FERRO BAHIA E MINAS RELATÓRIOS DE PEDRO VERSIANI

A CONQUISTA DO DIVÓRCIO. BREVES LINHAS APÓS A INDEPENDÊNCIA DO BRASIL

Os templos religiosos e a formação das Minas Gerais

6ª 10 4/out/11 HISTÓRIA 4º. Valor: 80

O ESTUDO DA CONSTRUÇÃO DE CASAS POPULARES E A RELAÇÃO COM CONTEÚDOS MATEMÁTICOS

De que jeito se governava a Colônia

Acta n.º 13/2010 de 19/05/2010

CALENDÁRIO COMUNIDADE KERYGMA 2016

Elas estão em toda parte. Lucas Albuquerque

MUNICÍPIO DE VILA NOVA DE CERVEIRA CÂMARA MUNICIPAL

Catecismo da Doutrina Cristã

PARECER N.º 103/CITE/2010

Trajetórias dos Imigrantes Açorianos em São Paulo Processos de Formação, Transformação e as Ressignificações Culturais

Mercado de Trabalho. O idoso brasileiro no. NOTA TÉCNICA Ana Amélia Camarano* 1- Introdução

Colégio Marista São José Montes Claros MG Prof. Sebastião Abiceu 7º ano

Mineração e a Crise do Sistema Colonial. Prof. Osvaldo

Notas técnicas. Introdução

o que é muito pouco. E o empoderamento das mulheres só se dará com a inserção delas no mercado de trabalho, comentou a coordenadora do Dandara no

AS CONTRIBUIÇÕES DAS VÍDEO AULAS NA FORMAÇÃO DO EDUCANDO.

Presidência da República Casa Civil Secretaria de Administração Diretoria de Gestão de Pessoas Coordenação Geral de Documentação e Informação

Cadernos do CNLF, Vol. XVI, Nº 04, t. 3, pág. 2451

PROJETO DE DECRETO LEGISLATIVO Nº 34/2012

PRESENÇAS E FALTAS

Relatório de atividades Arte e cidadania caminhando juntas Pampa Exportações Ltda.

A REVISTA OESTE NA CONSOLIDAÇÃO DO CENÁRIO POLÍTICO GOIANO

LIVROS DIDÁTICOS DE MATEMÁTICA E AS REFORMAS CAMPOS E CAPANEMA

ASSISTÊNCIA ESTUDANTIL NO ENSINO SUPERIOR: um estudo sobre o perfil dos estudantes usuários dos programas de assistência estudantil da UAG/UFRPE

A expansão da América Portuguesa

Deus o chamou para o ministério da palavra e do ensino também. Casou-se aos 21 de idade com a ministra de louvor Elaine Aparecida da Silva

PROJETO DE LEI DO SENADO Nº, DE 2009 (de autoria do Senador Pedro Simon)

COMISSÃO DE AGRICULTURA, PECUÁRIA, ABASTECIMENTO E DESENVOLVIMENTO RURAL. INDICAÇÃO N o 4.690, DE 2005

PROJETOS DE ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA: DO PLANEJAMENTO À AÇÃO.

Terceira Semana Latino-americana de Catequese Secção de Catequese do CELAM Bogotá 01 a 06 de Maio de 2006

Sobre o Sistema FiliaWEB

A criança recém-nascida como personagem do século XVIII (Freguesia de Natal)

O Barroco no Brasil. Capitulo 11

Resumo Aula-tema 05: Direito de Família e das Sucessões.

Por : Lourdinha Salles e Passos. Apresentação. Sendo assim, aprovo este Diretório para o Sacramento do Batismo, e o torno obrig

Vejamos uma Cronologia:

PROJETO DE LEI Nº, DE 2014

Leya Leituras Projeto de Leitura

ProfMat 2014 TAREFAS PARA A SALA DE AULA DE MATEMÁTICA

REQUERIMENTO (Do Sr. Maurício Rands)

CRIA O ISNTITUTO MUNICIPAL DE PREVIDÊNCIA DE CAMPO GRANDE, REGULA O SEU FUNCIONAMENTO E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS.

CURSO: TRIBUNAL REGULAR ASSUNTOS: CONCORDÂNCIA NOMINAL / CONCORDÂNCIA VERBAL SUMÁRIO DE AULA DÉCIO SENA

AS QUESTÕES OBRIGATORIAMENTE DEVEM SER ENTREGUES EM UMA FOLHA À PARTE COM ESTA EM ANEXO.

O CURSO DE EDUCAÇÃO FÍSICA NA UFBA; DA CRÍTICA A FORMAÇÃO À FORMAÇÃO CRÍTICA

O EMPREGO DOMÉSTICO. Boletim especial sobre o mercado de trabalho feminino na Região Metropolitana de São Paulo. Abril 2007

1) Nome do Projeto Plano de Cargos, Carreira e Vencimentos do Município de Vitória

TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 19ª REGIÃO 3ª VARA DO TRABALHO DE MACEIÓ/AL PROCESSO:

O Sindicato de trabalhadores rurais de Ubatã e sua contribuição para a defesa dos interesses da classe trabalhadora rural

A DOMINAÇÃO JESUÍTICA E O INÍCIO DA LITERATURA NACIONAL

TRABALHO VOLUNTÁRIO VISITA AO LAR DA TERCEIRA IDADE DONA VILMA

Palavras chave: Direito Constitucional. Princípio da dignidade da pessoa humana.

Processo de arbitragem. Sentença

FICHA BIBLIOGRÁFICA. Título: Perfil da Mulher Metalúrgica do ABC. Autoria: Subseção DIEESE/Metalúrgicos do ABC

Arquivo Público do Estado de São Paulo Oficina O(s) uso(s) de documentos de arquivo na sala de aula

- REGIMENTO - CAPITULO I (Disposições gerais) Artigo 1.º (Normas reguladoras)

A APLICAÇÃO DA JURIMETRIA NOS INQUÉRITOS POLICIAIS DA LEI MARIA DA PENHA

RECUPERAÇÃO FINAL 2015 HISTÓRIA 7º ano

História. Programação 3. bimestre. Temas de estudo

Desigualdade Entre Escolas Públicas no Brasil: Um Olhar Inicial

ENTREVISTA Questões para Adauto José Gonçalves de Araújo, FIOCRUZ, em 12/11/2009

Transcrição:

Padre Simão Rodrigues de Sá, um patriarca de batina José Rodrigues da Silva Filho Graduado em História, UFRN Orientadora: Carmen Margarida Oliveira Alveal rodrigues.omagno@gmail.com Quando se trata de História Colonial no Brasil os estudos sobre os clérigos regulares e sua atuação junto às missões são bem mais abundantes, que os poucos estudos sobre o clero secular e mais especificamente sobre os padres vigários e sua presença marcante na administração das freguesias. Constata-se, na historiografia uma lacuna neste campo, que alguns trabalhos recentes começaram a desbravar: Durante muito tempo, nossa historiografia centrou seu interesse na ação das ordens religiosas no processo de missionação. O fato de o Brasil ter permanecido, em boa medida, como terra de missão até o século XIX, não deve servir para negligenciar o papel do clero diocesano ao longo daqueles séculos 1. Ao lançarmos um olhar sobre os arquivos coloniais, constatamos que os registros paroquiais constituem uma importante fonte para trabalhos nas mais diversas áreas de estudos sobre o período. Os registros de batismos, casamentos, óbitos, Livros de Tombo, entre outros são comumente utilizados para analisar as redes sociais e relações étnicas. Os produtores dessa documentação: os padres seculares permanecem, contudo nas notas de rodapé da história. Este trabalho visa observar o caso do padre Doutor Simão Rodrigues de Sá, não somente como um clérigo inserido no contexto religioso, mas como agente histórico inserido na sociedade, em seus diversos aspectos, ampliando a visão acerca da presença do clero secular na capitania do Rio Grande durante o período colonial. O padre Doutor Simão Rodrigues de Sá (1697 1714) foi vigário da Freguesia de Nossa Senhora da Apresentação, na cidade do Natal, entre o final do século XVII e início do século XVIII. Segundo os registros de batismo da freguesia ele já estaria na condição de vigário em 1697 permanecendo, provavelmente até a morte, na segunda década do século XVIII. Conta no registro mais de batismo mais recente assina por ele que: 1 FEITLER, Bruno; SOUZA, Evergton Sales (Orgs.). A Igreja no Brasil, normas e práticas durante a Vigência das Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia. São Paulo: Ed UNIFESP, 2011.p. 19. 1

Em 4 de abril de 1714 anos, na capela de Nossa Senhora da Conceição de Jundiaí, de licença minha, batizou o padre Pedro Fernandes a João, filho de Maria, escrava do alferes Antonio Barbosa; foram padrinhos Francisco da Costa de Oliveira e Custódia de Oliveira. Simão Rodrigues de Sá 2. Os registros contrariam a versão defendida pela historiografia tradicional defendida por Mons. José Landim 3, de que o padre esteve em Natal de 1706 a 1714. O padre Simão esteve à frente da freguesia de Nossa Senhora da Apresentação em um contexto de crescimento da cidade com a recuperação do período de dominação holandesa. Esse crescimento possibilitou a consolidação da freguesia com a reforma da matriz (1672 1694) e a construção da Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos (1706? 1714). O vigário de Natal era a maior autoridade religiosa da capitania, que somente com o advento do século XVIII vai expandir sua atuação com a criação de novas freguesias, sendo até então a freguesia de Nossa Senhora da Apresentação em Natal a única da capitania. A primazia do vigário de Natal vai perdurar, mesmo que de forma honorifica, ao longo do século XVIII, quando os vigários de Natal continuaram a se intitular Vigários do Rio Grande, conforme consta do Livro de Tombo desta freguesia 4, mesmo sua jurisdição canônica não corespondia mais a totalidade do território capitania. Portanto o Vigário do Rio Grande era dotado de um grande prestigio na sociedade local, principalmente si tratando de uma sociedade marcada profundamente pelo catolicismo, que tinha a igreja matriz como centro da cidade e edifício mais importante. Era na igreja que aconteciam os eventos religiosos e políticos mais marcantes da sociedade local, como a posse dos capitães-mores perante o senado da câmara 5. As grandes festas comemorativas da cidade eram datas de cunho religioso, que tinham as celebrações litúrgicas como ponto alto. No centro destes acontecimentos estava o padre vigário, representando a Igreja; e pelos laços do padroado, também afirmando legitimidade divina do monarca e de seus representantes. O padre Doutor Simão Rodrigues de Sá se valeu deste prestigio para aumentar o cabedal e prestigio de sua família, formando uma complexa rede de clientela. Dentre as instituições da sociedade colonial a família e a Igreja figuram entre as principais. Ao passo que a Igreja Católica tem notável importância para a compreensão da sociedade colonial, observa Sergio Buarque de Holanda: A família patriarcal fornece, assim, 2 Livro de Registro de Batismos da Freguesia de Nossa Senhora da Apresentação (1681-1714). 3 LADIM, Mons. José. A poeira dos caminhos. Recife: Imprensa Industrial, 1950. 4 ACMN. Livro de Tombo, freguesia de Nossa Senhora da Apresentação (Cidade do Natal). 5 CASCUDO, Luis da Câmara. História da Cidade do Natal. 4 ed. Natal: EDUFRN, 2010.p.88. 2

o grande modelo por onde se hão de calcar, na vida política, as relações entre governantes e governados, entre monarcas e súditos 6. Neste sentido o estudo de caso do padre Doutor Simão Rodrigues de Sá é emblemático, pois reúne em um só agente histórico a figura de chefe religioso e familiar. O padre Simão Rodrigues de Sá é tido nesse trabalho como um patriarca, pois exercia notável ascendência entre os Rodrigues de Sá, família que se estabeleceu em Natal com a chegada do padre a cidade, visto que essa família só é citada nos registros a partir desse período. Os Rodrigues de Sá se tornaram uma importante família no contexto local formando uma considerável rede de parentela, sendo peça chave para a compreensão dessa rede a figura referencial do vigário patriarca. O referido vigário de Natal era pai de Eugênia Rodrigues de Sá, filha que tivera antes de ser ordenado presbítero, conforme consta nos Anais da Biblioteca Nacional, em um trecho escrito por Dom Domingos Lorêto Couto que diz: Caetano de Mello de Albuquerque nasceu na cidade do Natal do Rio Grande, sendo filho de Manoel de Mello de Albuquerque, natural de Olinda, filho ilegítimo de João Velho Barreto; e de Dona Eugênia Rodrigues de Sá, filha natural do Doutor Simão Rodrigues de Sá, que depois de a ter se ordenou presbítero, e foi Arcediago da Sé de Olinda, e morreu sendo vigário colado do Rio Grande. Serviu nesta capitania, sendo capitão, sargento-mor, comandante das ordenanças, e passando a Lisboa foi eleito capitão-mor da Ilha do Fogo onde morreu 7. A filha do padre Doutor Simão Rodrigues de Sá, Dona Eugênia era mulher de Manuel de Melo Albuquerque que exerceu o cargo de Provedor da Fazenda Real, recebendo os títulos de tenente e posteriormente de capitão, tendo sido ainda membro do senado da câmara em 1722 8, ele é notadamente uma figura de destaque na capitania. O enlace matrimonial com uma família de tamanha ascendência social mostrava o prestígio dos Rodrigues de Sá, e do padre de forma particular. Dona Eugênia Rodrigues Sá teve três filhos com Manuel de Melo Albuquerque, batizados na matriz de Nossa Senhora da Apresentação em Natal por seu pai sendo dois deles apadrinhados pelo avô padre. O primeiro filho de Dona Eugênia foi o acima citado Caetano de Melo Albuquerque, batizado em 28 de março de 1701 9, tendo o padre e avô por padrinho e 6 HOLANDA, Sérgio Buarque. Raízes do Brasil. 5ª edição. Rio de Janeiro, Livraria José Olimpio Livraria, 1956.p. 53. 7 DESAGRAVO do Brazil e glorias de Pernambuco. Anais da Biblioteca Nacional, Vol. XV. Rio de Janeiro, 1903. p. 84. 8 CASCUDO, Op cit., p.85 9 Livro de Registro de Batismos da Freguesia de Nossa Senhora da Apresentação (1681-1714). 3

por madrinha Dona Caetana Leitão, mulher do capitão-mor Bernardo Vieira de Melo. Neste registro Manoel de Melo Albuquerque é citado como Provedor da Fazenda Real e Tenente. O segundo filho, de Dona Eugênia foi Simão de Melo Albuquerque, batizado em 16 de julho de 1705 10, pelo avô que também foi seu padrinho, sendo a madrinha a viúva Maria Fernandes de Araújo. Neste segundo registro Manuel de Melo Albuquerque já é citado como capitão. O terceiro filho, batizado no dia 8 de setembro de 1707, recebeu o nome do pai, Manuel de Melo Albuquerque, foi seu padrinho Mateus Rodrigues de Sá, não constando no registro nenhuma referência ao nome da madrinha. Muito provavelmente Dona Eugênia não foi a única filha do padre Simão Rodrigues de Sá. Outros parentes do padre são citados nos registros paroquiais, cujo grau de parentesco não foi possível afirmar. Pode-se inferir, contudo pela estreita relação que essas figuras estabelecem que seu grau de parentesco fosse bastante forte. São citados nos registros de batismo: Genovesa Rodrigues de Sá casada com Diogo Melo, como pais de Maria Melo em batizada em 26 de agosto de 1702, tendo como padrinhos o padre Miguel de Carvalho e Maria Felipa Neri, filha da viúva Maria Fernandes de Araújo 11 ; Flávia Rodrigues de Sá casada com Sebastião Cardoso Batalha, pais de Augustinho Cardoso Batalha, batizado no dia 7 de setembro de 1705, tendo como padrinhos o próprio padre Simão Rodrigues de Sá e Dona Eugênia Rodrigues de Sá 12 ; Felipa Rodrigues de Sá casada com Urbano Leitão Martins, pais de Lourença Leitão Martins, em 13 de setembro de 1706, tendo como padrinhos Dona Eugênia Rodrigues de Sá e o padre Simão Rodrigues de Sá 13 ; Luiza Rodrigues de Sá casada com José Barbosa de Sousa pais de José Barbosa de Sousa, batizado em 28 de fevereiro de 1707, tendo como padrinhos o padre Simão Rodrigues de Sá e Maria Felipa Neri 14 e por fim o já citado Matheus Rodrigues de Sá que era casado com Violante Dias, pais de Clara Rodrigues de Sá, no dia 6 de novembro de 1708, tendo como padrinhos José Nolasco Pereira(?) e a viúva Maria Fernandes de Araújo 15. Os registros de batismo apontam ainda que o padre Simão Rodrigues de Sá era proprietário de pelo menos quatro escravos adultos, dois foram batizados na matriz, Antônio, 10 Livro de Registro de Batismos da Freguesia de Nossa Senhora da Apresentação (1681-1714). 11 Ibidem. 12 Ibidem. 13 Ibidem. 14 Ibidem. 15 Ibidem. 4

batizado em 12 de janeiro de 1702 16 e Vitoriana, batizada em 29 de outubro de 1712 17 e dois citados como padrinhos: Leão e Luzia, que foram padrinhos de Simão, batizado em 8 de dezembro de 1700 18. Sendo este ultimo escravo do padre Antônio Rodrigues Frazão, coadjutor da freguesia de Nossa Senhora da Apresentação. Portanto o referido vigário não parece enquadrar-se em um perfil de padre pobre se comparar com a situação de muitos dos seus pares que administravam freguesias modestas, como afirmou Arlindo Rubert 19, nem se enquadrar no estereótipo apresentado na clássica obra A História da Igreja no Brasil 20, de um clero secular mal instruído, visto que tem o título doutoral, o que indica sua possível formação na metrópole. O padre Simão Rodrigues de Sá recebeu sete concessões de sesmarias, sendo seis na capitania Rio Grande e uma em Pernambuco. Na carta de sesmaria requerida em Pernambuco 21, o suplicante requereu terras entre os rios Ipojuca e Serinhaem. Está sesmaria estava localizada em uma região coresponde ao atual município de Caruaru PE. Dentre os dez suplicantes constam o nome de Cônego Simão Rodrigues de Sá, Antonio Rodrigues, outro Simão Rodrigues, João Rodrigues de Sá, Francisco Rodrigues de Sá, Miguel Forte Velho, Eusébio de Oliveira Monteiro, Maria de Sá, Cristino Rodrigues de Sá e Eugênia de Sá. Chama atenção além da presença de um Simão Rodrigues de Sá, clérigo, também tem uma Eugênia entre os suplicantes. Na referida carta, que tem como data de concessão 2 de junho de 1681, o clérigo se apresenta como cônego, o que reforça a afirmação de Dom Domingos Lorêto Couto de que o padre Simão Rodrigues de Sá teria sido Arcediago 22 da Sé de Olinda 23. O cônego Simão Rodrigues de Sá é citado também na clássica obra de Borges da Fonseca, Nobiliarquia Pernambucana: Gonçalo Carneiro da Costa sucedeu a seu irmão no Morgado, do qual da mesma sorte mandou tomar posse por procuração e o logrou muitos anos. Nos livros da Câmara de Olinda o achamos servindo de Vereador no ano de 1680 e de Juiz 16 Ibidem. 17 Ibidem. 18 Ibidem. 19 RUBERT, Arlindo. A Igreja no Brasil. Santa Maria, Pallotti, 1981.v. II: (Expansão missionária e hierárquica, século XVII), p. 321. 20 AZZI, Riolando. História da Igreja do Brasil. Petrópolis: Vozes. 2008. p. 192 200. 21 Documentação Histórica Pernambucana: sesmarias. Recife: SECRETARIA DE EDUCAÇÃO E CULTURA BIBLIOTECA PÚBLICA, 1959. p. 98. v. 4. 22 Arcediago ou Arquidiácono era o título dado a um clérigo encarregado, pelo bispo, da administração de uma parte da diocese. O termo é comumente se referido a um dignitário de um cabido (conjunto de cônegos). 23 ANAIS DA BIBLIOTECA NACIONAL, Vol. XV. Desagravo do Brazil e glorias de Pernambuco (conclusão). Rio de Janeiro, 1903. p. 84. 5

ordinário no de 1697e neste o vejo notado por Capitão. Foi casado com D. Brites de Sá, viúva de Domingos de Oliveira Monteiro, a qual era irmã do Cônego Simão Rodrigues de Sá, filho de Simão Rodrigues, natural de Viseu, e de sua mulher Maria de Sá, natural de Pernambuco, filha de Francisco Velho Romeiro e de Beatriz de Sá, o que consta do inventário do dito Simão Rodrigues, e do seu testamento que foi feito ao 1º de novembro de 1680 e aprovado pelo Tabelião Diogo Cardoso. Do termo de Irmão da Misericórdia que assinou o dito Cônego Simão Rodrigues a 23 de abril de 1696 consta que era neto por via paterna de Antonio Rodrigues e de sua mulher Maria Antonia e que já então era Arcediago de Olinda 24. Neste caso, contudo não se exclui a possibilidade do cônego ser um homônimo do padre Simão, visto que nos registros paroquiais não existe referencias ao título de Arcediago, ou mesmo de cônego, que sendo título de destaque para o clero colonial não seria normalmente ocultado. Nas cartas referentes na capitania do Rio Grande, em quatro delas o suplicante se apresenta como padre vigário, sendo que em duas dessas, citado especificamente como vigário da matriz de Nossa Senhora da Apresentação. A primeira destas sesmarias é urbana, foi concedida pelo Senado da Câmara de Natal, ela estava localizada em frente à igreja Nossa Senhora do Rosário, onde provavelmente o padre edificou sua morada. Ao analisar as cartas referentes à capitania do Rio Grande temos informações que ajudam a ilustrar as complexas alianças do Padre Simão e da família dos Rodrigues de Sá. Exemplo disso é a concessão de 8 de abril de 1706 25, onde o padre Simão Rodrigues de Sá, juntamente com José Monteiro receberam concessão de uma sesmaria na Serra do Cabugi, na Ribeira do Caranhu. José Monteiro era genro da viúva Maria Fernandes de Araújo, que por diversas vezes é citada como madrinha nos registros de batismo referentes aos Rodrigues de Sá, além de ser madrinha do sua neta Felipa, filha de José Monteiro, que teve o próprio padre Simão Rodrigues de Sá como celebrante e padrinho. Portanto os suplicantes são compadres e a relação entre suas famílias eram muito estreitas. O que pode ser atestado ainda mais na carta de sesmaria de 3 de maio de 1706 26, que tinha por suplicantes o neto do padre Simão Rodrigues de Sá, Caetano de Melo Albuquerque e a já citada viúva Maria Fernandes de Araújo. As terras requeridas tinham por confrontante a sesmaria acima citada do Padre Simão Rodrigues de Sá e de José Monteiro. Também Mateus Rodrigues de Sá, recebeu terras nas proximidades do rio Caranhu, em 3 de maio de 1706 27. É registrada ainda carta de sesmaria 24 FONSECA, Antônio José Vitoriano Borges. Nobiliarquia Pernambucana, vol. I. In: ANAIS DA BIBLIOTECA NACIONAL, Vol. XLVII., 1918. p. 198. 25 IHGRN Fundo Sesmarias, Livro I, fls. 212 214. 26 IHGRN Fundo Sesmarias, Livro I, fls. 215 217. 27 IHGRN Fundo Sesmarias, Livro I, fls. 221 223. 6

do padre Simão Rodrigues de Sá e Antônio de Araújo e Souza 28, requerendo terras na localidade do Rio Salgado, na Ribeira do Assu, deferida em 3 de maio de 1706 e registrada em 7 de maio do mesmo ano 29. A partir das concessões analisadas pode-se afirmar que Rodrigues de Sá e seus aliados se tronaram senhores de uma vasta extensão de terras, principalmente na Ribeira do Caranhu. É de notável destaque a proximidade da viúva Maria Fernandes de Araújo e de sua família com os Rodrigues de Sá. Como já citado neste trabalho seu nome está presente como madrinha de Simão de Melo Albuquerque, filho de Dona Eugênia Rodrigues de Sá e de Clara Rodrigues de Sá, filha de Matheus Rodrigues de Sá. Já sua filha, Maria Felipa Neri foi madrinha de Maria de Melo, filha de Genovesa Rodrigues de Sá e de José Barbosa de Sousa, filho de Luiza Rodrigues de Sá. Por fim seu genro, José Monteiro, recebeu concessão de sesmaria junto com o padre Doutor Simão Rodrigues de Sá. Mostrando que a viúva é uma peça importante na rede formada pelos Rodrigues de Sá que se estendia para além das redes tradicionais de parentela, atingindo uma familiaridade a partir de uma parentela ritual, formada a partir das relações compadrio selada na pia batismal. Desta forma o padre Doutor Simão Rodrigues de Sá se constituiu como um verdadeiro patriarca dos Rodrigues de Sá na cidade do Natal, ao passo que como clérigo exercia uma paternidade espiritual sobre seus fregueses. Essa figura apresentou traços importantes do clero e da sociedade de sua época. Sua saída das notas de rodapé dos livros clássicos da historiografia local oferece um importante contributo para a ampliação de um campo historiográfico ainda pouco explorado no Rio Grande do Norte. Mostrando que os clérigos não são objeto de pesquisa exclusivo da História Eclesiástica, mas que podem ser abordados pela História Social, como agentes inseridos em sua sociedade, estabelecendo relações com os mais diversos grupos sociais. Por fim este trabalho buscou estabelecer uma análise de como os presbíteros seculares estavam ligados as redes de parentela, ao ponto de por vezes estabelecendo descendências fossem elas legítima ou ilegítimas. 28 Este aparece como padre ao apadrinhar a escrava Luiza, em cerimônia oficiada pelo padre Simão Rodrigues de Sá na capela de Nossa Senhora do Ó em Papary (no atual município de Nísia Floresta), em 27 de dezembro de 1707. Conforme o Livro de Registro de Batismos da Freguesia de Nossa Senhora da Apresentação (1681-1714). 29 IHGRN Fundo Sesmarias, Livro I, fls. 218 220. 7

REFERENCIAS ANAIS DA BIBLIOTECA NACIONAL, Vol. XV. Desagravo do Brazil e glorias de Pernambuco (conclusão). Rio de Janeiro, 1903. AZZI, Riolando. História da Igreja do Brasil. Petrópolis: Vozes. 2008. CASCUDO, Luis da Câmara. História da Cidade do Natal. 4 ed. Natal: EDUFRN, 2010. FEITLER, Bruno; SOUZA, Evergton Sales (Orgs.). A Igreja no Brasil, normas e práticas durante a Vigência das Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia. São Paulo: Ed UNIFESP, 2011. FONSECA, Antônio José Vitoriano Borges. Nobiliarquia Pernambucana, vol. I. In: ANAIS DA BIBLIOTECA NACIONAL, Vol. XLVII., 1918. LADIM, Mons. José. A poeira dos caminhos. Recife: Imprensa Industrial, 1950. HOLANDA, Sérgio Buarque. Raízes do Brasil. 5ª edição. Rio de Janeiro, Livraria José Olimpio Livraria, 1956. RUBERT, Arlindo. A Igreja no Brasil. Santa Maria, Pallotti, 1981.v. II: (Expansão missionária e hierárquica, século XVII). 8